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Jurisprudência


TRF3 0006035-05.2015.4.03.6119 00060350520154036119

Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. TRANSNACIONALIDADE. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. ERRO DE TIPO NÃO COMPROVADO. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA. COCULPABILIDADE NÃO RECONHECIDA. INCIDÊNCIA DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI 11.343/2006. CAUSA DE AUMENTO DECORRENTE DA TRANSNACIONALIDADE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. CAUSA ESPECIAL DE DIMUNIÇÃO DO ARTIGO 24, §2º CP NÃO APLICADA, REGIME SEMIABERTO. APELAÇÃO DA ACUSAÇÃO NÃO PROVIDA. APELAÇÃO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDA. 1. A materialidade, autoria e dolo restaram comprovados nos autos. 2. Cumpre afastar qualquer alegação de que os réus agiram em estado de necessidade exculpante ou em inexigibilidade de conduta diversa, pois ocorre que a simples alegação, sem qualquer comprovação nos autos, não é suficiente para caracterizar a alegada excludente de culpabilidade, ademais, os réus poderiam ter-se valido de outros meios lícitos para sanar a suposta dificuldade financeira, que sequer ficou comprovada nos autos e, ainda que houvesse essa comprovação, tal fato não seria hábil para justificar a prática de um ilícito de tamanha gravidade (tráfico internacional de entorpecentes) e elidir a responsabilização criminal, já que ingressar no mundo do crime não é solução acertada, honrosa, digna para resolver problemas econômicos. 3. As evidências são muitas, logo não merece guarida o pleito defensivo pela absolvição da ré, ante a atipicidade da conduta a ela imputada, em razão da configuração de erro de tipo ou, ao menos, ante a fundada dúvida sobre a sua existência, nos termos do artigo 20, caput, do Código Penal, a teor do disposto no art. 386, VI, do CPP, bem como de inexistência de prova. No mínimo, a apelante agiu com dolo eventual, aceitando transportar uma mala que lhe foi entregue por um terceiro, de um continente para outro. Portanto, não tenho qualquer dúvida a respeito da materialidade, da autoria e dolo da apelante ANA SOFIA PEREIRA VIEIRA pela prática do delito de tráfico internacional de entorpecentes. 4. Dosimetria de TIAGO MANUEL RUELA FINO PEREIRA. Primeira fase. Trata-se de apelante primário, que não ostenta maus antecedentes, bem como as demais circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não lhe são desfavoráveis, de outro lado, a denúncia não descreve a unidade de desígnios, o que poderia configurar o concurso de pessoas e acarretar a consideração do total de droga apreendida para efeito de fixação da pena-base. 5. Considerando a natureza e quantidade da droga apreendida com o réu, 5.264g (cinco mil, duzentos e sessenta e quatro gramas) de cocaína, com fundamento no art. 42 da Lei n.º 11.343/06, a pena-base merece exasperação em 1/5, consoante entendimento firmado por esta Turma. Reduzida a pena na primeira fase e fixada em 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa. 6. O fato do réu somente ter confessado em decorrência da prisão em flagrante e a ausência de informações precisas acerca das pessoas que o contrataram não afastam o reconhecimento da atenuante, direito subjetivo do réu que confessa os fatos, inclusive porque expressamente utilizada para a formação do convencimento do julgador. 7. Não se pode conferir ao estado de extrema pobreza, no qual vivem milhões de pessoas no país, a leniência de ser impeditivo à configuração da culpabilidade do agente, atribuindo-a ao Estado, pois mesmo que este deixe de prestar a devida assistência aos seus cidadãos (e, em especial, a determinada parcela da sociedade), isso, por si só, não justificativa ou autoriza a prática delitiva, na medida em tal carência é insuficiente para afastar a consciência da ilicitude e a capacidade de autodeterminação do indivíduo, cujo móvel pode ser questionado, mas não eliminado da equação da análise da culpabilidade. 8. Fixada a pena nesta fase em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. 9. Terceira fase da dosimetria. Mantida a majoração da pena em decorrência da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06 (transnacionalidade do delito), no percentual mínimo de 1/6 (um sexto). 10. Para a aplicação da causa de aumento da transnacionalidade do tráfico é irrelevante a distância da viagem realizada, pois a finalidade não é a disseminação do tráfico pelos lugares por onde o réu passaria, mas apenas a entrega da droga no destino. Em consequência, não há afetação maior do bem jurídico tutelado em razão de ser maior ou menor a distância a ser percorrida, até porque o dano à coletividade não depende da distância, mas à quantidade de pessoas que efetivamente recebem a droga. 11. Aplicada a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/06, pois trata-se de apelante primário, que não ostenta maus antecedentes. Não há prova nos autos de que se dedica a atividades criminosas, nem elementos para concluir que integra organização criminosa, apesar de encarregada do transporte da droga. Certamente, estava a serviço de bando criminoso internacional, o que não significa, porém, que fosse integrante dele. Portanto, faz jus à aplicação da referida causa de diminuição, entretanto, no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), pois se associou, de maneira eventual e esporádica, a uma organização criminosa de tráfico internacional de drogas. Pena definitivamente fixada em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão e pagamento de 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos. 12. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus n.º 111840, em 27 de junho de 2012, deferiu, por maioria, a ordem e declarou incidenter tantum a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/2007, motivo pelo qual o regime inicial de cumprimento de pena deve ser fixado nos termos do art. 33, § 2º, "b", e § 3º do Código Penal. 13. Trata-se de réu primário, que não ostenta maus antecedentes, bem como não existem circunstâncias judiciais desfavoráveis, nos termos do art. 59 do Código Penal. A pena-base foi majorada apenas em razão da quantidade e natureza da droga apreendida, nos termos do art. 42 da Lei de Drogas, e a pena definitiva fixada 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, o que não impede seja fixado o regime inicial semiaberto, em razão da quantidade da pena, com fundamento no art. 33, § 2º, "b" e § 3º, do Código Penal. 14. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, tendo em vista que a pena definitiva aplicada supera quatro anos de reclusão, não se encontrando preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal. 15. Dosimetria de ANA SOFIA PEREIRA VIEIRA. Primeira fase. Trata-se de apelante primária, que não ostenta maus antecedentes, bem como as demais circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não lhe são desfavoráveis, de outro lado, a denúncia não descreve a unidade de desígnios, o que poderia configurar o concurso de pessoas e acarretar a consideração do total de droga apreendida para efeito de fixação da pena-base. 16. Considerando a natureza e quantidade da droga apreendida com o réu, 5.255g (cinco mil, duzentos e cinquenta e cinco gramas) de cocaína, com fundamento no art. 42 da Lei n.º 11.343/06, a pena-base merece exasperação em 1/5, consoante entendimento firmado por esta Turma. Reduzida a pena na primeira fase e fixada em 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa. 17. Segunda fase. Ausentes atenuantes ou agravantes. Fixada a pena nesta fase em 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa. 18. Terceira fase da dosimetria. Mantida a majoração da pena em decorrência da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06 (transnacionalidade do delito), no percentual mínimo de 1/6 (um sexto). 19. Para a aplicação da causa de aumento da transnacionalidade do tráfico é irrelevante a distância da viagem realizada, pois a finalidade não é a disseminação do tráfico pelos lugares por onde o réu passaria, mas apenas a entrega da droga no destino. Em consequência, não há afetação maior do bem jurídico tutelado em razão de ser maior ou menor a distância a ser percorrida, até porque o dano à coletividade não depende da distância, mas à quantidade de pessoas que efetivamente recebem a droga. 20. Aplicada a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/06, pois trata-se de apelante primária, que não ostenta maus antecedentes. Não há prova nos autos de que se dedica a atividades criminosas, nem elementos para concluir que integra organização criminosa, apesar de encarregada do transporte da droga. Certamente, estava a serviço de bando criminoso internacional, o que não significa, porém, que fosse integrante dele. Portanto, faz jus à aplicação da referida causa de diminuição, entretanto, no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), pois se associou, de maneira eventual e esporádica, a uma organização criminosa de tráfico internacional de drogas. Pena definitivamente fixada em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos. 21. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus n.º 111840, em 27 de junho de 2012, deferiu, por maioria, a ordem e declarou incidenter tantum a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/2007, motivo pelo qual o regime inicial de cumprimento de pena deve ser fixado nos termos do art. 33, § 2º, "b", e § 3º do Código Penal. 22. Trata-se de ré primária, que não ostenta maus antecedentes, bem como não existem circunstâncias judiciais desfavoráveis, nos termos do art. 59 do Código Penal. A pena-base foi majorada apenas em razão da quantidade e natureza da droga apreendida, nos termos do art. 42 da Lei de Drogas, e a pena definitiva fixada 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, o que não impede seja fixado o regime inicial semiaberto, em razão da quantidade da pena, com fundamento no art. 33, § 2º, "b" e § 3º, do Código Penal. 23. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, tendo em vista que a pena definitiva aplicada supera quatro anos de reclusão, não se encontrando preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal. 24. Em relação a ambos os réus, o pedido de aguardar o julgamento do recurso em liberdade fica prejudicado com o presente julgamento da apelação. Ainda que assim não se entenda, os réus responderam presos ao processo e, no sentido de que não tem direito de apelar em liberdade o réu que, justificadamente, respondeu preso ao processo situa-se o entendimento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça: STF, 1ª Turma, HC 92612/PI, Rel.Min. Ricardo Lewandowski, j. 11/03/2008, DJe 10/04/2008; STF, 1ª Turma, HC 98464/SP, Rel.Min. Carlos Britto, j. 03/11/2009, DJe 03/12/2009; STJ, 5a Turma, HC 60073-SP, DJU 18.12.2006 p.428; STJ, 5a Turma, HC 59732-SP, DJU 30.10.2006 p.356. Da mesma forma e pelos mesmos fundamentos, inviável a prisão domiciliar. 25. Preliminar rejeitada. Apelação da acusação a que se nega provimento. Apelação da defesa parcialmente conhecida e, na parte conhecida, parcialmente provida.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da acusação, rejeitar a preliminar suscitada pela defesa, de inexigibilidade de conduta diversa, não conhecer da sua apelação quanto ao pleito de aplicação da atenuante da confissão espontânea, em relação ao réu Tiago Manuel Ruela Fino Pereira e dar parcial provimento ao restante da sua apelação, para reduzir a pena-base de ambos os réus e reconhecer a causa especial de diminuição de pena prevista no artigo 33, §4° da Lei n° 11.343/2006, também relativamente a ambos, fixando a pena de TIAGO MANUEL RUELA FINO PEREIRA em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão e pagamento de 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos, no regime prisional semiaberto e a de ANA SOFIA PEREIRA VIEIRA em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos, no regime prisional semiaberto. Nos termos do voto do Relator, tendo o Juiz Fed. Convocado Alessandro Diaferia ressalvado seu entendimento pessoal. Lavrará o acórdão o Relator.

Data do Julgamento : 26/07/2016
Data da Publicação : 02/08/2016
Classe/Assunto : Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 66770
Órgão Julgador : DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : JUIZ CONVOCADO RICARDO NASCIMENTO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Observações : OBJETO MATERIAL DO CRIME: 5,264 KG DE COCAÍNA.
Referência legislativa : ***** LDR-06 LEI DE DROGAS LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-33 PAR-4 ART-42 ART-40 INC-1 ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-24 PAR-2 ART-20 ART-33 PAR-2 LET-B PAR-3 ART-44 ART-59 ***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-386 INC-6 ***** LCH-90 LEI DOS CRIMES HEDIONDOS LEG-FED LEI-8072 ANO-1990 ART-2 PAR-1 LEG-FED LEI-11464 ANO-2007
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/08/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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