TRF3 0005150-51.2011.4.03.6112 00051505120114036112
DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL. "OPERAÇÃO DESFALQUE". QUADRILHA OU
BANDO. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. QUESTÕES PRELIMINARES DE ILEGALIDADE NAS
INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. NULIDADE DO FEITO PELA NÃO OBTENÇÃO
DE PROVAS POR OUTROS MEIOS. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INDEFERIMENTO DE
DILIGÊNCIAS NA FASE DO ART. 402 DO CPP. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA
CORRELAÇÃO. INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 288 DO CP. ILICITUDE DAS BUSCAS
E APREENSÕES. QUESTÕES PRELIMINARES REJEITADAS. MATERIALIDADE, AUTORIA E
DOLO COMPROVADOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA.
1. O monitoramento telefônico, embora imprescindível para a elucidação
do presente caso concreto, não foi o único meio de prova produzido nos
autos, tendo sido deferido outros meios de prova, com o depoimento de várias
testemunhas, ouvidas ao longo da instrução criminal. Questão preliminar
rejeitada.
2. Não há que se falar em nulidade processual por ilegalidade na decisão
judicial que deferiu a interceptação telefônica e telemática, posto que foi
devidamente fundamentada, tendo por base os relatórios detalhados elaborados
na fase inquisitiva e que trouxeram elementos suficientes que justificaram
a necessidade e a conveniência, tanto da interceptação telefônica,
como das sucessivas prorrogações. Questão preliminar rejeitada.
3. Com relação à preliminar de inépcia da denúncia, não há que se falar
em ausência de descrição das condutas praticadas pelos acusados, vez que
o Parquet descreveu os fatos criminosos, com todas as suas circunstâncias,
inclusive detalhando o modus operandi da associação criminosa. Como é
sabido, a denúncia é uma peça técnica que deve ser simples e objetiva,
atribuindo a responsabilidade por um fato, com a indicação da conduta
ilícita imputada, de modo a propiciar o pleno exercício do direito de
defesa. Questão preliminar rejeitada.
4. A decisão de indeferimento dos pleitos da defesa não caracteriza
cerceamento de defesa, nem revela qualquer prejuízo à defesa, pois,
se por um lado o direito do réu de produzir todas as provas requeridas
em sua defesa não é absoluto, de outro lado, ao Juiz é outorgada a
faculdade de indeferir provas que considere protelatórias, impertinentes
ou irrelevantes à instrução do processo, conforme preceitua o artigo 400,
§1º, do Código de Processo Penal. Questão preliminar rejeitada.
5. Pleiteia a defesa de EDNA a nulidade da sentença por ausência de
fundamentação da condenação da acusada pelo delito tipificado no
art. 171, caput, do Código Penal, além de violação ao princípio
da correlação. Entretanto, não se sustenta o argumento de nulidade
da sentença por ausência de fundamentação, uma vez que o MM. Juiz a
quo fundamentou a condenação da ré apontando as suas responsabilidades
perante a associação criminosa e quais eram as tarefas a ela destina. Com
relação aos argumentos de violação ao princípio da correlação alegado
tanto pela defesa de EDNA como pela defesa de PRISCILA, tem-se que o réu
defende-se dos fatos, e não da capitulação jurídica apresentada. Dessa
forma, não se mostra nula a sentença que diverge da denúncia, aplicando
o instituto da emendatio libeli. Questão preliminar rejeitada.
6. Aduz a defesa que o artigo 288, do Código Penal é inconstitucional
por violar os princípios da lesividade, da ofensividade, da dignidade
da pessoa humana e do Estado Democrático de Direito. O Supremo Tribunal
Federal em diversos julgados se deparou com o exame do delito de quadrilha,
não assentando qualquer inconstitucionalidade do tipo penal (ex. HC 115.701,
Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 10/09/2013). Questão preliminar rejeitada.
7. Alega a defesa que as provas obtidas por meio da busca e apreensão
autorizada pelo Juízo, a ser realizada em sua residência, são ilícitas
vez que o acusado utiliza sua residência como extensão de seu escritório
de advocacia e suas prerrogativas funcionais não foram asseguradas. Há nos
autos informação de que o escritório profissional do réu situa-se em
outro endereço, diferente daquele que fora objeto da busca e apreensão,
assim confessado pelo acusado. Conforme esclarecido pelo MM. Juiz em
sua sentença, a autorização de busca e apreensão foi concedida para
ser realizada no endereço residencial de ROBERTO RAINHA e a alegação
de que sua casa é extensão de seu escritório profissional trata-se de
medida protelatória com a clara intenção de blindar o acusado do poder
investigativo do Estado. Ademais, a prerrogativa concedida aos advogados
tem o condão de garantir o sigilo profissional em relação aos documentos
referentes aos seus clientes e não a documentos que digam respeito a sua
própria atuação ilícita. Questão preliminar rejeitada.
8. Do Mérito. Não há dúvida sobre a participação dos apelantes em
associação com os demais denunciados integrantes do grupo criminoso. O dolo
(consciência e vontade) dos acusados em estar associado aos demais de forma
estável e duradoura para praticar os delitos ficou comprovado pela prova
coligida aos autos. Desta feita, tendo em vista que restou comprovada a
materialidade e a autoria delitivas do crime de quadrilha ou bando (artigo
288 do CP), posto que demonstrada a associação de mais de três pessoas,
de forma estável, com a finalidade voltada ao cometimento de crimes, deve
ser mantida, portanto, a condenação dos réus pela prática desse crime.
9. Demonstrado pelo conjunto probatório carreado aos autos, que a ré EDNA
MARIA TORRIANI, na qualidade de coordenadora/representante do acampamento,
e unida ao grupo criminoso, participava ativamente da prática delitiva
de apropriação de cestas básicas fornecidas pelo Governo Federal, bem
como auxiliava na sua manipulação desvirtuando o seu real destino, com
a finalidade de obter vantagem econômica em proveito próprio e do grupo
criminoso. Desta feita, restando comprovadas a materialidade e a autoria
delitivas do crime de apropriação de cestas básicas (artigo 168 CP),
deve a ré EDNA MARIA TORRIANI ser condenada pela prática desse crime.
10. Dosimetria da pena devidamente analisada de forma individualizada,
com fundamento nos artigos 68 e 59, do Código Penal.
11. Rejeitada a matéria preliminar. Apelações defensivas de ROBERTO RAINHA,
RIVALDO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR, CRISTINA DA SILVA, CÁSSIA MARIA ALVES
DOS SANTOS e EDNA MARIA TORRIANI não providas.
12. Apelações defensivas de PRISCILA CARVALHO VIOTTI, EDVALDO JOSÉ DA
SILVA, VALDEMIR ANTÔNIO DE SANTANA e ROSALINA RODRIGUES DE OLIVEIRA ACORSI
parcialmente providas, para reduzir as penas-base.
13. Apelação ministerial provida para, em relação à ré EDNA MARIA
TORRIANI, alterar a classificação jurídica da conduta de apropriação de
cestas básicas, atribuindo-lhe o tipo penal previsto no artigo 168, caput,
do Código Penal.
Ementa
DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL. "OPERAÇÃO DESFALQUE". QUADRILHA OU
BANDO. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. QUESTÕES PRELIMINARES DE ILEGALIDADE NAS
INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. NULIDADE DO FEITO PELA NÃO OBTENÇÃO
DE PROVAS POR OUTROS MEIOS. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INDEFERIMENTO DE
DILIGÊNCIAS NA FASE DO ART. 402 DO CPP. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA
CORRELAÇÃO. INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 288 DO CP. ILICITUDE DAS BUSCAS
E APREENSÕES. QUESTÕES PRELIMINARES REJEITADAS. MATERIALIDADE, AUTORIA E
DOLO COMPROVADOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA.
1. O monitoramento telefônico, embora imprescindível para a elucidação
do presente caso concreto, não foi o único meio de prova produzido nos
autos, tendo sido deferido outros meios de prova, com o depoimento de várias
testemunhas, ouvidas ao longo da instrução criminal. Questão preliminar
rejeitada.
2. Não há que se falar em nulidade processual por ilegalidade na decisão
judicial que deferiu a interceptação telefônica e telemática, posto que foi
devidamente fundamentada, tendo por base os relatórios detalhados elaborados
na fase inquisitiva e que trouxeram elementos suficientes que justificaram
a necessidade e a conveniência, tanto da interceptação telefônica,
como das sucessivas prorrogações. Questão preliminar rejeitada.
3. Com relação à preliminar de inépcia da denúncia, não há que se falar
em ausência de descrição das condutas praticadas pelos acusados, vez que
o Parquet descreveu os fatos criminosos, com todas as suas circunstâncias,
inclusive detalhando o modus operandi da associação criminosa. Como é
sabido, a denúncia é uma peça técnica que deve ser simples e objetiva,
atribuindo a responsabilidade por um fato, com a indicação da conduta
ilícita imputada, de modo a propiciar o pleno exercício do direito de
defesa. Questão preliminar rejeitada.
4. A decisão de indeferimento dos pleitos da defesa não caracteriza
cerceamento de defesa, nem revela qualquer prejuízo à defesa, pois,
se por um lado o direito do réu de produzir todas as provas requeridas
em sua defesa não é absoluto, de outro lado, ao Juiz é outorgada a
faculdade de indeferir provas que considere protelatórias, impertinentes
ou irrelevantes à instrução do processo, conforme preceitua o artigo 400,
§1º, do Código de Processo Penal. Questão preliminar rejeitada.
5. Pleiteia a defesa de EDNA a nulidade da sentença por ausência de
fundamentação da condenação da acusada pelo delito tipificado no
art. 171, caput, do Código Penal, além de violação ao princípio
da correlação. Entretanto, não se sustenta o argumento de nulidade
da sentença por ausência de fundamentação, uma vez que o MM. Juiz a
quo fundamentou a condenação da ré apontando as suas responsabilidades
perante a associação criminosa e quais eram as tarefas a ela destina. Com
relação aos argumentos de violação ao princípio da correlação alegado
tanto pela defesa de EDNA como pela defesa de PRISCILA, tem-se que o réu
defende-se dos fatos, e não da capitulação jurídica apresentada. Dessa
forma, não se mostra nula a sentença que diverge da denúncia, aplicando
o instituto da emendatio libeli. Questão preliminar rejeitada.
6. Aduz a defesa que o artigo 288, do Código Penal é inconstitucional
por violar os princípios da lesividade, da ofensividade, da dignidade
da pessoa humana e do Estado Democrático de Direito. O Supremo Tribunal
Federal em diversos julgados se deparou com o exame do delito de quadrilha,
não assentando qualquer inconstitucionalidade do tipo penal (ex. HC 115.701,
Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 10/09/2013). Questão preliminar rejeitada.
7. Alega a defesa que as provas obtidas por meio da busca e apreensão
autorizada pelo Juízo, a ser realizada em sua residência, são ilícitas
vez que o acusado utiliza sua residência como extensão de seu escritório
de advocacia e suas prerrogativas funcionais não foram asseguradas. Há nos
autos informação de que o escritório profissional do réu situa-se em
outro endereço, diferente daquele que fora objeto da busca e apreensão,
assim confessado pelo acusado. Conforme esclarecido pelo MM. Juiz em
sua sentença, a autorização de busca e apreensão foi concedida para
ser realizada no endereço residencial de ROBERTO RAINHA e a alegação
de que sua casa é extensão de seu escritório profissional trata-se de
medida protelatória com a clara intenção de blindar o acusado do poder
investigativo do Estado. Ademais, a prerrogativa concedida aos advogados
tem o condão de garantir o sigilo profissional em relação aos documentos
referentes aos seus clientes e não a documentos que digam respeito a sua
própria atuação ilícita. Questão preliminar rejeitada.
8. Do Mérito. Não há dúvida sobre a participação dos apelantes em
associação com os demais denunciados integrantes do grupo criminoso. O dolo
(consciência e vontade) dos acusados em estar associado aos demais de forma
estável e duradoura para praticar os delitos ficou comprovado pela prova
coligida aos autos. Desta feita, tendo em vista que restou comprovada a
materialidade e a autoria delitivas do crime de quadrilha ou bando (artigo
288 do CP), posto que demonstrada a associação de mais de três pessoas,
de forma estável, com a finalidade voltada ao cometimento de crimes, deve
ser mantida, portanto, a condenação dos réus pela prática desse crime.
9. Demonstrado pelo conjunto probatório carreado aos autos, que a ré EDNA
MARIA TORRIANI, na qualidade de coordenadora/representante do acampamento,
e unida ao grupo criminoso, participava ativamente da prática delitiva
de apropriação de cestas básicas fornecidas pelo Governo Federal, bem
como auxiliava na sua manipulação desvirtuando o seu real destino, com
a finalidade de obter vantagem econômica em proveito próprio e do grupo
criminoso. Desta feita, restando comprovadas a materialidade e a autoria
delitivas do crime de apropriação de cestas básicas (artigo 168 CP),
deve a ré EDNA MARIA TORRIANI ser condenada pela prática desse crime.
10. Dosimetria da pena devidamente analisada de forma individualizada,
com fundamento nos artigos 68 e 59, do Código Penal.
11. Rejeitada a matéria preliminar. Apelações defensivas de ROBERTO RAINHA,
RIVALDO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR, CRISTINA DA SILVA, CÁSSIA MARIA ALVES
DOS SANTOS e EDNA MARIA TORRIANI não providas.
12. Apelações defensivas de PRISCILA CARVALHO VIOTTI, EDVALDO JOSÉ DA
SILVA, VALDEMIR ANTÔNIO DE SANTANA e ROSALINA RODRIGUES DE OLIVEIRA ACORSI
parcialmente providas, para reduzir as penas-base.
13. Apelação ministerial provida para, em relação à ré EDNA MARIA
TORRIANI, alterar a classificação jurídica da conduta de apropriação de
cestas básicas, atribuindo-lhe o tipo penal previsto no artigo 168, caput,
do Código Penal.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, após
o voto-vista do Desembargador Federal Wilson Zauhy, por unanimidade, rejeitar
a matéria preliminar e, no mérito, dar parcial provimento às apelações
defensivas de PRISCILA CARVALHO VIOTTI, EDVALDO JOSÉ DA SILVA, VALDEMIR
ANTÔNIO DE SANTANA e ROSALINA RODRIGUES DE OLIVEIRA ACORSI para reduzir as
penas-base e, por maioria, negar provimento às apelações defensivas de
ROBERTO RAINHA, RIVALDO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR, CRISTINA DA SILVA, CÁSSIA
MARIA ALVES DOS SANTOS e EDNA MARIA TORRIANI e, por fim, dar provimento à
apelação ministerial para, em relação à ré EDNA MARIA TORRIANI, alterar
a classificação jurídica da conduta de apropriação de cestas básicas,
atribuindo-lhe o tipo penal previsto no artigo 168, caput, do Código Penal,
nos termos do voto do Relator, acompanhado pelo Des. Fed. Hélio Nogueira,
vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy que dava parcial provimento aos recursos
de ROBERTO RAINHA, CRISTINA DA SILVA, CÁSSIA MARIA ALVES DOS SANTOS e EDNA
MARIA TORRIANI somente para reduzir suas penas, conforme fundamentação;
dava provimento à apelação de RIVALDO para absolvê-lo com fundamento no
artigo 386, IV, do Código de Processo Penal e negava provimento ao apelo do
MPF. Por maioria, determinar a imediata expedição de mandados de prisão,
em desfavor de ROBERTO RAINHA, CRISTINA DA SILVA, CÁSSIA MARIA ALVES DOS
SANTOS, EDNA MARIA TORRIANI, PRISCILA CARVALHO VIOTTI, EDVALDO JOSÉ DA SILVA
e ROSALINA RODRIGUES DE OLIVEIRA ACORSI, nos termos do voto do Relator,
acompanhado pelo Des. Fed. Hélio Nogueira, vencido o Des. Fed. Wilson
Zauhy que entende deva ser determinada a expedição de mandado de prisão
somente após a certificação de esgotamento dos recursos ordinários no
caso concreto.
Data do Julgamento
:
29/05/2018
Data da Publicação
:
11/06/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 70170
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-402 ART-288 ART-400 PAR-1 ART-386 INC-4
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-171 ART-288 ART-168 ART-68 ART-59
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/06/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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