TRF3 0004010-90.2012.4.03.6000 00040109020124036000
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO SOLIDÁRIO DE MEDICAMENTO
NÃO DISPONÍVEL NO SUS NA FORMA COMO NECESSITADO PELO CIDADÃO DOENTE,
A SER PRESTADO PELOS ENTES PÚBLICOS. ÔNUS CONSTITUCIONAL DE PRESTAR O
REMÉDIO. QUESTÕES DE "CAIXA" DO PODER PÚBLICO SÃO INDIFERENTES EM FACE
DO ESTADO DE PRECISÃO DO DOENTE. EFICÁCIA DO MEDICAMENTO NÃO REFUTADA A
CONTENTO PELA PARTE RÉ. PRELIMINAR REJEITADA, APELO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO
E REMESSA OFICIAL PROVIDA APENAS PARA CANCELAR A CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS
EM DESFAVOR DA UNIÃO.
1. Ação ordinária ajuizada por SILMA ENEAS DO CARMO em face da UNIÃO
FEDERAL, do ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL e do MUNICÍPIO DE CAMPO GRANDE/MS
objetivando o fornecimento do medicamento Bosentana (tracleer), nas dosagens de
62,5mg e 125mg, conforme prescrição médica, para tratamento da enfermidade
que acomete a autora (Doença de Gaucher com hipertensão pulmonar grave),
tendo em vista que a medicação fornecida pelo Sistema Único de Saúde -
SUS já não produz mais efeito e que não possui recursos financeiros para
adquirir, na rede privada, o referido remédio.
2. Afasta-se a alegação de que as determinações emanadas pelo Poder
Judiciário para o fornecimento de medicamentos ferem o Princípio da
Separação dos Poderes; a assertiva colide contra o artigo 5º, inciso XXXV,
segundo o qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça a direito". E a negativa do Poder Público tem sido a
tônica na espécie, pelo que não se pode imputar a quem necessita de um
remédio em situação de grave fragilidade da saúde, que aguarde a via
crucis a que o insensível Poder Público submete seus cidadãos.
3. A saúde é um direito social (art. 6º) decorrente do direito à vida
(art. 5º), disciplinado no artigo 196 e seguintes da Constituição Federal;
a saúde - como direito fundamental - está acima do dinheiro, embora assim
não entendam os governantes; mas eles não podem se opor à Constituição em
sua ótica vesga com que enxergam as prioridades que o Estado deve observar no
trato dos interesses dos cidadãos e na busca do bem comum. O direito a saúde
é indisponível (AgRg no REsp 1356286/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS,
SEGUNDA TURMA, julgado em 07/02/2013, DJe 19/02/2013) e deve ser assegurado
pelo Poder Público, porquanto a apelada dele necessita na espécie.
4. A responsabilidade pelo fornecimento do medicamento de que necessita a
apelada decorre do direito fundamental dela à vida e a uma existência digna,
do que um dos apanágios é a saúde, cuja preservação também é atribuída
aos poderes públicos executivos da União, dos Estados e dos Municípios,
todos eles solidários nessa obrigação. Múltiplos precedentes das Cortes
Superiores e desta Corte Regional.
5. O acesso à saúde compreende além da disponibilização por parte dos
entes públicos de hospitais, médicos, enfermeiros etc., também procedimentos
clínicos, ambulatoriais e medicação conveniente. E pouco importa se eles
estão ou não disponibilizados em algum programa específico dos órgãos
governamentais, já que a burocracia criada por governantes não pode privar
o cidadão do mínimo necessário para a sua sobrevivência quando ele mais
necessita: quando está efetivamente doente.
6. No cenário dos artigos 2º, § 1º, e 7º, II, da Lei Federal 8.080/90,
negar à apelada o medicamento necessário ao tratamento médico pretendido
implica desrespeito às normas constitucionais que garantem o direito à saúde
e à vida; mais: ofende a moral administrativa (art. 37 da Constituição),
pois o dinheiro e a conveniência dos detentores temporários do Poder não
sobreleva os direitos fundamentais.
7. Caso em que a eficácia do medicamento - recomendado para a situação
específica da parte autora - que veio a ser reconhecido pela Anvisa, não
foi refutada a contento pelas rés.
8. Cancelamento do ônus da União em pagar honorários advocatícios a sua
própria Defensoria Pública (precedentes das Cortes Superiores).
Ementa
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO SOLIDÁRIO DE MEDICAMENTO
NÃO DISPONÍVEL NO SUS NA FORMA COMO NECESSITADO PELO CIDADÃO DOENTE,
A SER PRESTADO PELOS ENTES PÚBLICOS. ÔNUS CONSTITUCIONAL DE PRESTAR O
REMÉDIO. QUESTÕES DE "CAIXA" DO PODER PÚBLICO SÃO INDIFERENTES EM FACE
DO ESTADO DE PRECISÃO DO DOENTE. EFICÁCIA DO MEDICAMENTO NÃO REFUTADA A
CONTENTO PELA PARTE RÉ. PRELIMINAR REJEITADA, APELO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO
E REMESSA OFICIAL PROVIDA APENAS PARA CANCELAR A CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS
EM DESFAVOR DA UNIÃO.
1. Ação ordinária ajuizada por SILMA ENEAS DO CARMO em face da UNIÃO
FEDERAL, do ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL e do MUNICÍPIO DE CAMPO GRANDE/MS
objetivando o fornecimento do medicamento Bosentana (tracleer), nas dosagens de
62,5mg e 125mg, conforme prescrição médica, para tratamento da enfermidade
que acomete a autora (Doença de Gaucher com hipertensão pulmonar grave),
tendo em vista que a medicação fornecida pelo Sistema Único de Saúde -
SUS já não produz mais efeito e que não possui recursos financeiros para
adquirir, na rede privada, o referido remédio.
2. Afasta-se a alegação de que as determinações emanadas pelo Poder
Judiciário para o fornecimento de medicamentos ferem o Princípio da
Separação dos Poderes; a assertiva colide contra o artigo 5º, inciso XXXV,
segundo o qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça a direito". E a negativa do Poder Público tem sido a
tônica na espécie, pelo que não se pode imputar a quem necessita de um
remédio em situação de grave fragilidade da saúde, que aguarde a via
crucis a que o insensível Poder Público submete seus cidadãos.
3. A saúde é um direito social (art. 6º) decorrente do direito à vida
(art. 5º), disciplinado no artigo 196 e seguintes da Constituição Federal;
a saúde - como direito fundamental - está acima do dinheiro, embora assim
não entendam os governantes; mas eles não podem se opor à Constituição em
sua ótica vesga com que enxergam as prioridades que o Estado deve observar no
trato dos interesses dos cidadãos e na busca do bem comum. O direito a saúde
é indisponível (AgRg no REsp 1356286/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS,
SEGUNDA TURMA, julgado em 07/02/2013, DJe 19/02/2013) e deve ser assegurado
pelo Poder Público, porquanto a apelada dele necessita na espécie.
4. A responsabilidade pelo fornecimento do medicamento de que necessita a
apelada decorre do direito fundamental dela à vida e a uma existência digna,
do que um dos apanágios é a saúde, cuja preservação também é atribuída
aos poderes públicos executivos da União, dos Estados e dos Municípios,
todos eles solidários nessa obrigação. Múltiplos precedentes das Cortes
Superiores e desta Corte Regional.
5. O acesso à saúde compreende além da disponibilização por parte dos
entes públicos de hospitais, médicos, enfermeiros etc., também procedimentos
clínicos, ambulatoriais e medicação conveniente. E pouco importa se eles
estão ou não disponibilizados em algum programa específico dos órgãos
governamentais, já que a burocracia criada por governantes não pode privar
o cidadão do mínimo necessário para a sua sobrevivência quando ele mais
necessita: quando está efetivamente doente.
6. No cenário dos artigos 2º, § 1º, e 7º, II, da Lei Federal 8.080/90,
negar à apelada o medicamento necessário ao tratamento médico pretendido
implica desrespeito às normas constitucionais que garantem o direito à saúde
e à vida; mais: ofende a moral administrativa (art. 37 da Constituição),
pois o dinheiro e a conveniência dos detentores temporários do Poder não
sobreleva os direitos fundamentais.
7. Caso em que a eficácia do medicamento - recomendado para a situação
específica da parte autora - que veio a ser reconhecido pela Anvisa, não
foi refutada a contento pelas rés.
8. Cancelamento do ônus da União em pagar honorários advocatícios a sua
própria Defensoria Pública (precedentes das Cortes Superiores).Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, rejeitar a questão preliminar e, no mérito, negar provimento
à apelação e dar parcial provimento à remessa oficial, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
15/12/2016
Data da Publicação
:
11/01/2017
Classe/Assunto
:
APELREEX - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2110094
Órgão Julgador
:
SEXTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-35 ART-6 ART-37
LEG-FED LEI-8080 ANO-1990 ART-2 PAR-1 ART-7 INC-2
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/01/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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