TRF3 0006204-34.2014.4.03.6181 00062043420144036181
PENAL. PROCESSO PENAL. ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. ART. 171,
§ 3º, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINARES. PRESCRIÇÃO. CERCEAMENTO DE
DEFESA. INOCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. DOSIMETRIA
DA PENA.
1. O crime de estelionato qualificado (artigo 171, § 3º, do Código Penal),
é delito de natureza binária, conforme entendimento consolidado pelos
Tribunais Superiores. Será crime permanente quando praticado pelo próprio
beneficiário da Previdência Social, fluindo o prazo prescricional a partir
da cessação da permanência, ou seja, com a supressão do recebimento
indevido. Quando praticado por terceiros não beneficiários, será crime
instantâneo de efeitos permanentes, hipótese em que o termo inicial da
prescrição será a data do início do pagamento do benefício fraudulento.
2. No caso em tela, a ré foi definitivamente condenada à pena de 02 (dois)
anos, 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, contra a qual não
recorreu o parquet, aplicando-se o prazo prescricional de 08 (oito) anos,
nos termos do art. 109, inciso IV, do estatuto repressivo. O prazo deve ser
reduzido pela metade, nos termos do artigo 115 do Código Penal, considerada
a idade da ré, maior de setenta anos, na data da sentença.
3. Diante deste quadro, considerando que a ré não foi a própria
beneficiária da prestação previdenciária indevida, a pretensão punitiva
não se encontra prescrita, por não ter sido superado, entre nenhum dos marcos
interruptivos da prescrição, o lapso temporal de quatro anos. Preliminar
rejeitada.
4. A realização de perícia grafotécnica foi indeferida em virtude dessa
diligência mostrar-se desnecessária à elucidação dos fatos aqui tratados,
isto é, a busca da caracterização do delito de estelionato previdenciário,
consubstanciando-se em providência meramente protelatória. Ademais,
inexiste qualquer prejuízo à defesa, descabida, portanto, a pretensão de
nulidade do processo, sobretudo diante do disposto no art. 563, do Código
de Processo Penal ("Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade
não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa").
5. Materialidade e autoria delitivas comprovadas. Não há como se afastar a
tipicidade da conduta com fundamento na ausência de dolo de manter a Autarquia
Previdenciária em erro. Isto porque, o benefício foi recebido por mais de
10(dez) anos, mesmo sem o preenchimento dos requisitos para sua concessão,
especialmente a hipossuficiência. Ainda que a ré alegue o desconhecimento
da irregularidade, tinha como sabê-lo. Com três filhas maiores de idade,
uma delas advogada, não as consultou, fiou-se apenas na informação da
mãe da amiga e no despachante. Aliás, a afirmação de que não pediu a
orientação das filhas sobre o benefício leva a crer que foi a própria ré
quem forneceu os documentos ao despachante, inclusive porque, já era viúva
à época do requerimento. Também não consta nos autos prova alguma que
faça crer que a acusada tenha praticado a conduta típica incidindo em erro.
6. O MM. Juízo a quo fixou a pena-base no dobro do mínimo previsto
abstratamente. Reduziu a reprimenda em 1/6 (um sexto) por ser a ré maior de
(70) setenta anos de idade à data da sentença e a majorou de 1/3 (um terço)
em razão da incidência da causa de aumento de pena do artigo 171, §3º,
do Código Penal.
7. A pena-base deve ser reduzida. Na primeira fase, verifico que
a culpabilidade da ré, os motivos e as circunstâncias do crime não
extrapolam o comum em crimes dessa natureza. Não há nos autos elementos
disponíveis para que se avalie a conduta social da ré, bem como a sua
personalidade. Não há que se falar em comportamento da vítima. Ademais,
a ré não registra antecedentes criminais. Quanto às consequências do
crime, o prejuízo causado aos cofres do INSS, em valores atualizados, atinge
o montante de R$75.708,33 (setenta e cinco mil, setecentos e oito reais e
trinta e três centavos). Não obstante a ré afirme que mantém em dia o
pagamento do parcelamento administrativo negociado para a devolução dos
valores indevidamente recebidos, não trouxe a comprovação aos autos. Desta
feita, fixo a pena-base 1/4 (um quarto) acima do mínimo legal, em 01 (um)
ano e 03 (três) meses de reclusão e 12 (dez) dias-multa, que considero
suficiente para o caso concreto.
8. Na segunda fase de fixação da pena, presente a atenuante do artigo 65,
I, do Código Penal, por ser a ré maior de 70 (setenta) anos na data da
sentença, a pena deve ser reduzida de 1/6 (um sexto), fixada em 1(um)
ano e 15 (quinze) dias de reclusão e 10 (dez) dias-multa.
9. Na terceira fase, incide a causa de aumento da pena do § 3º, do artigo
171 do Código Penal. Assim, procedo ao aumento da pena impingida à acusada
em 1/3 (um terço), pelo que a torno definitiva em 01 (um) ano, 04 (quatro)
meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa.
10. Em relação do valor do dia-multa, verifico que o montante fixado em
sentença, 10 (dez) salários mínimos, mostra-se exacerbado. Assim, fixo o
valor do dia-multa em 1/2 (meio) do salário mínimo vigente à época dos
fatos.
11. Fica mantido o regime inicial aberto para o cumprimento da pena corporal.
12. Substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de
direitos, consistentes na prestação pecuniária, no valor de 10 (dez)
salários mínimos, e na prestação de serviços a entidade de assistência
social, por período equivalente ao da pena corporal, cumprida à razão de
uma hora por dia de condenação, nos termos a serem definidos pelo Juízo
da Execução.
13. Diante da nova pena concretamente aplicada, 01 (um) ano, 04 (quatro)
meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa, observa-se o
prazo prescricional de 04 (quatro) anos, nos termos do art. 109, inciso V,
do estatuto repressivo. Considerada a idade de ré, maior de setenta anos
na data da sentença, o prazo deve ser reduzido da metade, nos termos do
art. 115 do Código Penal. Assim, até a presente data, não foi superado,
entre nenhum dos marcos interruptivos da prescrição, o lapso temporal de 02
(dois) anos.
14. Preliminares rejeitadas. Apelação da defesa provida em parte, para
reduzir a pena-base, fixada definitivamente em 01 (um) ano, 04 (quatro) meses
e 20 (vinte) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa, no valor unitário
de 1/2 (meio) salário mínimo vigente à data dos fatos, substituída e
pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, consistentes
na prestação pecuniária, no valor de 10 (dez) salários mínimos, e na
prestação de serviços a entidade de assistência social, por período
equivalente ao da pena corporal, cumprida à razão de uma hora por dia de
condenação, nos termos a serem definidos pelo Juízo da Execução.
Ementa
PENAL. PROCESSO PENAL. ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. ART. 171,
§ 3º, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINARES. PRESCRIÇÃO. CERCEAMENTO DE
DEFESA. INOCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. DOSIMETRIA
DA PENA.
1. O crime de estelionato qualificado (artigo 171, § 3º, do Código Penal),
é delito de natureza binária, conforme entendimento consolidado pelos
Tribunais Superiores. Será crime permanente quando praticado pelo próprio
beneficiário da Previdência Social, fluindo o prazo prescricional a partir
da cessação da permanência, ou seja, com a supressão do recebimento
indevido. Quando praticado por terceiros não beneficiários, será crime
instantâneo de efeitos permanentes, hipótese em que o termo inicial da
prescrição será a data do início do pagamento do benefício fraudulento.
2. No caso em tela, a ré foi definitivamente condenada à pena de 02 (dois)
anos, 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, contra a qual não
recorreu o parquet, aplicando-se o prazo prescricional de 08 (oito) anos,
nos termos do art. 109, inciso IV, do estatuto repressivo. O prazo deve ser
reduzido pela metade, nos termos do artigo 115 do Código Penal, considerada
a idade da ré, maior de setenta anos, na data da sentença.
3. Diante deste quadro, considerando que a ré não foi a própria
beneficiária da prestação previdenciária indevida, a pretensão punitiva
não se encontra prescrita, por não ter sido superado, entre nenhum dos marcos
interruptivos da prescrição, o lapso temporal de quatro anos. Preliminar
rejeitada.
4. A realização de perícia grafotécnica foi indeferida em virtude dessa
diligência mostrar-se desnecessária à elucidação dos fatos aqui tratados,
isto é, a busca da caracterização do delito de estelionato previdenciário,
consubstanciando-se em providência meramente protelatória. Ademais,
inexiste qualquer prejuízo à defesa, descabida, portanto, a pretensão de
nulidade do processo, sobretudo diante do disposto no art. 563, do Código
de Processo Penal ("Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade
não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa").
5. Materialidade e autoria delitivas comprovadas. Não há como se afastar a
tipicidade da conduta com fundamento na ausência de dolo de manter a Autarquia
Previdenciária em erro. Isto porque, o benefício foi recebido por mais de
10(dez) anos, mesmo sem o preenchimento dos requisitos para sua concessão,
especialmente a hipossuficiência. Ainda que a ré alegue o desconhecimento
da irregularidade, tinha como sabê-lo. Com três filhas maiores de idade,
uma delas advogada, não as consultou, fiou-se apenas na informação da
mãe da amiga e no despachante. Aliás, a afirmação de que não pediu a
orientação das filhas sobre o benefício leva a crer que foi a própria ré
quem forneceu os documentos ao despachante, inclusive porque, já era viúva
à época do requerimento. Também não consta nos autos prova alguma que
faça crer que a acusada tenha praticado a conduta típica incidindo em erro.
6. O MM. Juízo a quo fixou a pena-base no dobro do mínimo previsto
abstratamente. Reduziu a reprimenda em 1/6 (um sexto) por ser a ré maior de
(70) setenta anos de idade à data da sentença e a majorou de 1/3 (um terço)
em razão da incidência da causa de aumento de pena do artigo 171, §3º,
do Código Penal.
7. A pena-base deve ser reduzida. Na primeira fase, verifico que
a culpabilidade da ré, os motivos e as circunstâncias do crime não
extrapolam o comum em crimes dessa natureza. Não há nos autos elementos
disponíveis para que se avalie a conduta social da ré, bem como a sua
personalidade. Não há que se falar em comportamento da vítima. Ademais,
a ré não registra antecedentes criminais. Quanto às consequências do
crime, o prejuízo causado aos cofres do INSS, em valores atualizados, atinge
o montante de R$75.708,33 (setenta e cinco mil, setecentos e oito reais e
trinta e três centavos). Não obstante a ré afirme que mantém em dia o
pagamento do parcelamento administrativo negociado para a devolução dos
valores indevidamente recebidos, não trouxe a comprovação aos autos. Desta
feita, fixo a pena-base 1/4 (um quarto) acima do mínimo legal, em 01 (um)
ano e 03 (três) meses de reclusão e 12 (dez) dias-multa, que considero
suficiente para o caso concreto.
8. Na segunda fase de fixação da pena, presente a atenuante do artigo 65,
I, do Código Penal, por ser a ré maior de 70 (setenta) anos na data da
sentença, a pena deve ser reduzida de 1/6 (um sexto), fixada em 1(um)
ano e 15 (quinze) dias de reclusão e 10 (dez) dias-multa.
9. Na terceira fase, incide a causa de aumento da pena do § 3º, do artigo
171 do Código Penal. Assim, procedo ao aumento da pena impingida à acusada
em 1/3 (um terço), pelo que a torno definitiva em 01 (um) ano, 04 (quatro)
meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa.
10. Em relação do valor do dia-multa, verifico que o montante fixado em
sentença, 10 (dez) salários mínimos, mostra-se exacerbado. Assim, fixo o
valor do dia-multa em 1/2 (meio) do salário mínimo vigente à época dos
fatos.
11. Fica mantido o regime inicial aberto para o cumprimento da pena corporal.
12. Substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de
direitos, consistentes na prestação pecuniária, no valor de 10 (dez)
salários mínimos, e na prestação de serviços a entidade de assistência
social, por período equivalente ao da pena corporal, cumprida à razão de
uma hora por dia de condenação, nos termos a serem definidos pelo Juízo
da Execução.
13. Diante da nova pena concretamente aplicada, 01 (um) ano, 04 (quatro)
meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa, observa-se o
prazo prescricional de 04 (quatro) anos, nos termos do art. 109, inciso V,
do estatuto repressivo. Considerada a idade de ré, maior de setenta anos
na data da sentença, o prazo deve ser reduzido da metade, nos termos do
art. 115 do Código Penal. Assim, até a presente data, não foi superado,
entre nenhum dos marcos interruptivos da prescrição, o lapso temporal de 02
(dois) anos.
14. Preliminares rejeitadas. Apelação da defesa provida em parte, para
reduzir a pena-base, fixada definitivamente em 01 (um) ano, 04 (quatro) meses
e 20 (vinte) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa, no valor unitário
de 1/2 (meio) salário mínimo vigente à data dos fatos, substituída e
pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, consistentes
na prestação pecuniária, no valor de 10 (dez) salários mínimos, e na
prestação de serviços a entidade de assistência social, por período
equivalente ao da pena corporal, cumprida à razão de uma hora por dia de
condenação, nos termos a serem definidos pelo Juízo da Execução.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, rejeitar as preliminares e dar parcial provimento ao apelo, para
reduzir a pena-base, fixada definitivamente em 01 (um) ano, 04 (quatro) meses
e 20 (vinte) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa, no valor unitário
de 1/2 (meio) salário mínimo vigente à data dos fatos, substituída a
pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, consistentes
na prestação pecuniária, no valor de 10 (dez) salários mínimos, e na
prestação de serviços a entidade de assistência social, por período
equivalente ao da pena corporal, cumprida à razão de uma hora por dia de
condenação, a serem definidos pelo Juízo da Execução, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
05/12/2016
Data da Publicação
:
15/12/2016
Classe/Assunto
:
ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 67102
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-109 INC-4 ART-115 ART-171 PAR-3 ART-65 INC-1
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-563
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/12/2016
..FONTE_REPUBLICACAO:
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