main-banner

Jurisprudência


TRF3 0006506-67.2009.4.03.6107 00065066720094036107

Ementa
DIREITO PENAL. PROCESSUAL PENAL. ART. 33 C.C. O ART. 40, INCISO I, AMBOS DA LEI N. 11.343/2006. PRELIMINARES AFASTADAS. MÉRITO. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO. MATERIALIDADE, AUTORIA E ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO SUFICIENTEMENTE COMPROVADOS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE RECONDUZIDA AO MÍNIMO LEGAL. PEQUENA QUANTIDADE DE ENTORPECENTE. CONFISSÃO NÃO RECONHECIDA. TRANSNACIONALIDADE DO DELITO MANTIDA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 33, PARÁGRAFO 4º, DA LEI 11.343/2006. DIMINUIÇÃO EM 1/6 (UM SEXTO). REGIME INICIAL SEMIABERTO FIXADO. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. SENTENÇA REFORMADA. - Preliminar. Competência da Justiça Federal. O conjunto probatório desvela a transnacionalidade do delito. Com efeito, foi aprendido em poder do Recorrente um Cartão de Entrada no Brasil emitido pela Polícia Federal, evidenciando-se que ele ingressara no País pela fronteira seca com a Bolívia. Além disso, os policiais militares rodoviários responsáveis pelo encontro da droga em poder do réu, inquiridos em juízo, sob o crivo do contraditório, afirmaram que ele esclareceu, na ocasião da prisão em flagrante, ter adquirido a droga em Puerto Suares, na Bolívia, e iria transportá-la até Uberlândia/MG, evidenciando-se a internacionalidade de sua conduta. Não fosse o suficiente, o próprio réu revelou o itinerário percorrido para a consecução da atividade delituosa, relatando, perante a i. Autoridade Policial, que recebeu a mala em Puerto Soares, na Bolívia, de uma pessoa cuja qualificação ignora, para transportá-la até a Cidade de Uberlândia/MG. - Preliminar. Alegação de ausência de análise da tese defensiva (erro de tipo). Não cabimento. O aresto objurgado apreciou os pontos relevantes da controvérsia explicitando, com clareza, objetividade e coerência, as razões do julgamento. A decisão se acha motivada e enfrentou os argumentos, deduzidos pelo Recorrente nas alegações finais que, em seu entendimento, seriam capazes de infirmar a condenação. Assinale-se também que o juiz não fica obrigado a manifestar-se sobre todas as alegações das partes, nem a ater-se aos fundamentos indicados por elas ou a responder, um a um, a todos os seus argumentos, quando já encontrou motivo suficiente para fundamentar a decisão, o que de fato ocorreu (STJ: AgInt nos EDcl no REsp 1.610.756/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, j. 02/10/2018). - Preliminar. Alegação de nulidade da sentença pela ausência de intimação do réu para a audiência de instrução e julgamento. Não cabimento. Compulsando os autos, verifica-se que o Poder Judiciário adotou todas as providências para efetuar-se a intimação do Recorrente para a aludida solenidade. No mais, verifica-se que o acusado foi regularmente citado do teor do processo-crime instaurado e apresentou resposta à acusação. Deste modo, tinha ele ciência do processo judicial que tramitava em seu desfavor e da obrigação legal de informar eventual alteração em seu endereço residencial. - Mérito. A materialidade delitiva restou amplamente comprovada por meio do laudo de exame pericial químico-toxicológico e pelos demais documentos apreendidos em poder do Recorrente. - A autoria e o elemento subjetivo do tipo (dolo direto) restaram devidamente demonstrados, uma vez que a prova testemunhal e o laudo pericial produzido, corroborados pelo flagrante delito, endossam os fatos descritos na r. exordial incoativa. O réu é pessoa com grau de estudo (terceiro grau incompleto) suficiente para saber que a grande quantia financeira envolvida no transporte da bagagem, o forte odor dela exalado e as condições da viagem são circunstâncias que indicam o transporte de drogas. - Dosimetria da pena. Primeira fase. Considerando os patamares utilizados por esta C. 11ª Turma, o aumento aplicado pela sentença objurgada em razão da quantidade de droga apreendida (pouco mais de um quilo de Cocaína) mostra-se inadequado, razão pela qual, a pena deve permanecer no patamar mínimo legal. - Segunda fase. A confissão, a despeito de ser voluntária ou espontânea, deve ser concedida ao réu quando for utilizada para a formação do convencimento do julgador na sentença (Súmula 500, do STJ). No caso concreto, entretanto, o Apelante, em momento, algum confessou a internacionalização da droga no país, limitando-se a dizer que recebeu uma mala de um desconhecido, sem ter ciência acerca de seu conteúdo. Portanto, a assertiva do réu não foi, em momento algum, utilizada para a formação do convencimento do julgador, e, bem por isso, não deve ser reconhecida como benefício apto a reduzir a reprimenda. - Terceira fase. Aumento da pena pela transnacionalidade (art. 40, inciso I, da Lei nº 11.343/2006). Apreensão de Cartão de Entrada no Brasil emitido pela Polícia Federal, evidenciando-se que o Recorrente ingressou pela fronteira seca com a Bolívia. Não fosse o suficiente, o próprio réu admite, em seu interrogatório judicial, que trouxe a mala daquele país e que deveria entregá-la em Minas Gerais. Mantida a fração de 1/6 (um sexto). - A sentença deve ser reformada, entretanto, para aplicar-se o benefício do art. 33, § 4º, da Lei Federal nº 11.343/2006. Primeiramente, há de se ressaltar que os fins econômicos do transporte de droga demonstram a existência de uma atividade ou de uma organização criminosa necessariamente subjacente. Diferente seria a hipótese daquele que transporta drogas para entregar a terceiros, por questões divorciadas de qualquer sentido econômico, situação que, de plano, ensejaria a aplicação da causa de diminuição em questão. No caso em tela, é fato que o Apelante aderiu de modo eventual às atividades da organização criminosa com o objetivo de efetivar o crime de tráfico de drogas que estava em curso quando de sua prisão em flagrante, mesmo que se considere que sua participação estava adstrita ao transporte da substância entorpecente. A discussão concentra-se, então, se existem elementos que indiquem seu pertencimento à organização criminosa, ou seja, diferenciar se tal adesão se deu de maneira absolutamente pontual e específica, ou, se ao contrário, denota-se participação com vínculo mínimo de estabilidade, conhecimento a respeito da organização e pertencimento ao grupo criminoso. O fato de ter aceitado prestar um serviço à organização criminosa, in casu, o transporte da droga, não significa, por si só, que o transportador seja um membro desta organização e, no caso concreto, não existem provas ou quaisquer indícios de efetivo pertencimento à organização criminosa. Note-se que foi apreendido pouco mais de um quilo de Cocaína com o ora Apelante, logo após ingressar no País pela fronteira com a Bolívia, o qual revelou que havia sido contratado por um desconhecido para fazer o transporte da mala por US$ 700,00 (setecentos dólares americanos). Tais circunstâncias, evidenciadas pelo modus operandi utilizado, indicam que se está diante da chamada "mula", pessoa contratada de maneira pontual com o objetivo único de efetuar o transporte de entorpecentes. Estas pessoas, via de regra, não possuem a propriedade da droga nem auferem lucro direto com a sua venda, não tendo maior adesão ou conhecimento profundo sobre as atividades da organização criminosa subjacente, limitando-se a transportar drogas a um determinado destino. Não existem dados, tampouco, de realização de outras viagens internacionais em nome do réu, o que também indica que sua atuação como "mula" ocorreu de forma esporádica e eventual, diferenciando-se do traficante profissional que se utiliza do transporte reiterado de drogas como meio de vida. Em vista desses fundamentos, entendo cabível, no caso concreto, a aplicação da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006. - Regime inicial. Para determinação do regime inicial, deve-se observar o artigo 33, parágrafos 2º e 3º, do Código Penal, e o artigo 59 do mesmo Codex, de forma que a fixação do regime inicial adeque-se às circunstâncias do caso concreto. Ressalte-se que, especificamente quanto ao delito de tráfico ilícito de drogas, também se considerará a natureza e quantidade de entorpecentes como fundamentação idônea para a fixação do regime inicial para cumprimento de pena, nos termos do artigo 42 da Lei 11.343/2006. In casu, tem-se que a pena privativa de liberdade foi fixada em 04 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, e, sendo o réu primário, ensejaria, via de regra, a fixação no regime inicial SEMIABERTO, nos termos do artigo 33, § 2º, alínea b, do Código Penal. Analisando as circunstâncias previstas no art. 59 do Código Penal e art. 42 da Lei 11.343/2006, verifica-se que, no caso concreto, especificamente para fins de fixação de regime, não são negativas as condições pessoais do acusado, as circunstâncias e consequências do crime, tampouco a natureza e quantidade de droga apreendidas (pouco mais de um quilo de cocaína) são anormais à espécie delitiva. Diante disso, não existem razões para que seja aplicado regime inicial de cumprimento de pena mais gravoso que a regra legal geral, qual seja, regime inicial SEMIABERTO. - Ausentes os requisitos previstos no artigo 44 e incisos do Código Penal, impossível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. - Execução provisória da pena. Exauridos os recursos cabíveis perante esta Corte, mesmo que ainda pendente o julgamento de recursos interpostos perante as Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), deve ser expedida Carta de Sentença, bem como comunicação ao juízo de origem, a fim de que se inicie, provisoriamente, a execução da pena imposta por meio de acórdão condenatório exarado em sede de Apelação. Em havendo o trânsito em julgado, hipótese em que a execução será definitiva, ou no caso de já ter sido expedida guia provisória de execução, tornam-se desnecessárias tais providências. Prejudicada, portanto, a questão relativa ao direito de recorrer em liberdade. - Sentença reformada, em parte. Desprovida a Apelação do Ministério Público Federal. Provida, em parte, a Apelação do réu, para reduzir a pena-base referente ao delito de tráfico transnacional de drogas e aplicar a causa especial de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei Federal nº 11.343/2006, fixando-se a pena em 04 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, a ser inicialmente cumprida no regime SEMIABERTO, e no pagamento de 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa, fixados estes em 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal e DAR PARCIAL PROVIMENTO à Apelação de FRANS REINALDO POLANCO para reformar, em parte, a sentença penal condenatória, reduzir a pena-base referente ao delito de tráfico transnacional de drogas e aplicar a causa especial de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei Federal nº 11.343/2006, fixando-se a pena definitiva em 04 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, a ser inicialmente cumprida no regime SEMIABERTO, e no pagamento de 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa, fixados estes em 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos, confirmada, no mais, a r. sentença penal condenatória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 05/02/2019
Data da Publicação : 15/02/2019
Classe/Assunto : Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 57567
Órgão Julgador : DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA LEG-FED SUM-500 ***** LDR-06 LEI DE DROGAS LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-33 PAR-4 ART-40 INC-1 ART-42 ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-33 PAR-2 PAR-3 ART-44 ART-59
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/02/2019 ..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão