TRF3 0004043-62.2017.4.03.0000 00040436220174030000
REVISÃO CRIMINAL. PROTEÇÃO À COISA JULGADA E HIPÓTESES DE CABIMENTO. CASO
CONCRETO. PEDIDO DE DECRETAÇÃO DE NULIDADE DA AÇÃO PENAL SUBJACENTE. PEDIDO
DE ABSOLVIÇÃO FORMULADO PELO REVISIONANDO EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE PROVA
APTA A APONTÁ-LO COMO COAUTOR NOS DELITOS. PEDIDO DE AFASTAMENTO DE BIS IN
IDEM QUE MACULARIA A PENA QUE FOI IMPOSTA AO REVISIONANDO. IMPROCEDÊNCIA
DA PRETENSÃO.
- O Ordenamento Constitucional de 1988 elencou a coisa julgada como direito
fundamental do cidadão (art. 5º, XXXVI), conferindo indispensável
proteção ao valor segurança jurídica com o escopo de que as relações
sociais fossem pacificadas após a exaração de provimento judicial dotado
de imutabilidade. Sobrevindo a impossibilidade de apresentação de recurso
em face de uma decisão judicial, há que ser reconhecida a imutabilidade
do provimento tendo como base a formação tanto de coisa julgada formal
(esgotamento da instância) como de coisa julgada material (predicado que
torna imutável o que restou decidido pelo Poder Judiciário, prestigiando,
assim, a justiça e a ordem social).
- Situações excepcionais, fundadas na ponderação de interesses de
assento constitucional, permitem o afastamento de tal característica da
imutabilidade das decisões exaradas pelo Poder Judiciário a fim de que
prevaleça outro interesse (também tutelado constitucionalmente), sendo
justamente neste panorama que nosso sistema jurídico prevê a existência de
Ação Rescisória (a permitir o afastamento da coisa julgada no âmbito do
Processo Civil) e de Revisão Criminal (a possibilitar referido afastamento
na senda do Processo Penal).
- No âmbito do Processo Penal, para que seja possível a reconsideração
do que restou decidido sob o manto da coisa julgada, deve ocorrer no caso
concreto uma das situações previstas para tanto no ordenamento jurídico
como hipótese de cabimento da Revisão Criminal nos termos do art. 621
do Código de Processo Penal. Assim, permite-se o ajuizamento de Revisão
Criminal fundada em argumentação no sentido de que (a) a sentença proferida
encontra-se contrária a texto expresso de lei ou a evidência dos autos;
(b) a sentença exarada fundou-se em prova comprovadamente falsa; e (c) houve
o surgimento de prova nova, posterior à sentença, de que o condenado seria
inocente ou de circunstância que permitiria a diminuição da reprimenda
então imposta.
- A Revisão Criminal não se mostra como via adequada para que haja um
rejulgamento do conjunto fático-probatório constante da relação processual
originária, razão pela qual impertinente a formulação de argumentação que
já foi apreciada e rechaçada pelo juízo condenatório. Sequer a existência
de interpretação controvertida permite a propositura do expediente em
tela, pois tal situação (controvérsia de tema na jurisprudência) não
se enquadra na ideia necessária para que o instrumento tenha fundamento de
validade no inciso I do art. 621 do Código de Processo Penal.
- Almeja o revisionando o decreto de nulidade da relação processual
transitada em julgado sob o pálio de que as interceptações telefônicas
teriam perdurado por período muito superior ao previsto na Lei nº 9.296/1996
e porque a r. sentença penal teria se fundado exatamente em tal prova (ilegal)
para condená-lo. Com efeito, no que tange à existência de prorrogação
para além dos 30 (trinta) dias previstos na legislação de regência, a
jurisprudência pátria (C. Supremo Tribunal Federal, E. Superior Tribunal
de Justiça e C. Tribunal Regional Federal da 3ª Região) é uníssona no
sentido de não ser possível acoimar de ilegal a interceptação prorrogada
para além de mencionado interregno se, à luz da proporcionalidade e da
razoabilidade, notar-se a complexidade da investigação que está em curso
e houver a necessidade de se continuar a perquirir os meandros do intento
criminoso (até mesmo para se descobrir novas infrações que estão para ser
cometidas), exatamente aspectos que concorreram na investigação subjacente
a referendar a prova ora em comento.
- Nota-se, efetivamente, que o revisionando cometeu crime de corrupção
passiva elencado no art. 317 do Código Penal, com a causa de aumento de
pena disposta no § 1º de mencionado preceito, tendo como base o arcabouço
fático-probatório amealhado no feito subjacente, donde se conclui pela
correção do édito penal condenatório transitado em julgado a afastar
ilações no sentido de que não haveria prova apta a supedanear juízo em
seu desfavor.
- Alega o revisionando que sua reprimenda padeceria de ilegalidade na justa
medida em que utilizado o mesmo fundamento (agilização dos processos
administrativos) para majorá-la tanto na 1ª etapa como no 3º momento da
dosimetria. Destaca, ainda, que a traição citada pelo magistrado sentenciante
consistiria em elementar ínsita ao tipo penal em que incorrido, uma vez que
aquele que pratica o delito já está maculando a confiança depositada em
sua pessoa pela Administração Pública.
- Analisando a fundamentação expendida pelo magistrado sentenciante, não se
vislumbra nem a ocorrência do propalado bis in idem nem o emprego de elementar
típica para fins de recrudescimento da reprimenda. Diz-se isso tendo como
base o fato de que a pena-base restou majorada em razão de ter sido constatada
violação ao princípio da impessoalidade pelo atuar do revisionando (que não
respeitava a ordem cronológica de análise de procedimentos administrativos
em detrimento de segurados pobres e honestos da autarquia previdenciária),
bem como supedaneado pela violação concreta da confiança que sua então
chefe depositava nos préstimos de seu então subalterno - dentro de tal
contexto e sem se descurar que todo crime contra a administração pública
tem como pressuposto uma "traição" ao múnus público (traição esta tomada
em sua acepção mais ampla e genérica), a valoração negativa levada a
efeito teve como um de seus fundamentos a traição em concreto a uma pessoa
determinada (qual seja, a chefe do revisionando) que, aliada a mácula ao
princípio constitucional da impessoalidade, recomendava efetivamente o
incremento sancionatório executado.
- A causa de aumento de pena elencada no § 1º do art. 317 do Código Penal
tem como pressuposto para sua incidência a efetiva omissão ou ação
do servidor público corrupto, que, por ter recebido vantagem ilícita e
indevida ou meramente ter aquiescido com a promessa dela, retarda ou deixa de
praticar ato de ofício ou o leva a efeito infringindo dever funcional. Nesse
diapasão, sua incidência no caso concreto deu-se apenas pelo fato de que o
revisionando infringiu dever legal ao praticar ato de ofício consistente na
agilização do pagamento de importância relativa a atrasados de segurado da
Previdência Social, o que tem o condão de sufragar a legalidade da causa de
aumento ora em comento, sendo impossível inferir-se qualquer argumentação
passível no sentido de que haveria bis in idem em tal proceder.
- Após o exaurimento da análise dos pontos aventados pelo revisionando,
nota-se que sua intenção está em rediscutir nesta senda aspectos que foram
todos apreciados, contextualizados e julgados na Ação Penal subjacente, o que
não se coaduna com os limites de cognição consagrados para fins revisionais
na justa medida em que o expediente em tela não deve ser interpretado como
uma nova possibilidade de haver um julgamento de recurso de Apelação (com
a cognição inerente a tal recurso). Em última instância, depreende-se
sua intenção em manifestar seu inconformismo com a condenação que lhe
foi impingida, condenação esta balizada no amplo conhecimento das provas
e dos fatos e da extensiva valoração levada a efeito na Ação Penal que
deu origem ao título penal condenatório que se busca desconstituir, o que
não se admite ser aventado em Revisão Criminal.
- Revisão Criminal julgada improcedente.
Ementa
REVISÃO CRIMINAL. PROTEÇÃO À COISA JULGADA E HIPÓTESES DE CABIMENTO. CASO
CONCRETO. PEDIDO DE DECRETAÇÃO DE NULIDADE DA AÇÃO PENAL SUBJACENTE. PEDIDO
DE ABSOLVIÇÃO FORMULADO PELO REVISIONANDO EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE PROVA
APTA A APONTÁ-LO COMO COAUTOR NOS DELITOS. PEDIDO DE AFASTAMENTO DE BIS IN
IDEM QUE MACULARIA A PENA QUE FOI IMPOSTA AO REVISIONANDO. IMPROCEDÊNCIA
DA PRETENSÃO.
- O Ordenamento Constitucional de 1988 elencou a coisa julgada como direito
fundamental do cidadão (art. 5º, XXXVI), conferindo indispensável
proteção ao valor segurança jurídica com o escopo de que as relações
sociais fossem pacificadas após a exaração de provimento judicial dotado
de imutabilidade. Sobrevindo a impossibilidade de apresentação de recurso
em face de uma decisão judicial, há que ser reconhecida a imutabilidade
do provimento tendo como base a formação tanto de coisa julgada formal
(esgotamento da instância) como de coisa julgada material (predicado que
torna imutável o que restou decidido pelo Poder Judiciário, prestigiando,
assim, a justiça e a ordem social).
- Situações excepcionais, fundadas na ponderação de interesses de
assento constitucional, permitem o afastamento de tal característica da
imutabilidade das decisões exaradas pelo Poder Judiciário a fim de que
prevaleça outro interesse (também tutelado constitucionalmente), sendo
justamente neste panorama que nosso sistema jurídico prevê a existência de
Ação Rescisória (a permitir o afastamento da coisa julgada no âmbito do
Processo Civil) e de Revisão Criminal (a possibilitar referido afastamento
na senda do Processo Penal).
- No âmbito do Processo Penal, para que seja possível a reconsideração
do que restou decidido sob o manto da coisa julgada, deve ocorrer no caso
concreto uma das situações previstas para tanto no ordenamento jurídico
como hipótese de cabimento da Revisão Criminal nos termos do art. 621
do Código de Processo Penal. Assim, permite-se o ajuizamento de Revisão
Criminal fundada em argumentação no sentido de que (a) a sentença proferida
encontra-se contrária a texto expresso de lei ou a evidência dos autos;
(b) a sentença exarada fundou-se em prova comprovadamente falsa; e (c) houve
o surgimento de prova nova, posterior à sentença, de que o condenado seria
inocente ou de circunstância que permitiria a diminuição da reprimenda
então imposta.
- A Revisão Criminal não se mostra como via adequada para que haja um
rejulgamento do conjunto fático-probatório constante da relação processual
originária, razão pela qual impertinente a formulação de argumentação que
já foi apreciada e rechaçada pelo juízo condenatório. Sequer a existência
de interpretação controvertida permite a propositura do expediente em
tela, pois tal situação (controvérsia de tema na jurisprudência) não
se enquadra na ideia necessária para que o instrumento tenha fundamento de
validade no inciso I do art. 621 do Código de Processo Penal.
- Almeja o revisionando o decreto de nulidade da relação processual
transitada em julgado sob o pálio de que as interceptações telefônicas
teriam perdurado por período muito superior ao previsto na Lei nº 9.296/1996
e porque a r. sentença penal teria se fundado exatamente em tal prova (ilegal)
para condená-lo. Com efeito, no que tange à existência de prorrogação
para além dos 30 (trinta) dias previstos na legislação de regência, a
jurisprudência pátria (C. Supremo Tribunal Federal, E. Superior Tribunal
de Justiça e C. Tribunal Regional Federal da 3ª Região) é uníssona no
sentido de não ser possível acoimar de ilegal a interceptação prorrogada
para além de mencionado interregno se, à luz da proporcionalidade e da
razoabilidade, notar-se a complexidade da investigação que está em curso
e houver a necessidade de se continuar a perquirir os meandros do intento
criminoso (até mesmo para se descobrir novas infrações que estão para ser
cometidas), exatamente aspectos que concorreram na investigação subjacente
a referendar a prova ora em comento.
- Nota-se, efetivamente, que o revisionando cometeu crime de corrupção
passiva elencado no art. 317 do Código Penal, com a causa de aumento de
pena disposta no § 1º de mencionado preceito, tendo como base o arcabouço
fático-probatório amealhado no feito subjacente, donde se conclui pela
correção do édito penal condenatório transitado em julgado a afastar
ilações no sentido de que não haveria prova apta a supedanear juízo em
seu desfavor.
- Alega o revisionando que sua reprimenda padeceria de ilegalidade na justa
medida em que utilizado o mesmo fundamento (agilização dos processos
administrativos) para majorá-la tanto na 1ª etapa como no 3º momento da
dosimetria. Destaca, ainda, que a traição citada pelo magistrado sentenciante
consistiria em elementar ínsita ao tipo penal em que incorrido, uma vez que
aquele que pratica o delito já está maculando a confiança depositada em
sua pessoa pela Administração Pública.
- Analisando a fundamentação expendida pelo magistrado sentenciante, não se
vislumbra nem a ocorrência do propalado bis in idem nem o emprego de elementar
típica para fins de recrudescimento da reprimenda. Diz-se isso tendo como
base o fato de que a pena-base restou majorada em razão de ter sido constatada
violação ao princípio da impessoalidade pelo atuar do revisionando (que não
respeitava a ordem cronológica de análise de procedimentos administrativos
em detrimento de segurados pobres e honestos da autarquia previdenciária),
bem como supedaneado pela violação concreta da confiança que sua então
chefe depositava nos préstimos de seu então subalterno - dentro de tal
contexto e sem se descurar que todo crime contra a administração pública
tem como pressuposto uma "traição" ao múnus público (traição esta tomada
em sua acepção mais ampla e genérica), a valoração negativa levada a
efeito teve como um de seus fundamentos a traição em concreto a uma pessoa
determinada (qual seja, a chefe do revisionando) que, aliada a mácula ao
princípio constitucional da impessoalidade, recomendava efetivamente o
incremento sancionatório executado.
- A causa de aumento de pena elencada no § 1º do art. 317 do Código Penal
tem como pressuposto para sua incidência a efetiva omissão ou ação
do servidor público corrupto, que, por ter recebido vantagem ilícita e
indevida ou meramente ter aquiescido com a promessa dela, retarda ou deixa de
praticar ato de ofício ou o leva a efeito infringindo dever funcional. Nesse
diapasão, sua incidência no caso concreto deu-se apenas pelo fato de que o
revisionando infringiu dever legal ao praticar ato de ofício consistente na
agilização do pagamento de importância relativa a atrasados de segurado da
Previdência Social, o que tem o condão de sufragar a legalidade da causa de
aumento ora em comento, sendo impossível inferir-se qualquer argumentação
passível no sentido de que haveria bis in idem em tal proceder.
- Após o exaurimento da análise dos pontos aventados pelo revisionando,
nota-se que sua intenção está em rediscutir nesta senda aspectos que foram
todos apreciados, contextualizados e julgados na Ação Penal subjacente, o que
não se coaduna com os limites de cognição consagrados para fins revisionais
na justa medida em que o expediente em tela não deve ser interpretado como
uma nova possibilidade de haver um julgamento de recurso de Apelação (com
a cognição inerente a tal recurso). Em última instância, depreende-se
sua intenção em manifestar seu inconformismo com a condenação que lhe
foi impingida, condenação esta balizada no amplo conhecimento das provas
e dos fatos e da extensiva valoração levada a efeito na Ação Penal que
deu origem ao título penal condenatório que se busca desconstituir, o que
não se admite ser aventado em Revisão Criminal.
- Revisão Criminal julgada improcedente.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, JULGAR IMPROCEDENTE o pleito revisional, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
21/02/2019
Data da Publicação
:
28/02/2019
Classe/Assunto
:
RvC - REVISÃO CRIMINAL - 1403
Órgão Julgador
:
QUARTA SEÇÃO
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-36
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-621 INC-1
LEG-FED LEI-9296 ANO-1996
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-317 INC-1
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/02/2019
..FONTE_REPUBLICACAO:
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