TRF3 0006539-11.2015.4.03.6119 00065391120154036119
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL
DE DROGAS. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA
E DOLO DEMONSTRADOS. ERRO DE TIPO NÃO COMPROVADO. DOSIMETRIA DA
PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA. CO-CULPABILIDADE NÃO
RECONHECIDA. INCIDÊNCIA DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ARTIGO 33, §
4º, DA LEI 11.343/2006. CAUSA DE AUMENTO DECORRENTE DA TRANSNACIONALIDADE
FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. REGIME SEMIABERTO. APELAÇÃO DA ACUSAÇÃO NÃO
PROVIDA. APELAÇÃO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A materialidade, autoria e dolo restaram comprovados nos autos.
2. Não há como admitir a veracidade de que a ré foi contratada para
transportar dinheiro de um continente para outro e ainda receberia pagamento
de quinhentos milhões de bolívares venezuelanos e sequer sabia o que
transportava na mala.
3. As evidências são muitas, logo não merece guarida o pleito defensivo
pela absolvição da ré, ante a atipicidade da conduta a ela imputada, em
razão da configuração de erro de tipo ou, ao menos, ante a fundada dúvida
sobre a sua existência, nos termos do artigo 20, caput, do Código Penal, a
teor do disposto no art. 386, VI, do CPP, bem como de inexistência de prova.
4. No mínimo, a apelante agiu com dolo eventual, aceitando transportar
uma mala que lhe foi entregue por uma pessoa que conhecia há alguns dias,
de um continente para outro.
5. Dosimetria. Primeira fase.
6. Trata-se de apelante primária, que não ostenta maus antecedentes, bem
como as demais circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não
lhe são desfavoráveis.
7. Considerando a natureza e quantidade da droga, 8.719g (oito mil,
setecentos e dezenove gramas) de cocaína, com fundamento no art. 42 da Lei
n.º 11.343/06, resta mantida a pena na primeira fase em 7 (sete) anos de
reclusão e 700 (setecentos) dias-multa.
8. Segunda fase da dosimetria.
9. Não houve confissão espontânea. Como a acusada não confessou a
prática delitiva, mostra-se inaplicável ao caso a atenuante da confissão
espontânea.
10. Mesmo que o Estado deixe de prestar a devida assistência aos seus
cidadãos (e, em especial, à determinada parcela da sociedade), isso,
por si só, não justificativa ou autoriza a prática delitiva, na medida
em tal carência é insuficiente para afastar a consciência da ilicitude
e a capacidade de autodeterminação do indivíduo, cujo móvel pode ser
questionado, mas não eliminado da equação da análise da culpabilidade.
11. Pena mantida como na primeira fase, em 7 (sete) anos de reclusão e 700
(setecentos) dias-multa.
12. Terceira fase da dosimetria.
13. Mantida a majoração da pena em decorrência da causa de aumento prevista
no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06 (transnacionalidade do delito),
no percentual mínimo de 1/6 (um sexto).
14. Para a aplicação da causa de aumento da transnacionalidade do tráfico
é irrelevante a distância da viagem realizada, pois a finalidade não é a
disseminação do tráfico pelos lugares por onde o réu passaria, mas apenas
a entrega da droga no destino. Em consequência, não há afetação maior
do bem jurídico tutelado em razão de ser maior ou menor a distância a ser
percorrida, até porque o dano à coletividade não depende da distância,
mas à quantidade de pessoas que efetivamente recebem a droga.
15. Aplicada a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei
n.º 11.343/06, pois trata-se de apelante primária, que não ostenta
maus antecedentes. Não há prova nos autos de que se dedica a atividades
criminosas, nem elementos para concluir que integra organização criminosa,
apesar de encarregada do transporte da droga. Certamente, estava a serviço
de bando criminoso internacional, o que não significa, porém, que fosse
integrante dele. Portanto, faz jus à aplicação da referida causa de
diminuição, entretanto, no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), pois se
associou, de maneira eventual e esporádica, a uma organização criminosa de
tráfico internacional de drogas. Pena definitivamente fixada em 6 (seis)
anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e pagamento de 680
(seiscentos e oitenta) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo, vigente na data dos fatos.
16. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus
n.º 111840, em 27 de junho de 2012, deferiu, por maioria, a ordem e declarou
incidenter tantum a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei nº
8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/2007, motivo pelo qual o
regime inicial de cumprimento de pena deve ser fixado nos termos do art. 33,
§ 2º, "b", e § 3º do Código Penal.
17. Trata-se de ré primária, que não ostenta maus antecedentes, bem como
não existem circunstâncias judiciais desfavoráveis, nos termos do art. 59
do Código Penal. A pena-base foi majorada apenas em razão da quantidade
e natureza da droga apreendida, nos termos do art. 42 da Lei de Drogas,
e a pena definitiva fixada 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias
de reclusão, o que não impede seja fixado o regime inicial semiaberto,
em razão da quantidade da pena, com fundamento no art. 33, § 2º, "b"
e § 3º, do Código Penal.
18. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, tendo em vista que a pena definitiva aplicada supera
quatro anos de reclusão, não se encontrando preenchidos os requisitos do
art. 44 do Código Penal.
19. O pedido de aguardar o julgamento do recurso em liberdade fica prejudicado
com o presente julgamento da apelação. Ainda que assim não se entenda,
a ré respondeu presa ao processo e, no sentido de que não tem direito de
apelar em liberdade o réu que, justificadamente, respondeu preso ao processo
situa-se o entendimento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal
de Justiça: STF, 1ª Turma, HC 92612/PI, Rel.Min. Ricardo Lewandowski,
j. 11/03/2008, DJe 10/04/2008; STF, 1ª Turma, HC 98464/SP, Rel.Min. Carlos
Britto, j. 03/11/2009, DJe 03/12/2009; STJ, 5a Turma, HC 60073-SP, DJU
18.12.2006 p.428; STJ, 5a Turma, HC 59732-SP, DJU 30.10.2006 p.356. Da mesma
forma e pelos mesmos fundamentos, inviável a prisão domiciliar.
20. Apelação da acusação a que se nega provimento. Apelação da defesa
parcialmente provida.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL
DE DROGAS. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA
E DOLO DEMONSTRADOS. ERRO DE TIPO NÃO COMPROVADO. DOSIMETRIA DA
PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA. CO-CULPABILIDADE NÃO
RECONHECIDA. INCIDÊNCIA DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ARTIGO 33, §
4º, DA LEI 11.343/2006. CAUSA DE AUMENTO DECORRENTE DA TRANSNACIONALIDADE
FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. REGIME SEMIABERTO. APELAÇÃO DA ACUSAÇÃO NÃO
PROVIDA. APELAÇÃO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A materialidade, autoria e dolo restaram comprovados nos autos.
2. Não há como admitir a veracidade de que a ré foi contratada para
transportar dinheiro de um continente para outro e ainda receberia pagamento
de quinhentos milhões de bolívares venezuelanos e sequer sabia o que
transportava na mala.
3. As evidências são muitas, logo não merece guarida o pleito defensivo
pela absolvição da ré, ante a atipicidade da conduta a ela imputada, em
razão da configuração de erro de tipo ou, ao menos, ante a fundada dúvida
sobre a sua existência, nos termos do artigo 20, caput, do Código Penal, a
teor do disposto no art. 386, VI, do CPP, bem como de inexistência de prova.
4. No mínimo, a apelante agiu com dolo eventual, aceitando transportar
uma mala que lhe foi entregue por uma pessoa que conhecia há alguns dias,
de um continente para outro.
5. Dosimetria. Primeira fase.
6. Trata-se de apelante primária, que não ostenta maus antecedentes, bem
como as demais circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não
lhe são desfavoráveis.
7. Considerando a natureza e quantidade da droga, 8.719g (oito mil,
setecentos e dezenove gramas) de cocaína, com fundamento no art. 42 da Lei
n.º 11.343/06, resta mantida a pena na primeira fase em 7 (sete) anos de
reclusão e 700 (setecentos) dias-multa.
8. Segunda fase da dosimetria.
9. Não houve confissão espontânea. Como a acusada não confessou a
prática delitiva, mostra-se inaplicável ao caso a atenuante da confissão
espontânea.
10. Mesmo que o Estado deixe de prestar a devida assistência aos seus
cidadãos (e, em especial, à determinada parcela da sociedade), isso,
por si só, não justificativa ou autoriza a prática delitiva, na medida
em tal carência é insuficiente para afastar a consciência da ilicitude
e a capacidade de autodeterminação do indivíduo, cujo móvel pode ser
questionado, mas não eliminado da equação da análise da culpabilidade.
11. Pena mantida como na primeira fase, em 7 (sete) anos de reclusão e 700
(setecentos) dias-multa.
12. Terceira fase da dosimetria.
13. Mantida a majoração da pena em decorrência da causa de aumento prevista
no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06 (transnacionalidade do delito),
no percentual mínimo de 1/6 (um sexto).
14. Para a aplicação da causa de aumento da transnacionalidade do tráfico
é irrelevante a distância da viagem realizada, pois a finalidade não é a
disseminação do tráfico pelos lugares por onde o réu passaria, mas apenas
a entrega da droga no destino. Em consequência, não há afetação maior
do bem jurídico tutelado em razão de ser maior ou menor a distância a ser
percorrida, até porque o dano à coletividade não depende da distância,
mas à quantidade de pessoas que efetivamente recebem a droga.
15. Aplicada a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei
n.º 11.343/06, pois trata-se de apelante primária, que não ostenta
maus antecedentes. Não há prova nos autos de que se dedica a atividades
criminosas, nem elementos para concluir que integra organização criminosa,
apesar de encarregada do transporte da droga. Certamente, estava a serviço
de bando criminoso internacional, o que não significa, porém, que fosse
integrante dele. Portanto, faz jus à aplicação da referida causa de
diminuição, entretanto, no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), pois se
associou, de maneira eventual e esporádica, a uma organização criminosa de
tráfico internacional de drogas. Pena definitivamente fixada em 6 (seis)
anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e pagamento de 680
(seiscentos e oitenta) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo, vigente na data dos fatos.
16. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus
n.º 111840, em 27 de junho de 2012, deferiu, por maioria, a ordem e declarou
incidenter tantum a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei nº
8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/2007, motivo pelo qual o
regime inicial de cumprimento de pena deve ser fixado nos termos do art. 33,
§ 2º, "b", e § 3º do Código Penal.
17. Trata-se de ré primária, que não ostenta maus antecedentes, bem como
não existem circunstâncias judiciais desfavoráveis, nos termos do art. 59
do Código Penal. A pena-base foi majorada apenas em razão da quantidade
e natureza da droga apreendida, nos termos do art. 42 da Lei de Drogas,
e a pena definitiva fixada 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias
de reclusão, o que não impede seja fixado o regime inicial semiaberto,
em razão da quantidade da pena, com fundamento no art. 33, § 2º, "b"
e § 3º, do Código Penal.
18. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, tendo em vista que a pena definitiva aplicada supera
quatro anos de reclusão, não se encontrando preenchidos os requisitos do
art. 44 do Código Penal.
19. O pedido de aguardar o julgamento do recurso em liberdade fica prejudicado
com o presente julgamento da apelação. Ainda que assim não se entenda,
a ré respondeu presa ao processo e, no sentido de que não tem direito de
apelar em liberdade o réu que, justificadamente, respondeu preso ao processo
situa-se o entendimento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal
de Justiça: STF, 1ª Turma, HC 92612/PI, Rel.Min. Ricardo Lewandowski,
j. 11/03/2008, DJe 10/04/2008; STF, 1ª Turma, HC 98464/SP, Rel.Min. Carlos
Britto, j. 03/11/2009, DJe 03/12/2009; STJ, 5a Turma, HC 60073-SP, DJU
18.12.2006 p.428; STJ, 5a Turma, HC 59732-SP, DJU 30.10.2006 p.356. Da mesma
forma e pelos mesmos fundamentos, inviável a prisão domiciliar.
20. Apelação da acusação a que se nega provimento. Apelação da defesa
parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, em negar provimento à apelação da acusação e dar
parcial provimento à apelação da defesa, para reconhecer a causa especial
de diminuição de pena prevista no artigo 33, §4° da Lei n° 11.343/2006,
fixando a pena de CARMEN CECILIA GRACIA RENGEL em 6 (seis) anos, 9 (nove)
meses e 20 (vinte) dias de reclusão e pagamento de 680 (seiscentos e oitenta)
dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo,
vigente na data dos fatos e determinar o regime prisional inicial semiaberto,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Data do Julgamento
:
14/06/2016
Data da Publicação
:
23/06/2016
Classe/Assunto
:
ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 65852
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/06/2016
..FONTE_REPUBLICACAO:
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