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Jurisprudência


TRF3 0004150-53.2010.4.03.6111 00041505320104036111

Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONVERSÃO EM TEMPO COMUM. MOTORISTA DE CAMINHÃO. ENQUADRAMENTO PELA ATIVIDADE. CAMARISTA. AGENTE NOCIVO: FRIO. FORMULÁRIO. LAUDO PERICIAL. PERÍODO COMO AUTÔNOMO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA INTEGRAL POR TEMPO DE SERVIÇO. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA NECESSÁRIA, TIDA POR INTERPOSTA, PARCIALMENTE PROVIDAS. 1. No caso, o INSS foi condenado a reconhecer período laborado na especial e conceder o benefício de aposentadoria por tempo de serviço. Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I do artigo retro mencionado e da Súmula nº 490 do STJ. 2. Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999). 3. Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor. 4. Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. 5. O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais. Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial, o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema. 6. Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a MP nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela MP nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. 7. Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova. 8. A partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa. E a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais. 9. A permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador. 10. Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior. 11. Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, vale frisar, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais. 12. O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB. Por sua vez, o Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável. De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB. A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB. 13. O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação do STJ. 14. Deve ser mantida a sentença que entendeu como especiais os períodos de 01/11/1979 a 01/02/1983 (camarista), 01/02/1983 a 01/07/1985 (ajudante de motorista entregador) e 01/07/1985 a 10/12/1991 (motorista entregador), pois devidamente comprovada o labor em condições especiais pelos formulários e pelo laudo judicial (exposição a temperatura inferior a 30 graus negativos). 15. O agente "frio" está enquadrado como agente nocivo pelo Decreto nº 83.080/79, anexo I, item 1.1.2. A atividade desenvolvida de motorista de caminhão é passível de reconhecimento do caráter especial pelo mero enquadramento da categoria profissional (anexos dos Decretos nºs 53.831/64, código 2.4.4, e do Decreto 83.080/79, código 2.4.2). 16. Período de 11/10/73 a 28/01/74, laborado na empresa Glassmar Ind. e Com. de Fibra de Vidro Ltda, na função de "serviços gerais", esteve exposto o autor a ruído superior a 80 dB e ao agente químico "hidrocarboneto e outros compostos de carbono", conforme descrição do perito judicial trazida no laudo. O agente químico "hidrocarboneto e outros compostos de carbono" está previsto no Anexo I do Decreto 83.080/79, no item 1.2.10. Reconhecimento da especialidade, reformando-se a sentença nesse ponto. 17. Quanto aos períodos laborados como motorista, não é possível o reconhecimento, pois não há comprovação nos autos da atividade exercida em caráter especial. Embora conste da CTPS que o autor trabalhava como motorista não é possível aferir, seja pela atividade registrada na carteira, seja pelo ramo de atividade das empresas, se se tratava de motorista de caminhão. 18. Períodos de 01/01/96 a 31/12/2004, 01/02/2005 a 28/02/2005 e 01/04/2005 a 06/07/2009, para os quais o autor esteve cadastrado como autônomo na atividade de motorista de caminhão, a partir de quando a legislação passou a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado a agentes nocivos, afastando a possibilidade de enquadramento por categoria profissional. 19. O STJ vem consolidando o entendimento no sentido de ser possível ao segurado individual pleitear o reconhecimento de labor prestado em condições especiais, com a ressalva de que seja capaz também de comprovar a efetiva submissão aos agentes agressivos, nos moldes previstos à época em que realizado o serviço. 20. Na linha do entendimento acima exposto, caberia ao autor, portanto, demonstrar que esteve efetivamente submetido a condições de trabalho prejudiciais à sua saúde/integridade física, bem como que tais condições se amoldam ao quanto estabelecido na legislação vigente à época em que exerceu suas atividades como autônomo. A prova trazida aos autos pelo autor/apelante para caracterizar a especialidade da atividade exercida como autônomo é o laudo pericial judicial. 21. Conforme o laudo técnico o autor estava exposto, na função de caminhoneiro, a ruído emitido pelo caminhão foi quantificado pelo perito judicial em 74 a 87 dB. 22. Nesse particular, é certo que, até então, vinha aplicando o entendimento no sentido da impossibilidade de reconhecimento da especialidade da atividade, na hipótese de submissão do empregado a nível de pressão sonora de intensidade variável, em que aquela de menor valor fosse inferior ao limite estabelecido pela legislação vigente. 23. Ao revisitar os julgados sobre o tema, tormentoso, percebe-se nova reflexão jurisprudencial, a qual adiro, para admitir a possibilidade de se considerar, como especial, o trabalho desempenhado sob sujeição a ruído em sua maior intensidade, na medida em que esta acaba por mascarar a de menor intensidade, militando em favor do segurado a presunção de que uma maior pressão sonora prevalecia sobre as demais existentes no mesmo setor. 24. Em outras palavras, possível reconhecer a especialidade do labor, como motorista de caminhão, ao tempo em que o autor recolheu contribuições como empresário/autônomo, porém apenas nos períodos anteriores a 06/03/97 (quando o percentual máximo permitido era de 80 dB) e a partir de 19/11/2003 (quando passou a 85 dB). 25. Enquadrado, como especiais, os interregnos entre 01/01/96 a 05/03/97, bem como de 19/11/2003 a 31/12/2004, de 01/02/2005 a 28/02/2005 e de 01/04/2005 a 06/07/2009, eis que o maior ruído atestado é de 87 dB. 26. Somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda aos demais períodos de atividade comum constantes do CNIS e do "resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição", verifica-se que o autor contava com 37 anos, 9 meses e 27 dias de serviço, na data do requerimento administrativo (06/07/2009) o que lhe assegura o direito ao benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição. 27. O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (06/07/2009). 28. A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento. 29. Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante. 30. Quanto aos honorários advocatícios, com a reforma da sentença e determinação de implantação do benefício, restou sucumbente apenas a autarquia, que deverá ser condenada ao pagamento de verba honorária ao segurado. Com efeito, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça. 31. Isenta a Autarquia do pagamento de custas processuais. 32. Apelação do autor parcialmente provida. Apelação do INSS e remessa necessária, tida por interposta, parcialmente providas.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do autor, para reconhecer a especialidade do labor nos períodos de 11/10/1973 a 28/01/1974, 01/01/1996 a 05/03/1997, 19/11/2003 a 31/12/2004, 01/02/2005 a 28/02/2005 e de 01/04/2005 a 06/07/2009, e condenar o INSS na implantação e pagamento do benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, a partir da data do requerimento administrativo (06/07/2009) e dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, tida por interposta, para estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e para que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, sejam fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo no mais a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 08/10/2018
Data da Publicação : 18/10/2018
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1737888
Órgão Julgador : SÉTIMA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/10/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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