TRF3 0005688-35.2016.4.03.9999 00056883520164039999
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. DECISÃO
MONOCRÁTICA. ARTIGO 1.021 DO NOVO CPC. ASSISTÊNCIA SOCIAL. CONCEITO DE PESSOA
COM DEFICIÊNCIA. INTEGRAÇÃO SOCIAL. CRIANÇA E ADOLESCENTE. INCAPACIDADE
PARA O TRABALHO. IMPACTO NA ECONOMIA FAMILIAR. PROIBIÇÃO
CONSTITUCIONAL. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. LEI 11.470/2011. PRINCÍPIOS.
SELETIVIDADE. DISTRIBUTIVIDADE. CONTRAPARTIDA. CONVENÇÃO. REGULAMENTO. DEVER
DE PRESTAR ALIMENTOS. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO.
- Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do
benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 20 da
Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e
7.617/2011.
- Essa lei deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição
Federal, ao estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão
do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de
deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar a miserabilidade
ou a hipossuficiência, ou seja, não possuir meios de prover a própria
manutenção nem de tê-la provida por sua família.
- Até o advento da Lei n. 12.470/2011, que deu nova redação ao artigo 2º,
§ 2º, da LOAS, só se concebia a concessão do benefício assistencial
à pessoa com deficiência que não pudesse trabalhar. Somente com a
alteração legislativa infraconstitucional que se dispensou a referência
à impossibilidade de trabalhar.
- Serve a Seguridade Social a fornecer proteção social àqueles que não
podem trabalhar, por alguma contingência ou algum risco social, à vista
do disposto no artigo 193 do Texto Magno, que prevê o princípio do primado
do trabalho.
- Eis a redação do artigo 7º, XXXIII, da Constituição Federal, dada pela
Emenda Constitucional nº 20/1998: "XXXIII - proibição de trabalho noturno,
perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de
dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;"
- O legislador, pelas Leis nº 12.470/2011 e 13.146/2015, dispensou a
exigência da incapacidade para o trabalho e para a vida independente. O foco,
doravante, para fins de identificação da pessoa com deficiência, passa
a ser a existência de impedimentos de longo prazo, apenas e tão somente.
- Digno de nota é o artigo 4º, § 1o , do Decreto nº 6214/2007: "Para
fins de reconhecimento do direito ao Benefício de Prestação Continuada
às crianças e adolescentes menores de dezesseis anos de idade, deve ser
avaliada a existência da deficiência e o seu impacto na limitação do
desempenho de atividade e restrição da participação social, compatível
com a idade." (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011). Mas é
preciso consignar que não cabe ao Poder Executivo, por meio de decretos,
interpretar as normas constitucionais e legislação federal ordinária,
sob pena de se torna ilegal, porque regulamento autônomo. Consequentemente,
a solução da controvérsia prescinde do apelo às regras regulamentares.
- Outrossim, deverá ser levado em linha de conta o impacto na economia
familiar do menor, por exigir a dedicação de um dos membros do grupo para
seus cuidados, prejudicando a capacidade daquele grupo familiar de gerar
renda.
- No caso vertente, a parte autora, nascida em 28/01/1994, requereu o
benefício de amparo social por ser deficiente. E a deficiência vem comprovada
no laudo médico pericial (f. 145/147), que revela ter o autor retardo mental
grave, desde o nascimento, com alteração comportamental (F72.1).
- Quanto à hipossuficiência econômica, o estudo social (f. 127/130) revela
que a parte autora reside com o pai, um irmão maior e a avó, sobrevivendo
naquela época da aposentadoria da avó, no valor de um salário mínimo,
além da ajuda de terceiros. Concluiu a assistente social que o autor vive
em situação de vulnerabilidade social.
- Entretanto, nos termos do artigo 20, § 3º, da LOAS, o requisito da
miserabilidade não está comprovado durante todo o tempo de tramitação deste
feito. Ocorre que o estudo social foi realizado em 19/8/2011, de modo que não
se sabe a situação econômica do autor no período posterior. Infelizmente
a morosidade judicial causa graves danos às partes, inclusive em matéria
probatória.
- E considerando que o pai do autor voltou a contribuir para a previdência
social em 11/2013, mantendo as contribuições até a presente data;
e considerando a idade laborativa do irmão, lícito é inferir que não
há mais falar-se em hipossuficiência a partir de 11/2013 (vide CNIS),
devendo o termo final dar-se em 31/10/2013.
- Importa ainda registrar que a genitora do autor, que vive em São Paulo, tem
dever de prestar alimentos. A propósito, a Turma Nacional de Uniformização
dos Juizados Especiais Federais (TNU), ao analisar um pedido de uniformização
do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), fixou a tese que "o
benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se
ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis
sem prejuízo de sua manutenção". A decisão aconteceu durante sessão
realizada em 23/02/2017, em Brasília (autos nº 0517397-48.2012.4.05.8300).
- A DIB não poderia ser fixada antes de 31/8/2011, quando entrou em vigor
a Lei nº 12.470 (vide supra), mas como o autor atingiu 16 (dezesseis)
anos em 28/01/2010 (vide tópico supra, "CRIANÇAS E ADOLESCENTES ATÉ 16
ANOS") deve ser fixada a DIB em tal data. Assim, não é possível acolher
a pretensão ministerial de retroação da DIB à DER, porque naquela época
ainda não havia entrado em vigor a Lei nº 12.470/2011.
- As normas constitucionais as previstas no artigo 203, II e 227, da CF/88,
não são decisivas na solução da presente controvérsia, por se situarem
na área reservada aos princípios constitucionais. Por outro lado, o fato
de a proteção às crianças em adolescentes estar hospedada no inciso
II, e não no inciso V, do artigo 203 da CF/88, indica que a concessão do
benefício assistencial de prestação continuada não foi concebido para
o atendimento de tais necessitados.
- Entendimento contrário também implicará ofensa aos princípios da
seletividade e distributividade (artigo 194, § único, III, da Constituição
Federal), das prestações da seguridade social.
- Nesse diapasão, a extensão do benefício assistencial às crianças e
adolescentes, anteriormente à vigência do artigo 12.470/2011, implica
violação da regra da contrapartida, conformada no artigo 195, § 5º,
da Constituição da República.
- A definição de pessoa com deficiência trazida pela Convenção sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo (01/8/2008),
posteriormente introduzida no Brasil pelo Decreto nº 186/2008, publicado
em 10/7/2008, não influi na apuração do termo inicial do benefício ora
em análise. Isso porque a definição trazida pela convenção não era
aplicada à Assistência Social, ao menos para os fins assistenciais (ou seja,
do benefício de amparo social), até que a Lei nº 12.470/2011 incorporasse
os fundamentos da convenção, afastando o requisito da incapacidade para
o trabalho e para a vida independente.
- Agravo interno desprovido.
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. DECISÃO
MONOCRÁTICA. ARTIGO 1.021 DO NOVO CPC. ASSISTÊNCIA SOCIAL. CONCEITO DE PESSOA
COM DEFICIÊNCIA. INTEGRAÇÃO SOCIAL. CRIANÇA E ADOLESCENTE. INCAPACIDADE
PARA O TRABALHO. IMPACTO NA ECONOMIA FAMILIAR. PROIBIÇÃO
CONSTITUCIONAL. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. LEI 11.470/2011. PRINCÍPIOS.
SELETIVIDADE. DISTRIBUTIVIDADE. CONTRAPARTIDA. CONVENÇÃO. REGULAMENTO. DEVER
DE PRESTAR ALIMENTOS. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO.
- Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do
benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 20 da
Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e
7.617/2011.
- Essa lei deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição
Federal, ao estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão
do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de
deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar a miserabilidade
ou a hipossuficiência, ou seja, não possuir meios de prover a própria
manutenção nem de tê-la provida por sua família.
- Até o advento da Lei n. 12.470/2011, que deu nova redação ao artigo 2º,
§ 2º, da LOAS, só se concebia a concessão do benefício assistencial
à pessoa com deficiência que não pudesse trabalhar. Somente com a
alteração legislativa infraconstitucional que se dispensou a referência
à impossibilidade de trabalhar.
- Serve a Seguridade Social a fornecer proteção social àqueles que não
podem trabalhar, por alguma contingência ou algum risco social, à vista
do disposto no artigo 193 do Texto Magno, que prevê o princípio do primado
do trabalho.
- Eis a redação do artigo 7º, XXXIII, da Constituição Federal, dada pela
Emenda Constitucional nº 20/1998: "XXXIII - proibição de trabalho noturno,
perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de
dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;"
- O legislador, pelas Leis nº 12.470/2011 e 13.146/2015, dispensou a
exigência da incapacidade para o trabalho e para a vida independente. O foco,
doravante, para fins de identificação da pessoa com deficiência, passa
a ser a existência de impedimentos de longo prazo, apenas e tão somente.
- Digno de nota é o artigo 4º, § 1o , do Decreto nº 6214/2007: "Para
fins de reconhecimento do direito ao Benefício de Prestação Continuada
às crianças e adolescentes menores de dezesseis anos de idade, deve ser
avaliada a existência da deficiência e o seu impacto na limitação do
desempenho de atividade e restrição da participação social, compatível
com a idade." (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011). Mas é
preciso consignar que não cabe ao Poder Executivo, por meio de decretos,
interpretar as normas constitucionais e legislação federal ordinária,
sob pena de se torna ilegal, porque regulamento autônomo. Consequentemente,
a solução da controvérsia prescinde do apelo às regras regulamentares.
- Outrossim, deverá ser levado em linha de conta o impacto na economia
familiar do menor, por exigir a dedicação de um dos membros do grupo para
seus cuidados, prejudicando a capacidade daquele grupo familiar de gerar
renda.
- No caso vertente, a parte autora, nascida em 28/01/1994, requereu o
benefício de amparo social por ser deficiente. E a deficiência vem comprovada
no laudo médico pericial (f. 145/147), que revela ter o autor retardo mental
grave, desde o nascimento, com alteração comportamental (F72.1).
- Quanto à hipossuficiência econômica, o estudo social (f. 127/130) revela
que a parte autora reside com o pai, um irmão maior e a avó, sobrevivendo
naquela época da aposentadoria da avó, no valor de um salário mínimo,
além da ajuda de terceiros. Concluiu a assistente social que o autor vive
em situação de vulnerabilidade social.
- Entretanto, nos termos do artigo 20, § 3º, da LOAS, o requisito da
miserabilidade não está comprovado durante todo o tempo de tramitação deste
feito. Ocorre que o estudo social foi realizado em 19/8/2011, de modo que não
se sabe a situação econômica do autor no período posterior. Infelizmente
a morosidade judicial causa graves danos às partes, inclusive em matéria
probatória.
- E considerando que o pai do autor voltou a contribuir para a previdência
social em 11/2013, mantendo as contribuições até a presente data;
e considerando a idade laborativa do irmão, lícito é inferir que não
há mais falar-se em hipossuficiência a partir de 11/2013 (vide CNIS),
devendo o termo final dar-se em 31/10/2013.
- Importa ainda registrar que a genitora do autor, que vive em São Paulo, tem
dever de prestar alimentos. A propósito, a Turma Nacional de Uniformização
dos Juizados Especiais Federais (TNU), ao analisar um pedido de uniformização
do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), fixou a tese que "o
benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se
ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis
sem prejuízo de sua manutenção". A decisão aconteceu durante sessão
realizada em 23/02/2017, em Brasília (autos nº 0517397-48.2012.4.05.8300).
- A DIB não poderia ser fixada antes de 31/8/2011, quando entrou em vigor
a Lei nº 12.470 (vide supra), mas como o autor atingiu 16 (dezesseis)
anos em 28/01/2010 (vide tópico supra, "CRIANÇAS E ADOLESCENTES ATÉ 16
ANOS") deve ser fixada a DIB em tal data. Assim, não é possível acolher
a pretensão ministerial de retroação da DIB à DER, porque naquela época
ainda não havia entrado em vigor a Lei nº 12.470/2011.
- As normas constitucionais as previstas no artigo 203, II e 227, da CF/88,
não são decisivas na solução da presente controvérsia, por se situarem
na área reservada aos princípios constitucionais. Por outro lado, o fato
de a proteção às crianças em adolescentes estar hospedada no inciso
II, e não no inciso V, do artigo 203 da CF/88, indica que a concessão do
benefício assistencial de prestação continuada não foi concebido para
o atendimento de tais necessitados.
- Entendimento contrário também implicará ofensa aos princípios da
seletividade e distributividade (artigo 194, § único, III, da Constituição
Federal), das prestações da seguridade social.
- Nesse diapasão, a extensão do benefício assistencial às crianças e
adolescentes, anteriormente à vigência do artigo 12.470/2011, implica
violação da regra da contrapartida, conformada no artigo 195, § 5º,
da Constituição da República.
- A definição de pessoa com deficiência trazida pela Convenção sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo (01/8/2008),
posteriormente introduzida no Brasil pelo Decreto nº 186/2008, publicado
em 10/7/2008, não influi na apuração do termo inicial do benefício ora
em análise. Isso porque a definição trazida pela convenção não era
aplicada à Assistência Social, ao menos para os fins assistenciais (ou seja,
do benefício de amparo social), até que a Lei nº 12.470/2011 incorporasse
os fundamentos da convenção, afastando o requisito da incapacidade para
o trabalho e para a vida independente.
- Agravo interno desprovido.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, negar provimento ao agravo interno, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
17/07/2017
Data da Publicação
:
31/07/2017
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 2138551
Órgão Julgador
:
NONA TURMA
Relator(a)
:
JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/07/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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