TRF3 0007279-59.2011.4.03.6102 00072795920114036102
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. ART. 19
DA LEI Nº 7.492/86. NA FORMA DO ART. 14, II, DO CÓDIGO PENAL. CONDUTA
TÍPICA. MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTROVERSAS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
INAPLICÁVEL. DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO PARA O CRIME PREVISTO NO
ART. 171 DO CÓDIGO PENAL. INCABÍVEL. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE
REFORMADA. RECONHECIDA A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. REGIME DE
CUMPRIMENTO FIXADO NO ABERTO. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUBSTITUÍDA NOS
TERMOS DO ART. 44 DO CÓDIGO PENAL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A materialidade e autoria delitivas não foram objeto de recurso, ademais,
restaram devidamente demonstradas nos autos pelo Auto de Prisão em Flagrante,
Auto de Apresentação e Apreensão, Auto de Apreensão e Laudo Pericial, bem
como pelas declarações prestadas pelas testemunhas e pela própria acusada.
2. Conduta típica. A apelante foi condenada como incursa nas penas do artigo
19, parágrafo único, da Lei n.º 7.492/86. O tipo limita-se a obtenção
de financiamento mediante fraude. No caso, qualquer fraude é suficiente
para caracterizar o crime, ainda que não se constitua em crime autônomo de
falsidade. Além disso, a conduta, em si, deve conter ou envolver o elemento
"fraude", mas não se exige que dela advenha algum prejuízo específico
ou outro resultado. Basta a própria obtenção do financiamento (por meio
fraudulento) junto a instituição financeira. Portanto, a consumação do
delito não envolve o ganho de vantagem ilícita material pelo agente ou a
existência de prejuízo material/econômico à instituição financeira
credora. Por derradeiro, a consumação dá-se com a obtenção do
financiamento, ou seja, no momento da assinatura do contrato.
3. Princípio da insignificância inaplicável. Ao realizar-se o cotejo entre
os requisitos fixados pela Corte Suprema para aplicação do princípio da
insignificância, não se mostra viável considerar insignificante a conduta
descrita na denúncia.
4. Desclassificação do crime incabível. O tipo penal descrito no artigo
19 da Lei nº 7.492/86 é forma especial de estelionato, que deve prevalecer
sobre este último por força da aplicação do princípio da especialidade,
de modo que não colhe o pedido da Defesa de que a conduta seja enquadrada
no artigo 171 do Código Penal. Também sob a ótica do núcleo do tipo
penal tal requerimento não se justifica. No caso, tratou-se de obtenção
de financiamento e não de empréstimo, motivo pelo qual não cabe a
desclassificação para o crime de estelionato. A diferença básica
entre as duas operações está na destinação dos recursos liberados:
enquanto o financiamento está atrelado ao custeio de operação específica
e determinada, o empréstimo prevê a livre aplicação, pelo tomador, do
numerário obtido. A imputação dirigida a apelante refere-se à obtenção
de financiamento do tipo CONSTRUCARD, que é uma modalidade de financiamento
disponibilizado pela Caixa Econômica Federal - CEF, com a finalidade de
fornecer crédito para a reforma de imóveis residenciais, sendo que o
crédito possui finalidade específica, qual seja, aquisição de material
de construção, armários embutidos, piscina, elevador e aquecedor solar.
5. Dosimetria da pena. Pena-base reformada. As circunstâncias do crime não
extrapolam o comum em crimes dessa natureza, assim como não há elementos
disponíveis, nos autos, para que se avalie a personalidade da ré. Reconhecida
a atenuante da confissão espontânea. Incide a causa a causa de diminuição
da pena prevista no inciso II do artigo 14 do Código Penal. Incide, ainda,
a causa de aumento de pena no percentual de 1/3 por se tratar de instituição
financeira oficial, segundo o que dispõe o parágrafo único do artigo 19
da Lei 7.492/1986. Pena definitiva fixada em 01 (um) ano, 10 (dez) dez meses
e 06 (seis) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa.
6. Mantido o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo
vigente ao tempo dos fatos.
7. Regime inicial de cumprimento da pena fixado no aberto, nos termos do
artigo 33, § 2º, "c", do Código Penal.
8. Preenchidos os requisitos previstos no artigo 44 do Código Penal (pena
não superior a quatro anos, crime cometido sem violência ou grave ameaça à
pessoa, réu não reincidente e circunstâncias judiciais preponderantemente
favoráveis), substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de
direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo prazo
da pena substituída, e pena pecuniária no valor de 05 (cinco) salários
mínimos, uma vez que suficiente para a reprimenda do delito e equivalente
com a situação econômica.
9. Recurso parcialmente provido.
Ementa
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. ART. 19
DA LEI Nº 7.492/86. NA FORMA DO ART. 14, II, DO CÓDIGO PENAL. CONDUTA
TÍPICA. MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTROVERSAS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
INAPLICÁVEL. DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO PARA O CRIME PREVISTO NO
ART. 171 DO CÓDIGO PENAL. INCABÍVEL. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE
REFORMADA. RECONHECIDA A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. REGIME DE
CUMPRIMENTO FIXADO NO ABERTO. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUBSTITUÍDA NOS
TERMOS DO ART. 44 DO CÓDIGO PENAL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A materialidade e autoria delitivas não foram objeto de recurso, ademais,
restaram devidamente demonstradas nos autos pelo Auto de Prisão em Flagrante,
Auto de Apresentação e Apreensão, Auto de Apreensão e Laudo Pericial, bem
como pelas declarações prestadas pelas testemunhas e pela própria acusada.
2. Conduta típica. A apelante foi condenada como incursa nas penas do artigo
19, parágrafo único, da Lei n.º 7.492/86. O tipo limita-se a obtenção
de financiamento mediante fraude. No caso, qualquer fraude é suficiente
para caracterizar o crime, ainda que não se constitua em crime autônomo de
falsidade. Além disso, a conduta, em si, deve conter ou envolver o elemento
"fraude", mas não se exige que dela advenha algum prejuízo específico
ou outro resultado. Basta a própria obtenção do financiamento (por meio
fraudulento) junto a instituição financeira. Portanto, a consumação do
delito não envolve o ganho de vantagem ilícita material pelo agente ou a
existência de prejuízo material/econômico à instituição financeira
credora. Por derradeiro, a consumação dá-se com a obtenção do
financiamento, ou seja, no momento da assinatura do contrato.
3. Princípio da insignificância inaplicável. Ao realizar-se o cotejo entre
os requisitos fixados pela Corte Suprema para aplicação do princípio da
insignificância, não se mostra viável considerar insignificante a conduta
descrita na denúncia.
4. Desclassificação do crime incabível. O tipo penal descrito no artigo
19 da Lei nº 7.492/86 é forma especial de estelionato, que deve prevalecer
sobre este último por força da aplicação do princípio da especialidade,
de modo que não colhe o pedido da Defesa de que a conduta seja enquadrada
no artigo 171 do Código Penal. Também sob a ótica do núcleo do tipo
penal tal requerimento não se justifica. No caso, tratou-se de obtenção
de financiamento e não de empréstimo, motivo pelo qual não cabe a
desclassificação para o crime de estelionato. A diferença básica
entre as duas operações está na destinação dos recursos liberados:
enquanto o financiamento está atrelado ao custeio de operação específica
e determinada, o empréstimo prevê a livre aplicação, pelo tomador, do
numerário obtido. A imputação dirigida a apelante refere-se à obtenção
de financiamento do tipo CONSTRUCARD, que é uma modalidade de financiamento
disponibilizado pela Caixa Econômica Federal - CEF, com a finalidade de
fornecer crédito para a reforma de imóveis residenciais, sendo que o
crédito possui finalidade específica, qual seja, aquisição de material
de construção, armários embutidos, piscina, elevador e aquecedor solar.
5. Dosimetria da pena. Pena-base reformada. As circunstâncias do crime não
extrapolam o comum em crimes dessa natureza, assim como não há elementos
disponíveis, nos autos, para que se avalie a personalidade da ré. Reconhecida
a atenuante da confissão espontânea. Incide a causa a causa de diminuição
da pena prevista no inciso II do artigo 14 do Código Penal. Incide, ainda,
a causa de aumento de pena no percentual de 1/3 por se tratar de instituição
financeira oficial, segundo o que dispõe o parágrafo único do artigo 19
da Lei 7.492/1986. Pena definitiva fixada em 01 (um) ano, 10 (dez) dez meses
e 06 (seis) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa.
6. Mantido o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo
vigente ao tempo dos fatos.
7. Regime inicial de cumprimento da pena fixado no aberto, nos termos do
artigo 33, § 2º, "c", do Código Penal.
8. Preenchidos os requisitos previstos no artigo 44 do Código Penal (pena
não superior a quatro anos, crime cometido sem violência ou grave ameaça à
pessoa, réu não reincidente e circunstâncias judiciais preponderantemente
favoráveis), substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de
direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo prazo
da pena substituída, e pena pecuniária no valor de 05 (cinco) salários
mínimos, uma vez que suficiente para a reprimenda do delito e equivalente
com a situação econômica.
9. Recurso parcialmente provido.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, a fim de reformar a pena
fixada na r. sentença para 01 (um) ano, 10 (dez) meses e 06 (seis) dias
de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 13 (treze) dias-multa,
no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao
tempo dos fatos, pena corporal substituída por duas restritivas de direitos,
consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo prazo da pena
substituída, e pena pecuniária no valor de 05 (cinco) salários mínimos,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Data do Julgamento
:
22/01/2018
Data da Publicação
:
30/01/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 67712
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** LCCSF-86 LEI DOS CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL
LEG-FED LEI-7492 ANO-1986 ART-19 PAR-ÚNICO
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-14 INC-2 ART-171 ART-44 ART-33 PAR-2 LET-C
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/01/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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