TRF3 0006000-39.2014.4.03.6100 00060003920144036100
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ANISTIADO POLÍTICO. INDENIZAÇÃO
POR DANOS MORAIS. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM REPARAÇÃO
ECONÔMICA CONCEDIDA PELA COMISSÃO DE ANISTIA. NOVO POSICIONAMENTO DA
CORTE SUPERIOR. IMPRESCRITIBILIDADE. REPARAÇÃO DEVIDA. EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO. OMISSÃO E OBSCURIDADE INEXISTENTES.
1. São manifestamente improcedentes os presentes embargos de declaração,
pois não se verifica qualquer omissão ou obscuridade no julgamento impugnado,
mas mera contrariedade da embargante com a solução dada pela Turma,
que, à luz da legislação aplicável e com respaldo na jurisprudência,
consignou expressamente, quanto à prescrição, que "versando a espécie sobre
violação de direitos fundamentais decorrentes do regime de exceção anterior
à Constituição de 1988, pertinente destacar a consolidada jurisprudência
do Superior Tribunal de Justiça quanto à imprescritibilidade da pretensão".
2. Asseverou o acórdão que, no Recurso Especial 1.485.260, de relatoria do
Ministro SÉRGIO KUKINA, publicado no DJE de 19/04/2016, "a Corte Superior
perfilhou posicionamento divergente ao até então adotado e, portanto,
a partir deste julgamento, restou inviável exigir prévio requerimento
administrativo para discussão sobre os danos morais sofridos em razão de
perseguição, tortura ou prisão, praticadas por órgãos de repressão,
no período de vigência do regime militar".
3. Ressaltou o acórdão que "documentos provam que o marido da autora, por sua
militância política e ações contra o regime militar, sofreu persecução,
investigação, e prisão, conforme o sistema legal de então, caracterizado
por atos de exceção, nos termos do artigo 8º do ADCT, tendo sido, em razão
de tais fatos, demitido de seu cargo público, o que enquadra a situação
fática na hipótese do artigo 2º, XI, da Lei 10.559/2002, restando, portanto,
prejudicada a alegação de cerceamento de defesa. Ora, é inequívoco
que os procedimentos então adotados tinham caráter excepcional, usando
métodos e técnicas que infligiam grave violência física e psicológica,
que na normalidade democrática não poderiam ser admitidos, assim gerando
danos morais passíveis de indenização, na forma do artigo 37, § 6º,
c/c artigo 5º, V e X, ambos da Constituição Federal. Os atos estatais
narrados produziram mais do que inequívoca causalidade jurídica do dano,
em termos de séria ofensa à honra, imagem, dignidade e integridade, tanto
moral como psicológica, nos diversos planos possíveis, incluindo o pessoal,
familiar, profissional e social".
4. Notou-se que "a condição de anistiado político 'post mortem' foi
reconhecida pela Comissão de Anistia (Requerimento de Anistia 2003.01.22038),
formulado pela autora, na qualidade de sucessora, cujo voto da Conselheira
Relatora destacou que "é incontestável a existência dos fatos pela
Requerente", conquanto tenha concluído não ser possível a concessão de
reparação econômica em prestação única, tendo em vista a requerente
já ser beneficiária de prestação mensal. Não cabe, pois, negar o fato
gerador da situação lesiva. Neste sentido, deve ser aplicado o atual
entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto ao cabimento da ação
de reparação por danos morais, que não se confunde com a reparação feita
na via administrativa, e que, por outro lado, inexistente comprovação de
que tenha, efetivamente, havido indenização da mesma natureza".
5. Decidiu o acórdão que "Na espécie, é evidente que o cônjuge da autora
foi vítima do regime político instituído no país com o Golpe de 1964,
sendo submetido à prisão e às suas consequências, por isso sua condição
de anistiado político foi, inclusive, reconhecida pela Comissão de Anistia,
o que justifica a condenação da requerida ao pagamento de indenização,
arbitrada em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), de modo a permitir justa e
adequada reparação do prejuízo sem acarretar enriquecimento sem causa,
avaliando-se diversos aspectos relevantes - como a condição social,
viabilidade econômica e grau de culpa do ofensor, gravidade do dano ao
patrimônio moral e psíquico do autor".
6. Quanto à correção monetária e aos juros de mora, consignou o acórdão
que "O valor da indenização deve ser objeto de correção monetária
desde o arbitramento, conforme a Súmula 362/STJ; já os juros de mora são
devidos desde o evento danoso (Súmula 54/STJ), considerando-se, para tal
fim, a data da promulgação da Constituição Federal de 1988, nos termos
da jurisprudência da Turma (p. ex.: AC 2006.61.26.005917-4, Rel. Juiz
Conv. CLAUDIO SANTOS, D.E. de 08/08/2011); os índices a serem aplicados, a
título de correção e mora, devem ser os previstos na Resolução 267/2013
do Conselho da Justiça Federal para as ações condenatórias em geral,
que aprovou o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal".
7. Quanto à verba honorária, decidiu o acórdão que "deve ser fixada em
10% do valor da condenação, atendendo os critérios do artigo 20, § 4º,
do Código de Processo Civil, atinentes ao grau de zelo do profissional,
lugar de prestação do serviço, natureza e importância da causa, trabalho
realizado pelo advogado e tempo exigido para o seu serviço".
8. Não houve qualquer omissão ou obscuridade no julgamento impugnado,
revelando, na realidade, a articulação de verdadeira imputação de erro no
julgamento, e contrariedade da embargante com a solução dada pela Turma,
o que, por certo e evidente, não é compatível com a via dos embargos de
declaração. Assim, se o acórdão violou os artigos 1º da Lei 9.494/1997;
16 da Lei 10.559/2002; 1º da Lei 11.960/2009; 1º do Decreto-Lei 20.910/1932;
186, 396, 397, 407, 884, 944 do CC; 85, 86, 240, 269, IV, 485, VI, do CPC; 8º
do ADCT; 2º, 5º, caput e XXXVI, 37, §6º da CF, como mencionado, caso seria
de discutir a matéria em via própria e não em embargos declaratórios.
9. Para corrigir suposto error in judicando, o remédio cabível não
é, por evidente, o dos embargos de declaração, cuja impropriedade é
manifesta, de forma que a sua utilização para mero reexame do feito,
motivado por inconformismo com a interpretação e solução adotadas,
revela-se imprópria à configuração de vício sanável na via eleita.
10. Embargos de declaração rejeitados.
Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ANISTIADO POLÍTICO. INDENIZAÇÃO
POR DANOS MORAIS. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM REPARAÇÃO
ECONÔMICA CONCEDIDA PELA COMISSÃO DE ANISTIA. NOVO POSICIONAMENTO DA
CORTE SUPERIOR. IMPRESCRITIBILIDADE. REPARAÇÃO DEVIDA. EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO. OMISSÃO E OBSCURIDADE INEXISTENTES.
1. São manifestamente improcedentes os presentes embargos de declaração,
pois não se verifica qualquer omissão ou obscuridade no julgamento impugnado,
mas mera contrariedade da embargante com a solução dada pela Turma,
que, à luz da legislação aplicável e com respaldo na jurisprudência,
consignou expressamente, quanto à prescrição, que "versando a espécie sobre
violação de direitos fundamentais decorrentes do regime de exceção anterior
à Constituição de 1988, pertinente destacar a consolidada jurisprudência
do Superior Tribunal de Justiça quanto à imprescritibilidade da pretensão".
2. Asseverou o acórdão que, no Recurso Especial 1.485.260, de relatoria do
Ministro SÉRGIO KUKINA, publicado no DJE de 19/04/2016, "a Corte Superior
perfilhou posicionamento divergente ao até então adotado e, portanto,
a partir deste julgamento, restou inviável exigir prévio requerimento
administrativo para discussão sobre os danos morais sofridos em razão de
perseguição, tortura ou prisão, praticadas por órgãos de repressão,
no período de vigência do regime militar".
3. Ressaltou o acórdão que "documentos provam que o marido da autora, por sua
militância política e ações contra o regime militar, sofreu persecução,
investigação, e prisão, conforme o sistema legal de então, caracterizado
por atos de exceção, nos termos do artigo 8º do ADCT, tendo sido, em razão
de tais fatos, demitido de seu cargo público, o que enquadra a situação
fática na hipótese do artigo 2º, XI, da Lei 10.559/2002, restando, portanto,
prejudicada a alegação de cerceamento de defesa. Ora, é inequívoco
que os procedimentos então adotados tinham caráter excepcional, usando
métodos e técnicas que infligiam grave violência física e psicológica,
que na normalidade democrática não poderiam ser admitidos, assim gerando
danos morais passíveis de indenização, na forma do artigo 37, § 6º,
c/c artigo 5º, V e X, ambos da Constituição Federal. Os atos estatais
narrados produziram mais do que inequívoca causalidade jurídica do dano,
em termos de séria ofensa à honra, imagem, dignidade e integridade, tanto
moral como psicológica, nos diversos planos possíveis, incluindo o pessoal,
familiar, profissional e social".
4. Notou-se que "a condição de anistiado político 'post mortem' foi
reconhecida pela Comissão de Anistia (Requerimento de Anistia 2003.01.22038),
formulado pela autora, na qualidade de sucessora, cujo voto da Conselheira
Relatora destacou que "é incontestável a existência dos fatos pela
Requerente", conquanto tenha concluído não ser possível a concessão de
reparação econômica em prestação única, tendo em vista a requerente
já ser beneficiária de prestação mensal. Não cabe, pois, negar o fato
gerador da situação lesiva. Neste sentido, deve ser aplicado o atual
entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto ao cabimento da ação
de reparação por danos morais, que não se confunde com a reparação feita
na via administrativa, e que, por outro lado, inexistente comprovação de
que tenha, efetivamente, havido indenização da mesma natureza".
5. Decidiu o acórdão que "Na espécie, é evidente que o cônjuge da autora
foi vítima do regime político instituído no país com o Golpe de 1964,
sendo submetido à prisão e às suas consequências, por isso sua condição
de anistiado político foi, inclusive, reconhecida pela Comissão de Anistia,
o que justifica a condenação da requerida ao pagamento de indenização,
arbitrada em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), de modo a permitir justa e
adequada reparação do prejuízo sem acarretar enriquecimento sem causa,
avaliando-se diversos aspectos relevantes - como a condição social,
viabilidade econômica e grau de culpa do ofensor, gravidade do dano ao
patrimônio moral e psíquico do autor".
6. Quanto à correção monetária e aos juros de mora, consignou o acórdão
que "O valor da indenização deve ser objeto de correção monetária
desde o arbitramento, conforme a Súmula 362/STJ; já os juros de mora são
devidos desde o evento danoso (Súmula 54/STJ), considerando-se, para tal
fim, a data da promulgação da Constituição Federal de 1988, nos termos
da jurisprudência da Turma (p. ex.: AC 2006.61.26.005917-4, Rel. Juiz
Conv. CLAUDIO SANTOS, D.E. de 08/08/2011); os índices a serem aplicados, a
título de correção e mora, devem ser os previstos na Resolução 267/2013
do Conselho da Justiça Federal para as ações condenatórias em geral,
que aprovou o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal".
7. Quanto à verba honorária, decidiu o acórdão que "deve ser fixada em
10% do valor da condenação, atendendo os critérios do artigo 20, § 4º,
do Código de Processo Civil, atinentes ao grau de zelo do profissional,
lugar de prestação do serviço, natureza e importância da causa, trabalho
realizado pelo advogado e tempo exigido para o seu serviço".
8. Não houve qualquer omissão ou obscuridade no julgamento impugnado,
revelando, na realidade, a articulação de verdadeira imputação de erro no
julgamento, e contrariedade da embargante com a solução dada pela Turma,
o que, por certo e evidente, não é compatível com a via dos embargos de
declaração. Assim, se o acórdão violou os artigos 1º da Lei 9.494/1997;
16 da Lei 10.559/2002; 1º da Lei 11.960/2009; 1º do Decreto-Lei 20.910/1932;
186, 396, 397, 407, 884, 944 do CC; 85, 86, 240, 269, IV, 485, VI, do CPC; 8º
do ADCT; 2º, 5º, caput e XXXVI, 37, §6º da CF, como mencionado, caso seria
de discutir a matéria em via própria e não em embargos declaratórios.
9. Para corrigir suposto error in judicando, o remédio cabível não
é, por evidente, o dos embargos de declaração, cuja impropriedade é
manifesta, de forma que a sua utilização para mero reexame do feito,
motivado por inconformismo com a interpretação e solução adotadas,
revela-se imprópria à configuração de vício sanável na via eleita.
10. Embargos de declaração rejeitados.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, rejeitar os embargos de declaração, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
19/04/2017
Data da Publicação
:
03/05/2017
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2178840
Órgão Julgador
:
TERCEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MUTA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED LEI-10559 ANO-2002 ART-2 INC-11
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-5 INC-10 ART-37 PAR-6
***** ADCT-88 ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-8
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-362
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-54
***** MCR-13 MANUAL DE ORIENTAÇÃO DE PROCEDIMENTOS PARA OS CÁLCULOS NA JF
LEG-FED RCJF-267 ANO-2013
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-20 PAR-4
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/05/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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