TRF3 0003978-87.2010.4.03.6119 00039788720104036119
CIVIL E PROCESSO CIVIL. COMPENTÊNCIA PARA AS AÇÕES ACIDENTÁRIAS. AÇÃO DE
REGRESSO. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. INEXISTÊNCIA
DE BIS IN IDEM EM RELAÇÃO AO SAT/RAT. PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE
CIVIL SUBJETIVA. ÔNUS DA PROVA. PAGAMENTOS FUTUROS. ENRIQUECIMENTO SEM
CAUSA. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO DA RÉ DESPROVIDA.
1. A Constituição Federal excetuou, expressamente, algumas situações
de competência quando o Instituto Nacional do Seguro Social for parte,
atribuindo-a, seja para a Justiça Comum, seja para a Justiça do
Trabalho. Assim, definiu a competência da Justiça Comum Estadual para
julgamento de ações indenizatórias propostas pelo segurado contra o INSS,
a fim de se obter o benefício e serviços previdenciários relativos ao
acidente de trabalho. Isto pois a Constituição Federal exclui, expressamente,
as causas de acidente de trabalho da competência da Justiça Federal e
a competência da Justiça Estadual é residual. O C. Supremo Tribunal
Federal pacificou a questão com a edição da Súmula nº 501. A Emenda
Constitucional nº 45/2004, por sua vez, alterou o artigo 114, inciso VI,
para definir como competente a Justiça do Trabalho para o julgamento
de ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes
de acidente de trabalho propostas por empregado contra empregador. Esse
entendimento restou consolidado com a adição da Súmula Vinculante nº
22. E, por fim, as ações regressivas interpostas pelo Instituto Nacional do
Seguro Social em face de empregadores, a fim de ver ressarcidas as despesas
suportadas com o pagamento de benefícios previdenciários, causadas por
atos ilícitos dos empregadores, devem ser julgadas pela Justiça Federal,
porquanto o debate não diz respeito à relação de trabalho, mas à
responsabilização civil do empregador, a ensejar a aplicação da regra
geral contida no art. 109, I, da Constituição Federal. Assim, como se vê,
são três as ações possíveis: (i) ações indenizatórias propostas pelo
empregado-segurado contra o INSS, a fim de se obter o benefício e serviços
previdenciários relativos ao acidente de trabalho, de competência da
Justiça Comum Estadual; (ii) ações indenizatórias por danos materiais,
morais e estéticos, decorrentes de acidente de trabalho, ajuizadas pelo
empregado contra o empregador, de competência da Justiça do Trabalho;
(iii) ações regressivas ajuizadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social
- INSS contra o empregador, a fim de ver ressarcidas as despesas suportadas
com o pagamento de benefícios previdenciários, causadas por negligência
do empregador quanto às normas de segurança, de competência da Justiça
Comum Federal. Na primeira, verifica-se se o segurado faz jus ou não ao
benefício previdenciário pleiteado. Na segunda, verifica-se a existência
ou não de responsabilidade do empregador pelos danos sofridos, nos termos
da legislação trabalhista. Na terceira, verifica-se a existência ou não
de responsabilidade civil do empregador pelo ressarcimento dos benefícios
pagos pelo INSS, nos termos do artigo 120 da Lei nº 8.213/91. São, pois,
ações distintas e autônomas, submetidas à competência de Justiças
diversas. Necessário realizar estes breves esclarecimentos, diante do
teor das razões de apelação, a fim de fundamentar a seguinte conclusão:
não cabe à Justiça Federal apreciar se o benefício concedido e pago pelo
INSS é devido o não. Somente a Justiça Estadual possui competência para
tanto. À Justiça Federal cabe tão-somente apreciar se estão presentes
os requisitos da responsabilidade civil do empregador pelo ressarcimento
dos benefícios pagos pelo INSS, nos termos do artigo 120 da Lei nº 8.213/91.
2. Os artigos 120 e 121 da Lei nº 8.213/91 asseguram ao INSS o direito de
regresso contra o empregador nos casos de negligência do empregador quanto
às normas padrão de segurança e higiene no ambiente de trabalho. E, com a
Emenda Constitucional nº 20/98, restou expressamente estabelecido que tanto a
Previdência Social quanto o setor privado são responsáveis pela cobertura
do risco de acidente do trabalho. Essa responsabilidade funda-se na premissa
de que os danos gerados culposamente pelo empregador ao INSS, decorrente
de acidente do trabalho, não podem e não devem ser suportados por toda a
sociedade em razão de atitude ilícita da empresa que não cumpre normas do
ambiente de trabalho, além de possuir o escopo de evitar que o empregador
continue a descumprir as normas relativas à segurança do trabalho.
3. Ademais, o fato de o empregador contribuir para o custeio do regime geral
de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições
sociais, dentre estas aquela destinada ao Seguro de Acidente do Trabalho
(SAT), atualmente denominada Riscos Ambientais do Trabalho (RAT), não exclui
a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa
sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho. Isso
porque a cobertura do SAT/RAT abrange somente os casos em que o acidente
de trabalho decorre de culpa exclusiva da vítima, de caso fortuito ou de
força maior. Não abrange, portanto, os casos em que o acidente de trabalho
decorre de negligência do empregador quanto às normas padrão de segurança
e higiene no ambiente de trabalho.
4. A responsabilidade do empregador, em relação ao ressarcimento dos
valores despendidos pelo INSS com benefícios previdenciários concedidos em
razão de acidentes de trabalho, é subjetiva (exige culpa ou dolo). São
pressupostos da responsabilidade civil subjetiva: a) ação ou omissão do
agente; b) do dano experimentado pela vítima; c) do nexo causal entre a
ação e omissão e o dano; d) da culpa do agente, nos termos dos artigos
186 e 927 do Código Civil. Consoante art. 19, §1º, da Lei nº 8.213/91,
o empregador é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e
individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador. E mais que
isso, conforme art. 157, da Consolidação das Leis do Trabalho, é dever
do empregador fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos
de segurança do trabalho. Assim, é o empregador a responsável não apenas
pela adoção de medidas coletivas e individuais de proteção e segurança
da saúde do trabalhador, mas também pela fiscalização do seu cumprimento.
5. No âmbito das ações de regresso, considerando que se trata de
responsabilidade subjetiva e que o art. 120 da Lei nº 8.213/91 exige
"negligência do empregador quanto às normas padrão de segurança e higiene
no ambiente de trabalho", entende-se que a conduta do empregador apta a
ensejar a responsabilidade pelo ressarcimento ao INSS é a negligência
do empregador consistente na desobediência, dolosa ou culposa, das normas
regulamentares referentes à segurança e higiene no ambiente de trabalho.
6. Se a conduta negligente do empregador em relação às normas regulamentares
referentes à segurança e higiene no ambiente de trabalho for a única
causa do acidente de trabalho, há responsabilidade do empregador pelo
ressarcimento da totalidade dos valores pagos pelo INSS a título de benefício
previdenciário. Por sua vez, se tanto a conduta negligente do empregador
quanto a do empregado forem causas do acidente de trabalho (concurso de
causas), há responsabilidade do empregador pelo ressarcimento somente da
metade dos valores pagos pelo INSS a título de benefício previdenciário. E,
por fim, se se tratar de culpa exclusiva do empregado, de caso fortuito ou
de força maior, não há responsabilidade.
7. Ressalto que, nos termos do art. 333 do CPC, incumbe ao INSS comprovar a
existência de culpa do empregador (fato constitutivo do direito do autor)
e, por outro lado, cabe ao empregador demonstrar a existência de culpa
concorrente ou exclusiva do empregado, de caso fortuito ou de força maior
(fatos impeditivos do direito do autor).
8. Depreende-se dos autos que o INSS instruiu a inicial com cópias da ação
indenizatória que tramitou perante o E. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª
Região (fls. 29/54) e cópias do procedimento administrativo referente à
concessão do benefício (fls. 56/71). Dos depoimentos prestados na esfera
trabalhista verifica-se que houve culpa do empregador, pois foi determinado
ao empregado acidentado que operasse máquina para a qual não havia recebido
treinamento. Neste sentido, destaco seguintes trechos dos depoimentos do
empregado acidentado e de sua testemunha: "(...) o operador da máquina tirou
férias e o encarregado mandou o depoente operá-la mesmo sem ter treinamento"
(fl. 47) e "(...) que o reclamante foi designado pelo encarregado para
trabalhar no misturador no dia do acidente; que o reclamante foi designado
para fazer tudo na máquina, e não apenas auxiliar" (fl. 48). Aliás, destaco
também o seguinte trecho do depoimento do próprio preposto do empregador:
"(...) que foi instalada uma nova máquina no setor e foi nela que o reclamante
se acidentou; que o reclamante não era o operador dessa máquina, pois o
operador era o Vagner; que o reclamante se acidentou na máquina no 2º dia de
operação dela (...) que o reclamante não recebeu treinamento para trabalhar
na máquina porque não foi designado para operá-la" (fl. 47). Como se vê,
o preposto da empresa-ré reconheceu que o empregado acidentado não era o
operador da máquina que operava quando sofreu o acidente, assim como que
já era o 2º dia em que ele operava aquela máquina. Desse modo, ainda que
se cogitasse que não há prova de que a empresa tenha determinado, por meio
do encarregado, ao empregado acidentado que operasse máquina para a qual
não tinha treinamento, é inescapável a conclusão de que houve ao menos
negligência da empresa-ré quanto à fiscalização do cumprimento das normas
e procedimentos de segurança. Isso porque, neste caso, a empresa-ré teria
permitido ou não teria percebido que o empregado acidentado estava operando,
por dois dias consecutivos, máquina para a qual não tinha treinamento. Por
sua vez, a empresa-ré deixou de contestar a inicial e o MM. Juiz a quo,
em 18/07/2011, decretou a sua revelia e determinou a aplicação dos seus
efeitos (fl. 91). E, em 12/08/2011, a parte ré requereu vista dos autos
fora de cartório, o que restou indeferido pelo MM. Juiz a quo, tendo em
vista que os autos já estavam conclusos para sentença (fls. 95/96). Não
houve interposição de recurso contra esta decisão e, em 24/08/2012,
foi prolatada a sentença recorrida.
9. Portanto, no caso dos autos, o INSS logrou demonstrar a deficiência e
precariedade da segurança do trabalhador, restando caracterizada a culpa
do empregador e, por outro lado, o empregador sequer tentou demonstrar a
existência de culpa concorrente ou exclusiva do empregado, de caso fortuito
ou de força maior. Assim, a empresa-ré deve ressarcir ao INSS a totalidade
dos valores pagos pelo INSS a título de benefício previdenciário, bem
como os que vierem a ser pagos enquanto perdurar aquela obrigação (isto é,
enquanto perdurar o pagamento do benefício previdenciário).
10. Considerando que se trata de ação de regresso de benefício
previdenciário cujo pagamento perdurará após o trânsito em julgado
deste processo, é possível a condenação da empresa-ré ao ressarcimento
dos valores que vierem a ser pagos pelo INSS (parcelas vincendas). Isso
porque, embora o benefício previdenciário denominado auxílio-doença (NB
nº 52.998.964-30) tenha sido pago por tempo determinado (de 23/04/2008 a
11/04/2011 - fls. 158), este veio a ser convertido em auxílio-acidente (NB
nº 54.592.221-05), em 12/04/2011 (fl. 160), e o pagamento deste pode perdurar
após o trânsito em julgado. Todavia, não é possível a constituição
de capital, prevista no art. 475-Q do CPC, pois tal procedimento refere-se
especificamente às hipóteses em que indenização incluir prestação de
alimentos. E, embora os benefícios pagos pelo INSS ao empregado acidentado
ou aos seus familiares possuam natureza alimentar, a verba que o empregador
deve ressarcir, em regresso, ao INSS não possui natureza alimentar.
11. Por fim, apenas para que não se alegue omissão, consigno que a
parte apelante também sustenta que a concessão de auxílio-acidente
enseja enriquecimento sem causa do empregado acidentado, pois ele está
recebendo pensão vitalícia da empresa em razão da condenação na ação
trabalhista. Pois bem. A tese não merece prosperar. Primeiro porque, como
já dito, a Justiça Federal não tem competência para aferir se o pagamento
do auxílio-acidente é devido ou não, pois a Constituição Federal exclui,
expressamente, as causas de acidente de trabalho da sua competência. Desse
modo, ainda que houvesse alguma ilegalidade na concessão do benefício, este
Tribunal não poderia, como requer a apelante no primeiro pedido formulado nas
suas razões recursais, reconhecer que o segurado não faz jus ao benefício
auxílio-acidente. Segundo porque não há cumulação indevida entre a pensão
paga pela empesa ao empregado acidentado e o ressarcimento pago pela empresa ao
INSS, pois se tratam de indenizações distintas, pagas a pessoas distintas.
12. Por todas as razões expostas, a sentença deve ser integralmente mantida.
13. Recurso de apelação da parte ré desprovido.
Ementa
CIVIL E PROCESSO CIVIL. COMPENTÊNCIA PARA AS AÇÕES ACIDENTÁRIAS. AÇÃO DE
REGRESSO. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. INEXISTÊNCIA
DE BIS IN IDEM EM RELAÇÃO AO SAT/RAT. PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE
CIVIL SUBJETIVA. ÔNUS DA PROVA. PAGAMENTOS FUTUROS. ENRIQUECIMENTO SEM
CAUSA. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO DA RÉ DESPROVIDA.
1. A Constituição Federal excetuou, expressamente, algumas situações
de competência quando o Instituto Nacional do Seguro Social for parte,
atribuindo-a, seja para a Justiça Comum, seja para a Justiça do
Trabalho. Assim, definiu a competência da Justiça Comum Estadual para
julgamento de ações indenizatórias propostas pelo segurado contra o INSS,
a fim de se obter o benefício e serviços previdenciários relativos ao
acidente de trabalho. Isto pois a Constituição Federal exclui, expressamente,
as causas de acidente de trabalho da competência da Justiça Federal e
a competência da Justiça Estadual é residual. O C. Supremo Tribunal
Federal pacificou a questão com a edição da Súmula nº 501. A Emenda
Constitucional nº 45/2004, por sua vez, alterou o artigo 114, inciso VI,
para definir como competente a Justiça do Trabalho para o julgamento
de ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes
de acidente de trabalho propostas por empregado contra empregador. Esse
entendimento restou consolidado com a adição da Súmula Vinculante nº
22. E, por fim, as ações regressivas interpostas pelo Instituto Nacional do
Seguro Social em face de empregadores, a fim de ver ressarcidas as despesas
suportadas com o pagamento de benefícios previdenciários, causadas por
atos ilícitos dos empregadores, devem ser julgadas pela Justiça Federal,
porquanto o debate não diz respeito à relação de trabalho, mas à
responsabilização civil do empregador, a ensejar a aplicação da regra
geral contida no art. 109, I, da Constituição Federal. Assim, como se vê,
são três as ações possíveis: (i) ações indenizatórias propostas pelo
empregado-segurado contra o INSS, a fim de se obter o benefício e serviços
previdenciários relativos ao acidente de trabalho, de competência da
Justiça Comum Estadual; (ii) ações indenizatórias por danos materiais,
morais e estéticos, decorrentes de acidente de trabalho, ajuizadas pelo
empregado contra o empregador, de competência da Justiça do Trabalho;
(iii) ações regressivas ajuizadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social
- INSS contra o empregador, a fim de ver ressarcidas as despesas suportadas
com o pagamento de benefícios previdenciários, causadas por negligência
do empregador quanto às normas de segurança, de competência da Justiça
Comum Federal. Na primeira, verifica-se se o segurado faz jus ou não ao
benefício previdenciário pleiteado. Na segunda, verifica-se a existência
ou não de responsabilidade do empregador pelos danos sofridos, nos termos
da legislação trabalhista. Na terceira, verifica-se a existência ou não
de responsabilidade civil do empregador pelo ressarcimento dos benefícios
pagos pelo INSS, nos termos do artigo 120 da Lei nº 8.213/91. São, pois,
ações distintas e autônomas, submetidas à competência de Justiças
diversas. Necessário realizar estes breves esclarecimentos, diante do
teor das razões de apelação, a fim de fundamentar a seguinte conclusão:
não cabe à Justiça Federal apreciar se o benefício concedido e pago pelo
INSS é devido o não. Somente a Justiça Estadual possui competência para
tanto. À Justiça Federal cabe tão-somente apreciar se estão presentes
os requisitos da responsabilidade civil do empregador pelo ressarcimento
dos benefícios pagos pelo INSS, nos termos do artigo 120 da Lei nº 8.213/91.
2. Os artigos 120 e 121 da Lei nº 8.213/91 asseguram ao INSS o direito de
regresso contra o empregador nos casos de negligência do empregador quanto
às normas padrão de segurança e higiene no ambiente de trabalho. E, com a
Emenda Constitucional nº 20/98, restou expressamente estabelecido que tanto a
Previdência Social quanto o setor privado são responsáveis pela cobertura
do risco de acidente do trabalho. Essa responsabilidade funda-se na premissa
de que os danos gerados culposamente pelo empregador ao INSS, decorrente
de acidente do trabalho, não podem e não devem ser suportados por toda a
sociedade em razão de atitude ilícita da empresa que não cumpre normas do
ambiente de trabalho, além de possuir o escopo de evitar que o empregador
continue a descumprir as normas relativas à segurança do trabalho.
3. Ademais, o fato de o empregador contribuir para o custeio do regime geral
de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições
sociais, dentre estas aquela destinada ao Seguro de Acidente do Trabalho
(SAT), atualmente denominada Riscos Ambientais do Trabalho (RAT), não exclui
a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa
sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho. Isso
porque a cobertura do SAT/RAT abrange somente os casos em que o acidente
de trabalho decorre de culpa exclusiva da vítima, de caso fortuito ou de
força maior. Não abrange, portanto, os casos em que o acidente de trabalho
decorre de negligência do empregador quanto às normas padrão de segurança
e higiene no ambiente de trabalho.
4. A responsabilidade do empregador, em relação ao ressarcimento dos
valores despendidos pelo INSS com benefícios previdenciários concedidos em
razão de acidentes de trabalho, é subjetiva (exige culpa ou dolo). São
pressupostos da responsabilidade civil subjetiva: a) ação ou omissão do
agente; b) do dano experimentado pela vítima; c) do nexo causal entre a
ação e omissão e o dano; d) da culpa do agente, nos termos dos artigos
186 e 927 do Código Civil. Consoante art. 19, §1º, da Lei nº 8.213/91,
o empregador é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e
individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador. E mais que
isso, conforme art. 157, da Consolidação das Leis do Trabalho, é dever
do empregador fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos
de segurança do trabalho. Assim, é o empregador a responsável não apenas
pela adoção de medidas coletivas e individuais de proteção e segurança
da saúde do trabalhador, mas também pela fiscalização do seu cumprimento.
5. No âmbito das ações de regresso, considerando que se trata de
responsabilidade subjetiva e que o art. 120 da Lei nº 8.213/91 exige
"negligência do empregador quanto às normas padrão de segurança e higiene
no ambiente de trabalho", entende-se que a conduta do empregador apta a
ensejar a responsabilidade pelo ressarcimento ao INSS é a negligência
do empregador consistente na desobediência, dolosa ou culposa, das normas
regulamentares referentes à segurança e higiene no ambiente de trabalho.
6. Se a conduta negligente do empregador em relação às normas regulamentares
referentes à segurança e higiene no ambiente de trabalho for a única
causa do acidente de trabalho, há responsabilidade do empregador pelo
ressarcimento da totalidade dos valores pagos pelo INSS a título de benefício
previdenciário. Por sua vez, se tanto a conduta negligente do empregador
quanto a do empregado forem causas do acidente de trabalho (concurso de
causas), há responsabilidade do empregador pelo ressarcimento somente da
metade dos valores pagos pelo INSS a título de benefício previdenciário. E,
por fim, se se tratar de culpa exclusiva do empregado, de caso fortuito ou
de força maior, não há responsabilidade.
7. Ressalto que, nos termos do art. 333 do CPC, incumbe ao INSS comprovar a
existência de culpa do empregador (fato constitutivo do direito do autor)
e, por outro lado, cabe ao empregador demonstrar a existência de culpa
concorrente ou exclusiva do empregado, de caso fortuito ou de força maior
(fatos impeditivos do direito do autor).
8. Depreende-se dos autos que o INSS instruiu a inicial com cópias da ação
indenizatória que tramitou perante o E. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª
Região (fls. 29/54) e cópias do procedimento administrativo referente à
concessão do benefício (fls. 56/71). Dos depoimentos prestados na esfera
trabalhista verifica-se que houve culpa do empregador, pois foi determinado
ao empregado acidentado que operasse máquina para a qual não havia recebido
treinamento. Neste sentido, destaco seguintes trechos dos depoimentos do
empregado acidentado e de sua testemunha: "(...) o operador da máquina tirou
férias e o encarregado mandou o depoente operá-la mesmo sem ter treinamento"
(fl. 47) e "(...) que o reclamante foi designado pelo encarregado para
trabalhar no misturador no dia do acidente; que o reclamante foi designado
para fazer tudo na máquina, e não apenas auxiliar" (fl. 48). Aliás, destaco
também o seguinte trecho do depoimento do próprio preposto do empregador:
"(...) que foi instalada uma nova máquina no setor e foi nela que o reclamante
se acidentou; que o reclamante não era o operador dessa máquina, pois o
operador era o Vagner; que o reclamante se acidentou na máquina no 2º dia de
operação dela (...) que o reclamante não recebeu treinamento para trabalhar
na máquina porque não foi designado para operá-la" (fl. 47). Como se vê,
o preposto da empresa-ré reconheceu que o empregado acidentado não era o
operador da máquina que operava quando sofreu o acidente, assim como que
já era o 2º dia em que ele operava aquela máquina. Desse modo, ainda que
se cogitasse que não há prova de que a empresa tenha determinado, por meio
do encarregado, ao empregado acidentado que operasse máquina para a qual
não tinha treinamento, é inescapável a conclusão de que houve ao menos
negligência da empresa-ré quanto à fiscalização do cumprimento das normas
e procedimentos de segurança. Isso porque, neste caso, a empresa-ré teria
permitido ou não teria percebido que o empregado acidentado estava operando,
por dois dias consecutivos, máquina para a qual não tinha treinamento. Por
sua vez, a empresa-ré deixou de contestar a inicial e o MM. Juiz a quo,
em 18/07/2011, decretou a sua revelia e determinou a aplicação dos seus
efeitos (fl. 91). E, em 12/08/2011, a parte ré requereu vista dos autos
fora de cartório, o que restou indeferido pelo MM. Juiz a quo, tendo em
vista que os autos já estavam conclusos para sentença (fls. 95/96). Não
houve interposição de recurso contra esta decisão e, em 24/08/2012,
foi prolatada a sentença recorrida.
9. Portanto, no caso dos autos, o INSS logrou demonstrar a deficiência e
precariedade da segurança do trabalhador, restando caracterizada a culpa
do empregador e, por outro lado, o empregador sequer tentou demonstrar a
existência de culpa concorrente ou exclusiva do empregado, de caso fortuito
ou de força maior. Assim, a empresa-ré deve ressarcir ao INSS a totalidade
dos valores pagos pelo INSS a título de benefício previdenciário, bem
como os que vierem a ser pagos enquanto perdurar aquela obrigação (isto é,
enquanto perdurar o pagamento do benefício previdenciário).
10. Considerando que se trata de ação de regresso de benefício
previdenciário cujo pagamento perdurará após o trânsito em julgado
deste processo, é possível a condenação da empresa-ré ao ressarcimento
dos valores que vierem a ser pagos pelo INSS (parcelas vincendas). Isso
porque, embora o benefício previdenciário denominado auxílio-doença (NB
nº 52.998.964-30) tenha sido pago por tempo determinado (de 23/04/2008 a
11/04/2011 - fls. 158), este veio a ser convertido em auxílio-acidente (NB
nº 54.592.221-05), em 12/04/2011 (fl. 160), e o pagamento deste pode perdurar
após o trânsito em julgado. Todavia, não é possível a constituição
de capital, prevista no art. 475-Q do CPC, pois tal procedimento refere-se
especificamente às hipóteses em que indenização incluir prestação de
alimentos. E, embora os benefícios pagos pelo INSS ao empregado acidentado
ou aos seus familiares possuam natureza alimentar, a verba que o empregador
deve ressarcir, em regresso, ao INSS não possui natureza alimentar.
11. Por fim, apenas para que não se alegue omissão, consigno que a
parte apelante também sustenta que a concessão de auxílio-acidente
enseja enriquecimento sem causa do empregado acidentado, pois ele está
recebendo pensão vitalícia da empresa em razão da condenação na ação
trabalhista. Pois bem. A tese não merece prosperar. Primeiro porque, como
já dito, a Justiça Federal não tem competência para aferir se o pagamento
do auxílio-acidente é devido ou não, pois a Constituição Federal exclui,
expressamente, as causas de acidente de trabalho da sua competência. Desse
modo, ainda que houvesse alguma ilegalidade na concessão do benefício, este
Tribunal não poderia, como requer a apelante no primeiro pedido formulado nas
suas razões recursais, reconhecer que o segurado não faz jus ao benefício
auxílio-acidente. Segundo porque não há cumulação indevida entre a pensão
paga pela empesa ao empregado acidentado e o ressarcimento pago pela empresa ao
INSS, pois se tratam de indenizações distintas, pagas a pessoas distintas.
12. Por todas as razões expostas, a sentença deve ser integralmente mantida.
13. Recurso de apelação da parte ré desprovido.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, negar provimento ao recurso de apelação da parte ré, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
11/06/2018
Data da Publicação
:
15/06/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1881293
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/06/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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