TRF3 0006147-35.2014.4.03.6110 00061473520144036110
PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. 241-A E 241-B, DA
LEI 8.069/90. PORNOGRAFIA INFANTIL. MATERIALIDADE, AUTORIA E
DOLO COMPROVADOS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO E DA
SUBSIDIARIEDADE. DOSIMETRIA MANTIDA. INCIDÊNCIA DA ATENUANTE DA
CONFISSÃO. SÚMULA 545 DO STJ. INCIDÊNCIA DA CONTINUIDADE DELITIVA. REGIME
INCIAL ABERTO. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS MANTIDA. RECURSO
DA ACUSAÇÃO NÃO PROVIDO.
1. A materialidade delitiva dos crimes dos artigos 241-A e 241-B da Lei
8.069/1990 restou devidamente comprovada pelo conjunto probatório produzido. O
Laudo nº 5466/2016 - NUCRIM/SETEC/SR/PF/SP (fls. 140/161) esclareceu a
forma de compartilhamento do conteúdo ilícito, asseverando que, além do
arquivo de pornografia infantil compartilhado em 17 de dezembro de 2013,
objeto da acusação I, o réu compartilhou arquivos de pornografia infantil
utilizando o programa GIGATRIBE e ARES GALAXY no período compreendido entre
27 de outubro de 2013 e 30 de setembro de 2014, objeto da acusação II, e
entre 28 de agosto de 2012 e 14 de setembro de 2014, objeto da acusação III.
2. A autoria está amplamente comprovada, por meio da confissão do réu em
juízo e dos depoimentos testemunhais, que dão conta que ele mantinha em seus
equipamentos (computador e pendrive) arquivos de pornografia infantil e que
utilizava dos programas GIGATRIBE e ARES GALAXY para baixar e disponibilizar
as imagens e vídeos de pedofilia.
3. Quanto ao dolo, revela-se totalmente infundada a justificativa de que
somente manteve diálogos com outros pedófilos com o objetivo de tentar
entender o perfil dessas pessoas para poder se defender, bem como a sua
futura família por já ter sofrido abuso sexual na infância, mormente
em face do laudo pericial que demonstra que o acusado realizou download e
compartilhou arquivos contendo pornografia infantojuvenil.
4. Aplicação dos princípios da consunção e da subsidiariedade. O artigo
241-B da Lei 8.069/1990 foi criado com o fim de resolver situação específica
de armazenamento de conteúdo pornográfico infantil, trazendo figura
subsidiária àquelas descritas no caput, do artigo 241 e no artigo 241-A
da Lei 8.069/1990, quando há provas do cometimento das condutas descritas
nestes tipos penais. Verifica-se, assim, certa subsidiariedade entre os tipos
penais em questão, decorrentes do visível intuito legislativo de "cobrir"
todas as possíveis condutas e pessoas que de alguma forma participem das
práticas delitivas. Em razão da aplicação dos princípios da consunção
e da subsidiariedade, remanesce apenas a condenação pelo crime do artigo
241-A da Lei 8.069/1990.
5. Dosimetria. Em vista da manutenção, nesta sede, da aplicação dos
princípios da consunção e da subsidiariedade, a análise da dosimetria
da pena fica restrita apenas às questões relativas ao artigo 241-A da Lei
8.069/90.
6. Primeira fase. No que se refere à primariedade, conduta social,
personalidade, motivo, circunstâncias, consequências do crime e comportamento
da vítima revelam-se normais à espécie. A exasperação da pena-base
também deve ser mantida consoante os termos da sentença, diante da
culpabilidade exacerbada do acusado, uma vez que o conteúdo dos arquivos
pornográficos diz respeito a crianças em tenra idade, inclusive, conta
com a participação de bebês envolvidos em cenas de pornografia infantil,
conforme fotografia de fl. 149, o que lesa mais gravemente o tipo penal,
ultrapassando o bem jurídico tutelado. Mantido, com base no princípio da
razoabilidade o aumento da pena-base em ¼ (um quarto).
7. Segunda fase. Deve ser mantido o reconhecimento da confissão espontânea,
uma vez que, embora tenha se dado de forma parcial, foi utilizada para formar
o convencimento do juiz, nos termos da Súmula 545 do Superior Tribunal de
Justiça.
8. Deve ser mantida, ainda, a atenuante da menoridade, nos termos do artigo
65, inciso I, do Código Penal, uma vez que o réu completou 21 (vinte e um)
anos em 13 de maio de 2015, ou seja, após a prática dos crimes.
9. Mantida a redução da pena em 1/5 (um quinto), fixando a pena
intermediária em 3 (três) anos de reclusão e pagamento de 10 (dez)
dias-multa.
10. Terceira fase. As condutas de disponibilizar e publicar material
pornográfico infantil pelo réu ocorreram em continuidade delitiva, uma
vez que o acusado praticou os delitos da mesma espécie, mediante mais de
uma ação, nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução,
nos termos do artigo 71 do Código Penal.
11. Com efeito, a conduta se prolongou por vasto período, tendo o acusado
iniciado a ação criminosa em 2012, compartilhando arquivos de pornografia
infantil por meio do programa GigaTribe, no período de 27/10/2013 a
30/09/2014, bem como pelo programa Ares Galaxy, no período de 24/08/2012
a 14/09/2014.
12. Todavia, mostra-se proporcional a fixação da fração em ¼ (um
quarto), posto que a quantidade de arquivos disponibilizados pelos programas
de compartilhamento não se mostrou tão exorbitante, pois os únicos
arquivos ativos, contendo pornografia infantojuvenil, identificados na pasta
compartilhada do programa GigaTribe, eram 3 (três) vídeos (fl. 147) e com
relação ao programa Ares Galaxy, constatou-se que pelo menos 29 (vinte e
nove) continham de fato pornografia infantil (fl. 156), além das 05 (cinco)
imagens enviadas através do chat do GigaTribe.
13. Pena definitiva do acusado mantida em 3 (três) anos e 9 (nove) meses
de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa.
14. À míngua de recurso, fica mantido o valor unitário de cada-dia multa
fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do crime.
15. O regime prisional, em razão do redimensionamento da pena e das
circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, fica mantido regime
no aberto, nos termos do artigo 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal.
16. Presentes os requisitos do artigo 44 do Código Penal, mantida a
possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por duas
restritivas de direitos, nos termos da sentença.
17. Recurso de apelação do MPF a que se nega provimento.
Ementa
PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. 241-A E 241-B, DA
LEI 8.069/90. PORNOGRAFIA INFANTIL. MATERIALIDADE, AUTORIA E
DOLO COMPROVADOS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO E DA
SUBSIDIARIEDADE. DOSIMETRIA MANTIDA. INCIDÊNCIA DA ATENUANTE DA
CONFISSÃO. SÚMULA 545 DO STJ. INCIDÊNCIA DA CONTINUIDADE DELITIVA. REGIME
INCIAL ABERTO. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS MANTIDA. RECURSO
DA ACUSAÇÃO NÃO PROVIDO.
1. A materialidade delitiva dos crimes dos artigos 241-A e 241-B da Lei
8.069/1990 restou devidamente comprovada pelo conjunto probatório produzido. O
Laudo nº 5466/2016 - NUCRIM/SETEC/SR/PF/SP (fls. 140/161) esclareceu a
forma de compartilhamento do conteúdo ilícito, asseverando que, além do
arquivo de pornografia infantil compartilhado em 17 de dezembro de 2013,
objeto da acusação I, o réu compartilhou arquivos de pornografia infantil
utilizando o programa GIGATRIBE e ARES GALAXY no período compreendido entre
27 de outubro de 2013 e 30 de setembro de 2014, objeto da acusação II, e
entre 28 de agosto de 2012 e 14 de setembro de 2014, objeto da acusação III.
2. A autoria está amplamente comprovada, por meio da confissão do réu em
juízo e dos depoimentos testemunhais, que dão conta que ele mantinha em seus
equipamentos (computador e pendrive) arquivos de pornografia infantil e que
utilizava dos programas GIGATRIBE e ARES GALAXY para baixar e disponibilizar
as imagens e vídeos de pedofilia.
3. Quanto ao dolo, revela-se totalmente infundada a justificativa de que
somente manteve diálogos com outros pedófilos com o objetivo de tentar
entender o perfil dessas pessoas para poder se defender, bem como a sua
futura família por já ter sofrido abuso sexual na infância, mormente
em face do laudo pericial que demonstra que o acusado realizou download e
compartilhou arquivos contendo pornografia infantojuvenil.
4. Aplicação dos princípios da consunção e da subsidiariedade. O artigo
241-B da Lei 8.069/1990 foi criado com o fim de resolver situação específica
de armazenamento de conteúdo pornográfico infantil, trazendo figura
subsidiária àquelas descritas no caput, do artigo 241 e no artigo 241-A
da Lei 8.069/1990, quando há provas do cometimento das condutas descritas
nestes tipos penais. Verifica-se, assim, certa subsidiariedade entre os tipos
penais em questão, decorrentes do visível intuito legislativo de "cobrir"
todas as possíveis condutas e pessoas que de alguma forma participem das
práticas delitivas. Em razão da aplicação dos princípios da consunção
e da subsidiariedade, remanesce apenas a condenação pelo crime do artigo
241-A da Lei 8.069/1990.
5. Dosimetria. Em vista da manutenção, nesta sede, da aplicação dos
princípios da consunção e da subsidiariedade, a análise da dosimetria
da pena fica restrita apenas às questões relativas ao artigo 241-A da Lei
8.069/90.
6. Primeira fase. No que se refere à primariedade, conduta social,
personalidade, motivo, circunstâncias, consequências do crime e comportamento
da vítima revelam-se normais à espécie. A exasperação da pena-base
também deve ser mantida consoante os termos da sentença, diante da
culpabilidade exacerbada do acusado, uma vez que o conteúdo dos arquivos
pornográficos diz respeito a crianças em tenra idade, inclusive, conta
com a participação de bebês envolvidos em cenas de pornografia infantil,
conforme fotografia de fl. 149, o que lesa mais gravemente o tipo penal,
ultrapassando o bem jurídico tutelado. Mantido, com base no princípio da
razoabilidade o aumento da pena-base em ¼ (um quarto).
7. Segunda fase. Deve ser mantido o reconhecimento da confissão espontânea,
uma vez que, embora tenha se dado de forma parcial, foi utilizada para formar
o convencimento do juiz, nos termos da Súmula 545 do Superior Tribunal de
Justiça.
8. Deve ser mantida, ainda, a atenuante da menoridade, nos termos do artigo
65, inciso I, do Código Penal, uma vez que o réu completou 21 (vinte e um)
anos em 13 de maio de 2015, ou seja, após a prática dos crimes.
9. Mantida a redução da pena em 1/5 (um quinto), fixando a pena
intermediária em 3 (três) anos de reclusão e pagamento de 10 (dez)
dias-multa.
10. Terceira fase. As condutas de disponibilizar e publicar material
pornográfico infantil pelo réu ocorreram em continuidade delitiva, uma
vez que o acusado praticou os delitos da mesma espécie, mediante mais de
uma ação, nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução,
nos termos do artigo 71 do Código Penal.
11. Com efeito, a conduta se prolongou por vasto período, tendo o acusado
iniciado a ação criminosa em 2012, compartilhando arquivos de pornografia
infantil por meio do programa GigaTribe, no período de 27/10/2013 a
30/09/2014, bem como pelo programa Ares Galaxy, no período de 24/08/2012
a 14/09/2014.
12. Todavia, mostra-se proporcional a fixação da fração em ¼ (um
quarto), posto que a quantidade de arquivos disponibilizados pelos programas
de compartilhamento não se mostrou tão exorbitante, pois os únicos
arquivos ativos, contendo pornografia infantojuvenil, identificados na pasta
compartilhada do programa GigaTribe, eram 3 (três) vídeos (fl. 147) e com
relação ao programa Ares Galaxy, constatou-se que pelo menos 29 (vinte e
nove) continham de fato pornografia infantil (fl. 156), além das 05 (cinco)
imagens enviadas através do chat do GigaTribe.
13. Pena definitiva do acusado mantida em 3 (três) anos e 9 (nove) meses
de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa.
14. À míngua de recurso, fica mantido o valor unitário de cada-dia multa
fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do crime.
15. O regime prisional, em razão do redimensionamento da pena e das
circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, fica mantido regime
no aberto, nos termos do artigo 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal.
16. Presentes os requisitos do artigo 44 do Código Penal, mantida a
possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por duas
restritivas de direitos, nos termos da sentença.
17. Recurso de apelação do MPF a que se nega provimento.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria,
negar provimento à apelação do Ministério Público Federal, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
04/02/2019
Data da Publicação
:
25/02/2019
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 75287
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
JUIZ CONVOCADO SILVIO GEMAQUE
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** ECA-90 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
LEG-FED LEI-8069 ANO-1990 ART-241 ART-241A ART-241B
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-545
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-65 INC-1 ART-71 ART-59 ART-33 PAR-2 PAR-3
ART-44
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/02/2019
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