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Jurisprudência


TRF3 0006794-76.2009.4.03.9999 00067947620094039999

Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA CITRA PETITA. JULGAMENTO EM SEGUNDO GRAU. CAUSA MADURA. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO. ATIVIDADE ESPECIAL. MOTORISTA DE ÔNIBUS. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. BENEFÍCIO CONCEDIDO. TERMO INICIAL. DATA DA CITAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TERMO FINAL PARA A SUA INCIDÊNCIA. DATA DA PROLAÇÃO DA SENTENÇA. ISONOMIA CONSTITUCIONAL. PRECEDENTES DA TURMA. SENTENÇA ANULADA DE OFÍCIO. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PREJUDICADA. 1 - Pretende a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural, no período de 04/04/1963 a 14/10/1971. Além disso, pretende ver reconhecida a especialidade do trabalho desempenhado como motorista, nos períodos de 10/07/1972 a 09/05/1974, 10/05/1974 a 30/09/1975, 02/10/1975 a 01/04/1976, 07/03/1977 a 08/03/1978, 01/07/1978 a 13/12/1978, 12/02/1979 a 01/04/1980, 23/07/1980 a 06/09/1984, 01/03/1986 a 16/05/1986, 02/06/1998 a 06/02/2002 e 17/05/2002 a 17/03/2003. 2 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC/2015. Em sua decisão, o juiz a quo entendeu não ser devido o benefício previdenciário vindicado nos autos ao fundamento de que caberia ao trabalhador rural, no caso, comprovar o recolhimento de contribuições aos cofres da Previdência, relativas ao período que pretende ver reconhecido, o que não teria sido feito, resultando na ausência de cumprimento da carência exigida. Deixou, entretanto, de analisar o pedido do autor de reconhecimento da especialidade do labor desempenhado na condição de motorista, nos interregnos descritos na exordial. Desta forma, a sentença é citra petita, porquanto não analisou pedido expressamente formulado na inicial, restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015. O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil. 3 - Quanto ao alegado labor rural, cumpre salientar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça. 4 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado. 5 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea. 6 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII. 7 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. Precedentes jurisprudenciais. 8 - As pretensas provas materiais juntadas aos autos, a respeito do labor no campo do autor, são: a) Certidão, emitida pela Secretaria da Segurança Pública - Departamento de Identificação -, atestando que o autor "ao requerer Carteira de Identidade em 08/3/1971, (...) declarou ter a profissão de 'LAVRADOR'"; b) Certificado de Dispensa de Incorporação, datado de 26/12/1969, no qual consta a profissão de "lavrador" como sendo aquela exercida pelo autor; c) Declaração de Exercício de Atividade Rural, emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santa Fé do Sul, relativa aos períodos de 04/04/1963 a 30/09/1966 e de 01/10/1966 a 14/10/1971. 9 - A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino desde 04/04/1963 (quando o autor completou 14 anos de idade) até 14/10/1971, conforme requerido na exordial. 10 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. Precedente do STJ. 11 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor. 12 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ. 13 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais. 14 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais. 15 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região. 16 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais. 17 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. 18 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91. 19 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça. 20 - Compulsando os autos, verifica-se que a autarquia previdenciária reconheceu a especialidade do labor desempenhado nos períodos de 10/05/1974 a 30/09/1975 e 23/07/1980 a 06/09/1984 ("resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição"), motivo pelo qual referidos lapsos devem ser tidos, na verdade, como incontroversos. 21 - Para comprovar que suas atividades, nos períodos de 10/07/1972 a 09/05/1974, 02/10/1975 a 01/04/1976, 07/03/1977 a 08/03/1978, 01/07/1978 a 13/12/1978 e 01/03/1986 a 16/05/1986 foram exercidas em condições especiais, o autor coligiu aos autos a sua própria CTPS, a qual revela ter laborado para as seguintes empresas (e exercendo as seguintes funções), respectivamente: "Viação Esplanada Ltda", como "motorista/transporte coletivo"; "Turismo São Bernardo S/A", como "motorista/transporte coletivo rodoviário"; "Libertur Transportes e Turismo Ltda", como "motorista/transporte em ônibus" (07/03/1977 a 08/03/1978 e 01/07/1978 a 13/12/1978); e "Ueti Turismo Ltda", como "motorista/transporte coletivo". 22 - A documentação apresentada evidencia o trabalho como motorista de ônibus nos períodos descritos, cabendo ressaltar que a ocupação do requerente encontra subsunção no Código 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e no Código 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79, sendo passível de reconhecimento como atividade especial pelo mero enquadramento da categoria profissional até 28/04/1995. 23 - Pelo mesmo fundamento acima exposto, resta inviável o reconhecimento pretendido pelo autor no que diz respeito aos períodos de 12/02/1979 a 01/04/1980, de 02/06/1998 a 06/02/2002 e de 17/05/2002 a 17/03/2003; o primeiro, por não ter sido comprovado o labor como motorista de ônibus/caminhão, a permitir o enquadramento na legislação aplicável; os demais, em razão da ausência de demonstração, por meio da documentação exigida (laudo técnico ou PPP), da efetiva submissão a agentes prejudiciais à saúde e à integridade física, considerando não ser cabível, em tais períodos, o reconhecimento da atividade especial pelo mero enquadramento da atividade. 24 - Enquadrados como especiais os períodos de 10/07/1972 a 09/05/1974, 02/10/1975 a 01/04/1976, 07/03/1977 a 08/03/1978, 01/07/1978 a 13/12/1978 e 01/03/1986 a 16/05/1986. 25 - A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal. 26 - Somando-se o labor rural (04/04/1963 a 14/10/1971) e a atividade especial (10/07/1972 a 09/05/1974, 02/10/1975 a 01/04/1976, 07/03/1977 a 08/03/1978, 01/07/1978 a 13/12/1978 e 01/03/1986 a 16/05/1986), reconhecidos nesta demanda, aos demais períodos considerados incontroversos ("resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição" e CTPS), verifica-se que o autor, na data da citação (03/10/2007), perfazia 37 anos, 08 meses e 04 dias de serviço, o que lhe assegura, a partir daquela data, o direito à percepção do benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, não havendo que se falar em aplicação do requisito etário, nos termos do art. 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal. 27 - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação do ente autárquico na presente demanda (03/10/2007), momento em que consolidada a pretensão resistida, e conforme, ademais, expresso requerimento contido na exordial. 28 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento. 29 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante. 30 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça. 31 - O termo ad quem a ser considerado continua sendo a data da prolação da sentença, ainda que reformada. E isso se justifica pelo princípio constitucional da isonomia. Na hipótese de procedência do pleito em 1º grau de jurisdição e sucumbência da autarquia previdenciária, o trabalho do patrono, da mesma forma que no caso de improcedência, perdura enquanto não transitada em julgado a decisão final. O que altera são, tão somente, os papéis exercidos pelos atores judicias que, dependendo da sorte do julgamento, ocuparão polos distintos em relação ao que foi decidido. Portanto, não se afigura lógico e razoável referido discrímen, a ponto de justificar o tratamento diferenciado, agraciando com maior remuneração profissionais que exercem suas funções em 1º e 2º graus com o mesmo empenho e dedicação. Precedentes. 32 - Isenção da Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais. 33 - Sentença anulada de ofício. Julgada procedente a ação. Apelação da parte autora prejudicada.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, anular, de ofício, a r. sentença de 1º grau, por ser citra petita e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgar procedente o pedido, para reconhecer o labor rural no período de 04/04/1963 a 14/10/1971, bem como a especialidade do trabalho nos períodos de 10/07/1972 a 09/05/1974, 02/10/1975 a 01/04/1976, 07/03/1977 a 08/03/1978, 01/07/1978 a 13/12/1978 e 01/03/1986 a 16/05/1986, e para condenar o INSS na implantação e pagamento do benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, a partir da data da citação (03/10/2007), sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, e para condenar, ainda, a Autarquia no pagamento da verba honorária, fixada em 10% sobre as parcelas vencidas, contadas estas até a data de prolação da sentença, restando prejudicada a apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 26/03/2018
Data da Publicação : 10/04/2018
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1401420
Órgão Julgador : SÉTIMA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/04/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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