TRF3 0004797-57.2010.4.03.6108 00047975720104036108
DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ART. 1.013,
§ 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. LOTERIAS. COMERCIALIZAÇÃO DE
"BOLÕES" POR CASAS LOTÉRICAS. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. IMPLEMENTAÇÃO
DE PLANO DE FISCALIZAÇÃO PERMANENTE DAS PERMISSIONÁRIAS. PRESENÇA DO
INTERESSE DE AGIR. DEVER LEGAL RECONHECIDO. MULTA DIÁRIA. DESCUMPRIMENTO
DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. APLICAÇÃO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE.
1. O Ministério Público Federal promoveu Ação Civil Pública contra
a Caixa Econômica Federal e empresas lotéricas indicadas na inicial,
para coibir a prática de comercialização de "venda de bolões",
"jogos previamente marcados, cujo valor é fracionado entre diversos
apostadores/consumidores, que não têm qualquer garantia quanto à efetiva
realização da aposta".
2. O autor postulou "a condenação da Caixa Econômica Federal na obrigação
de fazer consistente em implementar plano de fiscalização permanente das
permissionárias de loterias, para verificação do integral cumprimento
dos termos dos contratos administrativos de adesão, bem como da Circular
CAIXA 471/09, ou do normativo que lhe venha suceder".
3. Restou homologado acordo com as empresas lotéricas demandadas, com o
estabelecimento, dentre outras, da obrigação de não fazer no que toca ao
oferecimento e comercialização de "bolões", o que propiciou a extinção
do processo em relação a elas, nos termos do art. 269, III, do Código
de Processo Civil outrora vigente, sendo que, na referida assentada, o
Ministério Público Federal pleiteou e o magistrado singular deferiu o
regular prosseguimento do feito em relação à Caixa Econômica Federal.
4. Merece reforma a sentença, visto que não se constata, in casu, ausência
superveniente de interesse de agir.
5. Não obstante existir o dever legal de a CEF proceder à fiscalização
permanente das permissionárias de loterias, resta evidente que este não tem
sido seu comportamento, haja vista que permitiu, ao arrepio da legislação de
regência, a realização de "vendas de bolões" aos consumidores, tal como
descrito na peça inicial desta demanda, impondo-se a reforma do julgado "a
quo", razão pela qual passa-se ao exame do mérito, com amparo no art. 1.013,
§ 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
6. Em consonância com o disposto no art. 1º do Decreto-Lei nº 204/67,
a exploração de loteria constitui serviço público exclusivo da União,
não suscetível de concessão, estabelecendo o art. 2º do Decreto-Lei
204/67 que o serviço de Loteria Federal será "executado pelo Conselho
Superior das Caixas Econômicas Federais".
7. Em outro plano, dispõe o art. 25 do Decreto-Lei 204/67 que "a
administração do Serviço de Loteria Federal compete superintender,
coordenar, fiscalizar e controlar, em todo território nacional, a execução
do Serviço de Loteria Federal, na forma do presente Decreto-lei", não
havendo dúvida de que a legislação de regência disciplina expressamente o
dever de fiscalização da CEF, no que toca aos serviços da Loteria Federal,
inexistindo nos autos controvérsia a respeito.
8. Ao contrário do que sustenta a apelada CAIXA, a realização de
fiscalização para apurar a ilegalidade da venda de "bolões" sempre foi
factível, visto que o próprio órgão Ministerial, com a consecução de
algumas diligências, apurou irregularidades em diversas casas lotéricas.
9. A desídia da corré CAIXA restou revelada também no curso desta demanda,
não obstante a comprovação cabal dos atos ilegais perpetrados pelas casas
lotéricas quanto à venda dos "bolões".
10. Embora, após a homologação de acordo, as casas lotéricas tenham
assumido, dentre outras, a obrigação de não fazer consistente na abstenção
de oferecer e comercializar a espécie de sorteio conhecido como "bolão",
há certidão nos autos noticiando que a Lotérica Mary Dota Ltda descumpriu
parte do avençado, haja vista que não afixou o cartaz referido em Termo
de Audiência, o que propiciou, inclusive, a prolação da decisão na
qual há determinação para que mencionada corré promova, no prazo de
24h, o cumprimento escorreito do que outrora restou ajustado, sob pena de
desobediência.
11. É notório, pois, que a CEF não cumpre qualquer plano de fiscalização,
visto que, mesmo após a homologação do acordo nestes autos, não realizou
qualquer diligência para verificar eventual descumprimento do avençado, o que
se revelou - mais uma vez - desidioso, especialmente em face da constatação
insofismável de descumprimento parcial do ajuste pela Lotérica Mary Dota
Ltda.
12. Diante do quadro probatório produzido, impõe-se o acolhimento do
pedido formulado pelo órgão Ministerial, no sentido de condenar a Caixa
Econômica Federal na obrigação de fazer "consistente em implementar plano
de fiscalização das permissionárias de loterias, para verificação do
integral cumprimento dos termos dos contratos administrativos de adesão,
bem como da Circular CAIXA 471/09, ou do normativo que lhe venha suceder".
13. O plano de fiscalização deverá ser oferecido no prazo de 30 dias após
o trânsito em julgado desta decisão, com implementação, também no prazo
de 30, a partir da apresentação, sob pena de imposição de multa diária
no importe de R$ 50.000,00, sem prejuízo da apuração da ocorrência de
eventual crime de desobediência.
14. Ressalta-se a possibilidade de aplicação de multa diária, de ofício,
em caso de descumprimento de obrigação de fazer, conforme julgado do STJ
(AgInt no REsp n.º 1.409.022/SP, Rel. Min. OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA,
DJe 11/09/2017).
15. Apelação parcialmente provida.
Ementa
DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ART. 1.013,
§ 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. LOTERIAS. COMERCIALIZAÇÃO DE
"BOLÕES" POR CASAS LOTÉRICAS. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. IMPLEMENTAÇÃO
DE PLANO DE FISCALIZAÇÃO PERMANENTE DAS PERMISSIONÁRIAS. PRESENÇA DO
INTERESSE DE AGIR. DEVER LEGAL RECONHECIDO. MULTA DIÁRIA. DESCUMPRIMENTO
DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. APLICAÇÃO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE.
1. O Ministério Público Federal promoveu Ação Civil Pública contra
a Caixa Econômica Federal e empresas lotéricas indicadas na inicial,
para coibir a prática de comercialização de "venda de bolões",
"jogos previamente marcados, cujo valor é fracionado entre diversos
apostadores/consumidores, que não têm qualquer garantia quanto à efetiva
realização da aposta".
2. O autor postulou "a condenação da Caixa Econômica Federal na obrigação
de fazer consistente em implementar plano de fiscalização permanente das
permissionárias de loterias, para verificação do integral cumprimento
dos termos dos contratos administrativos de adesão, bem como da Circular
CAIXA 471/09, ou do normativo que lhe venha suceder".
3. Restou homologado acordo com as empresas lotéricas demandadas, com o
estabelecimento, dentre outras, da obrigação de não fazer no que toca ao
oferecimento e comercialização de "bolões", o que propiciou a extinção
do processo em relação a elas, nos termos do art. 269, III, do Código
de Processo Civil outrora vigente, sendo que, na referida assentada, o
Ministério Público Federal pleiteou e o magistrado singular deferiu o
regular prosseguimento do feito em relação à Caixa Econômica Federal.
4. Merece reforma a sentença, visto que não se constata, in casu, ausência
superveniente de interesse de agir.
5. Não obstante existir o dever legal de a CEF proceder à fiscalização
permanente das permissionárias de loterias, resta evidente que este não tem
sido seu comportamento, haja vista que permitiu, ao arrepio da legislação de
regência, a realização de "vendas de bolões" aos consumidores, tal como
descrito na peça inicial desta demanda, impondo-se a reforma do julgado "a
quo", razão pela qual passa-se ao exame do mérito, com amparo no art. 1.013,
§ 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
6. Em consonância com o disposto no art. 1º do Decreto-Lei nº 204/67,
a exploração de loteria constitui serviço público exclusivo da União,
não suscetível de concessão, estabelecendo o art. 2º do Decreto-Lei
204/67 que o serviço de Loteria Federal será "executado pelo Conselho
Superior das Caixas Econômicas Federais".
7. Em outro plano, dispõe o art. 25 do Decreto-Lei 204/67 que "a
administração do Serviço de Loteria Federal compete superintender,
coordenar, fiscalizar e controlar, em todo território nacional, a execução
do Serviço de Loteria Federal, na forma do presente Decreto-lei", não
havendo dúvida de que a legislação de regência disciplina expressamente o
dever de fiscalização da CEF, no que toca aos serviços da Loteria Federal,
inexistindo nos autos controvérsia a respeito.
8. Ao contrário do que sustenta a apelada CAIXA, a realização de
fiscalização para apurar a ilegalidade da venda de "bolões" sempre foi
factível, visto que o próprio órgão Ministerial, com a consecução de
algumas diligências, apurou irregularidades em diversas casas lotéricas.
9. A desídia da corré CAIXA restou revelada também no curso desta demanda,
não obstante a comprovação cabal dos atos ilegais perpetrados pelas casas
lotéricas quanto à venda dos "bolões".
10. Embora, após a homologação de acordo, as casas lotéricas tenham
assumido, dentre outras, a obrigação de não fazer consistente na abstenção
de oferecer e comercializar a espécie de sorteio conhecido como "bolão",
há certidão nos autos noticiando que a Lotérica Mary Dota Ltda descumpriu
parte do avençado, haja vista que não afixou o cartaz referido em Termo
de Audiência, o que propiciou, inclusive, a prolação da decisão na
qual há determinação para que mencionada corré promova, no prazo de
24h, o cumprimento escorreito do que outrora restou ajustado, sob pena de
desobediência.
11. É notório, pois, que a CEF não cumpre qualquer plano de fiscalização,
visto que, mesmo após a homologação do acordo nestes autos, não realizou
qualquer diligência para verificar eventual descumprimento do avençado, o que
se revelou - mais uma vez - desidioso, especialmente em face da constatação
insofismável de descumprimento parcial do ajuste pela Lotérica Mary Dota
Ltda.
12. Diante do quadro probatório produzido, impõe-se o acolhimento do
pedido formulado pelo órgão Ministerial, no sentido de condenar a Caixa
Econômica Federal na obrigação de fazer "consistente em implementar plano
de fiscalização das permissionárias de loterias, para verificação do
integral cumprimento dos termos dos contratos administrativos de adesão,
bem como da Circular CAIXA 471/09, ou do normativo que lhe venha suceder".
13. O plano de fiscalização deverá ser oferecido no prazo de 30 dias após
o trânsito em julgado desta decisão, com implementação, também no prazo
de 30, a partir da apresentação, sob pena de imposição de multa diária
no importe de R$ 50.000,00, sem prejuízo da apuração da ocorrência de
eventual crime de desobediência.
14. Ressalta-se a possibilidade de aplicação de multa diária, de ofício,
em caso de descumprimento de obrigação de fazer, conforme julgado do STJ
(AgInt no REsp n.º 1.409.022/SP, Rel. Min. OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA,
DJe 11/09/2017).
15. Apelação parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
01/02/2018
Data da Publicação
:
09/02/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2072626
Órgão Julgador
:
SEXTA TURMA
Relator(a)
:
JUIZ CONVOCADO PAULO SARNO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Referência
legislativa
:
***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-1013 PAR-3 INC-1
LEG-FED CIR-471 ANO-2009
CIRCULAR CAIXA
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-269 INC-3
LEG-FED DEL-204 ANO-1967 ART-2 ART-25
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/02/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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