TRF3 0007400-50.2012.4.03.6103 00074005020124036103
DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. IMÓVEIS DA EXTINTA REDE FERROVIÁRIA
FEDERAL S.A. - RFFSA. TRANSFERÊNCIA À UNIÃO FEDERAL. OCUPAÇÃO DA ÁREA
POR TERCEIROS. DIREITO À AQUISIÇÃO E À PREFERÊNCIA NA COMPRA. LEI
Nº 11.483/2007. NECESSIDADE DE CONCLUSÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO PARA
VERIFICAÇÃO DA POSSIBILIDADE DE SEREM AS FAMÍLIAS RESIDENTES NA ÁREA
BENEFICIADAS PELO DIREITO DE AQUISIÇÃO.
1. A Lei n. 11.483, de 31 de maio de 2.007 visou resguardar, de um lado,
(a) o direito "aos ocupantes de baixa renda dos imóveis não-operacionais
residenciais", na "aquisição por venda direta do imóvel", bem como o direito
aos ocupantes não considerados de baixa renda, "o direito de preferência
na compra do imóvel" (artigos 12 e 13), e, de outro lado, (b) permitir que
tais imóveis (não-operacionais) pudessem ser alienados diretamente, desde
que destinados a: 1) "programas de regularização fundiária e provisão
habitacional de interesse social", 2) "programas de reabilitação de áreas
urbanas", 3) "sistemas de circulação e transporte", ou 4) "implantação
ou funcionamento de órgãos públicos" (artigo 14).
2. Há de ser fazer uma distinção entre as hipóteses colocadas pelos
artigos 12 e 13 da Lei 11.483/07, dado que elas demandam soluções diversas.
3. O artigo 12 é taxativo em estabelecer ser "assegurado o direito à
aquisição" do imóvel, pelo mecanismo da "venda direta". Trata-se de
verdadeiro direito real decorrente de lei, oponível à União Federal. Nessa
hipótese não pode a União Federal invocar os favores do artigo 14 da Lei
11.483/07.
4. Importante, nesse ponto, considerar que tanto a análise tópica dos
dispositivos em questão (artigos 12 e 14), quanto a interpretação da
natureza desses dispositivos legais da Lei 11.483/07, levam à conclusão
da impossibilidade de a União Federal transferir os imóveis, na forma do
artigo 14, sem antes garantir aos ocupantes de baixa renda o direito posto
pelo artigo 12, estando autorizado a aliená-los diretamente se e somente se
restar comprovado que os ocupantes desses imóveis não sejam considerados
de baixa renda ou não manifestem eles esse interesse ou, ainda, não reúnam
condições objetivas de aquisição.
5. A vontade legal é clara nesse sentido: sendo os imóveis residenciais,
não-operacionais, da extinta RFFSA, ocupados por pessoas consideradas de
"baixa renda" a elas deve ser assegurada a aquisição mediante o procedimento
da venda direta: daí, não sendo preenchida essa condição ou, em sendo
preenchida, não seja possível viabilizar a venda direta por absoluta falta
de meios ou de interesse dos ocupantes, estará o imóvel liberado para os
fins do artigo 14.
6. Diferente, por corolário lógico, é a situação posta pelo artigo 13,
que confere aos ocupantes não enquadrados como de "baixa renda", o direito de
preferência na compra, situação que só se coloca na hipótese de a União
Federal pretender vender, pelos mecanismos legais a ela disponibilizados,
os imóveis em questão, devendo, nesse caso, oportunizar aos ocupantes o
exercício do direito de preferência, preço por preço.
7. Quanto aos demais pontos dos pedidos deduzidos na ação civil pública,
a saber: obrigação de fazer "consistente em realizar a retomada dos bens
litigados com o ônus de garantir outra moradia às pessoas que habitam os
imóveis, no raio de 3 (três) quilômetros do local das moradias previamente
à desocupação efetiva dos imóveis, sob pena de indenizar cada família em
R$ 300.000,00 (trezentos mil reais)" e a de "inserir, no respectivo contrato,
cláusula obrigando o beneficiário a arcar com o ônus de garantir a moradia
das pessoas que habitam os imóveis, no raio de 4 (três) quilômetros do
local das moradias previamente à desocupação efetiva dos mesmos, sob pena
de indenizar cada família em R$ 300.000,00 (trezentos mil reais)", tudo com
fundamento no artigo 6º da Constituição da República, tais pretensões
não se sustentam. Não há previsão que imponha tais providências. Os
próprios bens transferidos à União Federal, por força de lei, conferem
o direito de propriedade e estabelecem as limitações e possibilidade de
uso, não havendo nenhuma previsão de garantia aos ocupantes dos imóveis,
além daquelas já exaustivamente consideradas (direito à aquisição e
direito à preferência na compra).
8. O artigo 6º da Constituição Federal, ao prever o direito à moradia
como um dos direitos sociais, não dá ao Poder Judiciário atribuições
típicas do Poder Executivo e do Poder Legislativo de implementarem as
políticas públicas aí previstas, dentre elas a da moradia.
9. Apelação parcialmente provida.
Ementa
DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. IMÓVEIS DA EXTINTA REDE FERROVIÁRIA
FEDERAL S.A. - RFFSA. TRANSFERÊNCIA À UNIÃO FEDERAL. OCUPAÇÃO DA ÁREA
POR TERCEIROS. DIREITO À AQUISIÇÃO E À PREFERÊNCIA NA COMPRA. LEI
Nº 11.483/2007. NECESSIDADE DE CONCLUSÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO PARA
VERIFICAÇÃO DA POSSIBILIDADE DE SEREM AS FAMÍLIAS RESIDENTES NA ÁREA
BENEFICIADAS PELO DIREITO DE AQUISIÇÃO.
1. A Lei n. 11.483, de 31 de maio de 2.007 visou resguardar, de um lado,
(a) o direito "aos ocupantes de baixa renda dos imóveis não-operacionais
residenciais", na "aquisição por venda direta do imóvel", bem como o direito
aos ocupantes não considerados de baixa renda, "o direito de preferência
na compra do imóvel" (artigos 12 e 13), e, de outro lado, (b) permitir que
tais imóveis (não-operacionais) pudessem ser alienados diretamente, desde
que destinados a: 1) "programas de regularização fundiária e provisão
habitacional de interesse social", 2) "programas de reabilitação de áreas
urbanas", 3) "sistemas de circulação e transporte", ou 4) "implantação
ou funcionamento de órgãos públicos" (artigo 14).
2. Há de ser fazer uma distinção entre as hipóteses colocadas pelos
artigos 12 e 13 da Lei 11.483/07, dado que elas demandam soluções diversas.
3. O artigo 12 é taxativo em estabelecer ser "assegurado o direito à
aquisição" do imóvel, pelo mecanismo da "venda direta". Trata-se de
verdadeiro direito real decorrente de lei, oponível à União Federal. Nessa
hipótese não pode a União Federal invocar os favores do artigo 14 da Lei
11.483/07.
4. Importante, nesse ponto, considerar que tanto a análise tópica dos
dispositivos em questão (artigos 12 e 14), quanto a interpretação da
natureza desses dispositivos legais da Lei 11.483/07, levam à conclusão
da impossibilidade de a União Federal transferir os imóveis, na forma do
artigo 14, sem antes garantir aos ocupantes de baixa renda o direito posto
pelo artigo 12, estando autorizado a aliená-los diretamente se e somente se
restar comprovado que os ocupantes desses imóveis não sejam considerados
de baixa renda ou não manifestem eles esse interesse ou, ainda, não reúnam
condições objetivas de aquisição.
5. A vontade legal é clara nesse sentido: sendo os imóveis residenciais,
não-operacionais, da extinta RFFSA, ocupados por pessoas consideradas de
"baixa renda" a elas deve ser assegurada a aquisição mediante o procedimento
da venda direta: daí, não sendo preenchida essa condição ou, em sendo
preenchida, não seja possível viabilizar a venda direta por absoluta falta
de meios ou de interesse dos ocupantes, estará o imóvel liberado para os
fins do artigo 14.
6. Diferente, por corolário lógico, é a situação posta pelo artigo 13,
que confere aos ocupantes não enquadrados como de "baixa renda", o direito de
preferência na compra, situação que só se coloca na hipótese de a União
Federal pretender vender, pelos mecanismos legais a ela disponibilizados,
os imóveis em questão, devendo, nesse caso, oportunizar aos ocupantes o
exercício do direito de preferência, preço por preço.
7. Quanto aos demais pontos dos pedidos deduzidos na ação civil pública,
a saber: obrigação de fazer "consistente em realizar a retomada dos bens
litigados com o ônus de garantir outra moradia às pessoas que habitam os
imóveis, no raio de 3 (três) quilômetros do local das moradias previamente
à desocupação efetiva dos imóveis, sob pena de indenizar cada família em
R$ 300.000,00 (trezentos mil reais)" e a de "inserir, no respectivo contrato,
cláusula obrigando o beneficiário a arcar com o ônus de garantir a moradia
das pessoas que habitam os imóveis, no raio de 4 (três) quilômetros do
local das moradias previamente à desocupação efetiva dos mesmos, sob pena
de indenizar cada família em R$ 300.000,00 (trezentos mil reais)", tudo com
fundamento no artigo 6º da Constituição da República, tais pretensões
não se sustentam. Não há previsão que imponha tais providências. Os
próprios bens transferidos à União Federal, por força de lei, conferem
o direito de propriedade e estabelecem as limitações e possibilidade de
uso, não havendo nenhuma previsão de garantia aos ocupantes dos imóveis,
além daquelas já exaustivamente consideradas (direito à aquisição e
direito à preferência na compra).
8. O artigo 6º da Constituição Federal, ao prever o direito à moradia
como um dos direitos sociais, não dá ao Poder Judiciário atribuições
típicas do Poder Executivo e do Poder Legislativo de implementarem as
políticas públicas aí previstas, dentre elas a da moradia.
9. Apelação parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
05/07/2016
Data da Publicação
:
14/07/2016
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2028854
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/07/2016
..FONTE_REPUBLICACAO:
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