TRF3 0007395-29.2006.4.03.6106 00073952920064036106
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. FORMAÇÃO DE QUADRILHA.
TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. CRIME DO ARTIGO 273, §§1º, 1º-A, 1º-B,
INCISOS I, III e V, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA DENÚNCIA,
NULIDADE DO PROCESSO e NULIDADE DA SENTENÇA REJEITADAS. MATERIALIDADE
COMPROVADA. AUTORIA DEMONSTRADA. DESCABIMENTO DA CONDENAÇÃO POR CRIME DE
ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO, ALÉM DO CRIME DE QUADRILHA.
1. Apelações interpostas pela Acusação e pela Defesa contra sentença
que condenou o réu à pena de 04 anos e 06 meses de reclusão como incurso
no artigo 288 do Código Penal.
2. Preliminar de inépcia da denúncia rejeitada. A denúncia descreve de
maneira satisfatória as condutas imputadas, contendo exposição objetiva dos
fatos ditos delituosos. O réu na ação penal defende-se dos fatos narrados
na denúncia e não de sua qualificação jurídica e assim, não implica em
inépcia da denúncia o acerto ou desacerto da capitulação legal atribuída
provisoriamente pela acusação e constante da denúncia, que poderá ser
corrigida no momento da prolação da sentença meritória. Precedentes.
3. Preliminar de bis in idem rejeitada. Não se vislumbra da documentação
encaminhada pela autoridade estadunidense que o acusado tenha sido condenado
pelo crime semelhante ao de formação de quadrilha. Verifica-se apenas o
indiciamento do acusado pela autoridade americana por conspiração para
distribuir substâncias controladas e a condenação à pena de 63 meses de
prisão, porém sem indicação da imputação. Competia à defesa o ônus
da prova do alegado bis in idem, a teor do artigo 156 do CPP, o que não se
observa no caso, não havendo ainda elementos para se falar em detração
da pena.
4. Preliminar de nulidade da prova documental desprovida de tradução
rejeitada. Eferida documentação constitui apenas pequena parte do
acervo probatório da materialidade e autoria delitiva em relação ao
acusado. Caso entendesse necessário, a defesa poderia solicitar a tradução
da documentação.
5. Preliminar de nulidade do depoimento de testemunha rejeitada. No primeiro
depoimento foi prestado no processo criminal original, a testemunha relatou
fatos que diziam respeito aos demais integrantes da quadrilha. Ao prestar o
segundo depoimento na ação penal desmembrada, a testemunha limitou-se aos
fatos que dizem respeito ao apelante Mauro Cesar, e não em relação aos
demais membros da quadrilha, de modo que não há que se falar em omissão
de informações.
6. Preliminar de nulidade da sentença extra petita, por aplicação de
preceito secundário previsto no artigo 8º da lei 8072/90 sem pedido expresso
da acusação rejeitada. Não se trata de inovação na acusação, pois
a denúncia imputou ao acusado o crime de formação de quadrilha voltado
para a prática dos crimes de tráfico de drogas e de medicamentos de uso
e comércio controlado e de medicamentos e substâncias nocivas à saúde
humana, previstos como crime hediondo e equiparado a hediondo.
7. A materialidade do delito de quadrilha encontra-se demonstrada pela
associação prévia e vínculo estável entre os componentes, alguns deles
vindo de uma estrutura familiar, e outros de elo de amizade. O conjunto
probatório comprova que os laços entre os réus para a prática de crime
hediondo (artigo 273, §§1º, 1º-A, 1º-B e incisos I, III e V, do Código
Penal do Código Penal) e crime assemelhado a hediondo (artigo 12 da Lei
6.368/1976) eram duradouros e estáveis.
8. Não há como se ter a necessária certeza para a condenação de Mauro
pelo crime de tráfico de drogas. Não consta dos autos laudo pericial que
ateste a natureza da substancia apreendida em sua residência, sequer havendo
cópia do laudo elaborado pela autoridade americana que ateste tecnicamente
ou pericialmente que a natureza dos comprimidos são de oxicodona.
9. Descabida a dupla condenação dos réus como incursos no artigo 288
do Código Penal e artigo 14 da Lei 6.368/1976, levando-se em conta haver
um único dolo de união para os cometimentos dos crimes de tráfico e
do artigo 273 do Código Penal. O intento dos acusados era a associação
para o cometimento de delitos, compreendendo a venda ao exterior tanto de
substâncias enquadradas como drogas, como enquadradas como medicamentos,
independentemente da natureza destas.
10. Quanto às substâncias apreendidas nas residências de Alessandro,
Juliana e Anderson e nas correspondências interceptadas pelos Correios,
não há nenhuma provas nos autos de que seriam comercializadas por Mauro ou
ainda que tenham sido pagos com ordens de pagamento em favor de Mauro ou de
sua empresa Modular TS. Mauro e sua empresa não eram os únicos recebedores
das ordens de pagamento. Não consta dos autos nenhum elemento que vincule
as apreensões efetuadas no Brasil com o acusado Mauro Fileto.
11. A distinção dos agentes entre os de classe social privilegiada e
desprivilegiada, entre os que possuem acesso à educação ou não, entre
ricos e pobres e entre jovens e idosos levaria a uma diferenciação despida
de fundamento legal e constitucional, no que diz respeito à reprovabilidade
de crimes.
12. A motivação apresentada para a avaliação negativa da conduta social
e personalidade do paciente Mauro revela-se absolutamente incongruente,
diante do reconhecimento, na própria sentença, da inexistência de registros
criminais anteriores em nome do paciente. O ilícito sob julgamento na ação
penal não pode servir de justificativa para a conclusão de "propensão à
prática de ilícitos penais", pois constitui o único registro criminal
contra o paciente, como reconhecido na sentença, considerando-se que o
exame da conduta social e da personalidade do agente, quanto ao aspecto
da existência de registros criminais, deve pautar-se em acontecimentos
anteriores ao crime e não ao próprio crime sob julgamento.
13. Nem mesmo inquéritos e ações penais em andamento justificam a
valoração negativa da personalidade do réu. Precedentes.
14. O lucro fácil é o móvel natural daqueles que se organizam para o
tráfico de substâncias entorpecentes, não justificando a majoração da
pena. Precedentes.
15. A prática do crime por organização criminosa de estrutura não
rudimentar ou estacionária, mediante a utilização de site criado
exclusivamente para a venda ilegal dos medicamentos, havendo inclusive elo de
contato no exterior (apelante Mauro César Fileto) para a comercialização,
com duração da prática delituosa por tempo considerável comporta a maior
reprovabilidade da conduta.
16. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva
de direitos, em face do não preenchimento dos requisitos subjetivos do
art. 44 do Código Penal, considerando que as circunstâncias judiciais não
lhe são favoráveis, tanto que fixada a pena-base acima do mínimo legal.
17. Considerando as circunstâncias judiciais desfavoráveis, ponderadas na
primeira fase da dosimetria da pena, correta a fixação do regime inicial de
cumprimento de pena semiberto, tendo por fundamento o disposto no artigo 33,
§ 3º, do Código Penal.
19. Apelação do MPF desprovida. Apelação da defesa parcialmente provida
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. FORMAÇÃO DE QUADRILHA.
TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. CRIME DO ARTIGO 273, §§1º, 1º-A, 1º-B,
INCISOS I, III e V, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA DENÚNCIA,
NULIDADE DO PROCESSO e NULIDADE DA SENTENÇA REJEITADAS. MATERIALIDADE
COMPROVADA. AUTORIA DEMONSTRADA. DESCABIMENTO DA CONDENAÇÃO POR CRIME DE
ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO, ALÉM DO CRIME DE QUADRILHA.
1. Apelações interpostas pela Acusação e pela Defesa contra sentença
que condenou o réu à pena de 04 anos e 06 meses de reclusão como incurso
no artigo 288 do Código Penal.
2. Preliminar de inépcia da denúncia rejeitada. A denúncia descreve de
maneira satisfatória as condutas imputadas, contendo exposição objetiva dos
fatos ditos delituosos. O réu na ação penal defende-se dos fatos narrados
na denúncia e não de sua qualificação jurídica e assim, não implica em
inépcia da denúncia o acerto ou desacerto da capitulação legal atribuída
provisoriamente pela acusação e constante da denúncia, que poderá ser
corrigida no momento da prolação da sentença meritória. Precedentes.
3. Preliminar de bis in idem rejeitada. Não se vislumbra da documentação
encaminhada pela autoridade estadunidense que o acusado tenha sido condenado
pelo crime semelhante ao de formação de quadrilha. Verifica-se apenas o
indiciamento do acusado pela autoridade americana por conspiração para
distribuir substâncias controladas e a condenação à pena de 63 meses de
prisão, porém sem indicação da imputação. Competia à defesa o ônus
da prova do alegado bis in idem, a teor do artigo 156 do CPP, o que não se
observa no caso, não havendo ainda elementos para se falar em detração
da pena.
4. Preliminar de nulidade da prova documental desprovida de tradução
rejeitada. Eferida documentação constitui apenas pequena parte do
acervo probatório da materialidade e autoria delitiva em relação ao
acusado. Caso entendesse necessário, a defesa poderia solicitar a tradução
da documentação.
5. Preliminar de nulidade do depoimento de testemunha rejeitada. No primeiro
depoimento foi prestado no processo criminal original, a testemunha relatou
fatos que diziam respeito aos demais integrantes da quadrilha. Ao prestar o
segundo depoimento na ação penal desmembrada, a testemunha limitou-se aos
fatos que dizem respeito ao apelante Mauro Cesar, e não em relação aos
demais membros da quadrilha, de modo que não há que se falar em omissão
de informações.
6. Preliminar de nulidade da sentença extra petita, por aplicação de
preceito secundário previsto no artigo 8º da lei 8072/90 sem pedido expresso
da acusação rejeitada. Não se trata de inovação na acusação, pois
a denúncia imputou ao acusado o crime de formação de quadrilha voltado
para a prática dos crimes de tráfico de drogas e de medicamentos de uso
e comércio controlado e de medicamentos e substâncias nocivas à saúde
humana, previstos como crime hediondo e equiparado a hediondo.
7. A materialidade do delito de quadrilha encontra-se demonstrada pela
associação prévia e vínculo estável entre os componentes, alguns deles
vindo de uma estrutura familiar, e outros de elo de amizade. O conjunto
probatório comprova que os laços entre os réus para a prática de crime
hediondo (artigo 273, §§1º, 1º-A, 1º-B e incisos I, III e V, do Código
Penal do Código Penal) e crime assemelhado a hediondo (artigo 12 da Lei
6.368/1976) eram duradouros e estáveis.
8. Não há como se ter a necessária certeza para a condenação de Mauro
pelo crime de tráfico de drogas. Não consta dos autos laudo pericial que
ateste a natureza da substancia apreendida em sua residência, sequer havendo
cópia do laudo elaborado pela autoridade americana que ateste tecnicamente
ou pericialmente que a natureza dos comprimidos são de oxicodona.
9. Descabida a dupla condenação dos réus como incursos no artigo 288
do Código Penal e artigo 14 da Lei 6.368/1976, levando-se em conta haver
um único dolo de união para os cometimentos dos crimes de tráfico e
do artigo 273 do Código Penal. O intento dos acusados era a associação
para o cometimento de delitos, compreendendo a venda ao exterior tanto de
substâncias enquadradas como drogas, como enquadradas como medicamentos,
independentemente da natureza destas.
10. Quanto às substâncias apreendidas nas residências de Alessandro,
Juliana e Anderson e nas correspondências interceptadas pelos Correios,
não há nenhuma provas nos autos de que seriam comercializadas por Mauro ou
ainda que tenham sido pagos com ordens de pagamento em favor de Mauro ou de
sua empresa Modular TS. Mauro e sua empresa não eram os únicos recebedores
das ordens de pagamento. Não consta dos autos nenhum elemento que vincule
as apreensões efetuadas no Brasil com o acusado Mauro Fileto.
11. A distinção dos agentes entre os de classe social privilegiada e
desprivilegiada, entre os que possuem acesso à educação ou não, entre
ricos e pobres e entre jovens e idosos levaria a uma diferenciação despida
de fundamento legal e constitucional, no que diz respeito à reprovabilidade
de crimes.
12. A motivação apresentada para a avaliação negativa da conduta social
e personalidade do paciente Mauro revela-se absolutamente incongruente,
diante do reconhecimento, na própria sentença, da inexistência de registros
criminais anteriores em nome do paciente. O ilícito sob julgamento na ação
penal não pode servir de justificativa para a conclusão de "propensão à
prática de ilícitos penais", pois constitui o único registro criminal
contra o paciente, como reconhecido na sentença, considerando-se que o
exame da conduta social e da personalidade do agente, quanto ao aspecto
da existência de registros criminais, deve pautar-se em acontecimentos
anteriores ao crime e não ao próprio crime sob julgamento.
13. Nem mesmo inquéritos e ações penais em andamento justificam a
valoração negativa da personalidade do réu. Precedentes.
14. O lucro fácil é o móvel natural daqueles que se organizam para o
tráfico de substâncias entorpecentes, não justificando a majoração da
pena. Precedentes.
15. A prática do crime por organização criminosa de estrutura não
rudimentar ou estacionária, mediante a utilização de site criado
exclusivamente para a venda ilegal dos medicamentos, havendo inclusive elo de
contato no exterior (apelante Mauro César Fileto) para a comercialização,
com duração da prática delituosa por tempo considerável comporta a maior
reprovabilidade da conduta.
16. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva
de direitos, em face do não preenchimento dos requisitos subjetivos do
art. 44 do Código Penal, considerando que as circunstâncias judiciais não
lhe são favoráveis, tanto que fixada a pena-base acima do mínimo legal.
17. Considerando as circunstâncias judiciais desfavoráveis, ponderadas na
primeira fase da dosimetria da pena, correta a fixação do regime inicial de
cumprimento de pena semiberto, tendo por fundamento o disposto no artigo 33,
§ 3º, do Código Penal.
19. Apelação do MPF desprovida. Apelação da defesa parcialmente providaDecisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, negar provimento à apelação da acusação e dar parcial
provimento à apelação da defesa para reduzir a pena-base, fixando a pena
em 03 anos e 06 meses de reclusão, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
24/05/2016
Data da Publicação
:
02/06/2016
Classe/Assunto
:
ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 52007
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-33 PAR-4 ART-44 ART-273 PAR-1 PAR-1A PAR-1B
INC-1 INC-3 INC-5 ART-288
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-156
***** LCH-90 LEI DOS CRIMES HEDIONDOS
LEG-FED LEI-8072 ANO-1990 ART-8
***** LT-76 LEI DE TÓXICOS
LEG-FED LEI-6368 ANO-1976 ART-12 ART-14
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/06/2016
..FONTE_REPUBLICACAO:
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