main-banner

Jurisprudência


TRF3 0004719-30.2000.4.03.6103 00047193020004036103

Ementa
TRIBUTÁRIO E PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. AJUIZAMENTO DA AÇÃO DE DEPÓSITO DA LEI Nº 8.866/94. POSSIBILIDADE. PRISÃO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA VINCULANTE 25 DO STF. RESPONSABILIZAÇÃO DOS SÓCIOS. IMPOSSIBILIDADE. PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO EM FACE DA EMPRESA DEVEDORA. DECRETAÇÃO DE FALÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. CONVERSÃO DESTA AÇÃO PARA O RITO DA LEI Nº 6.830/80. IMPOSSIBILIDADE. SUCUMBÊNCIA. EQUIDADE. SENTENÇA REFORMADA. 1. O art. 1º, caput, da Lei nº 8.866/94 equiparou à condição de depositário da Fazenda as pessoas obrigadas pela legislação tributária ou previdenciária a reter ou receber de terceiro impostos, taxas e contribuições, inclusive os devidos à Seguridade Social, e recolher aos cofres públicos. Já o seu §2º determinou que aquele que não entrega à Fazenda Pública o valor referido neste artigo, no termo e forma fixados na legislação tributária ou previdenciária, é depositário infiel. E o art. 3º determina a possibilidade de ajuizamento de ação civil de depósito, a fim de exigir o recolhimento do valor do imposto, taxa ou contribuição descontado, com os correspondentes acréscimos legais, quando estiver caracterizada a situação de depositário infiel. 2. A ADIN nº 1.055-7, que discute eventual inconstitucionalidade da Medida Provisória nº 449, de 17/03/1994, reedição da Medida Provisória nº 427, de 11/02/1994, e posteriormente convertida na Lei nº 8.866, de 11/04/1994, encontra-se pendente de julgamento definitivo pelo C. Supremo Tribunal Federal. Em seu curso, foi parcialmente deferida liminar para suspender, até decisão final da ação, os efeitos dos §§ 2º e 3º do art. 4º; da expressão "referida no §2º do art. 4º, contida no caput do art. 7º; e das expressões "ou empregados" e "empregados", inseridas no caput do art. 7º e no seu parágrafo único, todos da Lei n. 8.866, de 08.04.94. Ficou assentado, ainda, o Tribunal, que, da convalidação prevista no art. 10, ficam suspensos, a partir desta data, até o julgamento final da ação, os decretos de prisão fundados, exclusivamente, no §2º do art. 4º, e os decretos de revelia fundados em seu §3º. Destaco que neste julgamento ficou vencido o I. Ministro Marco Aurélio, que deferia o pedido de medida cautelar para suspender, até decisão final da ação, a eficácia de toda a lei impugnada (Lei nº 8.866/94). 3. Assim, em princípio persiste a possibilidade de ajuizamento da ação de depósito nos termos da Lei nº 8.866/94, bem como o interesse de agir no seu prosseguimento. Aplicável ao caso sub judice o artigo 1.013, §3º, I, do Código de Processo Civil/2015, porquanto se trata de matéria exclusivamente de direito e a causa se encontra madura para julgamento. Superada a matéria preliminar, passo à apreciação do mérito. 4. Todavia, ainda que superada a questão acerca da possibilidade de ajuizamento da ação de depósito nos termos da Lei nº 8.866/94, o mesmo não se pode dizer no tocante às nuances deste procedimento. Em primeiro lugar, não é admissível a responsabilização dos sócios tão-somente em virtude da determinação contida nos artigos 1º, §2º, e 7º da Lei nº 8.866/94, tampouco com base no art. 13 da Lei nº 8.620/93. Isto pois, o art. 1º, caput e §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.866/94, atribuiu a condição de depositário infiel às pessoas obrigadas pela legislação tributária ou previdenciária a reter ou receber de terceiro impostos, taxas e contribuições, inclusive os devidos à Seguridade Social, e recolher aos cofres públicos, que não o fazem, ao passo que o art. 7º, cuja eficácia foi parcialmente suspensa pela liminar deferida na ADIN nº 1.055-7, determinou que, sendo o depositário infiel pessoa jurídica, a prisão referida no § 2º. do art. 4º será decretada contra seus diretores, administradores, gerentes ou empregados. Desse modo, esta lei responsabilizou "automaticamente" os diretores, administradores e gerentes da pessoa jurídica que cometer a conduta descrita no art. 1º, caput, da Lei nº 8.866/94, o que não se coaduna com as diretrizes do Código Tributário Nacional. Por razão similar, o artigo 13 da Lei nº 8.620/93 foi declarado inconstitucional, pelo C. Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 562276/PR, sob a sistemática de repercussão geral do art. 543-B, §3º, do CPC. Em segundo lugar, tem-se que, desde a edição da Súmula Vinculante nº 25 pelo C. Supremo Tribunal Federal, em 2009, não é mais possível a pretensão referente à prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito, sobretudo no pressente caso, no qual sequer foi comprovada a responsabilidade dos sócios pelos débitos. Em terceiro lugar, a Lei nº 8.866/94, em alguma medida, desnaturou o conceito tradicional de depósito da lei civil (arts. 627 a 652 do CC/2002) e estendeu a previsão constitucional de prisão do depositário infiel (art. 5º, LXVII, CF) à hipótese da seara tributária, na qual sequer ocorre um "depósito" propriamente dito. E pior, sem a necessidade de comprovar a responsabilidade dos sócios da empresa "depositária infiel", determinou que o meio coercitivo dirigido a possibilitar a tutela jurisdicional específica (prisão civil) recaia sobre eles. Sendo que na redação original, antes da liminar deferida na ADIN nº 1.055-7, responsabilizava-se até os empregados que movimentassem recursos financeiros isolada ou conjuntamente. Não se pode olvidar que, nos termos do art. 110 do CTN, a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado. Por todas as razões expostas, não é possível responsabilizar os sócios pelos débitos da empresa, muito menos sob "pena" de prisão civil dos sócios como depositários infiéis, na hipótese de não cumprimento do mandado de entrega dos valores devidos. 5. Nestes termos, as ações de depósito da Lei nº 8.866/94, em tese, somente poderiam correr em face da empresa devedora, uma vez que há débito tributário e, em relação a ela, não há nada que impossibilite seja feita a cobrança por meio de ação civil de depósito, nos termos do art. 3º, caput, da Lei nº 8.866/94. Contudo, no caso dos autos, há a informação de decretação da falência da empresa devedora (fls. 137/147). Com efeito, a Lei nº 11.101/2005 prevê que a decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial enseja a suspensão de todas as ações e execuções em face do devedor, devendo os credores se habilitar perante o juízo universal da falência para satisfação dos seus créditos. A exceção do §7º desta Lei abrange tão-somente execuções fiscais. A Lei nº 8.866/94, que instituiu esta ação de depósito, também nada disse a respeito da possibilidade de seu prosseguimento nos casos de decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial. Portanto, é inequívoca impossibilidade de prosseguimento desta ação em face da ré CIRO DISTRIBUIDORA DE ALIMENTOS LTDA. 6. Por todas as razões expostas, ante a impossibilidade de prosseguimento da ação, seja em face dos sócios, seja contra a empresa devedora, a ação merece ser julgada improcedente. 7. Apenas para que não se alegue omissão, consigno que também entendo não ser possível a conversão desta ação para o rito da Lei nº 6.830/80, tendo em vista que se trata de procedimentos diversos e especiais. Conforme supra explicado, é uma faculdade da União ajuizar o procedimento executivo fiscal da Lei nº 6.830/80 ou a ação civil de depósito da Lei 8.866/94, de modo que, a meu ver, uma vez escolhida a ação de depósito, não há como alterar o procedimento. Na hipótese de parcial procedência da ação de depósito ocorreria a expedição do mandado de entrega em face da empresa devedora (sem previsão de prisão civil dos sócios como meio coercitivo) e, não se verificando o pagamento, o prosseguimento por cumprimento se sentença, sem qualquer eventual benesse específica do procedimento das execuções fiscais - o que não é possível no caso dos autos em razão da decretação da falência da empresa devedora. 8. Com relação ao ônus sucumbencial, verifico que persiste a sucumbência da União, devendo esta arcar com custas processuais e honorários advocatícios. Todavia, o valor arbitrado pelo magistrado a quo a título de honorários advocatícios, em 10% sobre o valor atribuído à causa, mostra-se excessivo e em desconformidade com o art. 20, §4º, do CPC, devendo ser reduzido para o patamar de R$ 2.000,00 (dois mil reais). 9. Recurso de apelação da União parcialmente provido, afastar a extinção sem julgamento do mérito e, com fulcro no art. 1.013, §3º, I, do Código de Processo Civil/15, julgar improcedente a ação, bem como reduzir os honorários para o patamar de R$ 2.000,00 (dois mil reais), nos termos do voto.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso de apelação da União, para afastar a extinção sem julgamento do mérito e, com fulcro no art. 1.013, §3º, I, do Código de Processo Civil/15, julgar improcedente a ação, bem como reduzir os honorários para o patamar de R$ 2.000,00 (dois mil reais), nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 10/10/2016
Data da Publicação : 17/10/2016
Classe/Assunto : AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1538484
Órgão Julgador : QUINTA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/10/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão