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Jurisprudência


TRF3 0006279-46.2006.4.03.6119 00062794620064036119

Ementa
PENAL. PROCESSO PENAL. OPERAÇÃO OVERBOX. QUADRILHA (ART. 288, CP). DESCAMINHO (ART. 334, "CAPUT", CP). CORRUPÇÃO ATIVA E PASSIVA (ARTS. 317 e 333, CP). CRIME DE QUADRILHA. IDENTIDADE DE FATOS. LITISPENDÊNCIA. EXTINÇÃO DO PROCESSO QUANTO A IMPUTAÇÃO DO ART. 288, CAPUT, DO CP. PRELIMINARES REJEITADAS. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA NÃO COMPROVADA EM RELAÇÃO A UM DOS RÉUS. ABSOLVIÇÃO. DOSIMETRIA. PENAS REDIMENSIONADAS. PENA DE MULTA READEQUADA AO SITEMA TRIFÁSICO. MAJORAÇÃO DO VALOR DO DIA-MULTA. ART. 60 DO CP. APELAÇÃO DE CORRÉ NÃO CONHECIDA POR FALTA DE INTERESSE RECURSAL. AGRAVANTE DO ART. 62, I DO CP. NÃO INCIDÊNCIA. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. - A litispendência visa evitar que uma mesma pessoa seja julgada duas vezes pelo mesmo delito (non bis in idem), ou que haja duas ações ou recursos em curso com as mesmas causas de pedir, pedido e partes, ainda que sob nova tipificação penal. Configurado o delito de quadrilha em autos próprios (ações nº 0006474-65.2005.4.03.6119 e nº 0005582-25.2006.4.03.6119), incabível nova condenação dos referidos réus pelo artigo 288 do CP a cada novo processo a que forem submetidos, sob pena de bis in idem. Extinção do processo sem apreciação do mérito em relação à imputação pelo crime de quadrilha aos denunciados CHUNG, VALTER, MARIA DE LOURDES e FABIO DA SILVA SANTOS. Prejudicada a questão atinente e incidência da qualificadora de quadrilha armada. - O delito de quadrilha é crime plurisubjetivo (ou de concurso necessário), sua configuração exige expressamente a associação de pelo menos três pessoas. Remanescendo a imputação pelo crime de quadrilha apenas em relação ao denunciado ANTONIO HENRIQUE PEREIRA LEITE, o referido delito não se configura, em face da evidente ausência de tipicidade. Por fundamento diverso, mantida a absolvição do réu ANTONIO HENRIQUE PEREIRA LEITE, da imputação do art. 288 do CP. - Preliminares arguidas pelos réus rejeitadas - Quanto aos fatos ocorridos na data de 18 de agosto 2005 e narrados na denúncia, não restaram comprovadas a autoria e materialidade delitivas em relação à imputação do crime de descaminho ao réu F.S.S.. - Absolvido o réu FABIO DA SILVA SANTOS do crime de descaminho com base no postulado do in dubio pro reo, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, haja vista não restar demonstrada a autoria delitiva. - As provas amealhadas aos autos não deixam claro que a ré MARIA DE LOURDES MOREIRA, Auditora da Receita Federal, solicitou e/ou aceitou promessa de vantagem indevida, deixando de praticar ato de ofício, consistente em fiscalizar a contento as bagagens trazidas pelas "mulas" que estavam sendo beneficiadas pela quadrilha ao entrarem no país trazendo do exterior, mercadorias sem o pagamento dos impostos devidos. - O conjunto probatório não é suficiente para a condenação da acusada MARIA DE LOURDES MOREIRA pela prática do crime de corrupção ativa. O indício e/ou suposição de oferecimento ou promessa de vantagem indevida a colega de trabalho, sem a corroboração de outros elementos durante a instrução processual, não basta para a condenação. - O conjunto probatório não é suficiente para a condenação da acusada MARIA DE LOURDES MOREIRA pelos delitos de corrupção ativa e passiva. Mantida a absolvição - O conjunto probatório demonstra à saciedade que houve a irregular internação de mercadorias estrangeiras em território nacional, originárias da China e transportadas pelo recorrente ANTONIO HENRIQUE PEREIRA LEITE no voo nº 8721, de 18 de agosto de 2005. Mantida a condenação pela pratica do delito de descaminho. - Para a condenação pela prática do crime previsto no artigo 333 do CP é prescindível que haja um oferecimento ou promessa expressa de vantagem, pois esta se infere do contexto da operação criminosa. - Distintos os tipos penais de corrupção ativa e descaminho, previstos, respectivamente, nos artigos 333 e 334 do Código Penal. A corrupção ativa não pode ser considerada como crime-meio, porquanto não é necessário para a concretização do crime de descaminho. Só o fato da entrada das mercadorias no país sem o pagamento do tributo devido, que se deu por meio de "mulas", configura o delito de descaminho. - Desnecessária a apreensão dos bens para a comprovação da materialidade do delito de descaminho e sua facilitação, uma vez que o resultado da operação policial, realizada por meio de interceptações telefônicas e vigilâncias/monitoramento dos acusados, somado à prova colhida em Juízo a atestam. - O trabalho investigativo realizado na "Operação Overbox" também se dera mediante ações controladas, expediente investigativo previsto no artigo 2º, inciso II, da Lei nº. 9.034/95, precedidas de autorização judicial. - No transcorrer de ações controladas, pela sua própria natureza de espreita investigativa, é natural que o objeto do crime se perca, de forma a individualizar que a prova da materialidade do crime, se daqueles que deixam vestígio, se faça por meio de exame pericial, nos termos do artigo 158 do Código Penal, de forma a incidir o disposto no artigo 167 do citado código. - O crime de descaminho não é daqueles que deixam vestígios, sendo desnecessário o exame de corpo de delito. - Inaplicável o princípio da insignificância, uma vez que todo o esquema para a internação das mercadorias descaminhadas envolvia "despesas" de alto custo, como o pagamento de propina para cada mala internada, "escolta", passagem aérea e hospedagem das "mulas", quantias estas desembolsadas pelos comerciantes, já que o valor dos bens internados fraudulentamente superava em muito o que haviam pago para fazer frentes àquelas "despesas". - Carece de acolhida alegação de atipicidade da conduta do corréu CHUNG CHOUL LEE pela aplicação da adequação social, porquanto não há inércia ou condescendência do Estado com relação ao crime de descaminho, cujo preceito proibitivo tutela bens jurídicos de extrema relevância, tais como a proteção ao erário público, diretamente atingido pela evasão de renda derivada das operações clandestinas ou fraudulentas, a moralidade pública com punição de importação e exportação de mercadoria proibida, bem assim a indústria e a economia nacionais, fortalecendo as barreiras alfandegárias. - O Juízo de Primeiro Grau fundamentadamente condenou o acusado CHUNG CHOUL LEE pela prática do crime de corrupção ativa. O esquema engendrado consistia, em síntese, no seguinte: o acusado mantinha contato direto com VALTER JOSÉ DE SANTANA, Agente de Polícia Federal, que em conluio com auditores da Receita Federal, agiam de forma a facilitar o contrabando/descaminho. Materialidade delitiva demonstrada. - Autoria e materialidade delitivas comprovadas. Há provas suficientes de que o recorrente VALTER JOSÉ DE SANTANA concorreu dolosamente para a prática delitiva, recebendo vantagem em razão da sua função. Deve, pois, ser mantida a sua condenação quanto ao delito previsto no artigo 317, §1º, do Código Penal. - Comporta provimento o apelo ministerial para elevar o valor de cada dia-multa de VALTER JOSÉ DE SANTANA para 03 (três) salários mínimos. Com efeito, à época dos fatos o acusado ocupava cargo público federal, na qualidade de agente de Polícia Federal, desfrutando de um padrão salarial consentâneo com o cargo ocupado, superior à maioria dos trabalhadores da esfera privada. Sem contar o valor auferido a cada internação irregular de mercadorias que facilitava. - Desconsiderada a atenuante da confissão espontânea. O recorrente CHUNG CHOUL LEE não admitiu a acusação feita contra si, como claramente se observa de seu interrogatório judicial. O denunciado tentara justificar sua conduta mediante excludente de tipicidade. - Ex officio, destinada a prestação pecuniária estabelecida aos acusados V.J.S. e ANTONIO HENRIQUE PEREIRA LEITE, substitutiva à União. - Aplicação do entendimento firmado no Supremo Tribunal Federal, que no julgamento do HC 126.292-SP reinterpretou o princípio da presunção de inocência, reconhecendo que "A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal", e em sessão de 05 de outubro de 2016 indeferiu liminares pleiteadas nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade 43 e 44, entendendo que o art. 283 do Código de Processo Penal não veda o início do cumprimento da pena após esgotadas as instâncias ordinárias. - Provida a apelação de FABIO DA SILVA SANTOS. - Parcialmente provida a apelação do Ministério Público Federal. - Parcialmente providas as apelações dos réus VALTER JOSÉ DE SANTANA, CHUNG CHOUL LEE e ANTONIO HENRIQUE PEREIRA LEITE.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, julgar extinto o processo sem apreciação do mérito em relação à imputação pelo crime de quadrilha aos denunciados CHUNG, VALTER, MARIA DE LOURDES e FABIO DA SILVA SANTOS haja vista a identidade de imputações nos autos da ação penal nº 0006474-65.2005.4.03.6119, restando prejudicada a questão atinente a incidência da qualificadora de quadrilha armada e o pleito de reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva formulado pela denunciada MARIA DE LOURDES MOREIRA; rejeitar as preliminares; dar provimento à apelação de FABIO DA SILVA SANTOS, para absolvê-lo da imputação do crime do artigo 334, "caput", do Código Penal, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código Penal, dar parcial provimento à apelação de ANTONIO HENRIQUE PEREIRA LEITE, para, mantendo a condenação pela prática do delito do artigo 334, caput, do Código Penal, redimensionar as penas fixadas em 1º grau para 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão a ser cumprida inicialmente em regime aberto e, nos termos do art. 44 do Código Penal, substituir a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consubstanciadas em uma de prestação de serviços à comunidade e uma de prestação pecuniária no valor de 3 (três) salários mínimos; dar parcial provimento à apelação de CHUNG CHOUL LEE, para, mantendo a condenação pela prática dos delitos dos artigos 334, caput e 333, parágrafo único, ambos do Código Penal, redimensionar as penas fixadas em 1º grau para 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão a ser cumprida inicialmente em regime semiaberto e 17 (dezessete) dias multa no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente à época do pagamento, corrigido monetariamente; dar parcial provimento à apelação de VALTER JOSÉ DE SANTANA, para, mantendo a condenação pela prática dos delitos dos artigos 317, § 1º do Código Penal, redimensionar as penas fixadas em 1º grau para 3 (três) anos, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão a ser cumprida inicialmente em regime semiaberto, 17 (dezessete) dias multa e, nos termos do art. 44 do Código Penal, substituir a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consubstanciadas em uma de prestação de serviços à comunidade e uma de prestação pecuniária no valor de 5 (cinco) salários mínimos; dar parcial provimento à apelação do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL para elevar o valor do dia-multa aplicado a VALTER JOSÉ DE SANTANA para 03 (três) salários mínimos; de ofício, destinar a prestação pecuniária estabelecida aos acusados ANTONIO HENRIQUE PEREIRA LEITE e VALTER JOSÉ DE SANTANA, substitutiva à União, nos termos do voto do relator; prosseguindo, a Turma, por maioria, decidiu, de ofício, por fundamento diverso da sentença, manter a absolvição de ANTONIO HENRIQUE PEREIRA LEITE da prática do crime de quadrilha, com base no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, nos termos do voto do relator, com quem votou a Des. Fed. Cecília Mello, vencido o Des. Fed. Nino Toldo que mantinha a absolvição desse réu, quanto à imputação de prática do crime de quadrilha ou bando (CP, art. 288), nos termos da sentença, ou seja, por insuficiência de provas (CPP, art. 386, VII).

Data do Julgamento : 31/01/2017
Data da Publicação : 09/02/2017
Classe/Assunto : ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 52756
Órgão Julgador : DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Observações : STF HC 126.292/SP; ADCS 43 E 44.
Referência legislativa : ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-288 ART-334 ART-333 ART-60 ART-62 INC-1 ART-158 ART-167 ART-317 PAR-1 ART-44 ***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-386 INC-7 ART-283 LEG-FED LEI-9034 ANO-1995 ART-2 INC-2 ***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-57
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/02/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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