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Jurisprudência


TRF3 0005252-84.2016.4.03.6181 00052528420164036181

Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO. ESTADO DE NECESSIDADE. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA FIXADA EM 1/6. INCIDÊNCIA DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI 11.343/2006. CAUSA DE AUMENTO DECORRENTE DA TRANSNACIONALIDADE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. DELAÇÃO PREMIADA. SUBSTITUIÇÃO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. 1. Do tráfico de entorpecentes. 2. A materialidade restou comprovada nos autos. 3. Da autoria e dolo de Crislaine Teixeira de Oliveira. A versão dos fatos apresentada pela ré em seu depoimento não é crível. Ela foi presa em flagrante, postando drogas para o exterior em uma agência dos Correios. Ainda que não soubesse que dentro dos frascos de shampoos havia drogas, no mínimo, a apelante agiu com dolo eventual, aceitando postar encomenda ao exterior, para um terceiro que conhecia há pouco tempo e cujas atividades profissionais ela não sabia ao certo. Apesar de ser plausível a versão de que a ré tinha como única vantagem ficar com o "troco" da postagem nos correios, o tipo penal em tela pode ser praticado "ainda que gratuitamente". 4. Para fazer jus à escusa do estado de necessidade, é imprescindível que o agente se encontre diante de uma "situação de perigo atual", que tenha gerado a "inevitabilidade da conduta lesiva". E no presente caso, além de tais requisitos não estarem comprovados, é certo que existem inúmeros caminhos lícitos de suprir ou amenizar problemas financeiros, sem necessitar partir para a criminalidade. Contudo, a ré optou pela saída cômoda, preferindo auferir proventos de maneira fácil, adentrando no repugnante mundo do crime, cometendo tráfico internacional de entorpecentes. 5. Da autoria e dolo de Charles Ejike Uzoeto (Bruno). Sua versão é inverossímil. O que se extrai dos autos é que o réu transferiu à corré a responsabilidade de postar a referida droga nos correios, em troca de lhe pagar o "troco". 6. Da autoria e dolo de Giselli Aparecida Teixeira de Oliveira. Não há provas nos autos quanto à participação da ré nos fatos ocorridos no dia 03/05/2016. Não é possível é utilizar, ao arrepio do artigo 155, durante o interrogatório judicial, um inquérito policial em andamento, ainda sem qualquer conclusão, que não estava juntado aos autos até aquele momento e que nada tem a ver com a denúncia narrada, realizar perguntas à ré com base no mesmo e, ainda, utilizá-lo como fundamento na sentença para condenar a ré. Ao contrário do que consta na sentença apelada, a testemunha Adriana de Oliveira Silva, funcionária dos Correios que chamou a Polícia por ocasião da postagem por parte da corré Crislaine, disse não poder reconhecer Giselli como autora de outras postagens naquela agência. No apenso relativo ao seu pedido de liberdade provisória ou de prisão domiciliar, consta declaração da escola onde a ré afirmou trabalhar, de que ela esteve naquele local trabalhando, entre 07h e 17h do dia dos fatos, o que confirma a sua versão. 7. Do delito de associação para o tráfico. No caso em tela, não há nada nos autos a demonstrar cabalmente a estabilidade e a permanência da reunião dos acusados para o fim da prática de crimes futuros, o que afasta a configuração do crime de associação para o tráfico. 8. Dosimetria da pena de Charles Ejike Uzoeto. 9. Primeira fase. Trata-se de réu primário, que não ostenta maus antecedentes, bem como as demais circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não lhe são desfavoráveis e, considerando o entendimento fixado pela 11ª Turma desta Corte, assim como a quantidade da droga apreendida, 368,8 gramas de cocaína, além da ausência de apelação da acusação, a pena-base deve ser mantida em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. 10. Na segunda fase da dosimetria, o magistrado sentenciante não considerou qualquer agravante ou atenuante, as quais, de fato, não há. Pena mantida nesta fase intermediária em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. 11. Terceira fase da dosimetria. Mantida a majoração da pena em decorrência da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06 (transnacionalidade do delito), no percentual mínimo de 1/6 (um sexto). Inaplicável a causa de diminuição prevista no artigo 33, §4º, da Lei n.º 11.343/06, que prevê a redução de 1/6 a 2/3 para o agente que seja primário, possua bons antecedentes e não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa. Tratando-se de requisitos que devem ser preenchidos cumulativamente, ausente um deles, deve ser afastada a causa de diminuição. No caso, pelo modo de operação, resta claro que o réu tem papel de relevo junto a uma organização criminosa, bem como se dedica a atividades criminosas, ao subcontratar terceiro para enviar drogas ao exterior. Pena definitiva fixada em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos. 12. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, na medida em que a pena definitiva supera quatro anos de reclusão e, portanto, não preenche os requisitos do art. 44 do Código penal. 13. Fixado o regime inicial semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º, b, do Código Penal, mesmo considerando-se o disposto no § 2º do art. 387 do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei n.º 12.736/2012. 14. Dosimetria da pena de Crislaine Teixeira de Oliveira. 15. Primeira fase. Trata-se de ré primária, que não ostenta maus antecedentes, bem como as demais circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não lhe são desfavoráveis e, considerando o entendimento fixado pela 11ª Turma desta Corte, assim como a quantidade da droga apreendida, 368,8 gramas de cocaína, além da ausência de apelação da acusação, a pena-base deve ser mantida em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. 16. Na segunda fase da dosimetria, o magistrado sentenciante não considerou qualquer agravante ou atenuante, as quais, de fato, não há. Pena mantida nesta fase intermediária em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. 17. Terceira fase da dosimetria. Mantida a majoração da pena em decorrência da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06 (transnacionalidade do delito), no percentual mínimo de 1/6 (um sexto). Trata-se de apelante primária, que não ostenta maus antecedentes, conforme comprovam os documentos acostados aos autos, bem como considerando que não há prova nos autos de que se dedica a atividades criminosas, nem elementos para concluir que integra organização criminosa, apesar de encarregado do transporte da droga. Portanto, a ré faz jus à aplicação da causa de diminuição do § 4º do artigo 33 da Lei 11.342/2006, entretanto, no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), pois se associou, de maneira eventual e esporádica, a uma organização criminosa de tráfico internacional de drogas, cumprindo papel de importância para o êxito da citada organização. 18. O benefício da delação premiada está previsto na Lei nº 11.343/2006 e objetiva estimular o fornecimento de informações acerca da existência de organização criminosa ou revelação dos demais integrantes de uma quadrilha, grupo ou bando, permitindo a prisão de um ou mais de seus integrantes, propiciando ao "delator" a redução da pena. No caso concreto é possível extrair dos autos que a acusada CRISLAINE TEIXEIRA DE OLIVEIRA forneceu, por iniciativa própria e voluntariamente, as informações que dispunha sobre os fatos, aos investigadores da Polícia Civil que efetuaram a prisão de CHARLES EJIKE UZOETO. Em decorrência da efetividade das informações fornecidas, a causa de diminuição da delação premiada presente no artigo 41 da Lei 11.343/06 deve ser aplicada em seu patamar mínimo de 1/3 (um terço), resultando em uma pena definitiva para a ré CRISLAINE TEIXEIRA DE OLIVEIRA, de 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 323 (trezentos e vinte e três) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos. 19. Trata-se de ré primária, que não ostenta maus antecedentes. A pena-base foi fixada no mínimo legal, o que favorece seja fixado o regime inicial aberto, com fundamento no art. 33, § 2º, c, do Código Penal. 20. Presentes os requisitos previstos no artigo 44, § 2º, do Código Penal, substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) penas restritivas de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade e proibição de frequentar determinados lugares, pois inoportuna a substituição da reprimenda segregacional por prestação pecuniária quando a condenada, desempregada, é desprovida de condição financeira para arcar com tal obrigação, ainda mais quando já lhe foi imposta pena de multa. 21. Quanto à reparação de danos, prevista pelo art. 387, IV, do Código de Processo Penal e fixada pelo Juízo "a quo" em R$ 10.000,00 (dez mil reais), de rigor o seu afastamento em razão de ter sido proferida sem que tenha havido qualquer pedido nesse sentido pelo Ministério Público Federal. 22. Exauridos os recursos nesta Corte e interpostos recursos dirigidos às Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), expeça-se Carta de Sentença, bem como comunique-se ao Juízo de Origem para o início da execução da pena imposta à ré, sendo dispensadas tais providências em caso de trânsito em julgado, hipótese em que terá início a execução definitiva da pena. 23. Expeça-se alvará de soltura clausulado em favor de GISELLI APARECIDA TEIXEIRA DE OLIVEIRA e de CRISLAINE TEIXEIRA DE OLIVEIRA, observando-se quanto a esta última a necessidade do comparecimento ao Juízo das Execuções Criminais, para início do cumprimento das penas restritivas de direitos. 24. Apelação da ré GISELLI APARECIDA TEIXEIRA DE OLIVEIRA provida. Apelações das defesas dos réus CRISLAINE TEIXEIRA DE OLIVEIRA e CHARLES EJIKE UZOETO parcialmente providas.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em dar provimento à apelação da defesa de GISELLI APARECIDA TEIXEIRA DE OLIVEIRA, para, com fundamento no artigo 386, VII do CPP, absolvê-la da prática dos delitos tipificados no art. 33, caput, e 35, caput, c/c art. 40, I, todos da Lei 11.343/06, bem como afastar a reparação de danos, prevista pelo art. 387, IV, do Código de Processo Penal; dar parcial provimento à apelação de CRISLAINE TEIXEIRA DE OLIVEIRA, para fazer incidir a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, na fração de 1/6 e a causa de diminuição presente no artigo 41 da Lei 11.343/06, em 1/3 (um terço) e afastar a reparação de danos, prevista pelo art. 387, IV, do Código de Processo Penal e, de ofício, com fundamento no artigo 386, VII do CPP, absolvê-la da prática do delito tipificado no art. 35, caput, c/c art. 40, I, da Lei 11.343/06, resultando em uma pena definitiva de 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, no regime prisional aberto, e 323 (trezentos e vinte e três) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos, substituída por 2 (duas) penas restritivas de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade e proibição de frequentar determinados lugares, a serem definidos pelos Juízo das Execuções Penais; dar parcial provimento à apelação de CHARLES EJIKE UZOETO, para com fundamento no artigo 386, VII do CPP, absolvê-lo da prática do delito tipificado no art. 35, caput, c/c art. 40, I, da Lei 11.343/06 e afastar a reparação de danos, prevista pelo art. 387, IV, do Código de Processo Penal, resultando em uma pena definitiva de em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, no regime prisional semiaberto e pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 27/06/2017
Data da Publicação : 07/07/2017
Classe/Assunto : Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 69956
Órgão Julgador : DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** LDR-06 LEI DE DROGAS LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-33 PAR-4 ART-40 INC-1 ART-41 ART-35 ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-33 PAR-2 LET-B LET-C ART-44 PAR-2 ART-59 ***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-387 PAR-2 LEG-FED LEI-12736 ANO-2012
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/07/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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