TRF3 0005182-63.2009.4.03.6100 00051826320094036100
PROCESSUAL CIVIL: CONTRATO. SISTEMA FINANCEIRO DA
HABITAÇÃO. FCVS. QUITAÇÃO. COBERTURA PELO FUNDO. TERMO DE
QUITAÇÃO. PROCURAÇÃO. PODERES ESPECÍFICOS. MULTA. PERDAS E
DANOS. UNIÃO. PRELIMINAR REJEITADA. RECURSOS DE APELAÇÃO IMPROVIDO E
PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO ADESIVO PARCIALMENTE PROVIDO.
1 - Quanto à alegação de carência da ação, ressalte-se que a ação se
deve à recusa de entrega do termo de quitação com base na ausência do
formulário de DECLARAÇÃO DE PROPRIEDADE DE OUTROS IMÓVEIS RESIDENCIAIS
E DE INEXISTÊNCIA DE OUTRAS RESPONSABILIDADES DO FCVS, para alcançar o
direito de cobertura do saldo devedor residual pelo Fundo, como se este
ainda não houvesse sido alcançado, o que, de fato, foi confirmado seu
alcance pela própria gestora do Fundo.
2 - No entanto, há que se reconhecer a legitimidade da Caixa Econômica
Federal - CEF para figurar no polo passivo da demanda proposta, uma vez que o
interesse da empresa pública federal restou evidenciado pelo comprometimento
do Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS, com informações
prestadas pela empresa pública federal de que o saldo devedor foi coberto
pelo Fundo, caso contrário não poderia ser baixado o ônus hipotecário.
3 - O agente financeiro contratante afirma que o tema central da demanda
é saber se a procuração outorgada pelos autores mutuários, designando
terceiros para representa-los perante o credor, conteria poderes suficientes
para que os mandatários viessem a firmar a "DECLARAÇÃO DE PROPRIEDADE DE
OUTROS IMÓVEIS RESIDENCIAIS E DE INEXISTÊNCIA DE OUTRAS RESPONSABILIDADES
DO FCVS".
4 - Em primeiro lugar, a procuração outorgada pelos autores aos seus
representantes é expressa ao conferir poderes para que emitam a declaração
exigida pela instituição financeira, em seus nomes; em segundo lugar,
não há qualquer impedimento legal, bem como a Circular do BACEN nº
1.866/1990, que regulamenta e prevê a exigência da declaração, não
mencionar qualquer obstáculo a tal manifestação de vontade realizada por
procuradores com poderes expressos, como é o caso dos autos, de sorte que,
não existindo norma que o impeça, o ato pode ser praticado por terceiros
nas condições aqui delimitadas.
5 - Cabe salientar que o instrumento confere poderes expressos para que
os procuradores possam emitir a declaração solicitada perante a credora
hipotecária do aludido imóvel, em nome dos antigos mutuários, alegando
e assinando o que preciso for e fazendo as declarações necessárias.
6 - Além do fato do agente financeiro não correr o risco de não ter a
possibilidade de ressarcir-se do saldo residual junto ao FCVS uma vez que
já homologado o direito de tal cobertura e quitação total do contrato.
7 - No que tange à hipótese, do credor hipotecário, de que a procuração
outorgada pelos mutuários seria o denominado 'contrato de gaveta', ou seja,
se fossemos considerar a procuração outorgada como contrato de gaveta
então não seria necessária a exigência de declaração assinada pelos
mutuários originários, uma vez que dispõe o artigo 2º da Lei nº 8.004
de 14/03/1990, com redação dada pela Lei nº 10.150/2000: "Nos contratos
que tenham cláusula de cobertura de eventual saldo devedor residual pelo
FCVS, a transferência dar-se-á mediante simples substituição do devedor,
mantidas para o novo mutuário as mesmas condições e obrigações do contrato
original, desde que se trate de financiamento destinado à casa própria,
observando-se os requisitos legais e regulamentares, inclusive quanto à
demonstração da capacidade de pagamento do cessionário em relação ao
valor do novo encargo mensal.".
8 - Com efeito, o hipotético contrato de gaveta firmado com os mutuários
originários, com saldo residual de responsabilidade do FCVS, foi assinado
originariamente em 24/09/79 e cedido em 20/06/80 aos seus representantes,
se enquadrando ao disposto no artigo acima transcrito, da Lei nº 8.004
de 14/03/1990 com redação dada pela Lei nº 10.250/2000, com vistas ao
reconhecimento do direito de cobertura do saldo devedor residual pelo FCVS.
9 - Saliente-se que a validade do afastamento do FCVS, em sendo matéria de
ordem pública, não está na livre disposição das partes, mas se opera com
amparo na Lei, estando fora da esfera de arbítrio dos agentes financeiros
disporem ou imporem sobre um encargo que não é seu, mas da União.
10 - Por outro lado, tal DECLARAÇÃO DE PROPRIEDADE DE OUTROS IMÓVEIS
RESIDENCIAIS E DE INEXISTÊNCIA DE OUTRAS RESPONSABILIDADES DO FCVS tem por
objetivo saber da existência de mais de um imóvel no mesmo município e
de outro saldo devedor.
11 - Mister apontar que o § 1º do artigo 9º da Lei 4.380/64, que determinava
a não possibilidade de aquisição de imóvel por financiamento, pelo SFH,
no caso da existência de mais de um imóvel na mesma localidade, nada dispõe
sobre restrições à cobertura de saldo devedor residual pelo FCVS, de modo
que não cabe impor ao mutuário a perda do direito de quitação da dívida,
pelo fundo, por tal motivo.
12 - Observe-se que a restrição de cobertura pelo FCVS de apenas um saldo
devedor remanescente ao final do contrato, imposta pelo § 1º do artigo 3º
da Lei nº 8100, de 05/11/90, aplica-se aos contratos firmados a partir de
sua vigência, não retroagindo para alcançar contratos anteriores.
13 - Destaca-se que a Lei nº 10.150/2000, que alterou o artigo 3º da lei
acima citada, ressalta a possibilidade de quitação, pelo FCVS, de mais
de um saldo devedor remanescente por mutuário, relativos aos contratos
anteriores a 05/12/1990.
14 - A jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça é uniforme
no sentido de que o artigo 9º, §1º, da Lei nº 4.380/64 não afasta a
quitação de um segundo imóvel financiado pelo mutuário, situado na mesma
localidade, utilizando os recursos do FCVS (REsp 1.133.769/RN submetido à
sistemática dos recursos repetitivos, nos termos do artigo 543-C do CPC/73).
15 - Conforme o exposto, tendo sido o contrato já quitado, há mais de 16
(dezesseis anos), tanto as prestações pactuadas e pagas pelos mutuários
contratantes, quanto o saldo devedor residual coberto pelo FCVS, não caberia
ao agente financeiro se recusar a fornecer a declaração de quitação
aos mesmos, e muito menos sob o fundamento de ausência do formulário de
DECLARAÇÃO DE PROPRIEDADE DE OUTROS IMÓVEIS RESIDENCIAIS E DE INEXISTÊNCIA
DE OUTRAS RESPONSABILIDADES DO FCVS, tendo sido entregue pelos representantes
dos mutuários originários para tanto, ou, caso se trate ou se tratasse de
contrato de gaveta, sua não necessidade, e/ou, por se tratar de um contrato
firmado antes de 05/11/1990, a possibilidade de existência de mais de um
imóvel com cobertura do FCVS.
16 - Ressalte-se que o agente financeiro aceitou o recebimento das prestações
durante todo o período contratual, encerrado, por decurso de prazo, em
23/09/1998, detectada, então, a inexistência de outro imóvel financiado
no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação na mesma localidade,
através da pesquisa pelo CADMUT, sendo habilitado o contrato ao FCVS em
30/10/1998 e homologado em 27/10/2000 com a COBERTURA INTEGRAL do contrato
pelo Fundo, ou seja, a instituição financeira credora recebeu a quitação
total do financiamento e persiste desde 27/10/2000, quando já homologada a
cobertura pelo Fundo, à recusa em fornecer aos mutuários, através de seus
representantes, o documento de Quitação do Contrato, com base num obstáculo
criado pela própria instituição financeira, uma vez que a Declaração que
exige, além de desnecessária, pois já foi comprovado seu conteúdo pelo
CADMUT, não se trata de documento personalíssimo, como exigido pelo credor
hipotecário, nem há norma que impeça que a declaração possa ser feita
por terceiros, como foi, uma vez que a Circular do BACEN nº 1.866/1990, que
regulamenta e prevê a exigência de tal declaração, não à delimita como
o credor hipotecário faz, sem razão e necessidade, sendo que a procuração
outorgada confere poderes expressos para que os procuradores possam emitir
a declaração solicitada em nome dos mutuários apelantes.
17 - Quanto à alegação de que, 'ainda que seja reconhecida válida
a assinatura por meio de mandatário, o apelante corre o risco de não
ter a possibilidade de ressarcir-se do saldo residual junto ao FCVS por
incompletude da documentação necessária prevista na Circular BACEN nºs
8.004/90 e 8.100/90', como é possível se não só já foi habilitado o
contrato ao FCVS, em 30/10/1998, como também homologada, em 27/10/2000, a
COBERTURA INTEGRAL do mesmo pelo Fundo, ou seja, a instituição financeira
credora apelante recebeu a quitação total do financiamento?
18 - Enfim, apesar do acima exposto, decorreram 16 (dezesseis) anos, se
considerada a homologação de cobertura do contrato pelo Fundo (27/02/2000)
e a data de conclusão dos autos a esta e. Corte (22/06/2016), de recusa
do credor hipotecário em fornecer aos mutuários, através de seus
representantes, o documento de Quitação do Contrato.
19 - Note-se que todas as prestações pagas pelo mutuário foram acrescidas
de parcela destinada ao fundo, não havendo como admitir que a instituição
financeira determine a perda do direito à quitação do saldo devedor pelo
fundo, como sanção frente ao não cumprimento de cláusula contratual outra,
aplicação esta não prevista tanto na norma acima citada como no contrato
firmado.
20 - Nesse passo, é descabido reputar válido o contrato naquilo que o agente
financeiro e o fundo aproveitam, ou seja, o recebimento das prestações e
das parcelas destinadas ao FCVS, respectivamente, e inválido naquilo que
em hipótese lhe prejudica, ou seja, a cobertura do saldo devedor residual
pelo FCVS, impondo aos mutuários a perda do direito de quitação da dívida.
21 - Enfim, conforme informações nos autos, os mutuários efetuaram
o pagamento de todas as parcelas do financiamento contratado, ou seja,
cumpriram com suas obrigações por todo o período estipulado para
quitação da dívida, e todo o saldo devedor residual foi coberto pelo
Fundo de Compensação de Variação Salarial - FCVS, quitando totalmente
o contrato de financiamento em debate.
22 - Diante de tal quadro, revela-se perfeitamente aplicável ao caso concreto
o reconhecimento do direito dos mutuários à quitação do financiamento
contratado, bem como a respectiva baixa da hipoteca incidente sobre o
imóvel em questão, após o pagamento das prestações avençadas e das
contribuições ao fundo e, através deste, a cobertura do saldo residual.
23 - O artigo 461, § 5º, do Código de Processo Civil, é claro a respeito
da possibilidade de imposição de multa diária pelo Magistrado, seja de
ofício, ou a requerimento da parte.
24 - Com relação ao valor a ser fixado, convém esclarecer que a aplicação
de multa diária alinha-se ao espírito que tem norteado as recentes
reformas processuais, as quais visam conciliar a efetividade do processo
com a segurança jurídica, cuidando para que o provimento não seja inócuo.
25 - Verifica-se que a multa diária, arbitrada no caso de descumprimento
da obrigação (a entrega dos documentos para quitação), conforme o
entendimento desta E. Décima Primeira Turma, é no sentido de que não
ultrapasse os R$ 300,00 (trezentos reais), a contar 30 (trinta) dias,
na execução, considerando-se o início da contagem do prazo a partir do
trânsito em julgado da ação.
26 - Quanto à indenização por perdas e danos, a parte autora nada trouxe
aos autos ou fez prova dos gastos ou prejuízo para tanto, não havendo
qualquer referência ou fundamentação jurídica à tal pedido.
27 - Tendo em vista a sucumbência mínima dos autores e dos fatos analisados,
merece reparo a r. sentença no que tange à proporcionalidade na condenação
da empresa gestora do FCVS ao pagamento de honorários advocatícios aos
patronos dos mutuários uma vez que não foi ela quem deu causa ao ingresso
dos mesmos na presente ação, sendo a instituição financeira contratante
e credora hipotecária a parte responsável e interessada direta ao seu
ingresso e no respectivo resultado negativo.
28 - No que diz respeito à condenação da CEF ao pagamento dos honorários
advocatícios, relevante considerar que, embora a presente tenha o propósito
de discutir o direito de entrega do documento de quitação do contrato,
que deveria ter sido reconhecido pela instituição financeira contratante,
é objeto, ainda que indireto, da demanda a cobertura em si, já realizada,
do saldo devedor pelo Fundo de Compensação das Variações Salariais, o
que, de certa forma, faria forçoso concluir no sentido da existência de
responsabilidade exclusiva do agente financeiro e não da CEF, gestora do
FCVS; observa-se, no entanto, que, em sede de contestação, a CEF, apesar
de ter juntado prontamente documentos comprovando os fatos necessários e
requeridos pelo agente financeiro, ofereceu resistência. Destarte, havendo
oposição à pretensão deduzida em juízo, resta razoável a condenação
da empresa pública federal ao pagamento dos honorários advocatícios e do
gravame sucumbencial.
29 - Tendo em vista o acima exposto, é mantida, em parte, a r. sentença
recorrida, no que tange à condenação ao pagamento das custas e despesas
processuais, assim como dos honorários advocatícios, pelo quantum fixado,
com supedâneo no artigo 20, §3º, "a", "b", e "c", e §4º do Código
de Processo Civil, uma vez que os mutuários decaíram de parte mínima do
pedido, impondo, no entanto, a proporcional distribuição e compensação
dos honorários e despesas do processo entre as instituições financeiras
na razão de 20% (vinte por cento) à CEF e 80% (oitenta por cento) ao agente
financeiro contratante e credor hipotecário.
30 - Preliminar rejeitada. Apelações improvida e parcialmente provida e
recurso adesivo parcialmente provido.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL: CONTRATO. SISTEMA FINANCEIRO DA
HABITAÇÃO. FCVS. QUITAÇÃO. COBERTURA PELO FUNDO. TERMO DE
QUITAÇÃO. PROCURAÇÃO. PODERES ESPECÍFICOS. MULTA. PERDAS E
DANOS. UNIÃO. PRELIMINAR REJEITADA. RECURSOS DE APELAÇÃO IMPROVIDO E
PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO ADESIVO PARCIALMENTE PROVIDO.
1 - Quanto à alegação de carência da ação, ressalte-se que a ação se
deve à recusa de entrega do termo de quitação com base na ausência do
formulário de DECLARAÇÃO DE PROPRIEDADE DE OUTROS IMÓVEIS RESIDENCIAIS
E DE INEXISTÊNCIA DE OUTRAS RESPONSABILIDADES DO FCVS, para alcançar o
direito de cobertura do saldo devedor residual pelo Fundo, como se este
ainda não houvesse sido alcançado, o que, de fato, foi confirmado seu
alcance pela própria gestora do Fundo.
2 - No entanto, há que se reconhecer a legitimidade da Caixa Econômica
Federal - CEF para figurar no polo passivo da demanda proposta, uma vez que o
interesse da empresa pública federal restou evidenciado pelo comprometimento
do Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS, com informações
prestadas pela empresa pública federal de que o saldo devedor foi coberto
pelo Fundo, caso contrário não poderia ser baixado o ônus hipotecário.
3 - O agente financeiro contratante afirma que o tema central da demanda
é saber se a procuração outorgada pelos autores mutuários, designando
terceiros para representa-los perante o credor, conteria poderes suficientes
para que os mandatários viessem a firmar a "DECLARAÇÃO DE PROPRIEDADE DE
OUTROS IMÓVEIS RESIDENCIAIS E DE INEXISTÊNCIA DE OUTRAS RESPONSABILIDADES
DO FCVS".
4 - Em primeiro lugar, a procuração outorgada pelos autores aos seus
representantes é expressa ao conferir poderes para que emitam a declaração
exigida pela instituição financeira, em seus nomes; em segundo lugar,
não há qualquer impedimento legal, bem como a Circular do BACEN nº
1.866/1990, que regulamenta e prevê a exigência da declaração, não
mencionar qualquer obstáculo a tal manifestação de vontade realizada por
procuradores com poderes expressos, como é o caso dos autos, de sorte que,
não existindo norma que o impeça, o ato pode ser praticado por terceiros
nas condições aqui delimitadas.
5 - Cabe salientar que o instrumento confere poderes expressos para que
os procuradores possam emitir a declaração solicitada perante a credora
hipotecária do aludido imóvel, em nome dos antigos mutuários, alegando
e assinando o que preciso for e fazendo as declarações necessárias.
6 - Além do fato do agente financeiro não correr o risco de não ter a
possibilidade de ressarcir-se do saldo residual junto ao FCVS uma vez que
já homologado o direito de tal cobertura e quitação total do contrato.
7 - No que tange à hipótese, do credor hipotecário, de que a procuração
outorgada pelos mutuários seria o denominado 'contrato de gaveta', ou seja,
se fossemos considerar a procuração outorgada como contrato de gaveta
então não seria necessária a exigência de declaração assinada pelos
mutuários originários, uma vez que dispõe o artigo 2º da Lei nº 8.004
de 14/03/1990, com redação dada pela Lei nº 10.150/2000: "Nos contratos
que tenham cláusula de cobertura de eventual saldo devedor residual pelo
FCVS, a transferência dar-se-á mediante simples substituição do devedor,
mantidas para o novo mutuário as mesmas condições e obrigações do contrato
original, desde que se trate de financiamento destinado à casa própria,
observando-se os requisitos legais e regulamentares, inclusive quanto à
demonstração da capacidade de pagamento do cessionário em relação ao
valor do novo encargo mensal.".
8 - Com efeito, o hipotético contrato de gaveta firmado com os mutuários
originários, com saldo residual de responsabilidade do FCVS, foi assinado
originariamente em 24/09/79 e cedido em 20/06/80 aos seus representantes,
se enquadrando ao disposto no artigo acima transcrito, da Lei nº 8.004
de 14/03/1990 com redação dada pela Lei nº 10.250/2000, com vistas ao
reconhecimento do direito de cobertura do saldo devedor residual pelo FCVS.
9 - Saliente-se que a validade do afastamento do FCVS, em sendo matéria de
ordem pública, não está na livre disposição das partes, mas se opera com
amparo na Lei, estando fora da esfera de arbítrio dos agentes financeiros
disporem ou imporem sobre um encargo que não é seu, mas da União.
10 - Por outro lado, tal DECLARAÇÃO DE PROPRIEDADE DE OUTROS IMÓVEIS
RESIDENCIAIS E DE INEXISTÊNCIA DE OUTRAS RESPONSABILIDADES DO FCVS tem por
objetivo saber da existência de mais de um imóvel no mesmo município e
de outro saldo devedor.
11 - Mister apontar que o § 1º do artigo 9º da Lei 4.380/64, que determinava
a não possibilidade de aquisição de imóvel por financiamento, pelo SFH,
no caso da existência de mais de um imóvel na mesma localidade, nada dispõe
sobre restrições à cobertura de saldo devedor residual pelo FCVS, de modo
que não cabe impor ao mutuário a perda do direito de quitação da dívida,
pelo fundo, por tal motivo.
12 - Observe-se que a restrição de cobertura pelo FCVS de apenas um saldo
devedor remanescente ao final do contrato, imposta pelo § 1º do artigo 3º
da Lei nº 8100, de 05/11/90, aplica-se aos contratos firmados a partir de
sua vigência, não retroagindo para alcançar contratos anteriores.
13 - Destaca-se que a Lei nº 10.150/2000, que alterou o artigo 3º da lei
acima citada, ressalta a possibilidade de quitação, pelo FCVS, de mais
de um saldo devedor remanescente por mutuário, relativos aos contratos
anteriores a 05/12/1990.
14 - A jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça é uniforme
no sentido de que o artigo 9º, §1º, da Lei nº 4.380/64 não afasta a
quitação de um segundo imóvel financiado pelo mutuário, situado na mesma
localidade, utilizando os recursos do FCVS (REsp 1.133.769/RN submetido à
sistemática dos recursos repetitivos, nos termos do artigo 543-C do CPC/73).
15 - Conforme o exposto, tendo sido o contrato já quitado, há mais de 16
(dezesseis anos), tanto as prestações pactuadas e pagas pelos mutuários
contratantes, quanto o saldo devedor residual coberto pelo FCVS, não caberia
ao agente financeiro se recusar a fornecer a declaração de quitação
aos mesmos, e muito menos sob o fundamento de ausência do formulário de
DECLARAÇÃO DE PROPRIEDADE DE OUTROS IMÓVEIS RESIDENCIAIS E DE INEXISTÊNCIA
DE OUTRAS RESPONSABILIDADES DO FCVS, tendo sido entregue pelos representantes
dos mutuários originários para tanto, ou, caso se trate ou se tratasse de
contrato de gaveta, sua não necessidade, e/ou, por se tratar de um contrato
firmado antes de 05/11/1990, a possibilidade de existência de mais de um
imóvel com cobertura do FCVS.
16 - Ressalte-se que o agente financeiro aceitou o recebimento das prestações
durante todo o período contratual, encerrado, por decurso de prazo, em
23/09/1998, detectada, então, a inexistência de outro imóvel financiado
no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação na mesma localidade,
através da pesquisa pelo CADMUT, sendo habilitado o contrato ao FCVS em
30/10/1998 e homologado em 27/10/2000 com a COBERTURA INTEGRAL do contrato
pelo Fundo, ou seja, a instituição financeira credora recebeu a quitação
total do financiamento e persiste desde 27/10/2000, quando já homologada a
cobertura pelo Fundo, à recusa em fornecer aos mutuários, através de seus
representantes, o documento de Quitação do Contrato, com base num obstáculo
criado pela própria instituição financeira, uma vez que a Declaração que
exige, além de desnecessária, pois já foi comprovado seu conteúdo pelo
CADMUT, não se trata de documento personalíssimo, como exigido pelo credor
hipotecário, nem há norma que impeça que a declaração possa ser feita
por terceiros, como foi, uma vez que a Circular do BACEN nº 1.866/1990, que
regulamenta e prevê a exigência de tal declaração, não à delimita como
o credor hipotecário faz, sem razão e necessidade, sendo que a procuração
outorgada confere poderes expressos para que os procuradores possam emitir
a declaração solicitada em nome dos mutuários apelantes.
17 - Quanto à alegação de que, 'ainda que seja reconhecida válida
a assinatura por meio de mandatário, o apelante corre o risco de não
ter a possibilidade de ressarcir-se do saldo residual junto ao FCVS por
incompletude da documentação necessária prevista na Circular BACEN nºs
8.004/90 e 8.100/90', como é possível se não só já foi habilitado o
contrato ao FCVS, em 30/10/1998, como também homologada, em 27/10/2000, a
COBERTURA INTEGRAL do mesmo pelo Fundo, ou seja, a instituição financeira
credora apelante recebeu a quitação total do financiamento?
18 - Enfim, apesar do acima exposto, decorreram 16 (dezesseis) anos, se
considerada a homologação de cobertura do contrato pelo Fundo (27/02/2000)
e a data de conclusão dos autos a esta e. Corte (22/06/2016), de recusa
do credor hipotecário em fornecer aos mutuários, através de seus
representantes, o documento de Quitação do Contrato.
19 - Note-se que todas as prestações pagas pelo mutuário foram acrescidas
de parcela destinada ao fundo, não havendo como admitir que a instituição
financeira determine a perda do direito à quitação do saldo devedor pelo
fundo, como sanção frente ao não cumprimento de cláusula contratual outra,
aplicação esta não prevista tanto na norma acima citada como no contrato
firmado.
20 - Nesse passo, é descabido reputar válido o contrato naquilo que o agente
financeiro e o fundo aproveitam, ou seja, o recebimento das prestações e
das parcelas destinadas ao FCVS, respectivamente, e inválido naquilo que
em hipótese lhe prejudica, ou seja, a cobertura do saldo devedor residual
pelo FCVS, impondo aos mutuários a perda do direito de quitação da dívida.
21 - Enfim, conforme informações nos autos, os mutuários efetuaram
o pagamento de todas as parcelas do financiamento contratado, ou seja,
cumpriram com suas obrigações por todo o período estipulado para
quitação da dívida, e todo o saldo devedor residual foi coberto pelo
Fundo de Compensação de Variação Salarial - FCVS, quitando totalmente
o contrato de financiamento em debate.
22 - Diante de tal quadro, revela-se perfeitamente aplicável ao caso concreto
o reconhecimento do direito dos mutuários à quitação do financiamento
contratado, bem como a respectiva baixa da hipoteca incidente sobre o
imóvel em questão, após o pagamento das prestações avençadas e das
contribuições ao fundo e, através deste, a cobertura do saldo residual.
23 - O artigo 461, § 5º, do Código de Processo Civil, é claro a respeito
da possibilidade de imposição de multa diária pelo Magistrado, seja de
ofício, ou a requerimento da parte.
24 - Com relação ao valor a ser fixado, convém esclarecer que a aplicação
de multa diária alinha-se ao espírito que tem norteado as recentes
reformas processuais, as quais visam conciliar a efetividade do processo
com a segurança jurídica, cuidando para que o provimento não seja inócuo.
25 - Verifica-se que a multa diária, arbitrada no caso de descumprimento
da obrigação (a entrega dos documentos para quitação), conforme o
entendimento desta E. Décima Primeira Turma, é no sentido de que não
ultrapasse os R$ 300,00 (trezentos reais), a contar 30 (trinta) dias,
na execução, considerando-se o início da contagem do prazo a partir do
trânsito em julgado da ação.
26 - Quanto à indenização por perdas e danos, a parte autora nada trouxe
aos autos ou fez prova dos gastos ou prejuízo para tanto, não havendo
qualquer referência ou fundamentação jurídica à tal pedido.
27 - Tendo em vista a sucumbência mínima dos autores e dos fatos analisados,
merece reparo a r. sentença no que tange à proporcionalidade na condenação
da empresa gestora do FCVS ao pagamento de honorários advocatícios aos
patronos dos mutuários uma vez que não foi ela quem deu causa ao ingresso
dos mesmos na presente ação, sendo a instituição financeira contratante
e credora hipotecária a parte responsável e interessada direta ao seu
ingresso e no respectivo resultado negativo.
28 - No que diz respeito à condenação da CEF ao pagamento dos honorários
advocatícios, relevante considerar que, embora a presente tenha o propósito
de discutir o direito de entrega do documento de quitação do contrato,
que deveria ter sido reconhecido pela instituição financeira contratante,
é objeto, ainda que indireto, da demanda a cobertura em si, já realizada,
do saldo devedor pelo Fundo de Compensação das Variações Salariais, o
que, de certa forma, faria forçoso concluir no sentido da existência de
responsabilidade exclusiva do agente financeiro e não da CEF, gestora do
FCVS; observa-se, no entanto, que, em sede de contestação, a CEF, apesar
de ter juntado prontamente documentos comprovando os fatos necessários e
requeridos pelo agente financeiro, ofereceu resistência. Destarte, havendo
oposição à pretensão deduzida em juízo, resta razoável a condenação
da empresa pública federal ao pagamento dos honorários advocatícios e do
gravame sucumbencial.
29 - Tendo em vista o acima exposto, é mantida, em parte, a r. sentença
recorrida, no que tange à condenação ao pagamento das custas e despesas
processuais, assim como dos honorários advocatícios, pelo quantum fixado,
com supedâneo no artigo 20, §3º, "a", "b", e "c", e §4º do Código
de Processo Civil, uma vez que os mutuários decaíram de parte mínima do
pedido, impondo, no entanto, a proporcional distribuição e compensação
dos honorários e despesas do processo entre as instituições financeiras
na razão de 20% (vinte por cento) à CEF e 80% (oitenta por cento) ao agente
financeiro contratante e credor hipotecário.
30 - Preliminar rejeitada. Apelações improvida e parcialmente provida e
recurso adesivo parcialmente provido.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida pela Caixa Econômica Federal
- CEF e, no mérito, negar provimento ao recurso de apelação do Banco
Nossa Caixa S/A e dar parcial provimento aos recursos de apelação da CEF
e adesivo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
14/03/2017
Data da Publicação
:
28/03/2017
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1718680
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/03/2017
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