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Jurisprudência


TRF3 0004078-26.2007.4.03.6126 00040782620074036126

Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ART. 168-A DO CÓDIGO PENAL. NULIDADE DA SENTENÇA INEXISTENTE. CORREÇÃO DA CAPITULAÇÃO DO DELITO. RECURSO DA ACUSAÇÃO. POSSIBILIDADE DE MAJORAÇÃO DA PENA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA AFASTADA. DIFICULDADES FINANCEIRAS. NÃO COMPROVAÇÃO. EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. REVISÃO DA DOSIMETRIA DA PENA. GRAU DE REPROVAÇÃO DA CONDUTA E DANO AOS COFRES DO INSS. CIRCUNSTÂNCIAS QUE IMPORTAM EM AGRAVAMENTO DA PENA. CONTINUIDADE DELITIVA. PENA APLICADA QUE EVIDENCIA A OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO RETROATIVA DA PRETENSÃO PUNITIVA. RECONHECIMENTO COM DECRETAÇÃO DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DOS RÉUS. 1. Não se vislumbra a existência de defeitos na sentença de modo a ensejar sua anulação e retorno dos autos à instância a quo para prolação de novo decisum. A inconsistência do julgado singular, no tocante à dosimetria da pena pode ser corrigida nesta oportunidade, visto tratar-se de error in judicando. 2. É de se corrigir a capitulação da infração imputada aos réus, com fulcro no art. 383 do Código de Processo Penal, uma vez que os fatos descritos na denúncia se amoldam ao tipo previsto no art. 168, § 1º, inc. I do Código Penal, e não àquele descrito no caput do referido dispositivo. 3. A prescrição da pretensão punitiva antes de transitar em julgado a sentença condenatória se regula pelo máximo da pena cominada ao crime, nos moldes do art. 109 do Código Penal. Dessa forma, havendo recurso da acusação, a reprimenda fixada na sentença poderá ser majorada, o que inviabiliza a contagem da prescrição com base na pena em concreto estabelecida na primeira instância. 4. Tanto a doutrina, como a jurisprudência, entendem pela possibilidade de se excluir a culpabilidade dos agentes do delito em questão, por inexigibilidade de conduta diversa, desde que se comprove a presença de determinadas circunstâncias, tidas por indispensáveis, dentre as quais se destacam: a existência efetiva das dificuldades financeiras, as quais devem ser comprovadas por prova documental incontestável; que tais dificuldades não foram causadas por má administração por parte do agente; a presença de risco à própria sobrevivência da empresa; ausência de alternativa diversa aos sócios ou administradores senão utilizar-se do numerário destinado às contribuições previdenciárias; efetiva utilização do dinheiro não repassado á Previdência Social para tentar sanear e preservar a empresa; e, ainda, a sujeição de bens pessoais dos sócios em benefício da empresa. 5. Ademais, as declarações dos réus, em juízo, assim como a prova testemunhal, eventualmente colhida, não são suficientes para demonstração da penúria econômica da empresa, cuja comprovação deve ser calcada em prova documental-contábil idônea, inclusive com realização de perícia, se este for o caso. 6. Dos elementos constantes dos autos é possível concluir-se que as dificuldades financeiras alegadas pelos acusados não foram capazes de demonstrar a excludente supralegal pleiteada, visto que não há provas contundentes capazes de demonstrar que a crise financeira da empresa era grave e séria a ponto de obriga-los a deixar de repassar aos cofres do INSS as contribuições previdenciárias descontadas dos empregados, por um período de quase 03 (três) anos, ante a necessidade de utilização de tal numerário para continuar operando, mediante apropriação recursos que não lhes pertenciam. 7. Impõe-se rever a dosimetria das penas, com vistas à correção de incoerências existentes na sentença, a qual, ao estabelecer a pena privativa de liberdade considerou inexistentes circunstâncias judiciais desfavoráveis aos réus, fixando a pena-base no patamar mínimo legalmente previsto, porém, ao fixar a pena de multa, contemplou a intensidade do dolo e as consequências do delito para exasperar a quantidade de dias-multa, estabelecendo-os muito acima do mínimo, deixando, assim, de observar a necessária simetria entre as sanções. Além disso, na fixação da prestação de serviços à comunidade, uma das penas restritivas de direitos, substitutiva da reprimenda corporal em conjunto com mais uma pena de multa, não guardou a proporção legal com a pena substituída, em desacordo com o disposto no art. 46, § 3º, do Código Penal. 8. Na primeira fase, a pena-base deve ser fixada considerando-se as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, do Código Penal, ou seja, a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias e consequências do crime, bem como o comportamento da vítima. 9. A finalidade dessas circunstâncias, denominadas judiciais, por balizarem uma atuação jurisdicional fundada num exercício discricionário, é a de permitir a aplicação de penas individualizadas e proporcionais aos delitos praticados, que sejam necessárias e suficientes para promover a reprovação e a prevenção da conduta. 10. Na espécie, vê-se que a culpabilidade e o dolo são inerentes ao tipo penal e, por outro lado os réus são primários e não registram antecedentes, não havendo indícios negativos quanto às suas personalidades, aos motivos e circunstâncias do crime. 11. Contudo, a conduta por eles praticada, causou à Previdência Social prejuízo equivalente a R$ 115.391,66 (cento e quinze mil trezentos e noventa e um reais e sessenta e seis centavos), atualizado até novembro de 2008 (fls. 424/425), sendo, também, altamente reprovável, na medida em que se apropriaram de recursos pertencentes a terceiros e, de certo, contribuíram para dificultar o cumprimento eficaz, pela Seguridade Social, de sua destinação legal, no sentido de assegurar os direitos relativos à previdência e assistência social. 12. Considerando o alto grau de reprovação da conduta criminosa e também o dano causado aos cofres públicos, circunstâncias previstas expressamente no art. 59 do Código Penal, é caso de se fixar a pena-base em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses, além do mínimo legal, considerando a majoração de ¼ (um quarto), em virtude das mencionadas circunstâncias judiciais desfavoráveis. 13. Na segunda fase, inexistem circunstâncias atenuantes ou agravantes, a serem consideradas. 14. Na terceira fase, cabe trazer ao presente julgado acórdão proferido nesta Segunda Turma, que adotou o critério de aumento decorrente da continuidade delitiva segundo o número de parcelas não recolhidas, nos seguintes termos: "de dois meses a um ano de omissão no recolhimento das contribuições previdenciárias, o acréscimo é de 1/6 (um sexto); de um a dois anos de omissão, aumenta-se 1/5 (um quinto); de dois a três anos de omissão, ¼ (um quarto); de três a quatro anos de omissão, 1/3 (um terço); de quatro a cinco anos de omissão, ½ (um meio); e acima de cinco anos de omissão, 2/3 (dois terços) de aumento" (TRF 3ª Região, Segunda Turma, ACR nº 11780, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos). 15. Considerando que a reiteração da conduta criminosa, consistente em não repassar à Previdência Social nas épocas devidas, as contribuições previdenciárias descontadas nas folhas de pagamento dos empregados, perdurou por 30 (trinta) meses (janeiro a maio/1996, agosto/1996, dezembro/1996, abril/1997 a dezembro/1998 e décimos terceiros salários de 1997 e 1998), de rigor a majoração da pena em 1/4 (um quarto), em vista da continuidade delitiva, resultando na pena definitiva de 03 (três) anos, 01 (um) mês e 15 (quinze) dias de reclusão, para ambos os réus. 16. O regime inicial para cumprimento da pena privativa de liberdade não havendo circunstância que torne recomendável a fixação em regime mais gravoso, será o aberto, nos termos do art. 33, § 2º, "c", do Código Penal. 17. Com base nos critérios empregados na fixação da pena privativa de liberdade, impõe-se redimensionar a pena de multa aplicada pelo Juízo a quo, a fim de fixa-la em 15 (quinze) dias-multa, no valor unitário de ½ (meio) salário mínimo vigente à época dos fatos, tendo em vista a situação econômica dos réus que declararam, por ocasião do interrogatório judicial, realizado aos 29/11/2007, receberem proventos correspondentes a R$ 1.500,00. 18. Nos moldes do art. 44, do Código Penal, deve ser mantida a substituição da pena privativa de liberdade, para ambos os réus, por 02 (duas) penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade pelo período da condenação, nos moldes do art. 46, § 3º, do Código Penal, mais a pena de multa, já fixada pelo magistrado sentenciante, cujo valor deve ser reduzido à vista da situação econômica dos acusados, para 05 (cinco) salários mínimos da época dos fatos, a ser arcada individualmente por cada réu, ambas em favor de entidade com destinação social a ser designada pelo Juízo das Execuções Penais. 19. Tendo em vista a pena privativa de liberdade fixada no presente julgado, deve ser reconhecida ex officio a prescrição da pretensão punitiva do Estado. Embora a reprimenda corporal estabelecida na sentença tenha sido redimensionada por força do recurso interposto pelo Ministério Público Federal, o fato é que o montante da pena ora aplicada evidencia a ocorrência da prescrição. 20. A pena privativa de liberdade foi estabelecida em 03 (três) anos, 01 (um) mês e 15 (quinze) dias, porém, descontando-se o aumento decorrente da continuidade delitiva, nos moldes da Súmula 497, do E. STF, a pena a ser considerada é de 02 (dois) anos e 06 (oito) meses, a qual prescreve em 08 (oito) anos, de acordo com o artigo 109, V, do CP. 21. Na hipótese, observa-se que entre as datas do último fato delituoso, praticado em dezembro/1998 e do recebimento da denúncia (30/07/2007 - fls. 109), decorreu lapso temporal superior a 08 (oito) anos, o que revela a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa, a teor do disposto no art. 110, §§ 1º e 2º, do Código Penal, na redação anterior à Lei nº 12.234/2010, impondo decretar a extinção da punibilidade dos réus, na forma do art. 107, inc. IV, do Estatuto Penal. 22. Parcial provimento parcial às apelações interpostas pelas partes (acusação e defesa), declarando-se, contudo, de ofício, a extinção da punibilidade dos acusados, da prática do delito em questão, pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, nos termos do arts. 107, inc. IV, 109, inc. IV, 110 §§ 1º e 2º, do Código Penal e 61 do Código de Processo Penal.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso da Acusação para, considerando os fatos descritos na denúncia, corrigir a capitulação do delito, para o tipo penal previsto no art. 168, § 1º, inc. I do Código Penal; fixar a pena privativa de liberdade dos réus Márcia Aparecida Ghiraldi Terssetti e Amilcar Terssetti, em 03 (três) anos, 01 (um) mês e 15 (quinze) dias de reclusão; estabelecer o regime inicial aberto para seu cumprimento; e determinar que a pena de prestação de serviços à comunidade seja cumprida nos moldes do art. 46, 3º do Código Penal; dar parcial provimento ao apelo da Defesa para, redimensionar a quantidade de dias-multa, para 15 (quinze); reduzir o valor unitário dos dias-multa para ½ (meio) salário mínimo; e diminuir a pena de multa substitutiva para 05 (cinco) salários mínimos, considerando nas duas hipóteses aquele vigente à época dos fatos; e, de oficio, declarar extinta a punibilidade dos acusados, Márcia Aparecida Ghiraldi Terssetti e Amilcar Terssetti, da prática do delito a eles imputado, ante a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal, na modalidade retroativa, nos temos dos artigos 107, inc. IV, 109, inc. IV, 110 §§ 1º e 2º, do Código Penal e artigo 61 do Código de Processo Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 23/08/2016
Data da Publicação : 01/09/2016
Classe/Assunto : Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 38556
Órgão Julgador : SEGUNDA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA RIBEIRO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-168A ART-168 PAR-1 INC-1 ART-59 ART-33 PAR-2 LET-C ART-44 ART-46 PAR-3 ART-109 INC-5 ART-110 PAR-1 PAR-2 ART-107 INC-4 ***** STF SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL LEG-FED SUM-497 LEG-FED LEI-12234 ANO-2010
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/09/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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