TRF3 0006871-05.2015.4.03.6110 00068710520154036110
PENAL. PROCESSUAL PENAL. ARTIGO 334 DO CÓDIGO PENAL (REDAÇÃO
ANTERIOR). CONTRABANDO. CIGARROS. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA
INSIGNIFICÂNCIA. ARTIGO 273, §1º-B, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. DEPÓSITO
PARA VENDA DE MEDICAMENTOS SEM REGISTRO NO ÓRGÃO DE VIGILÂNCIA. EMENDATIO
LIBELLI. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 334 DO CÓDIGO PENAL. PRECEITO SECUNDÁRIO
DO ARTIGO 273 DO CÓDIGO PENAL. ALEGADA INCONSTITUCIONALIDADE. APLICADA PENA
DO ARTIGO 272 DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E ELEMENTO SUBJETIVO
COMPROVADOS. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA.
- Princípio da Insignificância. Contrabando de cigarros. Inaplicabilidade. As
Cortes Superiores firmaram posição no sentido de que a introdução
clandestina de cigarros, ou seja, desacompanhados da respectiva
documentação comprobatória de sua regular entrada no território
nacional, configura crime de contrabando, e não descaminho Com efeito, a
introdução irregular de cigarros de origem estrangeira no mercado interno,
tem o condão de gerar malefícios conhecidos à saúde, ostentando um
elevado potencial de disseminação no comércio popular, apto a atingir
um número indeterminado de consumidores, em sua grande maioria de baixa
renda e sem acesso à informação a respeito da origem e prejudicialidade
da mercadoria que consomem. O bem jurídico tutelado é a Administração
Pública, nos seus interesses regulamentares que transcendem a mera tutela
do aspecto patrimonial, bem como a saúde pública, de forma que o valor do
tributo sonegado não pode ser empregado como referencial para aplicação
do princípio da insignificância, pois a questão relativa à evasão
tributária é secundária e, portanto, o delito de contrabando de cigarros
mostra-se incompatível com os pressupostos do princípio da insignificância.
- A materialidade, autoria e elemento subjetivo dos delitos imputados ao réu
restaram amplamente comprovadas através de Boletim de Ocorrência, Auto de
Exibição e Apreensão de 36 (trinta e seis) pacotes de cigarros da marca
EIGHT, e de 06 (seis) cartelas de comprimidos PRAMIL (contendo 20 comprimidos
cada cartela), Laudo Pericial elaborado pelo Instituto de Criminalística
da Polícia Federal, atestando que o medicamento apreendido é de origem
paraguaia, não possuindo registro junto à Agência Nacional de Vigilância
Sanitária, portanto de importação, comércio e uso proibidos em território
nacional, Laudo Pericial elaborado pelo Instituto de Criminalística da
Polícia Federal, concluindo que os cigarros apreendidos também são de
origem paraguaia e Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal
de Mercadoria, bem como pelo depoimento das testemunhas.
- Ainda que o acusado tenha negado, em juízo, os fatos que lhe foram
imputados, restou devidamente comprovada a materialidade e autoria dos
delitos previstos nos artigos 334, §1º, alínea c, e 273, §1º-B, inciso
I, ambos do Código Penal, através do conjunto probatório acima citado,
estando claro o dolo na conduta do réu, caracterizada pela vontade livre e
consciente de manter em depósito com o intuito de vender cigarros estrangeiros
de comercialização proibida em território nacional, bem como de medicamento
sem registro no órgão competente (ANVISA).
- Desclassificação do delito previsto no artigo 273 do Código
Penal. Comprovada a caracterização da conduta prevista no artigo 273,
§ 1º-B, inciso I, do Código Penal, deve ser afastado o pedido de
reclassificação do delito para que o acusado responda apenas pelo crime de
contrabando (artigo 334 do Código Penal). É certo que a conduta prevista
no art. 273, §1º-B, inciso I, do Código Penal, na modalidade importar,
assemelha-se à trazida pelo crime de contrabando (importar ou exportar
mercadoria proibida). Contudo, o tipo penal inscrito no primeiro dispositivo
mencionado objetiva tutelar a saúde pública, de modo que não é possível
a incidência do art. 334 do Código Penal, que traz previsão genérica,
em detrimento da caracterização do tipo penal específico do art. 273,
§1º-B, inciso I, do CP.
- Preceito sancionador do artigo 273 do Código Penal. Se por um lado
justifica-se a previsão de penas mais severas para condutas mais
censuráveis, como as do caput e as dos §§ 1º e 1º-A do art. 273 do
Código Penal, que implicam necessariamente em dano potencial às vítimas
diretas, de outro não se pode tolher a individualização da pena às
circunstâncias do caso concreto quando estas forem relativas ao §1º-B do
mesmo dispositivo. Fazendo-se uma comparação, ainda que breve, tratam-se de
atos muito distintos - e que implicam riscos quase incomparáveis entre si -
os de: a) introduzir no País medicamentos que não têm registro na ANVISA,
sobretudo em pequena quantidade, e ainda, que não têm relação com doenças
graves e/ou apresentam grande risco de morte; e b) falsificar, adulterar ou
vender remédios e produtos relacionados sabidamente alterados. Atos como o
perpetrado pelo réu foram equiparados a outros de natureza muito mais grave,
gerando uma notável distorção que pode ser atenuada pela devida valoração
e adequação que cabe ao julgador realizar em relação ao caso concreto.
- No tocante ao art. 273, §1º-B, do Código Penal, tem-se que só é
justificável a aplicação da pena prevista quando a conduta delitiva possa
gerar grandes danos à saúde pública - o que não significa necessariamente
o reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei n. 9.677, de 02.07.1998 (que
incluiu o referido dispositivo no estatuto repressivo). Conquanto o Órgão
Especial desta C. Corte tenha se pronunciado pela constitucionalidade do
preceito sancionador do delito previsto no art. 273 do Código Penal, nos
autos de Arguição de Inconstitucionalidade nº 000793-60.2009.4.03.6124
(e-DJF3 23.08.2013), curvo-me a ao novel entendimento da Corte Superior. A
pena aplicada deve ser justa, manter razoabilidade e proporcionalidade com
o delito cometido, o que não se vislumbra do preceito secundário inserto
no art. 273, § 1º-B, do Código Penal.
- No caso concreto, a dosimetria da pena deve ser mantida nos termos fixados
em sentença. Utilização do preceito secundário do artigo 272 do Código
Penal. Sem insurgência do órgão ministerial, remanesce o cálculo da pena
privativa de liberdade, sob pena de reformatio in pejus.
- Apelação da defesa a que se nega provimento.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. ARTIGO 334 DO CÓDIGO PENAL (REDAÇÃO
ANTERIOR). CONTRABANDO. CIGARROS. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA
INSIGNIFICÂNCIA. ARTIGO 273, §1º-B, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. DEPÓSITO
PARA VENDA DE MEDICAMENTOS SEM REGISTRO NO ÓRGÃO DE VIGILÂNCIA. EMENDATIO
LIBELLI. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 334 DO CÓDIGO PENAL. PRECEITO SECUNDÁRIO
DO ARTIGO 273 DO CÓDIGO PENAL. ALEGADA INCONSTITUCIONALIDADE. APLICADA PENA
DO ARTIGO 272 DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E ELEMENTO SUBJETIVO
COMPROVADOS. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA.
- Princípio da Insignificância. Contrabando de cigarros. Inaplicabilidade. As
Cortes Superiores firmaram posição no sentido de que a introdução
clandestina de cigarros, ou seja, desacompanhados da respectiva
documentação comprobatória de sua regular entrada no território
nacional, configura crime de contrabando, e não descaminho Com efeito, a
introdução irregular de cigarros de origem estrangeira no mercado interno,
tem o condão de gerar malefícios conhecidos à saúde, ostentando um
elevado potencial de disseminação no comércio popular, apto a atingir
um número indeterminado de consumidores, em sua grande maioria de baixa
renda e sem acesso à informação a respeito da origem e prejudicialidade
da mercadoria que consomem. O bem jurídico tutelado é a Administração
Pública, nos seus interesses regulamentares que transcendem a mera tutela
do aspecto patrimonial, bem como a saúde pública, de forma que o valor do
tributo sonegado não pode ser empregado como referencial para aplicação
do princípio da insignificância, pois a questão relativa à evasão
tributária é secundária e, portanto, o delito de contrabando de cigarros
mostra-se incompatível com os pressupostos do princípio da insignificância.
- A materialidade, autoria e elemento subjetivo dos delitos imputados ao réu
restaram amplamente comprovadas através de Boletim de Ocorrência, Auto de
Exibição e Apreensão de 36 (trinta e seis) pacotes de cigarros da marca
EIGHT, e de 06 (seis) cartelas de comprimidos PRAMIL (contendo 20 comprimidos
cada cartela), Laudo Pericial elaborado pelo Instituto de Criminalística
da Polícia Federal, atestando que o medicamento apreendido é de origem
paraguaia, não possuindo registro junto à Agência Nacional de Vigilância
Sanitária, portanto de importação, comércio e uso proibidos em território
nacional, Laudo Pericial elaborado pelo Instituto de Criminalística da
Polícia Federal, concluindo que os cigarros apreendidos também são de
origem paraguaia e Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal
de Mercadoria, bem como pelo depoimento das testemunhas.
- Ainda que o acusado tenha negado, em juízo, os fatos que lhe foram
imputados, restou devidamente comprovada a materialidade e autoria dos
delitos previstos nos artigos 334, §1º, alínea c, e 273, §1º-B, inciso
I, ambos do Código Penal, através do conjunto probatório acima citado,
estando claro o dolo na conduta do réu, caracterizada pela vontade livre e
consciente de manter em depósito com o intuito de vender cigarros estrangeiros
de comercialização proibida em território nacional, bem como de medicamento
sem registro no órgão competente (ANVISA).
- Desclassificação do delito previsto no artigo 273 do Código
Penal. Comprovada a caracterização da conduta prevista no artigo 273,
§ 1º-B, inciso I, do Código Penal, deve ser afastado o pedido de
reclassificação do delito para que o acusado responda apenas pelo crime de
contrabando (artigo 334 do Código Penal). É certo que a conduta prevista
no art. 273, §1º-B, inciso I, do Código Penal, na modalidade importar,
assemelha-se à trazida pelo crime de contrabando (importar ou exportar
mercadoria proibida). Contudo, o tipo penal inscrito no primeiro dispositivo
mencionado objetiva tutelar a saúde pública, de modo que não é possível
a incidência do art. 334 do Código Penal, que traz previsão genérica,
em detrimento da caracterização do tipo penal específico do art. 273,
§1º-B, inciso I, do CP.
- Preceito sancionador do artigo 273 do Código Penal. Se por um lado
justifica-se a previsão de penas mais severas para condutas mais
censuráveis, como as do caput e as dos §§ 1º e 1º-A do art. 273 do
Código Penal, que implicam necessariamente em dano potencial às vítimas
diretas, de outro não se pode tolher a individualização da pena às
circunstâncias do caso concreto quando estas forem relativas ao §1º-B do
mesmo dispositivo. Fazendo-se uma comparação, ainda que breve, tratam-se de
atos muito distintos - e que implicam riscos quase incomparáveis entre si -
os de: a) introduzir no País medicamentos que não têm registro na ANVISA,
sobretudo em pequena quantidade, e ainda, que não têm relação com doenças
graves e/ou apresentam grande risco de morte; e b) falsificar, adulterar ou
vender remédios e produtos relacionados sabidamente alterados. Atos como o
perpetrado pelo réu foram equiparados a outros de natureza muito mais grave,
gerando uma notável distorção que pode ser atenuada pela devida valoração
e adequação que cabe ao julgador realizar em relação ao caso concreto.
- No tocante ao art. 273, §1º-B, do Código Penal, tem-se que só é
justificável a aplicação da pena prevista quando a conduta delitiva possa
gerar grandes danos à saúde pública - o que não significa necessariamente
o reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei n. 9.677, de 02.07.1998 (que
incluiu o referido dispositivo no estatuto repressivo). Conquanto o Órgão
Especial desta C. Corte tenha se pronunciado pela constitucionalidade do
preceito sancionador do delito previsto no art. 273 do Código Penal, nos
autos de Arguição de Inconstitucionalidade nº 000793-60.2009.4.03.6124
(e-DJF3 23.08.2013), curvo-me a ao novel entendimento da Corte Superior. A
pena aplicada deve ser justa, manter razoabilidade e proporcionalidade com
o delito cometido, o que não se vislumbra do preceito secundário inserto
no art. 273, § 1º-B, do Código Penal.
- No caso concreto, a dosimetria da pena deve ser mantida nos termos fixados
em sentença. Utilização do preceito secundário do artigo 272 do Código
Penal. Sem insurgência do órgão ministerial, remanesce o cálculo da pena
privativa de liberdade, sob pena de reformatio in pejus.
- Apelação da defesa a que se nega provimento.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à Apelação do réu DAMIÃO LUIZ DA
SILVA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Data do Julgamento
:
26/03/2019
Data da Publicação
:
05/04/2019
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 75171
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/04/2019
..FONTE_REPUBLICACAO:
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