TRF3 0003053-18.2015.4.03.6119 00030531820154036119
APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. LEI
11.343/2006. PRELIMINARES. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. DIREITO DE
RECORRER EM LIBERDADE. COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL. AUSÊNCIA
DE DOLO. DOLO EVENTUAL. AUTORIA E MATERIALIDADE. DOSIMETRIA
DA PENA. PENA-BASE. CONFISSÃO. MINORANTE. ART. 33, § 4º,
DA LEI 11.343/06. DETRAÇÃO PENAL. REGIME. SUBSTITUIÇÃO DA
PENA. MULTA. ISENÇÃO. DESCABIMETO. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS.
1. Verifico que a apelante foi presa em flagrante, permanecendo custodiada
durante todo o processo, sendo, ao final, condenado, não tendo havido
mudança do quadro fático descrito na sentença a ensejar a alteração de
sua situação prisional, nos termos do artigo 387, p. único, do Código de
Processo Penal. Por outro ângulo, observo que estão presentes os requisitos
para a manutenção da segregação cautelar da apelante, para garantia
da ordem pública e para assegurar a aplicação da lei penal (art. 312 do
Código de Processo Penal).
2. Não cabe a inversão do ônus da prova em favor de réu assistido pela
Defensoria Pública, ainda que se verifique a vulnerabilidade inerente a essa
situação. Não há previsão legal específica, devendo a distribuição
do ônus da prova seguir o que está disposto no art. 156 do Código de
Processo Penal. Preliminares rejeitadas.
3. Mérito. A autoria e a materialidade do crime de tráfico restaram bem
demonstradas pelos seguintes documentos: auto de prisão em flagrante
(fls. 02/03); Laudo Preliminar de Constatação (fls. 09/11), Auto de
Apresentação e Apreensão (fl. 17), Laudo de Perícia Criminal (fls. 62/65),
passagens aéreas (fls. 18/19), e pelos depoimentos das testemunhas e pelo
interrogatório da ré (mídia de fl. 150).
4. Situação de penúria não afasta responsabilidade penal, deixando
de configurar inexigibilidade de conduta diversa. Não comprovado perigo
imediato que justificasse cometimento do delito. Significativo intervalo
temporal entre proposta para a realização do tráfico, recebimento da droga
em território nacional e chegada ao Aeroporto Internacional de Guarulhos,
onde embarcaria, em vôo com destino a Abu/Dhabi. Alegação de estado de
necessidade afastada. Inaplicabilidade da causa de diminuição de pena
prevista no art. 24, § 2º, do Código Penal. Coação moral irresistível
não comprovada.
5. As circunstâncias do caso concreto indicam que a apelante possuía
plena ciência de que postava substância entorpecente e, somente a título
de argumentação, mesmo que não tivesse conhecimento da ilicitude de
sua conduta, no mínimo assumiu o risco de praticá-la, configurando o
dolo eventual, a ensejar sua condenação nas penas do delito de tráfico
internacional.
6. Dosimetria da pena. A pena-base merece ser reduzida para 5 (cinco) anos
de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, especialmente pela pequena
quantidade de droga apreendida (pouco menos de um quilo de cocaína).
7. Reputo que a ré faz jus à incidência da atenuante da confissão,
pois, a despeito de ter sido presa em flagrante, confessou espontaneamente a
autoria dos fatos a si imputados, o que inclusive foi utilizado para embasar
a condenação. De modo diverso, verifico que no caso concreto não há
nenhuma circunstância excepcional que justifique a aplicação da atenuante
genérica prevista no art. 66, do Código Penal.
8. Os requisitos do benefício previsto no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06,
são cumulativos. No caso em tela, a ré é primária e não ostenta maus
antecedentes, tampouco há elementos que indiquem integrar organização
criminosa, ainda que em escala restrita, de modo que aplicável a minorante,
mas apenas no patamar de 1/6 (um sexto), pois ao menos aceitou realizar o
transporte intercontinental de droga, delito que envolve certo nível de
planejamento e estruturação (compra de passagens internacionais, gastos
com hospedagem, preparação da ocultação da droga, etc).
9. Para a fixação do regime inicial de cumprimento de pena, deve ser
considerado o tempo de prisão provisória cumprido pelo acusado, o que não
se confunde com a progressão do regime prisional, pela dicção dada ao artigo
387, § 2º, do Código de Processo Penal pela Lei nº 12.736, de 30/11/2012.
10. No caso dos autos, a apelante foi presa pelo delito de tráfico de
entorpecentes em 25.03.2015 e condenada à pena total de 4 (quatro) anos, 10
(dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão. Considerando-se o tempo de prisão
cumprido pela recorrente até a prolação da sentença (22.10.2015), aplico a
detração penal e verifico que o total de pena a ser cumprida pela acusada,
naquela data, ainda era superior a 04 (quatro) anos, devendo ser fixado o
regime inicial semiaberto, nos termos do §3º do artigo 33 do Código Penal.
11. Em virtude da quantidade de pena cominada à acusada, incabível a
substituição de pena privativa de liberdade por penas restritivas de
direitos, nos termos do art. 44, do Código Penal.
12. O legislador, ao fixar os parâmetros da pena pecuniária, observou as
características inerentes ao delito de tráfico ilícito de entorpecentes,
cometido quase que exclusivamente pela ganância e busca do lucro fácil,
tendo o recrudescimento da pena pecuniária se mostrado totalmente adequado
e proporcional, não se podendo falar em sua inconstitucionalidade, devendo
as questões referentes à eventual impossibilidade de cumprimento serem
discutidas perante o Juízo das Execuções.
13. Uma vez cumprida a sanção penal atribuída à ré, não haverá
óbice para que a própria se dirija aos órgãos responsáveis e obtenha,
diretamente, os documentos que solicitou (CTPS e RNE), desde que cumpridos
os devidos requisitos.
14. Recurso de apelação a que se dá parcial provimento, para reduzir a
pena-base para 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa e
aplicar a atenuante da confissão, redundando na pena definitiva de 4 (quatro)
anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, além do pagamento de 485
(quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, no regime semiaberto.
Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. LEI
11.343/2006. PRELIMINARES. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. DIREITO DE
RECORRER EM LIBERDADE. COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL. AUSÊNCIA
DE DOLO. DOLO EVENTUAL. AUTORIA E MATERIALIDADE. DOSIMETRIA
DA PENA. PENA-BASE. CONFISSÃO. MINORANTE. ART. 33, § 4º,
DA LEI 11.343/06. DETRAÇÃO PENAL. REGIME. SUBSTITUIÇÃO DA
PENA. MULTA. ISENÇÃO. DESCABIMETO. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS.
1. Verifico que a apelante foi presa em flagrante, permanecendo custodiada
durante todo o processo, sendo, ao final, condenado, não tendo havido
mudança do quadro fático descrito na sentença a ensejar a alteração de
sua situação prisional, nos termos do artigo 387, p. único, do Código de
Processo Penal. Por outro ângulo, observo que estão presentes os requisitos
para a manutenção da segregação cautelar da apelante, para garantia
da ordem pública e para assegurar a aplicação da lei penal (art. 312 do
Código de Processo Penal).
2. Não cabe a inversão do ônus da prova em favor de réu assistido pela
Defensoria Pública, ainda que se verifique a vulnerabilidade inerente a essa
situação. Não há previsão legal específica, devendo a distribuição
do ônus da prova seguir o que está disposto no art. 156 do Código de
Processo Penal. Preliminares rejeitadas.
3. Mérito. A autoria e a materialidade do crime de tráfico restaram bem
demonstradas pelos seguintes documentos: auto de prisão em flagrante
(fls. 02/03); Laudo Preliminar de Constatação (fls. 09/11), Auto de
Apresentação e Apreensão (fl. 17), Laudo de Perícia Criminal (fls. 62/65),
passagens aéreas (fls. 18/19), e pelos depoimentos das testemunhas e pelo
interrogatório da ré (mídia de fl. 150).
4. Situação de penúria não afasta responsabilidade penal, deixando
de configurar inexigibilidade de conduta diversa. Não comprovado perigo
imediato que justificasse cometimento do delito. Significativo intervalo
temporal entre proposta para a realização do tráfico, recebimento da droga
em território nacional e chegada ao Aeroporto Internacional de Guarulhos,
onde embarcaria, em vôo com destino a Abu/Dhabi. Alegação de estado de
necessidade afastada. Inaplicabilidade da causa de diminuição de pena
prevista no art. 24, § 2º, do Código Penal. Coação moral irresistível
não comprovada.
5. As circunstâncias do caso concreto indicam que a apelante possuía
plena ciência de que postava substância entorpecente e, somente a título
de argumentação, mesmo que não tivesse conhecimento da ilicitude de
sua conduta, no mínimo assumiu o risco de praticá-la, configurando o
dolo eventual, a ensejar sua condenação nas penas do delito de tráfico
internacional.
6. Dosimetria da pena. A pena-base merece ser reduzida para 5 (cinco) anos
de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, especialmente pela pequena
quantidade de droga apreendida (pouco menos de um quilo de cocaína).
7. Reputo que a ré faz jus à incidência da atenuante da confissão,
pois, a despeito de ter sido presa em flagrante, confessou espontaneamente a
autoria dos fatos a si imputados, o que inclusive foi utilizado para embasar
a condenação. De modo diverso, verifico que no caso concreto não há
nenhuma circunstância excepcional que justifique a aplicação da atenuante
genérica prevista no art. 66, do Código Penal.
8. Os requisitos do benefício previsto no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06,
são cumulativos. No caso em tela, a ré é primária e não ostenta maus
antecedentes, tampouco há elementos que indiquem integrar organização
criminosa, ainda que em escala restrita, de modo que aplicável a minorante,
mas apenas no patamar de 1/6 (um sexto), pois ao menos aceitou realizar o
transporte intercontinental de droga, delito que envolve certo nível de
planejamento e estruturação (compra de passagens internacionais, gastos
com hospedagem, preparação da ocultação da droga, etc).
9. Para a fixação do regime inicial de cumprimento de pena, deve ser
considerado o tempo de prisão provisória cumprido pelo acusado, o que não
se confunde com a progressão do regime prisional, pela dicção dada ao artigo
387, § 2º, do Código de Processo Penal pela Lei nº 12.736, de 30/11/2012.
10. No caso dos autos, a apelante foi presa pelo delito de tráfico de
entorpecentes em 25.03.2015 e condenada à pena total de 4 (quatro) anos, 10
(dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão. Considerando-se o tempo de prisão
cumprido pela recorrente até a prolação da sentença (22.10.2015), aplico a
detração penal e verifico que o total de pena a ser cumprida pela acusada,
naquela data, ainda era superior a 04 (quatro) anos, devendo ser fixado o
regime inicial semiaberto, nos termos do §3º do artigo 33 do Código Penal.
11. Em virtude da quantidade de pena cominada à acusada, incabível a
substituição de pena privativa de liberdade por penas restritivas de
direitos, nos termos do art. 44, do Código Penal.
12. O legislador, ao fixar os parâmetros da pena pecuniária, observou as
características inerentes ao delito de tráfico ilícito de entorpecentes,
cometido quase que exclusivamente pela ganância e busca do lucro fácil,
tendo o recrudescimento da pena pecuniária se mostrado totalmente adequado
e proporcional, não se podendo falar em sua inconstitucionalidade, devendo
as questões referentes à eventual impossibilidade de cumprimento serem
discutidas perante o Juízo das Execuções.
13. Uma vez cumprida a sanção penal atribuída à ré, não haverá
óbice para que a própria se dirija aos órgãos responsáveis e obtenha,
diretamente, os documentos que solicitou (CTPS e RNE), desde que cumpridos
os devidos requisitos.
14. Recurso de apelação a que se dá parcial provimento, para reduzir a
pena-base para 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa e
aplicar a atenuante da confissão, redundando na pena definitiva de 4 (quatro)
anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, além do pagamento de 485
(quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, no regime semiaberto.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar parcial provimento ao recurso de apelação, para reduzir
a pena-base para 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa e
aplicar a atenuante da confissão, redundando na pena definitiva de 4 (quatro)
anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, além do pagamento de 485
(quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, no regime semiaberto, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
13/06/2016
Data da Publicação
:
21/06/2016
Classe/Assunto
:
ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 66410
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** LDR-06 LEI DE DROGAS
LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-33 PAR-4
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-24 PAR-2 ART-33 PAR-3 ART-44 ART-66
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-156 ART-312 ART-387 PAR-ÚNICO PAR-2
LEG-FED LEI-12736 ANO-2012
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/06/2016
..FONTE_REPUBLICACAO:
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