TRF3 0007064-25.2012.4.03.6110 00070642520124036110
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. SFH. MEDIDA CAUTELAR
PREPARATÓRIA. DECRETO-LEI 70/1966: CONSTITUCIONALIDADE. EXECUÇÃO
EXTRAJUDICIAL ENCERRADA. NOTIFICAÇÃO PARA PURGAÇÃO DA MORA EM NOME
DOS MUTUÁRIOS ORIGINÁRIOS. ANUÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA
QUANTO À CESSÃO DOS DIREITOS SOBRE O IMÓVEL. IRREGULARIDADE DO
PROCEDIMENTO. IMINÊNCIA DE COMERCIALIZAÇÃO DO IMÓVEL EM LEILÃO
ONLINE. PRESENÇA DE FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA. RECURSO PARCIALMENTE
PROVIDO.
1. A transferência de direitos relativos a contrato de mútuo regido
pelo SFH requer a interveniência obrigatória do agente financeiro, com
a consequente satisfação dos requisitos legais e regulamentares para a
concessão do financiamento ao cessionário.
2. Se a cessão de direitos sobre imóvel financiado no âmbito do Sistema
Financeiro da Habitação foi realizada após 25/10/1996, a anuência da
instituição financeira mutuante é indispensável para que o cessionário
adquira legitimidade ativa para requerer revisão das condições ajustadas,
tanto para os contratos garantidos pelo FCVS como para aqueles sem referida
cobertura. Precedente obrigatório.
3. Embora a CEF reitere a afirmação de que a única relação jurídica
válida seria aquela estabelecida entre a instituição financeira e os
mutuários originários, o conjunto probatório demonstra ter a CEF anuído
com a transferência. Corolário disso é o "Termo de Parcelamento para
Liquidação de Dívida de Contrato do SFH, sem Apólice Securitária -
Mutuário ou Ocupante", documento preparado em nome da cessionária em
30/07/2008.
4. Ademais, nos autos da ação nº 0012393-28.2006.4.03.6110, foi prolatada
sentença homologatória de transação havida entre a CEF e a cessionária,
na qual foram estabelecidos os termos em que seria feita a renegociação
da dívida.
5. A garantia do devido processo legal não deve ser entendida como exigência
de processo judicial. Por outro lado, o devedor não fica impedido de levar a
questão ao conhecimento do Judiciário, ainda que já realizado o leilão,
caso em que eventual procedência do alegado resolver-se-ia em perdas e
danos. Precedentes.
6. O Supremo Tribunal Federal entendeu que o Decreto-lei nº 70/66 foi
recepcionado pela Carta de 1988. Precedentes.
7. Esse entendimento não exclui a possibilidade de medida judicial que
obste o prosseguimento do procedimento previsto no Decreto-Lei nº 70/66,
desde que haja indicação precisa, acompanhada de suporte probatório, do
descumprimento de cláusulas contratuais, ou mesmo mediante contracautela,
com o depósito à disposição do Juízo do valor exigido, o que não ocorre
no caso dos autos.
8. A providência da notificação pessoal, prevista no §1º do artigo
31 do Decreto-lei nº 70/1966, tem a finalidade única de comunicar os
devedores quanto à purgação da mora, não havendo qualquer previsão
legal no sentido da necessidade de sua intimação pessoal nas demais fases
do procedimento. Precedente.
9. Impossibilitada a notificação pessoal para purgação da mora, mostra-se
admissível que a ciência aos mutuários se dê via edital. Precedente.
10. No caso dos autos, a CEF deixou de cumprir a determinação deste Juízo
para apresentar os documentos relacionados à execução extrajudicial do
imóvel ocupado pelos apelantes e, com essa postura, perdeu a chance de
demonstrar a regularidade do procedimento.
11. Os documentos acostados aos autos - edital de notificação para purgação
da mora e edital de notificação de leilão - demonstram que o procedimento
de execução extrajudicial foi dirigido aos mutuários originários,
respectivamente em agosto e novembro de 2009. A sentença hmologatória do
acordo firmado entre a CEF e Josiane Germaine Valluis Mendes, por sua vez,
transitou em julgado em 29/07/2008.
12. Constatada a ciência inequívoca da CEF quanto ao fato de que os
mutuários originários já não respondiam pelo financiamento, bem como a
regularidade da cessão de direitos a Josiane Germaine Valluis Mendes, na
medida em que as partes transacionaram judicialmente, presente o fumus boni
iuris, de sorte que os efeitos das Averbações de n. 7 a 10 e do Registro
n. 11 da matrícula n. 12.653 do Livro n. 2 do Cartório de Registro de
Imóveis da Comarca de Salto/SP devem ser suspensos até decisão definitiva
na ação principal a ser ajuizada pelos autores.
13. Presente também o requisito do periculum in mora, porquanto o imóvel
está em vias de ser comercializado em leilão online da CEF, procedimento
que fica obstado, desde logo.
14. Ainda que a infringência ao dever de cooperação trazido pelo Novo
Código de Processo Civil não conte com previsão de sanção, o mesmo não
ocorre se dessa violação se verifica a infringência ao dever de boa-fé,
como ocorre neste caso, em que fica a CEF condenada ao pagamento de multa
por ato atentatório da dignidade da justiça, nos termos do artigo 77,
inciso IV e § 2º, do Código de Processo Civil, no montante de 10% (dez
por cento) sobre o valor da causa atualizado.
15. Apelação parcialmente provida.
Ementa
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. SFH. MEDIDA CAUTELAR
PREPARATÓRIA. DECRETO-LEI 70/1966: CONSTITUCIONALIDADE. EXECUÇÃO
EXTRAJUDICIAL ENCERRADA. NOTIFICAÇÃO PARA PURGAÇÃO DA MORA EM NOME
DOS MUTUÁRIOS ORIGINÁRIOS. ANUÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA
QUANTO À CESSÃO DOS DIREITOS SOBRE O IMÓVEL. IRREGULARIDADE DO
PROCEDIMENTO. IMINÊNCIA DE COMERCIALIZAÇÃO DO IMÓVEL EM LEILÃO
ONLINE. PRESENÇA DE FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA. RECURSO PARCIALMENTE
PROVIDO.
1. A transferência de direitos relativos a contrato de mútuo regido
pelo SFH requer a interveniência obrigatória do agente financeiro, com
a consequente satisfação dos requisitos legais e regulamentares para a
concessão do financiamento ao cessionário.
2. Se a cessão de direitos sobre imóvel financiado no âmbito do Sistema
Financeiro da Habitação foi realizada após 25/10/1996, a anuência da
instituição financeira mutuante é indispensável para que o cessionário
adquira legitimidade ativa para requerer revisão das condições ajustadas,
tanto para os contratos garantidos pelo FCVS como para aqueles sem referida
cobertura. Precedente obrigatório.
3. Embora a CEF reitere a afirmação de que a única relação jurídica
válida seria aquela estabelecida entre a instituição financeira e os
mutuários originários, o conjunto probatório demonstra ter a CEF anuído
com a transferência. Corolário disso é o "Termo de Parcelamento para
Liquidação de Dívida de Contrato do SFH, sem Apólice Securitária -
Mutuário ou Ocupante", documento preparado em nome da cessionária em
30/07/2008.
4. Ademais, nos autos da ação nº 0012393-28.2006.4.03.6110, foi prolatada
sentença homologatória de transação havida entre a CEF e a cessionária,
na qual foram estabelecidos os termos em que seria feita a renegociação
da dívida.
5. A garantia do devido processo legal não deve ser entendida como exigência
de processo judicial. Por outro lado, o devedor não fica impedido de levar a
questão ao conhecimento do Judiciário, ainda que já realizado o leilão,
caso em que eventual procedência do alegado resolver-se-ia em perdas e
danos. Precedentes.
6. O Supremo Tribunal Federal entendeu que o Decreto-lei nº 70/66 foi
recepcionado pela Carta de 1988. Precedentes.
7. Esse entendimento não exclui a possibilidade de medida judicial que
obste o prosseguimento do procedimento previsto no Decreto-Lei nº 70/66,
desde que haja indicação precisa, acompanhada de suporte probatório, do
descumprimento de cláusulas contratuais, ou mesmo mediante contracautela,
com o depósito à disposição do Juízo do valor exigido, o que não ocorre
no caso dos autos.
8. A providência da notificação pessoal, prevista no §1º do artigo
31 do Decreto-lei nº 70/1966, tem a finalidade única de comunicar os
devedores quanto à purgação da mora, não havendo qualquer previsão
legal no sentido da necessidade de sua intimação pessoal nas demais fases
do procedimento. Precedente.
9. Impossibilitada a notificação pessoal para purgação da mora, mostra-se
admissível que a ciência aos mutuários se dê via edital. Precedente.
10. No caso dos autos, a CEF deixou de cumprir a determinação deste Juízo
para apresentar os documentos relacionados à execução extrajudicial do
imóvel ocupado pelos apelantes e, com essa postura, perdeu a chance de
demonstrar a regularidade do procedimento.
11. Os documentos acostados aos autos - edital de notificação para purgação
da mora e edital de notificação de leilão - demonstram que o procedimento
de execução extrajudicial foi dirigido aos mutuários originários,
respectivamente em agosto e novembro de 2009. A sentença hmologatória do
acordo firmado entre a CEF e Josiane Germaine Valluis Mendes, por sua vez,
transitou em julgado em 29/07/2008.
12. Constatada a ciência inequívoca da CEF quanto ao fato de que os
mutuários originários já não respondiam pelo financiamento, bem como a
regularidade da cessão de direitos a Josiane Germaine Valluis Mendes, na
medida em que as partes transacionaram judicialmente, presente o fumus boni
iuris, de sorte que os efeitos das Averbações de n. 7 a 10 e do Registro
n. 11 da matrícula n. 12.653 do Livro n. 2 do Cartório de Registro de
Imóveis da Comarca de Salto/SP devem ser suspensos até decisão definitiva
na ação principal a ser ajuizada pelos autores.
13. Presente também o requisito do periculum in mora, porquanto o imóvel
está em vias de ser comercializado em leilão online da CEF, procedimento
que fica obstado, desde logo.
14. Ainda que a infringência ao dever de cooperação trazido pelo Novo
Código de Processo Civil não conte com previsão de sanção, o mesmo não
ocorre se dessa violação se verifica a infringência ao dever de boa-fé,
como ocorre neste caso, em que fica a CEF condenada ao pagamento de multa
por ato atentatório da dignidade da justiça, nos termos do artigo 77,
inciso IV e § 2º, do Código de Processo Civil, no montante de 10% (dez
por cento) sobre o valor da causa atualizado.
15. Apelação parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar parcial provimento à apelação, para suspender os efeitos
das Averbações de n. 7 a 10 e do Registro n. 11 da matrícula n. 12.653
do Livro n. 2 do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Salto/SP,
bem como para obstar, desde a intimação deste acórdão, o procedimento de
comercialização do referido imóvel em leilão online da CEF, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
11/10/2016
Data da Publicação
:
24/10/2016
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1903522
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:24/10/2016
..FONTE_REPUBLICACAO:
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