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Jurisprudência


TRF3 0003121-92.2015.4.03.6110 00031219220154036110

Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO MAJORADO E QUALIFICADO. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA CAUSA DE AUMENTO DO CRIME PRATICADO DURANTE O REPOUSO NOTURNO EM CASO DE FURTO QUALIFICADO. COMPATIBILIDADE NORMATIVA. FASES DISTINTAS DA DOSIMETRIA DA PENA. CONCURSO DE PESSOAS E IMPUTAÇÃO DO CRIME DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM. MATERIALIDADE E AUTORIA. DEMONSTRAÇÃO. DANO QUALIFICADO COMETIDO CONTRA PATRIMÔNIO DA UNIÃO. DELITO SUBSIDIÁRIO. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. ABSORÇÃO PELO CRIME DE FURTO QUALIFICADO PELO ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. RECEPTAÇÃO. PROVA DA MATERIALIDADE E AUTORIA. CRIME DE EXPLOSÃO MAJORADO. PRÉDIO DE USO PÚBLICO. CRIME AUTÔNOMO. BEM JURÍDICO DISTINTO. CONDENAÇÃO EM CONCURSO MATERIAL. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA ARMADA. DEMONSTRAÇÃO DO VÍNCULO PERMANENTE. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR. CRIME IMPOSSÍVEL. PLACA DO CARRO FALSA. USO DE DOCUMENTO PÚBLICO FALSO. MATERIALIDADE DEMONSTRADA POR PERÍCIA. AUTORIA INCONTESTE. PORTE E POSSE DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. LEI PENAL ESPECIAL. PROVA PERICIAL. MATERIALIDADE E AUTORIA. COMPROVAÇÃO. DOSIMETRIA. SÚMULAS 231 E 444 DO STJ. FURTO DUPLAMENTE QUALIFICADO. POSSIBILIDADE DE EXASPERAÇÃO DA PENA BASE. DUPLA REINCIDÊNCIA. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA NÃO COMPENSADA INTEGRALMENTE. PENA DE MULTA. PROPORCIONALIDADE COM A PENA CORPORAL. INCABÍVEL A SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. QUANTIDADE DA PENA. REQUISITOS SUBJETIVOS NÃO PREENCHIDOS. FIXAÇÃO DO MÍNIMO PARA REPARAÇÃO DOS DANOS. AUSÊNCIA DE PEDIDO EXPRESSO. DECOTE DA CONDENAÇÃO. APELOS PARCIALMENTE PROVIDOS. 1- Denúncia que imputa aos sete acusados a prática dos crimes de furto majorado pelo cometimento durante o repouso noturno e qualificado pelo rompimento de obstáculo e pelo concurso de pessoas (art. 155, §§1º e 4§, I e IV, CP); dano qualificado (art. 163, parágrafo único, III, CP); receptação (art. 180, CP); explosão majorada (art. 251, §2º, CP); associação criminosa armada (art. 288, parágrafo único, CP); adulteração de sinal identificador de veículo automotor (art. 311, CP); e porte ou posse de arma de fogo de uso restrito (art. 16 da Lei nº 10.826/2003). 2- Deferido o pleito de assistência judiciária gratuita, pois a Lei nº 1. 060/50, em seu art. 4º, dispõe que o benefício será concedido mediante simples afirmação da hipossuficiência econômica pela parte requerente, dispensada a apresentação de declaração de próprio punho ou em peça separada. Hipótese concreta na qual, ademais, o acusado está assistido pela Defensoria Pública da União, o que milita em prol da afirmação de hipossuficiência contida na apelação. 3- Materialidade e autoria do crime de furto majorado e qualificado demonstradas pelo conjunto probatório produzido, em especial pela prova pericial e oral. 4- A causa de aumento relativa ao crime cometido durante o repouso noturno justifica-se pela reduzida vigilância no período e, portanto, maior gravidade na forma de cometimento do delito, razão pela qual descabe restringir sua aplicação às hipóteses de furto simples, inclusive por ausência de disposição legal em tal sentido. Ainda, a causa de aumento não apresenta nenhuma incompatibilidade com a forma qualificada do delito de furto, por cuidar de circunstância que reflete em momento diverso da fixação da reprimenda, sendo, portanto, perfeitamente aplicável, tanto aos casos de furto simples quanto à modalidade qualificada. 5- Não há um horário específico para o período de repouso noturno, devendo o julgador, caso a caso, analisar a situação. Na hipótese dos autos, o delito de furto qualificado foi praticado durante a alta madrugada, por volta das 3h43min, de molde que incide, na espécie, a causa de aumento prevista no art. 155, §1º, do Código Penal. 6- Não se verifica o alegado bis in idem quanto à imputação concomitante da prática do crime de furto qualificado pelo concurso de duas ou mais pessoas e do delito de associação criminosa. Os crimes previstos nos artigos 155, §4º, IV, e 288, ambos do Código Penal, são autônomos e tutelam bens jurídicos distintos (patrimônio e paz pública, respectivamente), sendo perfeitamente possível a condenação pela prática de ambos os delitos. Não há qualquer vinculação necessária entre a forma como praticados os delitos pela associação criminosa anteriormente constituída (quer individualmente, quer em concurso de pessoas) e a própria tipificação da conduta descrita no art. 288 do Código Penal, donde inegável que imputação contida na denúncia não configura bis in idem. 7- Materialidade do delito do art. 16 da Lei nº 10.826/2003 é incontroversa e vem demonstrada, especialmente, pela prova pericial produzida, a demonstrar que as armas, munições e artefatos apreendidos cuidavam de material de uso restrito, cuja posse e utilização somente competem às Forças Armadas ou aos autorizados pelo Exército, nos termos do Decreto nº 3.665/2000. 8- A autoria do delito do art. 16 da Lei nº 10.826/2003 em relação aos acusados WILSON, LUIZ GUSTAVO, AGUINALDO, RODRIGO e MICHEL também restou incontroversa, tanto pela confissão judicial dos fatos e depoimentos judiciais das testemunhas, quanto pela ausência de recurso da defesa no particular. 9- Reforma da sentença absolutória quanto aos acusados ALEXANDRE e RODOLFO, por ter restado sobejamente demonstrado que os réus tinham em depósito armas de fogo de uso restrito, na chácara de propriedade do genitor do primeiro acusado (auto de apresentação e apreensão e depoimentos em juízo dos policiais responsáveis pelo flagrante, além dos interrogatórios dos réus). É irrelevante para a condenação dos réus o fato de terem negado a propriedade do armamento. 10- O crime de explosão previsto no art. 251 do Código Penal é de perigo comum, tutelando o risco de lesão a bens jurídicos de terceiros indeterminados, vale dizer, a incolumidade pública (objetividade jurídica). Não há, portanto, como aplicar o princípio da consunção, na medida em que a explosão da qual se valeram os réus para a prática do delito de furto não era o único meio disponível para o rompimento do obstáculo, bem como porque o crime do art. 251 do Código Penal tutela bem jurídico distinto daquele salvaguardado pelo tipo do art. 155 do mesmo Diploma Legal. 11- Configurada a causa de aumento de pena do art. 251, §2º, do CP, porque o crime de explosão foi praticado em edifício destinado a uso público, no caso, uma sala de autoatendimento da Caixa Econômica Federal no Município de Alumínio/SP. 12- O crime de dano possui natureza subsidiária, por se tratar de crime genérico em relação a outros tipos, podendo caracterizar-se como crime de passagem (delito-meio) para delitos mais graves ou, até mesmo, como eventual fato posterior impunível. Cede espaço, pois, a outros tipos que o subentendem em suas formas simples ou qualificadas ou que se apresentam com detalhes indicativos de exclusividade. 13- Hipótese em que os crimes de dano e de furto qualificado estão numa relação de causalidade de meio para fim (consunção), pois não é possível a consumação do crime de furto mediante rompimento/destruição de obstáculo sem que, ao menos, se danifique o bem atingido. 14- Mantida a sentença que reconheceu a absorção do crime de dano qualificado pelo de furto qualificado por rompimento de obstáculo. 15- Receptação. Circunstâncias da aquisição do veículo automotor que demonstram de maneira inequívoca a origem ilícita do bem e que eram de conhecimento de todos os acusados, que praticaram o delito em coautoria. 16- Absolvição dos réus da imputação do crime do art. 311, caput, do Código Penal, por tratar o caso concreto de crime impossível. A conduta típica de adulterar sinal identificador de veículo automotor pressupõe a idoneidade e higidez do elemento adulterado/remarcado, o que não se verifica no caso dos autos, pois a placa alterada com fita isolante já era falsa e tal circunstância não era conhecida dos acusados. 17- Mantida a condenação do réu AGUINALDO pelo crime de uso de documento falso. Provas incontestes da autoria e materialidade do delito. 18- Associação criminosa armada. Elementos caracterizadores demonstrados. A ausência de condenação dos réus pela prática conjunta de delitos em momento anterior não é requisito para a conformação típica da conduta. A estrutura aparelhada pelos réus para a prática do crime de furto e demais delitos vinculados demonstra inequivocamente a associação dos indivíduos de maneira organizada e complexa, com divisão clara de tarefas e por meios acessíveis e justificáveis apenas no âmbito de um organismo estruturado com o fim específico de cometer crimes. 19- Dosimetria. Furto duplamente qualificado. Perfeitamente possível que o concurso de pessoas seja valorado como circunstância judicial negativa (art. 59 do Código Penal), na linha de entendimento já pacificado do Superior Tribunal de Justiça de que, "em havendo o concurso de agentes e o rompimento de obstáculo, é possível que uma circunstância seja utilizada para tipificar a conduta, como furto qualificado, e a outra empregada na dosimetria da sanção, a fim de se considerar como desfavorável circunstância judicial, acrescendo, assim, a pena- base" (6ª Turma, HC 234.191, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 04/06/2014). 20- A pena de multa deve guardar a devida proporção com a pena corporal. Redimensionamento de ofício. 21- A existência, em concreto, de duas condenações que configuram reincidência não autoriza a integral compensação entre tal agravante e a atenuante do art. 65, III, "d" do Código Penal. 22- A valoração negativa dos antecedentes criminais depende da condenação definitiva do acusado, sob pena de violação ao princípio constitucional da presunção de não-culpabilidade. A questão encontra-se, inclusive, sumulada no C. Superior Tribunal de Justiça (verbete nº 444). Circunstância judicial afastada, de ofício, com relação aos acusados que não ostentam condenações transitadas em julgado. 23- Nos termos da jurisprudência consolidada do C. STJ, a permissão legal de cumulação de pretensão acusatória com a indenizatória não dispensa a existência de expresso pedido formulado pelo ofendido, inclusive como forma de garantia do contraditório e da ampla defesa ao acusado. Ausente pedido expresso para fixação do valor mínimo de reparação dos danos, a indenização fixada em primeiro grau fica extirpada da condenação. 24- Apelos parcialmente providos.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, i. dar parcial provimento ao recurso ministerial para reconhecer a causa de aumento do art. 155, §1º, do Código Penal e a qualificadora do §4º, IV, do mesmo dispositivo legal; condenar ALEXANDRE BONFIM e RODOLFO RODRIGUES ALVES pela prática do delito do art. 16 da Lei nº 10.826/2003 e do art. 288 do CP; e condenar todos os réus pela prática do crime do art. 251, §2º, do Código Penal; ii. dar parcial provimento aos recursos das defesas de ALEXANDRE BONFIM, RODOLFO RODRIGUES ALVES, MICHEL CARNEIRO RAMALHO, RODRIGO DE OLIVEIRA SOARES DE SOUZA, WILSON VENÂNCIO MARQUES e LUIZ GUSTAVO PEREIRA DOS SANTOS, para absolvê-los da imputação do crime do art. 311, do Código Penal, com espeque no art. 386, III, do Código de Processo Penal, estendendo, de ofício, a ordem para absolver o réu AGUINALDO DOS SANTOS pelos mesmos fundamentos; iii. dar parcial provimento ao recurso da defesa de AGUINALDO DOS SANTOS apenas para conceder ao acusado os benefícios da assistência judiciária gratuita; iv. de ofício, afastar a valoração negativa dos antecedentes criminais dos réus LUIZ GUSTAVO PEREIRA DOS SANTOS e AGUINALDO DOS SANTOS; redimensionar as penas de multa fixadas em primeiro grau; e afastar a fixação do valor mínimo para reparação dos danos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 26/04/2016
Data da Publicação : 04/05/2016
Classe/Assunto : ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 65447
Órgão Julgador : DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA LEG-FED SUM-231 ***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA LEG-FED SUM-444 ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-59 ART-65 INC-3 LET-D ART-155 PAR-1 PAR-4 INC-1 INC-4 ART-163 PAR-ÚNICO INC-3 ART-180 ART-251 PAR-2 ART-288 PAR-ÚNICO ART-311 ***** ED-2003 ESTATUTO DO DESARMAMENTO LEG-FED LEI-10826 ANO-2003 ART-16 ***** LAJ-50 LEI DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA LEG-FED LEI-1060 ANO-1950 ART-4 LEG-FED DEC-3665 ANO-2000 ***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-386 INC-3
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/05/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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