TRF3 0005995-36.2013.4.03.6105 00059953620134036105
PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA - PMCMV. SEGURO
PESSOAL. FGHAB. SINISTRO ÓBITO. NEGATIVA DE COBERTURA POR FALSIDADE DE
DECLARAÇÃO. ESTADO CIVIL. COMPOSIÇÃO DE RENDA FAMILIAR. VENCIMENTO
ANTECIPADO DA DÍVIDA. DANO MORAL. APELAÇÃO PROVIDA.
I - Caso em que, na data da assinatura e registro do contrato, o estado
civil do mutuário, que posteriormente viria a óbito, foi descrito como
"divorciado", ocasião em que já havia contraído um segundo matrimônio. A
CEF negou a cobertura securitária por entender que houve má fé do mutuário,
que teria prestado declaração falsa com o intuito de omitir a renda de sua
esposa e evitar que ambos pudessem ser excluídos do Programa Minha Casa,
Minha Vida por possuírem renda superior àquela prevista no programa.
II - A suposta falsidade da declaração só seria relevante se efetivamente
tivesse servido ao propósito de ocultar parte da renda familiar. A parte
Autora não apenas alegou ser dona de casa à época da assinatura do
contrato, como trouxe prova robusta neste sentido. Em outras palavras, mesmo
que o mutuário fosse qualificado como "casado" no contrato e a parte Autora
também tivesse figurado como mutuária, não haveria qualquer alteração
na composição da renda familiar.
III - Ainda que restasse provada a falsidade da declaração com consequências
sobre a renda familiar, a sanção prevista pelo contrato para a declaração
falsa seria apenas o vencimento antecipado da dívida, não se cogitando
de rescisão contratual, multa, consolidação da propriedade fiduciária,
reintegração de posse, muito menos a perda do direito ao seguro pessoal. É
de se destacar que, ainda que houvesse nulidade no contrato, sua rescisão
e a reconstituição do status quo ante geraria ônus para ambas as partes,
não sendo possível à CEF defender a nulidade do contrato apenas na parte
que lhe interessa.
IV - Ao se considerar a concomitância do sinistro e a identificação da
suposta falsidade de declaração, que, repita-se, não cominou qualquer vício
à formação do contrato, o vencimento antecipado e a cobertura securitária
se sobrepõem, não subsistindo à CEF qualquer exceção oponível à
beneficiária com fundamenta na cláusula reivindicada. É de se destacar,
ademais, que seria de todo contraditório que a CEF negasse a cobertura
securitária, mas se dispusesse a receber os pagamentos das prestações
por parte da parte Autora ou de quaisquer eventuais herdeiros, como se estes
não tivessem a legítima expectativa de ver a extinção satisfatória do
contrato, com a propriedade do imóvel livre de qualquer ônus.
V - A troca de e-mails entre a parte Autora e o representante da CEF ilustram
a boa-fé da primeira, ao insistentemente pretender realizar a regularização
das prestações em aberto mesmo antes de requerer a cobertura securitária,
e a conduta temerária da CEF, incapaz de oferecer uma resposta rápida e
categórica em relação à situação do contrato em comento, sendo mesmo
possível cogitar o seu interesse em protelar a regularização da dívida
com vistas a realizar a consolidação da propriedade fiduciária.
VI - Não se cogita da configuração da prescrição no caso em tela,
tendo vista o prazo transcorrido entre o óbito e a negativa de cobertura,
bem como o teor da Súmula 229 do STJ. Inquestionável, portanto, o direito
à cobertura securitária.
VII - É dever de uma empresa pública primar pelo atendimento ágil e
eficiente de modo a não deixar prejudicados os interesses da sociedade. Deve
ser banida da cultura nacional a ideia de que ser mal atendido faz parte
dos aborrecimentos triviais do cidadão comum, principalmente quando tal
comportamento provém das entidades administrativas. O cidadão não pode ser
compelido a suportar as consequências da má organização, abuso e falta de
eficiência daqueles que devem, com toda boa vontade, solicitude e cortesia,
atender ao público. Os simples aborrecimentos triviais aos quais o cidadão
encontra-se sujeito devem ser considerados como os que não ultrapassem o
limite do razoável, tais como: a longa espera em filas para atendimento,
a falta de estacionamentos públicos suficientes, engarrafamentos etc.
VIII - As circunstâncias narradas nos autos, denotam que a parte Autora
sofreu, sim, aflição e intranquilidade com a conduta da mutuante desde o
óbito do mutuário. Intuitivo que, em face desses anos decorridos implicou
angústia e injusto sentimento de impotência, decorrendo daí o indeclinável
dever de indenizar.
IX - Em face disso, e atento às circunstâncias do caso concreto,
a indenização pelo dano moral deve ser fixada em quantum que traduza
legítima reparação à vítima e justa punição à ofensora. Assim sendo,
entendo que, no caso, a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais), mostra-se
suficiente o bastante para atingir às finalidades da reparação.
X - Os honorários advocatícios são devidos em 10% sobre o valor
da condenação. Custas ex lege. Juros de mora e correção monetária
nos termos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos
na Justiça Federal. Quanto à condenação por dano moral, a correção
monetária deverá ser realizada desde a data da decisão que a fixou,
nos termos da Súmula 362 do STJ.
XI - Apelação provida para reconhecer o direito à cobertura securitária
com recursos do Fundo Garantidor da Habitação Popular desde o óbito do
mutuário, bem como para condenar a parte Ré ao pagamento de indenização
por danos morais.
Ementa
PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA - PMCMV. SEGURO
PESSOAL. FGHAB. SINISTRO ÓBITO. NEGATIVA DE COBERTURA POR FALSIDADE DE
DECLARAÇÃO. ESTADO CIVIL. COMPOSIÇÃO DE RENDA FAMILIAR. VENCIMENTO
ANTECIPADO DA DÍVIDA. DANO MORAL. APELAÇÃO PROVIDA.
I - Caso em que, na data da assinatura e registro do contrato, o estado
civil do mutuário, que posteriormente viria a óbito, foi descrito como
"divorciado", ocasião em que já havia contraído um segundo matrimônio. A
CEF negou a cobertura securitária por entender que houve má fé do mutuário,
que teria prestado declaração falsa com o intuito de omitir a renda de sua
esposa e evitar que ambos pudessem ser excluídos do Programa Minha Casa,
Minha Vida por possuírem renda superior àquela prevista no programa.
II - A suposta falsidade da declaração só seria relevante se efetivamente
tivesse servido ao propósito de ocultar parte da renda familiar. A parte
Autora não apenas alegou ser dona de casa à época da assinatura do
contrato, como trouxe prova robusta neste sentido. Em outras palavras, mesmo
que o mutuário fosse qualificado como "casado" no contrato e a parte Autora
também tivesse figurado como mutuária, não haveria qualquer alteração
na composição da renda familiar.
III - Ainda que restasse provada a falsidade da declaração com consequências
sobre a renda familiar, a sanção prevista pelo contrato para a declaração
falsa seria apenas o vencimento antecipado da dívida, não se cogitando
de rescisão contratual, multa, consolidação da propriedade fiduciária,
reintegração de posse, muito menos a perda do direito ao seguro pessoal. É
de se destacar que, ainda que houvesse nulidade no contrato, sua rescisão
e a reconstituição do status quo ante geraria ônus para ambas as partes,
não sendo possível à CEF defender a nulidade do contrato apenas na parte
que lhe interessa.
IV - Ao se considerar a concomitância do sinistro e a identificação da
suposta falsidade de declaração, que, repita-se, não cominou qualquer vício
à formação do contrato, o vencimento antecipado e a cobertura securitária
se sobrepõem, não subsistindo à CEF qualquer exceção oponível à
beneficiária com fundamenta na cláusula reivindicada. É de se destacar,
ademais, que seria de todo contraditório que a CEF negasse a cobertura
securitária, mas se dispusesse a receber os pagamentos das prestações
por parte da parte Autora ou de quaisquer eventuais herdeiros, como se estes
não tivessem a legítima expectativa de ver a extinção satisfatória do
contrato, com a propriedade do imóvel livre de qualquer ônus.
V - A troca de e-mails entre a parte Autora e o representante da CEF ilustram
a boa-fé da primeira, ao insistentemente pretender realizar a regularização
das prestações em aberto mesmo antes de requerer a cobertura securitária,
e a conduta temerária da CEF, incapaz de oferecer uma resposta rápida e
categórica em relação à situação do contrato em comento, sendo mesmo
possível cogitar o seu interesse em protelar a regularização da dívida
com vistas a realizar a consolidação da propriedade fiduciária.
VI - Não se cogita da configuração da prescrição no caso em tela,
tendo vista o prazo transcorrido entre o óbito e a negativa de cobertura,
bem como o teor da Súmula 229 do STJ. Inquestionável, portanto, o direito
à cobertura securitária.
VII - É dever de uma empresa pública primar pelo atendimento ágil e
eficiente de modo a não deixar prejudicados os interesses da sociedade. Deve
ser banida da cultura nacional a ideia de que ser mal atendido faz parte
dos aborrecimentos triviais do cidadão comum, principalmente quando tal
comportamento provém das entidades administrativas. O cidadão não pode ser
compelido a suportar as consequências da má organização, abuso e falta de
eficiência daqueles que devem, com toda boa vontade, solicitude e cortesia,
atender ao público. Os simples aborrecimentos triviais aos quais o cidadão
encontra-se sujeito devem ser considerados como os que não ultrapassem o
limite do razoável, tais como: a longa espera em filas para atendimento,
a falta de estacionamentos públicos suficientes, engarrafamentos etc.
VIII - As circunstâncias narradas nos autos, denotam que a parte Autora
sofreu, sim, aflição e intranquilidade com a conduta da mutuante desde o
óbito do mutuário. Intuitivo que, em face desses anos decorridos implicou
angústia e injusto sentimento de impotência, decorrendo daí o indeclinável
dever de indenizar.
IX - Em face disso, e atento às circunstâncias do caso concreto,
a indenização pelo dano moral deve ser fixada em quantum que traduza
legítima reparação à vítima e justa punição à ofensora. Assim sendo,
entendo que, no caso, a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais), mostra-se
suficiente o bastante para atingir às finalidades da reparação.
X - Os honorários advocatícios são devidos em 10% sobre o valor
da condenação. Custas ex lege. Juros de mora e correção monetária
nos termos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos
na Justiça Federal. Quanto à condenação por dano moral, a correção
monetária deverá ser realizada desde a data da decisão que a fixou,
nos termos da Súmula 362 do STJ.
XI - Apelação provida para reconhecer o direito à cobertura securitária
com recursos do Fundo Garantidor da Habitação Popular desde o óbito do
mutuário, bem como para condenar a parte Ré ao pagamento de indenização
por danos morais.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar provimento à apelação da parte Autora para reconhecer
o direito à cobertura securitária com recursos do Fundo Garantidor da
Habitação Popular desde o óbito do mutuário, bem como para condenar
a parte Ré ao pagamento de indenização por danos morais, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
05/09/2017
Data da Publicação
:
14/09/2017
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 2164416
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/09/2017
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