TRF3 0006811-87.2000.4.03.6100 00068118720004036100
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO DE DEPÓSITO (LEI 8.866/94) -
IMPOSSIBILIDADE DE PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL (SÚMULA VINCULANTE
Nº 25) - COBRANÇA VIA AÇÃO DE DEPÓSITO - POSSIBILIDADE - AFASTADA A
EXTINÇÃO DO FEITO - APRECIAÇÃO DO MÉRITO, COM FULCRO NO ART. 1013, §
3º, I, DO CPC/2015 - APELO PARCIALMENTE PROVIDO - AÇÃO JULGADA PROCEDENTE,
EM PARTE.
1. O NCPC, conquanto se aplique imediatamente aos processos em curso,
não atinge as situações já consolidadas dentro do processo (art. 14),
em obediência ao princípio da não surpresa e ao princípio constitucional
do isolamento dos atos processuais. Assim, ainda que o recurso tivesse sido
interposto após a entrada em vigor do NCPC, o que não é o caso, por ter
sido a sentença proferida sob a égide da lei anterior, é à luz dessa
lei que ela deverá ser reexaminada pelo Tribunal, ainda que para reformá-la.
2. Pretendendo reaver as quantias descontadas pelo empregador, a título de
contribuição previdenciária do empregado, e não recolhidas aos cofres
públicos, a União ajuizou a presente ação de depósito, amparando-se na
Lei nº 8.866/94, que dispõe sobre o depositário infiel de valor pertencente
à Fazenda Pública e autoriza a sua prisão se não recolhida nem depositada
a importância devida, no prazo de 15 (quinze) dias, contados da citação
(artigo 4º, parágrafo 2º).
3. O Egrégio STF, em julgamento realizado em 16/04/94, deferiu medida
cautelar, para suspender a eficácia dos parágrafos 2º e 3º do artigo 4º
da Lei nº 8.866/94, bem como das expressões "referida no § 2º do art. 4º",
"ou empregados" e "e empregados", contidas no artigo 7º, "caput" e parágrafo
único", da referida lei (MC na ADI nº 1.055/DF, Relator Ministro Sydney
Sanches, DJ 13/06/97, pág. 26689). Nesse sentido, aquela Corte, em sessão
de julgamento realizada em 03/12/2008, declarou ser ilícita a prisão civil
do depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito (RE nº
466.343/SP, Relator Ministro Cezar Peluzo, DJe 05/06/2009; RE nº 349.703/RS,
Relator p/ Acórdão Gilmar Mendes, DJe 05/06/2009; HC nº 87.585/TO, Relator
Ministro Marco Aurélio, DJe 26/06/2009, HC nº 92.566/SP, Relator Ministro
Marco Aurélio, DJe 05/05/2009), entendimento que resultou na edição da
Súmula Vinculante nº 25.
4. Não obstante o entendimento consolidado no Egrégio Supremo Tribunal
Federal, a ação de depósito, prevista na Lei nº 8.866/94, não perdeu a
sua utilidade, pois não foram atingidos todos os aspectos do procedimento
previsto nessa lei, mas apenas aqueles referentes à prisão do depositário
infiel e à pena de revelia para a hipótese de não vir a contestação
acompanhada do comprovante de depósito judicial. Assim, pode a União optar
pelo ajuizamento da ação de depósito prevista na Lei nº 8.866/94, para
cobrança de valores retidos dos empregados e não repassados aos cofres da
Previdência.
3. Sem a possibilidade da prisão do depositário infiel, a ação de
depósito, prevista na Lei nº 8.866/94, tornou-se menos eficaz que a
execução fiscal, na medida em que aquela perdeu o seu meio de coagir o
devedor ao pagamento da dívida. No entanto, julgada procedente a ação, caso
o réu não entregue, conforme estabelece o artigo 6º da Lei nº 8.866/94,
o valor devido no prazo de 24 horas, poderá o autor requerer o cumprimento
da sentença, na forma prevista na lei processual civil.
4. A LEF foi estabelecida em favor da Fazenda Pública, não estando ela
impedida de buscar outros meios para a satisfação do crédito tributário,
desde que previstos em lei, como é o caso da ação de depósito.
5. A extinção da ação de depósito, sem resolução do mérito, por
ausência de interesse de agir, pode inviabilizar, no caso, a cobrança do
crédito, tendo em vista o prazo prescricional previsto no art. 174 do CTN e
o longo tempo transcorrido desde o ajuizamento da ação. Não bastasse isso,
podendo a execução prosseguir nos autos da ação de depósito, na forma
prevista na lei processual civil, não se justifica a extinção do feito,
tendo em vista o princípio insculpido no artigo 5º, inciso LXXVIII, da
Constituição Federal.
6. No caso, tendo sido citados os réus e reconhecida a sua revelia, não
pode subsistir a sentença que extinguiu o feito, sem resolução do mérito,
com fundamento na ausência de interesse de agir, sendo, pois, o caso de se
adentrar no mérito do pedido, nos termos do artigo 1013, parágrafo 3º,
inciso I, do CPC/2015, para julgar parcialmente procedente a presente ação
de depósito, afastando apenas a aplicação dos dispositivos da Lei nº
8.866/94 que estejam em confronto com a Súmula Vinculante nº 25 ou cuja
eficácia esteja suspensa por força da medida cautelar deferida nos autos
da ADI nº 1.055/DF (DJ 13/06/97, pág. 26689).
7. Vencidos os réus, a eles incumbe o pagamento de custas e honorários
advocatícios, fixados em 5% (cinco por cento) do valor atualizado atribuído
à causa, em harmonia com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade,
nos termos do artigo 20, parágrafo 4º, do CPC/1973.
8. Apelo parcialmente provido. Ação julgada procedente, em parte.
Ementa
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO DE DEPÓSITO (LEI 8.866/94) -
IMPOSSIBILIDADE DE PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL (SÚMULA VINCULANTE
Nº 25) - COBRANÇA VIA AÇÃO DE DEPÓSITO - POSSIBILIDADE - AFASTADA A
EXTINÇÃO DO FEITO - APRECIAÇÃO DO MÉRITO, COM FULCRO NO ART. 1013, §
3º, I, DO CPC/2015 - APELO PARCIALMENTE PROVIDO - AÇÃO JULGADA PROCEDENTE,
EM PARTE.
1. O NCPC, conquanto se aplique imediatamente aos processos em curso,
não atinge as situações já consolidadas dentro do processo (art. 14),
em obediência ao princípio da não surpresa e ao princípio constitucional
do isolamento dos atos processuais. Assim, ainda que o recurso tivesse sido
interposto após a entrada em vigor do NCPC, o que não é o caso, por ter
sido a sentença proferida sob a égide da lei anterior, é à luz dessa
lei que ela deverá ser reexaminada pelo Tribunal, ainda que para reformá-la.
2. Pretendendo reaver as quantias descontadas pelo empregador, a título de
contribuição previdenciária do empregado, e não recolhidas aos cofres
públicos, a União ajuizou a presente ação de depósito, amparando-se na
Lei nº 8.866/94, que dispõe sobre o depositário infiel de valor pertencente
à Fazenda Pública e autoriza a sua prisão se não recolhida nem depositada
a importância devida, no prazo de 15 (quinze) dias, contados da citação
(artigo 4º, parágrafo 2º).
3. O Egrégio STF, em julgamento realizado em 16/04/94, deferiu medida
cautelar, para suspender a eficácia dos parágrafos 2º e 3º do artigo 4º
da Lei nº 8.866/94, bem como das expressões "referida no § 2º do art. 4º",
"ou empregados" e "e empregados", contidas no artigo 7º, "caput" e parágrafo
único", da referida lei (MC na ADI nº 1.055/DF, Relator Ministro Sydney
Sanches, DJ 13/06/97, pág. 26689). Nesse sentido, aquela Corte, em sessão
de julgamento realizada em 03/12/2008, declarou ser ilícita a prisão civil
do depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito (RE nº
466.343/SP, Relator Ministro Cezar Peluzo, DJe 05/06/2009; RE nº 349.703/RS,
Relator p/ Acórdão Gilmar Mendes, DJe 05/06/2009; HC nº 87.585/TO, Relator
Ministro Marco Aurélio, DJe 26/06/2009, HC nº 92.566/SP, Relator Ministro
Marco Aurélio, DJe 05/05/2009), entendimento que resultou na edição da
Súmula Vinculante nº 25.
4. Não obstante o entendimento consolidado no Egrégio Supremo Tribunal
Federal, a ação de depósito, prevista na Lei nº 8.866/94, não perdeu a
sua utilidade, pois não foram atingidos todos os aspectos do procedimento
previsto nessa lei, mas apenas aqueles referentes à prisão do depositário
infiel e à pena de revelia para a hipótese de não vir a contestação
acompanhada do comprovante de depósito judicial. Assim, pode a União optar
pelo ajuizamento da ação de depósito prevista na Lei nº 8.866/94, para
cobrança de valores retidos dos empregados e não repassados aos cofres da
Previdência.
3. Sem a possibilidade da prisão do depositário infiel, a ação de
depósito, prevista na Lei nº 8.866/94, tornou-se menos eficaz que a
execução fiscal, na medida em que aquela perdeu o seu meio de coagir o
devedor ao pagamento da dívida. No entanto, julgada procedente a ação, caso
o réu não entregue, conforme estabelece o artigo 6º da Lei nº 8.866/94,
o valor devido no prazo de 24 horas, poderá o autor requerer o cumprimento
da sentença, na forma prevista na lei processual civil.
4. A LEF foi estabelecida em favor da Fazenda Pública, não estando ela
impedida de buscar outros meios para a satisfação do crédito tributário,
desde que previstos em lei, como é o caso da ação de depósito.
5. A extinção da ação de depósito, sem resolução do mérito, por
ausência de interesse de agir, pode inviabilizar, no caso, a cobrança do
crédito, tendo em vista o prazo prescricional previsto no art. 174 do CTN e
o longo tempo transcorrido desde o ajuizamento da ação. Não bastasse isso,
podendo a execução prosseguir nos autos da ação de depósito, na forma
prevista na lei processual civil, não se justifica a extinção do feito,
tendo em vista o princípio insculpido no artigo 5º, inciso LXXVIII, da
Constituição Federal.
6. No caso, tendo sido citados os réus e reconhecida a sua revelia, não
pode subsistir a sentença que extinguiu o feito, sem resolução do mérito,
com fundamento na ausência de interesse de agir, sendo, pois, o caso de se
adentrar no mérito do pedido, nos termos do artigo 1013, parágrafo 3º,
inciso I, do CPC/2015, para julgar parcialmente procedente a presente ação
de depósito, afastando apenas a aplicação dos dispositivos da Lei nº
8.866/94 que estejam em confronto com a Súmula Vinculante nº 25 ou cuja
eficácia esteja suspensa por força da medida cautelar deferida nos autos
da ADI nº 1.055/DF (DJ 13/06/97, pág. 26689).
7. Vencidos os réus, a eles incumbe o pagamento de custas e honorários
advocatícios, fixados em 5% (cinco por cento) do valor atualizado atribuído
à causa, em harmonia com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade,
nos termos do artigo 20, parágrafo 4º, do CPC/1973.
8. Apelo parcialmente provido. Ação julgada procedente, em parte.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo da União, para afastar a
extinção do feito e, com fulcro no artigo 1013, parágrafo 3º, inciso I,
do CPC/2015, julgar parcialmente procedente o pedido, afastando tão-somente
a aplicação dos dispositivos da Lei nº 8.866/94 que estejam em confronto
com a Súmula Vinculante nº 25 ou cuja eficácia esteja suspensa por força
da medida cautelar deferida nos autos da ADI nº 1.055/DF (DJ 13/06/97,
pág. 26689), e condenando os réus ao pagamento de custas processuais e
honorários advocatícios, fixados em 5% (cinco por cento) do valor atualizado
atribuído à causa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
20/09/2016
Data da Publicação
:
28/09/2016
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1611829
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** STFV SÚMULA VINCULANTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
LEG-FED SUV-25
LEG-FED LEI-8866 ANO-1994 ART-4 PAR-2 PAR-3 ART-7 PAR-ÚNICO ART-6
***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-14 ART-1013 PAR-3 INC-1
***** CTN-66 CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL
LEG-FED LEI-5172 ANO-1966 ART-174
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-78
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-20 PAR-4
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/09/2016
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