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Jurisprudência


TRF3 0002987-93.2009.4.03.6104 00029879320094036104

Ementa
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL - PAR. NORMAS DO CDC: INAPLICABILIDADE. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL DA ARRENDADORA PELA QUALIDADE DOS IMÓVEIS OFERTADOS AOS BENEFICIÁRIOS DO PROGRAMA. INADIMPLEMENTO ABSOLUTO DA OBRIGAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS CARACTERIZADOS. VALOR ARBITRADO. ATENDIMENTO AOS CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1. O contrato em questão é regulado pelas normas da Lei nº 10.188/2001, que instituiu o Programa de Arrendamento Residencial - PAR para atendimento da necessidade de moradia da população de baixa renda, sob a forma de arrendamento residencial com opção de compra. 2. Os contratos do PAR são firmados pela instituição financeira, no caso a Caixa Econômica Federal, que age na qualidade de agente operador do Programa, na forma § 1º do artigo 1º da Lei nº 10.188/2001. Trata-se, portanto, de um programa de governo destinado a ampliar o acesso das populações mais carentes à moradia. 3. Aplicando analogicamente o entendimento jurisprudencial consagrado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, é impossível a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor aos contratos vinculados ao PAR, na medida em que referidos contratos não caracterizam relação de consumo nem tampouco apresentam conotação de serviço bancário, mas sim consubstanciam-se em programa habitacional custeado com recursos públicos. Precedente. 4. Ao tratar da responsabilidade contratual, o Código Civil faz emergir, como seus pressupostos, a existência de contrato válido; sua inexecução, pelo inadimplemento absoluto ou pela mora; dano e nexo causal. A propósito deste último, o artigo 403 exige que o dano seja consequência necessária, direta e imediata, da inexecução da obrigação. 5. No âmbito no PAR, a CEF adquire imóveis já construídos, com a finalidade de atender às exigências do programa habitacional, conforme determina o caput do artigo 6º da Lei nº 10.188/2001. A CEF, portanto, tem o dever de entregar aos beneficiários do PAR imóveis aptos à moradia, na medida em que o programa foi instituído para atendimento da necessidade de moradia da população de baixa renda. 6. A Lei nº 10.188/2001 também estabelece que se aplica ao arrendamento residencial, no que couber, a legislação pertinente ao arrendamento mercantil (artigo 10). Nesse sentido, convém ressaltar que a Lei nº 6.099/1974, no parágrafo único de seu artigo 1º, define o arrendamento mercantil como "o negócio jurídico realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta". 7. Dessa definição legal depreende-se que o arrendador tem o dever de entregar o bem arrendado, garantindo sua idoneidade e adequação aos fins a que se destina, ou seja, o uso do bem pelo arrendatário. 8. No caso dos autos, a CEF não nega os argumentos dos réus quanto à impossibilidade de entrar no imóvel antes da contratação, bem como, não apresentou qualquer prova da habitualidade do imóvel arrendado, ou seja, não houve impugnação específica. Ademais, em réplica de fls. 165/169, a CEF (reconvinda) não apresentou qualquer oposição de defesa quanto aos danos materiais e morais pleiteados pela parte ré (reconvinte), o que enseja a aplicação dos efeitos da revelia, ou seja, presunção de veracidade dos fatos alegados pelos réus reconvintes (art. 344 do CPC/2015). 9. Diante de tais considerações, uma vez não assegurado o bom uso ao fim a que se destina o bem, conclui-se pela inexecução do contrato de arrendamento residencial, ante o inadimplemento absoluto da obrigação pela CEF. 10. Diante do fato incontroverso de vícios no imóvel arrendado, resta caracterizado o dano como decorrência necessária do inadimplemento. Assim, presentes os pressupostos, há que reconhecer a responsabilidade contratual da CEF no presente caso, a ensejar a reparação da autora por danos materiais e morais. 11. Os danos materiais estão suficientemente comprovados nos autos, mediante as várias ligações telefônicas realizadas, conforme os documentos acostados aos autos de fls. 104/113. Quanto ao dano moral, o moderno entendimento, à luz da Constituição da República de 1988, classifica-o, em sentido estrito, como violação ao direito à dignidade e, em sentido amplo, como os diversos graus de ofensa aos direitos da personalidade, considerada a pessoa em suas dimensões individual e social. 12. Em vista disso, o mero inadimplemento contratual, em princípio, não teria o condão de caracterizar o dano moral. No entanto, se os efeitos do inadimplemento contratual, como no caso dos autos, extrapolam o mero aborrecimento cotidiano e repercutem na esfera da dignidade da vítima, o dano moral resta perfeitamente configurado. 13. Assim, reconhecida a responsabilidade da CEF, bem como, diante dos indicadores supramencionados, do interesse jurídico lesado e das particularidades do caso concreto, a indenização fixada no valor cobrado na reconvenção (R$ 10.577,46, acrescido de atualização monetária e juros de mora de 1% ao mês desde a data do ilícito até a data do efetivo pagamento), o valor revela-se adequado para recompor os danos imateriais sofridos, atendendo aos padrões adotados pela jurisprudência bem como aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 14. Considerando que o recurso foi interposto sob a égide do CPC/1973 e, nos termos do Enunciado Administrativo nº 7, elaborado pelo Superior Tribunal de Justiça para orientar a comunidade jurídica acerca da questão do direito intertemporal, tratando-se de recurso interposto contra decisão publicada anteriormente a 18/03/2016, não é possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do artigo 85, § 11, do CPC/2015. 15. Apelação improvida.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso de apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 24/04/2018
Data da Publicação : 04/05/2018
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2052359
Órgão Julgador : PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/05/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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