TRF3 0004634-77.2005.4.03.6100 00046347720054036100
DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO
PREVIDENCIÁRIA. ENTIDADE BENEFICENTE DE ASSISTÊNCIA
SOCIAL. IMUNIDADE. ARTIGO 195, §7º, DA CF. REQUISITOS. ARTIGO 14
DO CTN. ARTIGO 55 DA LEI Nº 8.212/91. INCONSTITUCIONALIDADE. LEI
COMPLEMENTAR. IMPRESCINDIBILIDADE. DEPÓSITO JUDICIAL SUSPENSIVO DE
EXIGIBILIDADE. ARTIGO 151, II, DO CTN. FINALIDADE DÚPLICE. REGIME
DE INDISPONIBILIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA. SELIC. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. ARTIGO 20, §4, DO CPC/73.
1. Apelações interpostas contra sentença que julgou procedente ação
de rito ordinário, com resolução do mérito, nos termos do artigo 269,
inciso I, do CPC/73, "para declarar a inexistência de relação jurídica
que obrigue a autora ao recolhimento de contribuições sociais (sobre folha
de salários), por força da imunidade prevista no artigo 195, §7º, da
Constituição da República, combinado com o artigo 55 da Lei Federal nº
8.212/1991, reconhecendo o direito de repetição dos valores recolhidos a
este título, consoante as guias juntadas aos autos (...), com atualização
exclusivamente pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e
Custódia - SELIC, desde as datas dos respectivos recolhimentos indevidos",
condenando ainda "a ré ao reembolso das custas processuais e ao pagamento de
honorários advocatícios", arbitrados "em 10% sobre os valores atualizados
a serem repetidos, nos termos do artigo 20, §3º," do CPC/73, indeferindo,
a final, "o levantamento imediato dos valores depositados", em virtude "da
impossibilidade de distinguir os valores das contribuições descontadas
dos empregados e das recolhidas pela autora diretamente sobre a folha de
salários".
2. Na repercussão geral reconhecida no RE nº 566.622/RS decidiu o colendo
Supremo Tribunal Federal, em 23/02/2017, declarar a inconstitucionalidade
formal de todo o artigo 55 da Lei nº 8.212/1991, quando, então,
fixadas importantes premissas para o enfrentamento da questão da imunidade
tributária em relação às contribuições previdenciárias: a) o benefício
constitucional posto no artigo 195, § 7º da Carta é verdadeira imunidade;
b) as entidades beneficentes de assistência social ali mencionadas são
aquelas que prestam serviços não somente na área de atuação estritamente
prevista no artigo 203 da Constituição, mas também no campo das atividades
relacionadas à saúde e à educação, fazendo-o sem fins lucrativos,
com caráter assistencial em favor da coletividade; c) as "exigências
estabelecidas em lei" prenunciadas no citado dispositivo constitucional
hão de ser aquelas disciplinadas por lei complementar; d) "Cabe à lei
ordinária apenas prever requisitos que não extrapolem os estabelecidos
no Código Tributário Nacional ou em lei complementar superveniente,
sendo-lhe vedado criar obstáculos novos, adicionais aos já previstos em
ato complementar"; e) é inconstitucional o artigo 55 da Lei nº 8.212/91,
por exorbitar do núcleo do artigo 14 do CTN, já que não versa regras
meramente procedimentais para o funcionamento das instituições, mas antes
impõe formalidades que se constituem genuínos condicionantes limitadores
prévios, verdadeiros requisitos constitutivos do direito à imunidade; f)
enquanto não editada nova lei complementar, os requisitos a que alude o
artigo 195, § 7º da Constituição são aqueles delineados no artigo 14
do Código Tributário Nacional.
3. Além disso, nos termos do voto condutor do RE 566.622, "A qualificação
jurídica da entidade imune advém do atendimento aos requisitos firmados
nos artigos 14 e 9º, do CTN, provados de modo seguro pela entidade,
na oportunidade de eventual controle estatal que possa justificar sua
"suspensão". Trata-se de direito pleno à imunidade, como ocorre com livros
e periódicos ou mesmo templos de qualquer culto, ficando apenas sujeito
a eventual suspensão caso não se comprove adequadamente os requisitos
que confirmam, além do desempenho das finalidades essenciais, que não
contemplam fins lucrativos. E naquelas hipóteses em que seja cabível o
direito, com provas de atendimento dos requisitos legais, mesmo que não
se tenha manifestado previamente o poder público, para todo o período
doravante, há de vir mantido o reconhecimento do direito subjetivo, sob pena
de não se perpetrar a garantia constitucional. [...] Não é aceitável,
pois, concentrar vistas sobre a condição formal em detrimento do direito
material de proteção de liberdade, sob a forma de garantia fundamental. A
condicionalidade do benefício é medida de controle para justificar
sua eventual suspensão, mas não para prestar-se como instrumento vil de
restrição ao direito constitucionalmente protegido, a manter as entidades
relacionadas como subjugadas à discricionariedade estatal. É justamente
contra isso que se eleva a imunidade. (TORRES, Heleno Taveira. Teoria da
Norma de Imunidade Tributária e sua Aplicação às Entidades sem Fins
Lucrativos. In: TORRES, Heleno Taveira (Coordenador). Direito Tributário e
Ordem Econômica: Homenagem aos 60 Anos da ABDF. São Paulo: Quartier Latin,
2010, p. 36)." (grifos nossos)
4. A pretensão recursal da autora para que seja determinada "a imediata
expedição dos alvarás de levantamento de todos os depósitos judiciais",
ou, subsidiariamente, "o levantamento, ao menos, dos depósitos judiciais
dos créditos referentes ao período compreendido entre 10/2006 a 06/2007",
não pode ser recepcionada, haja vista que a mera possibilidade de a questão
de fundo ser eventualmente favorável à autora não autoriza o levantamento
dos valores depositados, mesmo porque o depósito previsto no artigo 151,
inciso II, do Código Tributário Nacional, é feito sob o regime de
indisponibilidade, o qual cessa somente com o trânsito em julgado.
5. Quanto à correção monetária, o Superior Tribunal de Justiça, no
julgamento do REsp nº 1.112.524/DF e do REsp nº 1.111.175/SP, conforme
procedimento previsto para os recursos repetitivos, assentou o entendimento
de ser a taxa SELIC aplicável exclusivamente a partir de 01º/01/1996, sem
cumulação com qualquer outro índice de correção monetária ou de juros.
6. Honorários advocatícios alterados para R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos
reais), com base no artigo 20, §4º, do CPC/73.
7. Apelações desprovidas. Remessa oficial provida em parte.
Ementa
DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO
PREVIDENCIÁRIA. ENTIDADE BENEFICENTE DE ASSISTÊNCIA
SOCIAL. IMUNIDADE. ARTIGO 195, §7º, DA CF. REQUISITOS. ARTIGO 14
DO CTN. ARTIGO 55 DA LEI Nº 8.212/91. INCONSTITUCIONALIDADE. LEI
COMPLEMENTAR. IMPRESCINDIBILIDADE. DEPÓSITO JUDICIAL SUSPENSIVO DE
EXIGIBILIDADE. ARTIGO 151, II, DO CTN. FINALIDADE DÚPLICE. REGIME
DE INDISPONIBILIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA. SELIC. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. ARTIGO 20, §4, DO CPC/73.
1. Apelações interpostas contra sentença que julgou procedente ação
de rito ordinário, com resolução do mérito, nos termos do artigo 269,
inciso I, do CPC/73, "para declarar a inexistência de relação jurídica
que obrigue a autora ao recolhimento de contribuições sociais (sobre folha
de salários), por força da imunidade prevista no artigo 195, §7º, da
Constituição da República, combinado com o artigo 55 da Lei Federal nº
8.212/1991, reconhecendo o direito de repetição dos valores recolhidos a
este título, consoante as guias juntadas aos autos (...), com atualização
exclusivamente pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e
Custódia - SELIC, desde as datas dos respectivos recolhimentos indevidos",
condenando ainda "a ré ao reembolso das custas processuais e ao pagamento de
honorários advocatícios", arbitrados "em 10% sobre os valores atualizados
a serem repetidos, nos termos do artigo 20, §3º," do CPC/73, indeferindo,
a final, "o levantamento imediato dos valores depositados", em virtude "da
impossibilidade de distinguir os valores das contribuições descontadas
dos empregados e das recolhidas pela autora diretamente sobre a folha de
salários".
2. Na repercussão geral reconhecida no RE nº 566.622/RS decidiu o colendo
Supremo Tribunal Federal, em 23/02/2017, declarar a inconstitucionalidade
formal de todo o artigo 55 da Lei nº 8.212/1991, quando, então,
fixadas importantes premissas para o enfrentamento da questão da imunidade
tributária em relação às contribuições previdenciárias: a) o benefício
constitucional posto no artigo 195, § 7º da Carta é verdadeira imunidade;
b) as entidades beneficentes de assistência social ali mencionadas são
aquelas que prestam serviços não somente na área de atuação estritamente
prevista no artigo 203 da Constituição, mas também no campo das atividades
relacionadas à saúde e à educação, fazendo-o sem fins lucrativos,
com caráter assistencial em favor da coletividade; c) as "exigências
estabelecidas em lei" prenunciadas no citado dispositivo constitucional
hão de ser aquelas disciplinadas por lei complementar; d) "Cabe à lei
ordinária apenas prever requisitos que não extrapolem os estabelecidos
no Código Tributário Nacional ou em lei complementar superveniente,
sendo-lhe vedado criar obstáculos novos, adicionais aos já previstos em
ato complementar"; e) é inconstitucional o artigo 55 da Lei nº 8.212/91,
por exorbitar do núcleo do artigo 14 do CTN, já que não versa regras
meramente procedimentais para o funcionamento das instituições, mas antes
impõe formalidades que se constituem genuínos condicionantes limitadores
prévios, verdadeiros requisitos constitutivos do direito à imunidade; f)
enquanto não editada nova lei complementar, os requisitos a que alude o
artigo 195, § 7º da Constituição são aqueles delineados no artigo 14
do Código Tributário Nacional.
3. Além disso, nos termos do voto condutor do RE 566.622, "A qualificação
jurídica da entidade imune advém do atendimento aos requisitos firmados
nos artigos 14 e 9º, do CTN, provados de modo seguro pela entidade,
na oportunidade de eventual controle estatal que possa justificar sua
"suspensão". Trata-se de direito pleno à imunidade, como ocorre com livros
e periódicos ou mesmo templos de qualquer culto, ficando apenas sujeito
a eventual suspensão caso não se comprove adequadamente os requisitos
que confirmam, além do desempenho das finalidades essenciais, que não
contemplam fins lucrativos. E naquelas hipóteses em que seja cabível o
direito, com provas de atendimento dos requisitos legais, mesmo que não
se tenha manifestado previamente o poder público, para todo o período
doravante, há de vir mantido o reconhecimento do direito subjetivo, sob pena
de não se perpetrar a garantia constitucional. [...] Não é aceitável,
pois, concentrar vistas sobre a condição formal em detrimento do direito
material de proteção de liberdade, sob a forma de garantia fundamental. A
condicionalidade do benefício é medida de controle para justificar
sua eventual suspensão, mas não para prestar-se como instrumento vil de
restrição ao direito constitucionalmente protegido, a manter as entidades
relacionadas como subjugadas à discricionariedade estatal. É justamente
contra isso que se eleva a imunidade. (TORRES, Heleno Taveira. Teoria da
Norma de Imunidade Tributária e sua Aplicação às Entidades sem Fins
Lucrativos. In: TORRES, Heleno Taveira (Coordenador). Direito Tributário e
Ordem Econômica: Homenagem aos 60 Anos da ABDF. São Paulo: Quartier Latin,
2010, p. 36)." (grifos nossos)
4. A pretensão recursal da autora para que seja determinada "a imediata
expedição dos alvarás de levantamento de todos os depósitos judiciais",
ou, subsidiariamente, "o levantamento, ao menos, dos depósitos judiciais
dos créditos referentes ao período compreendido entre 10/2006 a 06/2007",
não pode ser recepcionada, haja vista que a mera possibilidade de a questão
de fundo ser eventualmente favorável à autora não autoriza o levantamento
dos valores depositados, mesmo porque o depósito previsto no artigo 151,
inciso II, do Código Tributário Nacional, é feito sob o regime de
indisponibilidade, o qual cessa somente com o trânsito em julgado.
5. Quanto à correção monetária, o Superior Tribunal de Justiça, no
julgamento do REsp nº 1.112.524/DF e do REsp nº 1.111.175/SP, conforme
procedimento previsto para os recursos repetitivos, assentou o entendimento
de ser a taxa SELIC aplicável exclusivamente a partir de 01º/01/1996, sem
cumulação com qualquer outro índice de correção monetária ou de juros.
6. Honorários advocatícios alterados para R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos
reais), com base no artigo 20, §4º, do CPC/73.
7. Apelações desprovidas. Remessa oficial provida em parte.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, desprover as apelações e dar parcial provimento à remessa
oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Data do Julgamento
:
06/11/2018
Data da Publicação
:
21/11/2018
Classe/Assunto
:
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1599415
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/11/2018
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