TRF3 0003354-88.2008.4.03.6125 00033548820084036125
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. FINANCIAMENTO ESTUDANTIL. ADMISSIBILIDADE
RECURSAL. AUSÊNCIA DE PREPARO. JUSTIÇA GRATUITA. PRESCRIÇÃO DA
AÇÃO. VENCIMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA. TERMO INICIAL DA CONTAGEM DO
PRAZO. VENCIMENTO DA ÚLTIMA PARCELA. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STJ. FORÇA
OBRIGATÓRIA DOS CONTRATOS. TABELA PRICE. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
1. O art. 518, §1º, do Código de Processo Civil de 1973, dispõe que o
juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em
conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo
Tribunal Federal. Na hipótese, vê-se que as razões de apelação
contém fundamento distinto do quanto previsto no citado art. 518, que
cuida da hipótese em que a apelação envolve unicamente a rediscussão de
entendimento sumulado.
2. A parte ré requereu a concessão do benefício da justiça gratuita,
trazendo aos autos declaração de hipossuficiência e cópias das
Declarações de Ajuste Anual dos exercícios 2007 e 2008 (fls. 70 e
72/88). A autora não se desincumbiu de fazer prova da inexistência ou do
desaparecimento dos requisitos essenciais à concessão do benefício da
justiça gratuita, a teor do art. 7º, da Lei nº 1.060/50, a implicar na
negativa dessa benesse à parte ré, motivo pelo qual concedo o benefício
requerido a fl. 70.
3. Qualquer discussão acerca do termo inicial do prazo prescricional para a
cobrança de créditos parcelados tornou-se inócua diante da pacificação do
entendimento do E. STJ no sentido de que mesmo diante do vencimento antecipado
da dívida, subsiste inalterado o termo inicial do prazo de prescrição,
no caso, o dia do vencimento da última parcela.
4. O vencimento antecipado da dívida previsto contratualmente é uma
faculdade do credor e não uma obrigatoriedade, de modo que, não estando
vencido o prazo fixado contratualmente, não corre o prazo prescricional.
5. Nos casos em que, no momento em que o novo Código Civil passou a vigorar
(11 de janeiro de 2003), ainda não havia transcorrido mais da metade do prazo
prescricional anteriormente disposto (10 anos), a nova legislação passou
a regular inteiramente a matéria no que concerne ao prazo prescricional,
devendo ser aplicado o artigo 206 do Código Civil de 2.002.
6. Este é o prazo aplicável para a cobrança de dívidas oriundas de
contrato de abertura de crédito educativo, não havendo como negar que tal
contrato, juntamente com os seus termos aditivos, atendem aos requisitos
mínimos de certeza e liquidez do título e se constituem como prova escrita
satisfatória para embasar o aforamento da monitória, valendo ressaltar
que eventuais divergências de valores não são suficientes para inibirem a
cobrança, bastando que tais valores sejam revistos mediante simples cálculos
aritméticos.
7. Uma vez convencionados os direitos e obrigações, ficam as partes
ligadas pelo vínculo da vontade que as uniu. Este é o princípio da Força
Obrigatória dos Contratos - também denominado Pacta Sunt Servanda - segundo
o qual, ainda que não positivado no ordenamento jurídico brasileiro, o
referido vínculo acaba sendo tutelado pelo Estado de forma que, estipulado
validamente seu conteúdo e definidos os direitos e obrigações de cada parte,
as respectivas cláusulas têm força obrigatória para os contratantes.
8. Uma das mais importantes consequências deste princípio é a imutabilidade
ou intangibilidade das cláusulas contratuais que somente seriam passiveis
de revisão no caso de estarem eivadas de nulidade ou vício de vontade.
9. Na hipótese, a parte ré, no pleno gozo de sua capacidade civil,
firmou contrato de financiamento estudantil e respectivos aditamentos, com
inquestionável manifestação de livre consentimento e concordância com
todas as condições constantes em tal instrumento.
10. Quanto à função social do contrato, cumpriu ele sua finalidade, que
foi o financiamento da formação escolar da recorrente, não se podendo
falar em desvio de sua finalidade social, no caso concreto.
11. A Tabela Price não denuncia, por si só, a prática de anatocismo, dado
que ele pressupõe a incidência de juros sobre essa mesma grandeza - juros -
acumulada em período pretérito, dentro de uma mesma "conta corrente".
12. O fato de esse sistema antecipar a incidência de juros até o final do
contrato não quer dizer que está havendo aí anatocismo, ou incidência de
juros sobre juros, até porque o contratante recebeu o numerário de uma só
vez e vai pagá-lo ao longo de um período (superior a um ano), em parcelas.
13. O que se observa no caso dos contratos educacionais é que a Caixa
Econômica Federal, ao aplicar esse sistema de amortização, faz incidir
uma taxa de juros capitalizada, a chamada taxa efetiva, e não aquela nominal
que consta do contrato, aplicando, aí sim, juros sobre juros.
14. Somente a partir da edição da Medida Provisória nº 517, publicada
em 31.12.10, que alterou a redação do art. 5º da Lei nº 10.260/01,
posteriormente convertida na Lei nº 12.431/11, de 24.06.11 (art. 24)
autorizou-se a cobrança de juros capitalizados mensalmente, de modo que
para os contratos firmados até 30.12.10 é vedada a cobrança de juros
sobre juros, ao passo que prevista legalmente a capitalização mensal para
os contratos firmados após essa data. Na hipótese, pois, nula a cláusula
que permite a capitalização mensal dos juros.
15. Não obstante seja inquestionável a impossibilidade da capitalização
mensal dos juros, deve ser provido o recurso da CEF, em parte, para se
reconhecer a possibilidade da capitalização anual, conforme a fundamentação
exposta e os precedentes referidos.
16. Importante registrar que a vedação somente diz com a capitalização
mensal, dado que a anual é autorizada pelo Decreto nº 22.626/33
("art. 4º. É proibido contar juros dos juros: esta proibição não
compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta
corrente de ano a ano").
17. Ademais, inaplicável o entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca
das disposições do Decreto nº 22.626/33 (Lei de Usura) não se aplicarem
às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas
por instituições publicas ou privadas que integram o Sistema Financeiro
Nacional (Súmulas nº 121 e nº 596), na medida em que os contratos de
financiamento estudantil submetem-se à norma específica.
18. Considerando que o recurso foi interposto na vigência do Código de
Processo Civil de 1973 e que ambas as partes sucumbiram em parte do pedido,
condeno-as ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 10% (dez
por cento) sobre o benefício econômico por cada uma obtido com a demanda,
que se compensarão no momento do pagamento, nos termos do que dispõe o
artigo 21, daquele diploma processual, observado, se o caso, o disposto nos
artigos 11 e 12, da Lei nº 1.050/60, no caso de resultar obrigação para a
parte ré pagar os honorários após a compensação, já que beneficiária
da assistência judiciária gratuita, requerida a fl. 70 e que ora defiro.
19. Rejeitadas as preliminares arguidas em contrarrazões. Recurso da parte
ré não provida. Apelação da CEF parcialmente provida.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. FINANCIAMENTO ESTUDANTIL. ADMISSIBILIDADE
RECURSAL. AUSÊNCIA DE PREPARO. JUSTIÇA GRATUITA. PRESCRIÇÃO DA
AÇÃO. VENCIMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA. TERMO INICIAL DA CONTAGEM DO
PRAZO. VENCIMENTO DA ÚLTIMA PARCELA. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STJ. FORÇA
OBRIGATÓRIA DOS CONTRATOS. TABELA PRICE. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
1. O art. 518, §1º, do Código de Processo Civil de 1973, dispõe que o
juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em
conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo
Tribunal Federal. Na hipótese, vê-se que as razões de apelação
contém fundamento distinto do quanto previsto no citado art. 518, que
cuida da hipótese em que a apelação envolve unicamente a rediscussão de
entendimento sumulado.
2. A parte ré requereu a concessão do benefício da justiça gratuita,
trazendo aos autos declaração de hipossuficiência e cópias das
Declarações de Ajuste Anual dos exercícios 2007 e 2008 (fls. 70 e
72/88). A autora não se desincumbiu de fazer prova da inexistência ou do
desaparecimento dos requisitos essenciais à concessão do benefício da
justiça gratuita, a teor do art. 7º, da Lei nº 1.060/50, a implicar na
negativa dessa benesse à parte ré, motivo pelo qual concedo o benefício
requerido a fl. 70.
3. Qualquer discussão acerca do termo inicial do prazo prescricional para a
cobrança de créditos parcelados tornou-se inócua diante da pacificação do
entendimento do E. STJ no sentido de que mesmo diante do vencimento antecipado
da dívida, subsiste inalterado o termo inicial do prazo de prescrição,
no caso, o dia do vencimento da última parcela.
4. O vencimento antecipado da dívida previsto contratualmente é uma
faculdade do credor e não uma obrigatoriedade, de modo que, não estando
vencido o prazo fixado contratualmente, não corre o prazo prescricional.
5. Nos casos em que, no momento em que o novo Código Civil passou a vigorar
(11 de janeiro de 2003), ainda não havia transcorrido mais da metade do prazo
prescricional anteriormente disposto (10 anos), a nova legislação passou
a regular inteiramente a matéria no que concerne ao prazo prescricional,
devendo ser aplicado o artigo 206 do Código Civil de 2.002.
6. Este é o prazo aplicável para a cobrança de dívidas oriundas de
contrato de abertura de crédito educativo, não havendo como negar que tal
contrato, juntamente com os seus termos aditivos, atendem aos requisitos
mínimos de certeza e liquidez do título e se constituem como prova escrita
satisfatória para embasar o aforamento da monitória, valendo ressaltar
que eventuais divergências de valores não são suficientes para inibirem a
cobrança, bastando que tais valores sejam revistos mediante simples cálculos
aritméticos.
7. Uma vez convencionados os direitos e obrigações, ficam as partes
ligadas pelo vínculo da vontade que as uniu. Este é o princípio da Força
Obrigatória dos Contratos - também denominado Pacta Sunt Servanda - segundo
o qual, ainda que não positivado no ordenamento jurídico brasileiro, o
referido vínculo acaba sendo tutelado pelo Estado de forma que, estipulado
validamente seu conteúdo e definidos os direitos e obrigações de cada parte,
as respectivas cláusulas têm força obrigatória para os contratantes.
8. Uma das mais importantes consequências deste princípio é a imutabilidade
ou intangibilidade das cláusulas contratuais que somente seriam passiveis
de revisão no caso de estarem eivadas de nulidade ou vício de vontade.
9. Na hipótese, a parte ré, no pleno gozo de sua capacidade civil,
firmou contrato de financiamento estudantil e respectivos aditamentos, com
inquestionável manifestação de livre consentimento e concordância com
todas as condições constantes em tal instrumento.
10. Quanto à função social do contrato, cumpriu ele sua finalidade, que
foi o financiamento da formação escolar da recorrente, não se podendo
falar em desvio de sua finalidade social, no caso concreto.
11. A Tabela Price não denuncia, por si só, a prática de anatocismo, dado
que ele pressupõe a incidência de juros sobre essa mesma grandeza - juros -
acumulada em período pretérito, dentro de uma mesma "conta corrente".
12. O fato de esse sistema antecipar a incidência de juros até o final do
contrato não quer dizer que está havendo aí anatocismo, ou incidência de
juros sobre juros, até porque o contratante recebeu o numerário de uma só
vez e vai pagá-lo ao longo de um período (superior a um ano), em parcelas.
13. O que se observa no caso dos contratos educacionais é que a Caixa
Econômica Federal, ao aplicar esse sistema de amortização, faz incidir
uma taxa de juros capitalizada, a chamada taxa efetiva, e não aquela nominal
que consta do contrato, aplicando, aí sim, juros sobre juros.
14. Somente a partir da edição da Medida Provisória nº 517, publicada
em 31.12.10, que alterou a redação do art. 5º da Lei nº 10.260/01,
posteriormente convertida na Lei nº 12.431/11, de 24.06.11 (art. 24)
autorizou-se a cobrança de juros capitalizados mensalmente, de modo que
para os contratos firmados até 30.12.10 é vedada a cobrança de juros
sobre juros, ao passo que prevista legalmente a capitalização mensal para
os contratos firmados após essa data. Na hipótese, pois, nula a cláusula
que permite a capitalização mensal dos juros.
15. Não obstante seja inquestionável a impossibilidade da capitalização
mensal dos juros, deve ser provido o recurso da CEF, em parte, para se
reconhecer a possibilidade da capitalização anual, conforme a fundamentação
exposta e os precedentes referidos.
16. Importante registrar que a vedação somente diz com a capitalização
mensal, dado que a anual é autorizada pelo Decreto nº 22.626/33
("art. 4º. É proibido contar juros dos juros: esta proibição não
compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta
corrente de ano a ano").
17. Ademais, inaplicável o entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca
das disposições do Decreto nº 22.626/33 (Lei de Usura) não se aplicarem
às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas
por instituições publicas ou privadas que integram o Sistema Financeiro
Nacional (Súmulas nº 121 e nº 596), na medida em que os contratos de
financiamento estudantil submetem-se à norma específica.
18. Considerando que o recurso foi interposto na vigência do Código de
Processo Civil de 1973 e que ambas as partes sucumbiram em parte do pedido,
condeno-as ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 10% (dez
por cento) sobre o benefício econômico por cada uma obtido com a demanda,
que se compensarão no momento do pagamento, nos termos do que dispõe o
artigo 21, daquele diploma processual, observado, se o caso, o disposto nos
artigos 11 e 12, da Lei nº 1.050/60, no caso de resultar obrigação para a
parte ré pagar os honorários após a compensação, já que beneficiária
da assistência judiciária gratuita, requerida a fl. 70 e que ora defiro.
19. Rejeitadas as preliminares arguidas em contrarrazões. Recurso da parte
ré não provida. Apelação da CEF parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, rejeitar as preliminares arguidas em contrarrazões, negar
provimento ao recurso da parte ré e dar parcial provimento à apelação
da CEF, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Data do Julgamento
:
07/06/2016
Data da Publicação
:
17/06/2016
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1758228
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/06/2016
..FONTE_REPUBLICACAO:
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