TRF3 0007158-80.2010.4.03.6000 00071588020104036000
PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS DA ACUSAÇÃO E DA DEFESA. MOEDA
FALSA. ARTIGO 289,§1º, DO CÓDIGO PENAL. DESCABIDA DESCLASSIFICAÇÃO
DA IMPUTAÇÃO DELITIVA PARA O CRIME DE ESTELIONATO. INOCORRÊNCIA DE
FALSIFICAÇÃO GROSSEIRA. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO
MÍNIMO LEGAL. CRIME CONTINUADO. CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA
GRATUITA. APELAÇÃO MINISTERIAL E APELAÇÕES DA DEFESA PARCIALMENTE
PROVIDAS.
1. Afigura-se despropositado a desclassificação para o crime de estelionato,
de competência da Justiça Estadual, sob a tese de crime impossível,
previsto no artigo 17 do Código Penal, pela absoluta ineficácia do meio
(falsificação grosseira), haja vista que o laudo pericial de fls. 62/68,
atesta a boa qualidade da contrafação e o meio empregado pelo agente
tem capacidade de produzir o evento almejado e, como consequência,
deve prevalecer a classificação do delito feita da denúncia. Assim, a
constatação da excelente qualidade de impressão pela perícia define a
competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, afastando,
por consequência, a hipótese de prática de estelionato, de competência
da Justiça Estadual, quando a falsificação for grosseira.
2. A materialidade foi demonstrada pelo Auto de Exibição e Apreensão
(fl.19/21 e 51) pelo Laudo Pericial (fls. 62/68) que atestou a aptidão
das cédulas falsas de enganar o homem médio, afastando expressamente a
hipótese de falsificação grosseira. A autoria delitiva e o dolo também
foram evidenciados, especialmente, pelo teor dos interrogatórios policiais
dos acusados os quais admitiram a prática delitiva e pelos depoimentos das
testemunhas de acusação.
3. Nota-se que o crime de moeda falsa, em qualquer das modalidades previstas
no art. 289, do CP, só é punível a título de dolo, ou seja, o agente,
livre e conscientemente, guarda ou introduz em circulação a moeda falsa,
sabendo-a inautêntica. Com efeito, pelo conjunto probatório, afasta-se
qualquer dúvida acerca do dolo dos acusados, inclusive, ambos confessaram
ter a consciência da falsidade das cédulas que adquiriram no Paraguai
e após essa conduta introduziram em circulação, conforme teor de seus
interrogatórios policiais. Ademais, o modus operandi deste crime de moeda
falsa restou configurado na prática delitiva, na medida em que os acusados
introduziram em circulação, nos estabelecimentos comerciais, nota falsa
de valor alto (R$ 50,00) na compra de mercadorias de valor inferior (no
caso, produtos em loja de confecções), para o fim de obtenção de troco
em cédulas verdadeiras. Registre-se que a modalidade deste crime de moeda
falsa consistente em introduzir em circulação é de natureza instantânea
ao passo que a modalidade guardar é de natureza permanente, o que faz com
que o agente permaneça em estado de flagrância.
4. Dosimetria da pena. Na primeira fase, de acordo com o artigo 59 do Código
Penal, a culpabilidade, a personalidade e a conduta social não podem ser
valoradas negativamente, pois não ultrapassam o grau de normalidade daquelas
que se verificam habitualmente, sendo certo que o desprezo das normas legais é
ínsita à prática delitiva. De fato, inquéritos e ações penais em curso
não configuram maus antecedentes e não ensejam o agravamento da pena-base,
nos termos da súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça. Apenas as
circunstâncias do crime merecem ser valoradas negativamente, em razão
da grande quantidade de cédulas que os acusados mantiveram consigo (400
cédulas de R$ 50,00, conforme laudo pericial de fls. 62/68). Esse é o
entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "quanto maior a quantidade
de notas ou metais falsos, mais expressiva será a exposição da fé
pública ao perigo, eis que, quanto maior a circulação, maior o número
de pessoas que serão atingidas, daí a maior reprovabilidade da conduta"
(REsp 1.170.922/RJ, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em
01/03/2011, DJe 14/03/2011). Dessa forma, assiste razão à acusação
e descabidas as alegações da defesa para a fixação da pena-base no
mínimo legal, de modo que a elevo em ½ (metade) acima do mínimo legal,
o que resulta a pena-base de 4 anos e 6 meses de reclusão para cada um
dos acusados. Na segunda fase, ausentes agravantes. Mas resta presente a
atenuante de confissão, haja vista os interrogatórios extrajudiciais dos
acusados que confessaram a prática criminosa, de modo que reduzo a pena em
1/6, o que resulta, nessa fase, a pena de 3 anos e 9 meses de reclusão para
cada um dos acusados. Na terceira fase, inexistem causas de diminuição ou
aumento da pena, todavia verifico a existência da causa de aumento de pena
correspondente à continuidade delitiva, prevista no artigo 71 do Código Penal
Brasileiro. Para a caracterização do crime continuado, consignou-se que o
STJ vem adotando a teoria mista, a qual exige o preenchimento dos requisitos
objetivos - mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução
- e do subjetivo - unidade de desígnios. Assim, afasto a alegação da
acusação de que houve concurso material, considerando que as condutas dos
acusados caracterizaram a prática de dois crimes de moeda falsa, a saber,
guardar moeda falsa consigo e introdução de moeda falsa na circulação e,
o que autoriza o aumento de 1/6 (um sexto). Portanto, a pena definitiva dos
acusados resta fixada em 4 anos, 4 meses e 15 dias de reclusão.
5. A pena de multa do tipo deve seguir aos mesmos parâmetros da pena
privativa de liberdade, em obediência aos princípios da proporcionalidade
e razoabilidade, bem como as condições financeiras do acusado, de modo
que a fixo em 15 dias-multa, cada um na fração de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo vigente à época dos fatos.
6. Do regime prisional. Para a fixação do regime prisional, devem ser
observados os seguintes fatores: a) modalidade de pena de privativa de
liberdade, ou seja, reclusão ou detenção (art. 33, caput, CP); b)
quantidade de pena aplicada (art. 33, §2º, alíneas a, b e c, CP); c)
caracterização ou não da reincidência (art. 33, §2º, alíneas b e c,
CP) e d) as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal (art. 33, §3º,
do CP). No particular, a pena será cumprida em regime inicial semiaberto
(art. 33, §2º, "c", do Código Penal).
7. Da substituição. É incabível a substituição da pena privativa de
liberdade por restritivas de direitos, diante da quantidade de pena aplicada,
nos termos do art. 44, inciso I, do Código Penal.
8. Da Justiça gratuita. Concedido o pedido de gratuidade de justiça,
na forma do artigo 98 da Lei n.º 13.105/2015.
9. Mantida, no mais, a r. sentença.
10. Recursos parcialmente providos.
Ementa
PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS DA ACUSAÇÃO E DA DEFESA. MOEDA
FALSA. ARTIGO 289,§1º, DO CÓDIGO PENAL. DESCABIDA DESCLASSIFICAÇÃO
DA IMPUTAÇÃO DELITIVA PARA O CRIME DE ESTELIONATO. INOCORRÊNCIA DE
FALSIFICAÇÃO GROSSEIRA. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO
MÍNIMO LEGAL. CRIME CONTINUADO. CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA
GRATUITA. APELAÇÃO MINISTERIAL E APELAÇÕES DA DEFESA PARCIALMENTE
PROVIDAS.
1. Afigura-se despropositado a desclassificação para o crime de estelionato,
de competência da Justiça Estadual, sob a tese de crime impossível,
previsto no artigo 17 do Código Penal, pela absoluta ineficácia do meio
(falsificação grosseira), haja vista que o laudo pericial de fls. 62/68,
atesta a boa qualidade da contrafação e o meio empregado pelo agente
tem capacidade de produzir o evento almejado e, como consequência,
deve prevalecer a classificação do delito feita da denúncia. Assim, a
constatação da excelente qualidade de impressão pela perícia define a
competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, afastando,
por consequência, a hipótese de prática de estelionato, de competência
da Justiça Estadual, quando a falsificação for grosseira.
2. A materialidade foi demonstrada pelo Auto de Exibição e Apreensão
(fl.19/21 e 51) pelo Laudo Pericial (fls. 62/68) que atestou a aptidão
das cédulas falsas de enganar o homem médio, afastando expressamente a
hipótese de falsificação grosseira. A autoria delitiva e o dolo também
foram evidenciados, especialmente, pelo teor dos interrogatórios policiais
dos acusados os quais admitiram a prática delitiva e pelos depoimentos das
testemunhas de acusação.
3. Nota-se que o crime de moeda falsa, em qualquer das modalidades previstas
no art. 289, do CP, só é punível a título de dolo, ou seja, o agente,
livre e conscientemente, guarda ou introduz em circulação a moeda falsa,
sabendo-a inautêntica. Com efeito, pelo conjunto probatório, afasta-se
qualquer dúvida acerca do dolo dos acusados, inclusive, ambos confessaram
ter a consciência da falsidade das cédulas que adquiriram no Paraguai
e após essa conduta introduziram em circulação, conforme teor de seus
interrogatórios policiais. Ademais, o modus operandi deste crime de moeda
falsa restou configurado na prática delitiva, na medida em que os acusados
introduziram em circulação, nos estabelecimentos comerciais, nota falsa
de valor alto (R$ 50,00) na compra de mercadorias de valor inferior (no
caso, produtos em loja de confecções), para o fim de obtenção de troco
em cédulas verdadeiras. Registre-se que a modalidade deste crime de moeda
falsa consistente em introduzir em circulação é de natureza instantânea
ao passo que a modalidade guardar é de natureza permanente, o que faz com
que o agente permaneça em estado de flagrância.
4. Dosimetria da pena. Na primeira fase, de acordo com o artigo 59 do Código
Penal, a culpabilidade, a personalidade e a conduta social não podem ser
valoradas negativamente, pois não ultrapassam o grau de normalidade daquelas
que se verificam habitualmente, sendo certo que o desprezo das normas legais é
ínsita à prática delitiva. De fato, inquéritos e ações penais em curso
não configuram maus antecedentes e não ensejam o agravamento da pena-base,
nos termos da súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça. Apenas as
circunstâncias do crime merecem ser valoradas negativamente, em razão
da grande quantidade de cédulas que os acusados mantiveram consigo (400
cédulas de R$ 50,00, conforme laudo pericial de fls. 62/68). Esse é o
entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "quanto maior a quantidade
de notas ou metais falsos, mais expressiva será a exposição da fé
pública ao perigo, eis que, quanto maior a circulação, maior o número
de pessoas que serão atingidas, daí a maior reprovabilidade da conduta"
(REsp 1.170.922/RJ, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em
01/03/2011, DJe 14/03/2011). Dessa forma, assiste razão à acusação
e descabidas as alegações da defesa para a fixação da pena-base no
mínimo legal, de modo que a elevo em ½ (metade) acima do mínimo legal,
o que resulta a pena-base de 4 anos e 6 meses de reclusão para cada um
dos acusados. Na segunda fase, ausentes agravantes. Mas resta presente a
atenuante de confissão, haja vista os interrogatórios extrajudiciais dos
acusados que confessaram a prática criminosa, de modo que reduzo a pena em
1/6, o que resulta, nessa fase, a pena de 3 anos e 9 meses de reclusão para
cada um dos acusados. Na terceira fase, inexistem causas de diminuição ou
aumento da pena, todavia verifico a existência da causa de aumento de pena
correspondente à continuidade delitiva, prevista no artigo 71 do Código Penal
Brasileiro. Para a caracterização do crime continuado, consignou-se que o
STJ vem adotando a teoria mista, a qual exige o preenchimento dos requisitos
objetivos - mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução
- e do subjetivo - unidade de desígnios. Assim, afasto a alegação da
acusação de que houve concurso material, considerando que as condutas dos
acusados caracterizaram a prática de dois crimes de moeda falsa, a saber,
guardar moeda falsa consigo e introdução de moeda falsa na circulação e,
o que autoriza o aumento de 1/6 (um sexto). Portanto, a pena definitiva dos
acusados resta fixada em 4 anos, 4 meses e 15 dias de reclusão.
5. A pena de multa do tipo deve seguir aos mesmos parâmetros da pena
privativa de liberdade, em obediência aos princípios da proporcionalidade
e razoabilidade, bem como as condições financeiras do acusado, de modo
que a fixo em 15 dias-multa, cada um na fração de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo vigente à época dos fatos.
6. Do regime prisional. Para a fixação do regime prisional, devem ser
observados os seguintes fatores: a) modalidade de pena de privativa de
liberdade, ou seja, reclusão ou detenção (art. 33, caput, CP); b)
quantidade de pena aplicada (art. 33, §2º, alíneas a, b e c, CP); c)
caracterização ou não da reincidência (art. 33, §2º, alíneas b e c,
CP) e d) as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal (art. 33, §3º,
do CP). No particular, a pena será cumprida em regime inicial semiaberto
(art. 33, §2º, "c", do Código Penal).
7. Da substituição. É incabível a substituição da pena privativa de
liberdade por restritivas de direitos, diante da quantidade de pena aplicada,
nos termos do art. 44, inciso I, do Código Penal.
8. Da Justiça gratuita. Concedido o pedido de gratuidade de justiça,
na forma do artigo 98 da Lei n.º 13.105/2015.
9. Mantida, no mais, a r. sentença.
10. Recursos parcialmente providos.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por maioria, DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação ministerial para majorar
a pena-base de ambos os acusados e reconhecer o crime continuado, de modo
a resultar a pena definitiva em 4 anos, 4 meses e 15 dias de reclusão, em
regime semiaberto e ao pagamento de 15 dias-multa, cada um na fração de
1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos e, por
unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO às apelações da defesa tão somente
para conceder os benefícios da gratuidade de justiça, na forma do artigo
98 da Lei n.º 13.105/2015. Mantida, no mais, a r. sentença, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
20/08/2018
Data da Publicação
:
29/08/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 72209
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL MAURICIO KATO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-289 PAR-1 ART-17 ART-59 ART-71 ART-33 PAR-2
LET-A LET-B LET-C PAR-3 ART-44 INC-1
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-444
***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-98
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/08/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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