TRF3 0007387-24.2012.4.03.6112 00073872420124036112
PROCESSO CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL
EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DANOS DECORRENTES DE ATIVIDADE
ANTRÓPICA. AUSÊNCIA DE REQUISITOS PARA CARACTERIZAÇÃO DE ÁREA URBANA
OU EXPANÇÃO URBANA. INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA CUMULADA COM OBRIGAÇÃO DE
FAZER. APELAÇÕES DA UNIÃO E MPF PROVIDAS. APELAÇÃO PARTE RÉ PARCIALMENTE
PROVIDA.
1. O caso é de ação civil pública promovida pelo Ministério Público
Federal em face de Hélio Corsato, Eunice Giovani Corsato, Edmilson José
Bernardo Martins e Neci da Silva objetivando a condenação dos requeridos ao
cumprimento de obrigações de fazer e de não fazer relativas à exploração
e recomposição de área de preservação ambiental em sua propriedade, e
demolição de todas as construções existentes na área de preservação
permanente no limites da 500 metros das margens do Rio Paraná, e não
previamente autorizadas pelo órgão ambiental, bem como ao pagamento de
dano de indenização correspondente ao dano ambiental causado.
2. Rejeita-se a preliminar de cerceamento de defesa suscitada ante não
realização das provas e julgamento antecipado da lide. O pedido de
produção de provas foi devidamente analisado e indeferido, inclusive,
sem interposição de recurso dos réus em face da decisão de indeferimento.
3. Ademais, cumpre esclarecer que o juiz é o destinatário legal da prova
e a ele compete produzir as provas que entender necessárias e indeferir
aquelas que lhe parecerem inúteis ao deslinde da causa, à luz do art. 130 do
CPC/1973. Assim, se o magistrado entender que a lide está madura para proferir
decisão, cabe-lhe conhecer diretamente do pedido, julgando antecipadamente
a lide, nos termos do art. 330, I do mesmo código.
4. Quanto ao mérito, é sabido que a ocupação/edificação em área de
preservação permanente constitui dano ambiental in re ipsa, em razão do
local ser qualificado como território non aedificandi.
6. Resta incontroverso nos autos que a área onde se localiza o imóvel dos
apelantes/réus, encontra-se em Área de Preservação Permanente (APP),
pois dista apenas 30 (trinta) metros da margem do Rio Paraná, rio este
que possui largura variável de 2700m a 4000m, conforme consta do laudo de
fls. 77 do apenso, imponto a faixa marginal de proteção de 500 metros.
7. Os documentos anexados aos autos consistente no Relatório Técnico de
Vistoria de fls. 92/104 e de fls. 180/200 e laudos de fls. 71/87 comprovam
que no local em que se situa o imóvel não possui malha viária com
canalização de águas, rede de esgoto, além da falta de tratamento de
resíduos sólidos. Ausente ainda o requisito de densidade demográfica,
por ser inferior aos exigidos 50 habitantes, conforme artigo 47, I da Lei
11.977/2009.
8. Considerando os termos da Resolução Conama 302/2002, bem como em
atenção aos princípios de proteção ambiental e do primado da vedação ao
retrocesso ecológico, segundo o qual deve prevalecer a aplicação da norma
mais favorável e mais rigorosa quanto à fixação de área de preservação
permanente, a área onde se situa os imóveis do apelantes/réus não pode
ser considerada como área urbana consolidada.
9. Quanto ao desmatamento da área questionada, ainda que se reconheça que
os requeridos adquiriram a propriedade após a supressão da vegetação
nativa, comprovou-se que continuaram a causar dano na área de preservação
permanente, ademais, nos casos de reparação de danos ambientais causados em
área de preservação permanente, repisa-se que a obrigação é propter rem,
aderindo ao título de domínio ou posse, independente da efetiva autoria
da degradação ambiental, conforme entendimento já firmado pelo Superior
Tribunal de Justiça.
10. O arquivamento do inquérito policial somente ocorreu pela ausência de
demonstração de que os apelantes agiram com "dolo" e não por ausência
de dano ambiental, ademais, as condutas e atividades consideradas lesivas ao
meio ambiente sujeitão os infratores a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
11. Ante a impossibilidade de regeneração da área sem a demolição das
edificações, não há razoabilidade para afastar aplicação de medida,
sendo necessário desfazer as construções, remover o entulho e recompor
o meio ambiente, com a elaboração de projeto nos termos da sentença,
atentando ao limite estabelecido de 500 metros.
12. As obrigações de fazer ou não fazer destinadas à recomposição
in natura do bem lesado e a indenização pecuniária são perfeitamente
cumuláveis, ao menos em tese, por terem pressupostos diversos, priorizando os
princípios do poluidor-pagador e da reparação integral do dano ambiental,
nos termos dos artigos 225, §3°, da Constituição Federal e 4° da Lei
n° 6.938/1981 (Lei da Política Nacional do Meio Ambiente).
13. Os deveres de indenizar e recuperar possuem natureza de ressarcimento
cível, os quais almejam de forma simultânea e complementar a restauração
do status quo ante do bem ambiental lesado, finalidade maior a ser alcançada
pelo Poder Público e pela sociedade.
14. A possibilidade de cumulação visa, em última análise, evitar o
enriquecimento sem causa, já que a submissão do poluidor tão somente
à reparação do ecossistema degradado fomentaria a prática de ilícitos
contra o meio ambiente. Inexistindo, portanto, bis in idem, os réus não
se eximem da obrigação de indenizar ainda que demonstrem o propósito de
recuperar a área ambientalmente degradada.
15. Imperiosa a condenação da parte ré ao pagamento de indenização
pelos danos causados pela intervenção antrópica na área de preservação
permanente, correspondente à extensão da degradação ambiental e ao
período temporal em que a coletividade esteve privada desse bem comum.
16. À míngua de elementos suficientes para arbitrar o quantum debeatur, a
ser revertido ao Fundo Federal de Defesa de Direitos Difusos, por se tratar
de dano a direito e interesse difuso, este deverá ser fixado na fase de
liquidação, a ser realizada por arbitramento, nos termos dos artigos 509
e 510 do Código de Processo Civil.
17. Remessa necessária e apelações da União Federal e Ministério Público
Federal providas.
18. Apelação da parte ré parcialmente provida.
Ementa
PROCESSO CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL
EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DANOS DECORRENTES DE ATIVIDADE
ANTRÓPICA. AUSÊNCIA DE REQUISITOS PARA CARACTERIZAÇÃO DE ÁREA URBANA
OU EXPANÇÃO URBANA. INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA CUMULADA COM OBRIGAÇÃO DE
FAZER. APELAÇÕES DA UNIÃO E MPF PROVIDAS. APELAÇÃO PARTE RÉ PARCIALMENTE
PROVIDA.
1. O caso é de ação civil pública promovida pelo Ministério Público
Federal em face de Hélio Corsato, Eunice Giovani Corsato, Edmilson José
Bernardo Martins e Neci da Silva objetivando a condenação dos requeridos ao
cumprimento de obrigações de fazer e de não fazer relativas à exploração
e recomposição de área de preservação ambiental em sua propriedade, e
demolição de todas as construções existentes na área de preservação
permanente no limites da 500 metros das margens do Rio Paraná, e não
previamente autorizadas pelo órgão ambiental, bem como ao pagamento de
dano de indenização correspondente ao dano ambiental causado.
2. Rejeita-se a preliminar de cerceamento de defesa suscitada ante não
realização das provas e julgamento antecipado da lide. O pedido de
produção de provas foi devidamente analisado e indeferido, inclusive,
sem interposição de recurso dos réus em face da decisão de indeferimento.
3. Ademais, cumpre esclarecer que o juiz é o destinatário legal da prova
e a ele compete produzir as provas que entender necessárias e indeferir
aquelas que lhe parecerem inúteis ao deslinde da causa, à luz do art. 130 do
CPC/1973. Assim, se o magistrado entender que a lide está madura para proferir
decisão, cabe-lhe conhecer diretamente do pedido, julgando antecipadamente
a lide, nos termos do art. 330, I do mesmo código.
4. Quanto ao mérito, é sabido que a ocupação/edificação em área de
preservação permanente constitui dano ambiental in re ipsa, em razão do
local ser qualificado como território non aedificandi.
6. Resta incontroverso nos autos que a área onde se localiza o imóvel dos
apelantes/réus, encontra-se em Área de Preservação Permanente (APP),
pois dista apenas 30 (trinta) metros da margem do Rio Paraná, rio este
que possui largura variável de 2700m a 4000m, conforme consta do laudo de
fls. 77 do apenso, imponto a faixa marginal de proteção de 500 metros.
7. Os documentos anexados aos autos consistente no Relatório Técnico de
Vistoria de fls. 92/104 e de fls. 180/200 e laudos de fls. 71/87 comprovam
que no local em que se situa o imóvel não possui malha viária com
canalização de águas, rede de esgoto, além da falta de tratamento de
resíduos sólidos. Ausente ainda o requisito de densidade demográfica,
por ser inferior aos exigidos 50 habitantes, conforme artigo 47, I da Lei
11.977/2009.
8. Considerando os termos da Resolução Conama 302/2002, bem como em
atenção aos princípios de proteção ambiental e do primado da vedação ao
retrocesso ecológico, segundo o qual deve prevalecer a aplicação da norma
mais favorável e mais rigorosa quanto à fixação de área de preservação
permanente, a área onde se situa os imóveis do apelantes/réus não pode
ser considerada como área urbana consolidada.
9. Quanto ao desmatamento da área questionada, ainda que se reconheça que
os requeridos adquiriram a propriedade após a supressão da vegetação
nativa, comprovou-se que continuaram a causar dano na área de preservação
permanente, ademais, nos casos de reparação de danos ambientais causados em
área de preservação permanente, repisa-se que a obrigação é propter rem,
aderindo ao título de domínio ou posse, independente da efetiva autoria
da degradação ambiental, conforme entendimento já firmado pelo Superior
Tribunal de Justiça.
10. O arquivamento do inquérito policial somente ocorreu pela ausência de
demonstração de que os apelantes agiram com "dolo" e não por ausência
de dano ambiental, ademais, as condutas e atividades consideradas lesivas ao
meio ambiente sujeitão os infratores a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
11. Ante a impossibilidade de regeneração da área sem a demolição das
edificações, não há razoabilidade para afastar aplicação de medida,
sendo necessário desfazer as construções, remover o entulho e recompor
o meio ambiente, com a elaboração de projeto nos termos da sentença,
atentando ao limite estabelecido de 500 metros.
12. As obrigações de fazer ou não fazer destinadas à recomposição
in natura do bem lesado e a indenização pecuniária são perfeitamente
cumuláveis, ao menos em tese, por terem pressupostos diversos, priorizando os
princípios do poluidor-pagador e da reparação integral do dano ambiental,
nos termos dos artigos 225, §3°, da Constituição Federal e 4° da Lei
n° 6.938/1981 (Lei da Política Nacional do Meio Ambiente).
13. Os deveres de indenizar e recuperar possuem natureza de ressarcimento
cível, os quais almejam de forma simultânea e complementar a restauração
do status quo ante do bem ambiental lesado, finalidade maior a ser alcançada
pelo Poder Público e pela sociedade.
14. A possibilidade de cumulação visa, em última análise, evitar o
enriquecimento sem causa, já que a submissão do poluidor tão somente
à reparação do ecossistema degradado fomentaria a prática de ilícitos
contra o meio ambiente. Inexistindo, portanto, bis in idem, os réus não
se eximem da obrigação de indenizar ainda que demonstrem o propósito de
recuperar a área ambientalmente degradada.
15. Imperiosa a condenação da parte ré ao pagamento de indenização
pelos danos causados pela intervenção antrópica na área de preservação
permanente, correspondente à extensão da degradação ambiental e ao
período temporal em que a coletividade esteve privada desse bem comum.
16. À míngua de elementos suficientes para arbitrar o quantum debeatur, a
ser revertido ao Fundo Federal de Defesa de Direitos Difusos, por se tratar
de dano a direito e interesse difuso, este deverá ser fixado na fase de
liquidação, a ser realizada por arbitramento, nos termos dos artigos 509
e 510 do Código de Processo Civil.
17. Remessa necessária e apelações da União Federal e Ministério Público
Federal providas.
18. Apelação da parte ré parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar parcial provimento à apelação dos réus, nos termos
do voto do Relator, e, por maioria, dar provimento à remessa oficial,
tida por interposta, e às apelações da União Federal e do Ministério
Público Federal, nos termos do voto do Des. Federal Antonio Cedenho,
vencido o Relator que negava provimento à remessa oficial tida por ocorrida,
e dava parcial provimento às apelações da União Federal e do Ministério
Público Federal.
Data do Julgamento
:
02/08/2018
Data da Publicação
:
10/08/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2005098
Órgão Julgador
:
TERCEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL NERY JUNIOR
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO
Referência
legislativa
:
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-130 ART-330 INC-1
LEG-FED LEI-11977 ANO-2009
LEG-FED RES-302 ANO-2002
CONAMA
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-225 PAR-3
LEG-FED LEI-6938 ANO-1981 ART-4
***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-509 ART-510
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/08/2018
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