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Jurisprudência


TRF3 0006416-08.2018.4.03.9999 00064160820184039999

Ementa
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. AGENTE BIOLÓGICO. DENTISTA. DO USO DE EPI. DA EXTENSÃO DA SUA EFICÁCIA. EXPOSIÇÃO HABITUAL E PERMANENTE. PERÍODO DE ATIVIDADE ESPECIAL MANTIDO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO CASSADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Recebida a apelação interposta pelo INSS, já que manejada tempestivamente, conforme certificado nos autos, e com observância da regularidade formal, nos termos do Código de Processo Civil/2015. 2. O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova. 3. A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações. Diante de tal evolução normativa e do princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -, reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 06.03.97); superior a 90dB (de 06.03.1997 a 17.11.2003); e superior a 85 dB, a partir de 18.11.2003. O C. STJ, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou a tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003: "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694). 4. O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria". Logo, no caso de ruído, ainda que haja registro no PPP de que o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do labor quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo como se sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuída ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia. 5. No caso dos autos, de 09/09/2012 a 12/10/2013, a parte autora era cirurgiã dentista na Irmandade da Santa casa de Misericórdia de Mococa-SP. O PPP de fls. 75/77, descreve as atividades da autora em síntese, " (...) atender e orientar pacientes; executar procedimentos odontológicos; aplicar medidas de promoção e prevenção de saúde, ações de saude coletiva, estabelecendo diagnóstico e prognóstico (...)" 6. Demais disso, o formulário legal aponta como exposição à agente de risco o "contato com pacientes e instrumentais infecto-contagiantes"(fl. 75). 7. Nesse cenário, considerando que, conforme se extrai do PPP de fls. 55/57, as atividades desenvolvidas pela autora, em ambos os períodos acima referenciados, implicavam em contato habitual e permanente com agentes biológicos considerados nocivos pela legislação de regência, devem tais interregnos, ser enquadrados como especiais. 8. Embora o PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 65/72 seja mais conciso em suas informações, consta dos autos laudo técnico de condições ambientais do trabalho, elaborado e assinado por técnico de segurança do trabalho (fls. 180/446), o qual constatou a exposição da parte autora a vírus e bactérias, além de ruído 94dB e radiação ionizantes (Raio-X) durante o labor na condição de cirurgiã-dentista. Há registro igualmente de contato com sangue e materiais/equipamentos contaminados (fl.324) 9. Em ambos os interregnos sob análise restou também comprovado o recolhimento das contribuições previdenciárias no período na qualidade, respectivamente, de empregado, consoante planilhas extraídas do sistema informatizado CNIS, que ora determino a juntada (fls. 123/137 e 143/153). 10. Não se vislumbra qualquer mácula ao direito da parte autora, ainda que tenha recolhido em concomitância como contribuinte individual, condição que, diga-se, por si só, não é óbice ao reconhecimento das atividades especiais exercidas pelo trabalhador autônomo (REsp nº 1.436.794-SC), desde que conjugadas a fatores outros. 11. Constando da documentação juntada pela parte que o segurado ficava exposto a agente nocivo acima do limite de tolerância, deve-se concluir que tal exposição era, nos termos do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência Social, habitual, não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço. 12. Não se pode exigir menção expressa, no formulário, a habitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, já que no modelo de PPP concebido pelo INSS não existe campo específico para tanto. 13. Os elementos residentes nos autos revelam que a exposição da parte autora a agentes nocivos era inerente à atividade que ela desenvolvia, donde se conclui que tal exposição deve ser considerada permanente, nos termos do artigo 65, do RPS, o qual, consoante já destacado, reputa trabalho permanente "aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço". 14. Não se exige, portanto, que o trabalhador se exponha durante todo o período da sua jornada ao agente nocivo, o que interdita o acolhimento da alegação autárquica em sentido contrário. 15. Apresentando o segurado um PPP que indique sua exposição a um agente nocivo, e inexistindo prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era efetivamente capaz de neutralizar a nocividade do ambiente laborativo, a configurar uma dúvida razoável no particular, deve-se reconhecer o labor como especial. 16. O fato de o PPP consignar que o EPI é eficaz não significa que ele seja capaz de neutralizar a nocividade, tal como exigido pelo E. STF para afastar a especialidade do labor. 18. O fornecimento de EPI não é suficiente a afastar o malefício do ambiente de trabalho quando se tratar de agente nocivo qualitativo, tendo em vista a própria natureza deste, cuja ofensividade decorre da sua simples presença no ambiente de trabalho, não havendo limites de tolerância ou doses como parâmetro configurador da insalubridade, tampouco como se divisar que o EPI ou EPC possa neutralizá-la. Isso, no mais das vezes, é reconhecido pelo próprio INSS. 19. O artigo 201, §7º, I, da Constituição Federal confere ao segurado o direito a aposentadoria por tempo de contribuição integral quando ele conta com 35 anos de contribuição, independentemente da sua idade. 20. No caso dos autos, o INSS indeferiu a aposentadoria por tempo de contribuição pleiteada pela parte autora 27 anos 03 meses e 28 dias de tempo de contribuição, quando o mínimo necessário para tanto seria 30 anos (fl. 88). 21. Assim, mesmo considerando que, o período reconhecido como especial nesse feito, de 06/03/1997 a 01/09/1999 e de 23/03/2001 a 17/08/2010, quando convertido em comum resulta em um acréscimo de 02 anos 04 meses e 16 dias, conforme tabela que ora determino seja anexada, tem-se que a parte autora soma 29 anos 07 meses e 44 dias de contribuição o que é insuficiente para concessão do benefício da aposentadoria por tempo de contribuição deferida na origem, a qual deve ser cassada. 22. Diante do parcial provimento do recurso do INSS, sucumbindo, todavia, em parte mínima de seu pleito na apelação porque mantido o reconhecimento de trabalho em condições especiais do período de 06/03/1997 a 01/09/1999 e 23/01/2001 a 17/08/2010, revogando-se, entretanto, a aposentadoria por tempo de contribuição, a parte autora deve arcar com as despesas processuais, na forma do artigo 85, do CPC/15. 23. Por tais razões, com base no referido artigo, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios aos patronos do INSS, que fixo em 10% do valor atualizado da causa, considerando que não se trata de causa de grande complexidade, mas sim repetitiva, o que facilita o trabalho realizado pelo advogado, diminuindo o tempo exigido para o seu serviço. 24. Vencida no que tange à revogação da aposentadoria da parte autora, a ela incumbe o pagamento de honorários advocatícios, no particular, fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ). 25. Apelação do INSS parcialmente provida para manter o reconhecimento como atividade especial do período de 06/03/1997 a 01/09/1999 e 23/01/2001 a 17/08/2010 e, todavia, cassar a aposentadoria por tempo de contribuição.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS para manter o reconhecimento como atividade especial do período de 06/03/1997 a 01/09/1999 e 23/01/2001 a 17/08/2010, mas cassar a aposentadoria por tempo de contribuição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 30/07/2018
Data da Publicação : 16/08/2018
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2295758
Órgão Julgador : SÉTIMA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/08/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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