TRF3 0005530-90.2014.4.03.6105 00055309020144036105
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. UNIÃO FEDERAL. ANISTIA. LEGITIMIDADE
ATIVA. SENTENÇA. FUNDAMENTAÇÃO. ADCT. IMPRESCRITIBILIDADE. DANOS
MORAIS. CARÁTER DÚPLICE. INOCORRENTE. INDENIZAÇÃO. JUROS
MORATÓRIOS. MONTANTE ARBITRADO.
1. A presente Ação foi ajuizada em 23.05.2014 por Ivanice da Silva
Denobile (fls. 2), cônjuge supérstite de José Luiz Denobile, funcionário
da PETROBRAS junto à REPLAN, demitido em 12.07.1983 por fazer parte de
movimento paredista, sendo readmitido em 30.05.1985 (fls. 16 a 23) e falecido
em 05.06.2009 (fls. 19).
2. Não se sustenta a alegação de nulidade da sentença em razão
de ausência de fundamentação. Todas as questões foram devidamente
abordadas, não se restringindo o MM Juízo a quo a basear seu entendimento
em jurisprudência, nem carecendo a última de pertinência.
3. Não há que se falar em ilegitimidade ativa em relação à
autora. Encontra-se consolidada a jurisprudência no sentido de que os
sucessores são legitimados para propor ação de indenização por danos
morais, na qualidade de herdeiros, sendo mesmo desnecessária a demonstração
da dependência econômica da vítima - acrescente-se que, tratando-se de
direito patrimonial, não personalíssimo, a regra é a transmissibilidade,
nos termos do art. 943 do Código Civil de 2002 - equivalente ao art. 1.526
do Código Civil de 1916. Precedentes.
4. Imprescritíveis as ações de reparação de danos decorrentes de
perseguição política durante o regime da ditadura militar, não havendo
que se falar no prazo prescricional quinquenal previsto pelo art. 1º do
Decreto 20.910/32, bem como o entendimento de que o advento da Lei 10.559/02
implicou renúncia tácita à prescrição. Precedentes.
5. A responsabilidade objetiva do Estado está estampada no artigo 37, §6º
da Constituição Federal e, na forma do texto constitucional, o Estado e
a pessoa jurídica de direito privado prestadora do serviço respondem a
terceiros pelo dano causado, independente de dolo ou culpa.
6. O autor foi participante de movimento grevista deflagrado em 1983 na
Petrobras, vindo a ser demitido em represália na data de 12.07.1983; em
30.05.1985 procedeu-se à sua readmissão. A responsabilidade objetiva do
Estado restou caracterizada por meio de decisão proferida em 26.11.2008
pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça (fls. 16), ratificando
a declaração de anistiado político em relação ao de cujus, José Luiz
Denobile. Ademais, restou comprovado o caráter público da indevida sanção
de demissão aplicada ao autor (fls. 21 a 23).
7. Havia entendimento de que a indenização prevista pela Lei 10.559/02
englobava tanto valores relativos a danos materiais quanto morais,
portanto possuindo dúplice caráter indenizatório, uma vez que tanto
o texto constitucional transitório quanto da lei específica utiliza
apenas a expressão "reparação econômica de caráter indenizatório",
sem maiores especificações. Ato contínuo, entendia-se que, à hipótese,
a proposição de demanda com o intuito de obtenção de indenização por
danos morais não seria admissível, sob pena de infração do princípio
do bis in idem - nesse sentido, o Acórdão proferido no âmbito do REsp
1.323.405/DF, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima (DJe 01.04.2013)
- inclusive em razão disposto pelo art. 16 da mencionada Lei. No entanto,
recentemente houve modificação do entendimento: em sentido diverso, a
reparação econômica não possuiria caráter dúplice, mas tão somente
material, não constituindo óbice sua acumulação com indenização por
dano moral; assim, ainda que possuindo causa comum, diversos seriam seus
fundamentos e finalidades, ou seja, recomposição patrimonial de um lado e
reparação por ofensa aos direitos da personalidade, por outro. Precedentes.
8. Quanto ao valor da indenização, entendo ser razoável o montante de
R$100.000,00, valor que de fato é amiúde arbitrado nesta Corte. Precedentes.
9. Quanto à atualização monetária, o e. Superior Tribunal de Justiça
editou a Súmula 362/STJ: "A correção monetária do valor da indenização
do dano moral incide desde a data do arbitramento." Os juros moratórios
incidem a partir do evento danoso, a teor da Súmula 54/STJ.
10. No tocante aos juros moratórios e atualização monetária em
específico, considerando que ainda não houve pronunciamento expresso
do Egrégio Supremo Tribunal Federal quanto à constitucionalidade ou
não do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº
11.960/09, entendo pela aplicação dos critérios insculpidos no Manual de
Orientação para os Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião do
julgado - especificamente, a Resolução 134/2010-CJF, com as modificações
introduzidas pela Resolução 267/2013-CJF, ou seja, "correção monetária,
a partir de janeiro de 2001, deverá ser utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15
/ IBGE). (...) [quanto aos juros] a partir de maio/2012 incide o mesmo
percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, capitalizados
de forma simples (Art. 1º.-F da Lei n. 9.494, de 10 de setembro de 1997,
com a redação dada pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, combinado
com a Lei n. 8.177, de 1º de março de 1991, com alterações da MP n. 567,
de 03 de maio de 2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012,
correspondentes a 0,5% ao mês, caso a taxa SELIC ao ano seja superior a 8,5%;
70% da taxa SELIC ao ano, mensalizada, nos demais casos". Desse modo, assiste
parcial razão à União Federal quanto aos juros moratórios, incidente o
art. 1º-F da Lei n. 9.494, de 10 de setembro de 1997, com a redação dada
pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, combinado com a Lei n. 8.177,
de 1º de março de 1991, com alterações da MP n. 567, de 03 de maio de
2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012).
11. A fixação de indenização por dano moral em valor inferior ao requerido
não configura procedência parcial do pedido, conforme Súmula 326/STJ.
12. Apelo da parte autora provido.
13. Apelo da União Federal parcialmente provido.
Ementa
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. UNIÃO FEDERAL. ANISTIA. LEGITIMIDADE
ATIVA. SENTENÇA. FUNDAMENTAÇÃO. ADCT. IMPRESCRITIBILIDADE. DANOS
MORAIS. CARÁTER DÚPLICE. INOCORRENTE. INDENIZAÇÃO. JUROS
MORATÓRIOS. MONTANTE ARBITRADO.
1. A presente Ação foi ajuizada em 23.05.2014 por Ivanice da Silva
Denobile (fls. 2), cônjuge supérstite de José Luiz Denobile, funcionário
da PETROBRAS junto à REPLAN, demitido em 12.07.1983 por fazer parte de
movimento paredista, sendo readmitido em 30.05.1985 (fls. 16 a 23) e falecido
em 05.06.2009 (fls. 19).
2. Não se sustenta a alegação de nulidade da sentença em razão
de ausência de fundamentação. Todas as questões foram devidamente
abordadas, não se restringindo o MM Juízo a quo a basear seu entendimento
em jurisprudência, nem carecendo a última de pertinência.
3. Não há que se falar em ilegitimidade ativa em relação à
autora. Encontra-se consolidada a jurisprudência no sentido de que os
sucessores são legitimados para propor ação de indenização por danos
morais, na qualidade de herdeiros, sendo mesmo desnecessária a demonstração
da dependência econômica da vítima - acrescente-se que, tratando-se de
direito patrimonial, não personalíssimo, a regra é a transmissibilidade,
nos termos do art. 943 do Código Civil de 2002 - equivalente ao art. 1.526
do Código Civil de 1916. Precedentes.
4. Imprescritíveis as ações de reparação de danos decorrentes de
perseguição política durante o regime da ditadura militar, não havendo
que se falar no prazo prescricional quinquenal previsto pelo art. 1º do
Decreto 20.910/32, bem como o entendimento de que o advento da Lei 10.559/02
implicou renúncia tácita à prescrição. Precedentes.
5. A responsabilidade objetiva do Estado está estampada no artigo 37, §6º
da Constituição Federal e, na forma do texto constitucional, o Estado e
a pessoa jurídica de direito privado prestadora do serviço respondem a
terceiros pelo dano causado, independente de dolo ou culpa.
6. O autor foi participante de movimento grevista deflagrado em 1983 na
Petrobras, vindo a ser demitido em represália na data de 12.07.1983; em
30.05.1985 procedeu-se à sua readmissão. A responsabilidade objetiva do
Estado restou caracterizada por meio de decisão proferida em 26.11.2008
pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça (fls. 16), ratificando
a declaração de anistiado político em relação ao de cujus, José Luiz
Denobile. Ademais, restou comprovado o caráter público da indevida sanção
de demissão aplicada ao autor (fls. 21 a 23).
7. Havia entendimento de que a indenização prevista pela Lei 10.559/02
englobava tanto valores relativos a danos materiais quanto morais,
portanto possuindo dúplice caráter indenizatório, uma vez que tanto
o texto constitucional transitório quanto da lei específica utiliza
apenas a expressão "reparação econômica de caráter indenizatório",
sem maiores especificações. Ato contínuo, entendia-se que, à hipótese,
a proposição de demanda com o intuito de obtenção de indenização por
danos morais não seria admissível, sob pena de infração do princípio
do bis in idem - nesse sentido, o Acórdão proferido no âmbito do REsp
1.323.405/DF, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima (DJe 01.04.2013)
- inclusive em razão disposto pelo art. 16 da mencionada Lei. No entanto,
recentemente houve modificação do entendimento: em sentido diverso, a
reparação econômica não possuiria caráter dúplice, mas tão somente
material, não constituindo óbice sua acumulação com indenização por
dano moral; assim, ainda que possuindo causa comum, diversos seriam seus
fundamentos e finalidades, ou seja, recomposição patrimonial de um lado e
reparação por ofensa aos direitos da personalidade, por outro. Precedentes.
8. Quanto ao valor da indenização, entendo ser razoável o montante de
R$100.000,00, valor que de fato é amiúde arbitrado nesta Corte. Precedentes.
9. Quanto à atualização monetária, o e. Superior Tribunal de Justiça
editou a Súmula 362/STJ: "A correção monetária do valor da indenização
do dano moral incide desde a data do arbitramento." Os juros moratórios
incidem a partir do evento danoso, a teor da Súmula 54/STJ.
10. No tocante aos juros moratórios e atualização monetária em
específico, considerando que ainda não houve pronunciamento expresso
do Egrégio Supremo Tribunal Federal quanto à constitucionalidade ou
não do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº
11.960/09, entendo pela aplicação dos critérios insculpidos no Manual de
Orientação para os Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião do
julgado - especificamente, a Resolução 134/2010-CJF, com as modificações
introduzidas pela Resolução 267/2013-CJF, ou seja, "correção monetária,
a partir de janeiro de 2001, deverá ser utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15
/ IBGE). (...) [quanto aos juros] a partir de maio/2012 incide o mesmo
percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, capitalizados
de forma simples (Art. 1º.-F da Lei n. 9.494, de 10 de setembro de 1997,
com a redação dada pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, combinado
com a Lei n. 8.177, de 1º de março de 1991, com alterações da MP n. 567,
de 03 de maio de 2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012,
correspondentes a 0,5% ao mês, caso a taxa SELIC ao ano seja superior a 8,5%;
70% da taxa SELIC ao ano, mensalizada, nos demais casos". Desse modo, assiste
parcial razão à União Federal quanto aos juros moratórios, incidente o
art. 1º-F da Lei n. 9.494, de 10 de setembro de 1997, com a redação dada
pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, combinado com a Lei n. 8.177,
de 1º de março de 1991, com alterações da MP n. 567, de 03 de maio de
2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012).
11. A fixação de indenização por dano moral em valor inferior ao requerido
não configura procedência parcial do pedido, conforme Súmula 326/STJ.
12. Apelo da parte autora provido.
13. Apelo da União Federal parcialmente provido.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar parcial provimento à apelação da União Federal, nos termos
do voto do Des. Fed. Marcelo Saraiva (Relator). E, por maioria, deu provimento
à apelação da parte autora, nos termos do voto do Des. Fed. Marcelo
Saraiva (Relator), com quem votaram o Juiz Fed. Conv. Ferreira da Rocha e a
Des. Fed. Mônica Nobre. Vencidos a Des. Fed. Marli Ferreira e, convocado na
forma dos artigos 53 e 260, §1.º do RITRF3, o Juiz Fed. Conv. Paulo Sarno,
que negavam provimento à apelação da autora.
Data do Julgamento
:
07/02/2018
Data da Publicação
:
16/04/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2248806
Órgão Julgador
:
QUARTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO SARAIVA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Referência
legislativa
:
***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002
LEG-FED LEI-10406 ANO-2002 ART-943
***** CC-16 CÓDIGO CIVIL DE 1916
LEG-FED LEI-3071 ANO-1916 ART-1526
LEG-FED DEC-20910 ANO-1932 ART-1
LEG-FED LEI-10559 ANO-2002 ART-16
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-37 PAR-6
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-362
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-54
LEG-FED LEI-9494 ANO-1997 ART-1F
LEG-FED LEI-11960 ANO-2009
***** MCR-10 MANUAL DE ORIENTAÇÃO DE PROCEDIMENTOS PARA OS CÁLCULOS NA JF
LEG-FED RCJF-134 ANO-2010
***** MCR-13 MANUAL DE ORIENTAÇÃO DE PROCEDIMENTOS PARA OS CÁLCULOS NA JF
LEG-FED RCJF-267 ANO-2013
LEG-FED LEI-8177 ANO-1991
LEG-FED MPR-567 ANO-2012
LEG-FED LEI-12703 ANO-2012
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-326
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/04/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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