TRF3 0007558-15.2011.4.03.6112 00075581520114036112
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL. LEGITIMIDADE
PASSIVA DA UNIÃO. CONFIGURAÇÃO. PRESCRIÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. PESSOA
PORTADORA DA SÍNDROME DA TALIDOMIDA. INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. CABIMENTO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
- A autora pleiteia indenização por danos morais, prevista no artigo 1º da
Lei nº 12.190/2010, em razão de ser portadora de síndrome de talidomida,
doença que lhe causou má-formação congênita incapacitante.
- A despeito de o artigo 3º do Decreto nº 7.235/2010 dispor que cabe
ao INSS a operacionalização do pagamento da indenização prevista na
Lei nº 12.190/2010, previu que as dotações específicas devem provir do
orçamento da União. Assim, está claro que os recursos para o pagamento do
ressarcimento provêm dos cofres da União, o que denota o seu interesse no
feito. Ademais, no presente pleito a causa de pedir está relacionada não
somente ao disposto na Lei nº 12.190/2010, como também à conduta omissiva
o Ministério da Saúde, órgão da União, no que toca à fiscalização da
produção, venda, distribuição e embalagem da talidomida, sem a devida
publicidade à população quanto às consequências de seu uso, o que
gerou a oportunidade de ingestão por gestantes, o que geraria o dever de
indenizar as vítimas. Destarte, a preliminar deve ser afastada. Precedente
desta corte regional.
- No que diz respeito à prescrição, de acordo com a jurisprudência
pacificada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça por meio do julgamento
do REsp nº 1251993, submetido à sistemática do artigo 543-C do CPC
e da REsp. STJ nº 8/2008, prevalece o prazo prescricional quinquenal -
previsto do Decreto 20.910/32 - nas ações indenizatórias ajuizadas contra
a Fazenda Pública, em detrimento do prazo trienal contido no Código Civil
de 2002. O principal fundamento que autoriza tal afirmação decorre da
natureza especial do Decreto 20.910/32, que regula a prescrição, seja qual
for a sua natureza, das pretensões formuladas contra a Fazenda Pública,
ao contrário da disposição prevista no Código Civil, norma geral que
regula o tema de maneira genérica, a qual não altera o caráter especial
da legislação, muito menos é capaz de determinar a sua revogação. Sobre
o tema: Rui Stoco ("Tratado de Responsabilidade Civil". Editora Revista
dos Tribunais, 7ª Ed. - São Paulo, 2007; págs. 207/208) e Lucas Rocha
Furtado ("Curso de Direito Administrativo". Editora Fórum, 2ª Ed. -
Belo Horizonte, 2010; pág. 1042). 5. A previsão contida no art. 10 do
Decreto 20.910/32, por si só, não autoriza a afirmação de que o prazo
prescricional nas ações indenizatórias contra a Fazenda Pública foi
reduzido pelo Código Civil de 2002, a qual deve ser interpretada pelos
critérios histórico e hermenêutico. Nesse sentido: Marçal Justen Filho
("Curso de Direito Administrativo". Editora Saraiva, 5ª Ed. - São Paulo,
2010; págs. 1.296/1.299).
- A corte superior assentou orientação no sentido de que o termo "a quo"
do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de indenização contra
ato do Estado, por dano moral e material, conta-se da ciência inequívoca
dos efeitos decorrentes do ato lesivo (REsp 1172028/RJ, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/04/2010, DJe 20/04/2010).
- A jurisprudência do STJ assentou ter o artigo 1º do Decreto-lei nº
20.910/32 estabelecido a prescrição quinquenal de qualquer direito ou
ação contra a fazenda pública, seja qual for a sua natureza, a partir
do ato ou fato do qual se originou (REsp nº 534.671/CE). Entende-se que
a prescrição na espécie atinge o próprio fundo de direito. Assim, na
espécie, feito o diagnóstico da talidomida com o conhecimento do paciente,
passa a correr o prazo prescricional.
- De acordo com os documentos acostados aos autos, constata-se que a
autora teve ciência inequívoca das consequências de eventual ato
lesivo em 25/08/2011, data do diagnóstico da má formação por uso de
talidomida. Ressalte-se que a União não produziu prova em contrário,
de modo que prevalece a prova acostada aos autos pela requerente. Assim,
considerada essa data e à vista de que a presente demanda foi proposta em
05.10.2011 (fl. 02), é certo que não decorreu o prazo prescricional.
- A Constituição Federal de 1988, no artigo 37, § 6º, da CF, impõe ao
Estado o dever de indenizar os danos causados a terceiros por seus servidores,
independentemente da prova do dolo ou culpa.
- A indenização por danos morais no caso específico das deformidades
físicas causadas pelo uso da talidomida foi prevista no artigo 1º da Lei
12.190/2010.
- Dada a constatação por perícia de que a deficiência da autora é
compatível com a talidomida, bem como considerado que nasceu em época em
que o fármaco já era comercializado, resulta que faz jus à indenização
prevista no artigo 1º da Lei nº 12.190/2010.
- Na espécie, configurou-se o nexo causal, liame entre a conduta omissiva da
ré (fato danoso), que falhou na fiscalização e na publicidade dos efeitos
danosos do medicamento, que eram de sua responsabilidade, em razão de que
cabe ao governo federal tal atividade, por meio do Ministério da Saúde,
e a lesão acarretada. Ademais, o ente estatal não provou causa excludente
de responsabilidade e se cingiram a alegar que não foi demonstrada a sua
culpa no evento, o que não o exime do dever de indenizar.
- Quanto ao valor da indenização, segundo doutrina e jurisprudência
pátrias, a indenização por dano moral tem duplo conteúdo: de sanção
e compensação. As deformidades congênitas sofridas pela requerente nos
membros superiores são gravíssimas, eis que acompanhadas das patologias
consequentes, geram dor, parestesia e perda de força (laudo de fls. 52/55),
além dos danos estéticos. Consequentemente, tais sequelas certamente
tiraram a tranquilidade e provocaram sério sofrimento na autora sob o aspecto
emocional. Diante desses fatos, inexiste um montante capaz de aplacar tamanha
dor. De todo modo, o valor fixado em R$ 100.000,00 (cem mil reais) não se
mostra exacerbado, pois cumpre os critérios mencionados.
- A sentença deve ser reformada no que toca ao termo inicial da correção
monetária, que deve ser fixado na data da condenação (Súmula 362 do
Superior Tribunal de Justiça).
- Quanto ao cálculo dos juros de mora e correção monetária, determinou-se
que fosse realizado de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos
para os Cálculos na Justiça Federal, o qual nada mais faz do que explicitar
os índices aplicáveis de acordo com as normas vigentes no período,
nos seguintes termos: correção monetária, a partir de janeiro de 2001,
aplicável IPCA-E / IBGE (em razão da extinção da Ufir como indexador,
pela MP n. 1.973-67/2000, art. 29, §3º), observado que o percentual a ser
utilizado em janeiro de 2001 deverá ser o IPCA-E acumulado no período
de janeiro a dezembro de 2000. A partir de janeiro de 2001, deverá ser
utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15 / IBGE). Já a título de juros de mora:
de jan/2003 a jun/2009 aplica-se a Selic (Art. 406 da Lei n.10.406/2002 -
Código Civil); de jul/2009 a abr/2012, aplica-se a taxa de 0,5% ao mês
(Art. 1º.-F da Lei n. 9.494, de 10 de setembro de 1997, com a redação dada
pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, combinado com a Lei n. 8.177, de
1º de março de 1991); e a partir de maio/2012 incide o mesmo percentual de
juros incidentes sobre a caderneta de poupança, capitalizados de forma simples
(Art. 1º.-F da Lei n. 9.494, de 10 de setembro de 1997, com a redação dada
pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, combinado com a Lei n. 8.177,
de 1º de março de 1991, com alterações da MP n. 567, de 03 de maio de
2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012). Ressalte-se que
nessa especificação de índices já está considerado o resultado das ADI
Nº 4357 e 4425, bem como a respectiva modulação de seus efeitos pelo STF.
- Preliminares rejeitadas. Apelação da União e reexame necessário
parcialmente providos.
Ementa
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL. LEGITIMIDADE
PASSIVA DA UNIÃO. CONFIGURAÇÃO. PRESCRIÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. PESSOA
PORTADORA DA SÍNDROME DA TALIDOMIDA. INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. CABIMENTO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
- A autora pleiteia indenização por danos morais, prevista no artigo 1º da
Lei nº 12.190/2010, em razão de ser portadora de síndrome de talidomida,
doença que lhe causou má-formação congênita incapacitante.
- A despeito de o artigo 3º do Decreto nº 7.235/2010 dispor que cabe
ao INSS a operacionalização do pagamento da indenização prevista na
Lei nº 12.190/2010, previu que as dotações específicas devem provir do
orçamento da União. Assim, está claro que os recursos para o pagamento do
ressarcimento provêm dos cofres da União, o que denota o seu interesse no
feito. Ademais, no presente pleito a causa de pedir está relacionada não
somente ao disposto na Lei nº 12.190/2010, como também à conduta omissiva
o Ministério da Saúde, órgão da União, no que toca à fiscalização da
produção, venda, distribuição e embalagem da talidomida, sem a devida
publicidade à população quanto às consequências de seu uso, o que
gerou a oportunidade de ingestão por gestantes, o que geraria o dever de
indenizar as vítimas. Destarte, a preliminar deve ser afastada. Precedente
desta corte regional.
- No que diz respeito à prescrição, de acordo com a jurisprudência
pacificada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça por meio do julgamento
do REsp nº 1251993, submetido à sistemática do artigo 543-C do CPC
e da REsp. STJ nº 8/2008, prevalece o prazo prescricional quinquenal -
previsto do Decreto 20.910/32 - nas ações indenizatórias ajuizadas contra
a Fazenda Pública, em detrimento do prazo trienal contido no Código Civil
de 2002. O principal fundamento que autoriza tal afirmação decorre da
natureza especial do Decreto 20.910/32, que regula a prescrição, seja qual
for a sua natureza, das pretensões formuladas contra a Fazenda Pública,
ao contrário da disposição prevista no Código Civil, norma geral que
regula o tema de maneira genérica, a qual não altera o caráter especial
da legislação, muito menos é capaz de determinar a sua revogação. Sobre
o tema: Rui Stoco ("Tratado de Responsabilidade Civil". Editora Revista
dos Tribunais, 7ª Ed. - São Paulo, 2007; págs. 207/208) e Lucas Rocha
Furtado ("Curso de Direito Administrativo". Editora Fórum, 2ª Ed. -
Belo Horizonte, 2010; pág. 1042). 5. A previsão contida no art. 10 do
Decreto 20.910/32, por si só, não autoriza a afirmação de que o prazo
prescricional nas ações indenizatórias contra a Fazenda Pública foi
reduzido pelo Código Civil de 2002, a qual deve ser interpretada pelos
critérios histórico e hermenêutico. Nesse sentido: Marçal Justen Filho
("Curso de Direito Administrativo". Editora Saraiva, 5ª Ed. - São Paulo,
2010; págs. 1.296/1.299).
- A corte superior assentou orientação no sentido de que o termo "a quo"
do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de indenização contra
ato do Estado, por dano moral e material, conta-se da ciência inequívoca
dos efeitos decorrentes do ato lesivo (REsp 1172028/RJ, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/04/2010, DJe 20/04/2010).
- A jurisprudência do STJ assentou ter o artigo 1º do Decreto-lei nº
20.910/32 estabelecido a prescrição quinquenal de qualquer direito ou
ação contra a fazenda pública, seja qual for a sua natureza, a partir
do ato ou fato do qual se originou (REsp nº 534.671/CE). Entende-se que
a prescrição na espécie atinge o próprio fundo de direito. Assim, na
espécie, feito o diagnóstico da talidomida com o conhecimento do paciente,
passa a correr o prazo prescricional.
- De acordo com os documentos acostados aos autos, constata-se que a
autora teve ciência inequívoca das consequências de eventual ato
lesivo em 25/08/2011, data do diagnóstico da má formação por uso de
talidomida. Ressalte-se que a União não produziu prova em contrário,
de modo que prevalece a prova acostada aos autos pela requerente. Assim,
considerada essa data e à vista de que a presente demanda foi proposta em
05.10.2011 (fl. 02), é certo que não decorreu o prazo prescricional.
- A Constituição Federal de 1988, no artigo 37, § 6º, da CF, impõe ao
Estado o dever de indenizar os danos causados a terceiros por seus servidores,
independentemente da prova do dolo ou culpa.
- A indenização por danos morais no caso específico das deformidades
físicas causadas pelo uso da talidomida foi prevista no artigo 1º da Lei
12.190/2010.
- Dada a constatação por perícia de que a deficiência da autora é
compatível com a talidomida, bem como considerado que nasceu em época em
que o fármaco já era comercializado, resulta que faz jus à indenização
prevista no artigo 1º da Lei nº 12.190/2010.
- Na espécie, configurou-se o nexo causal, liame entre a conduta omissiva da
ré (fato danoso), que falhou na fiscalização e na publicidade dos efeitos
danosos do medicamento, que eram de sua responsabilidade, em razão de que
cabe ao governo federal tal atividade, por meio do Ministério da Saúde,
e a lesão acarretada. Ademais, o ente estatal não provou causa excludente
de responsabilidade e se cingiram a alegar que não foi demonstrada a sua
culpa no evento, o que não o exime do dever de indenizar.
- Quanto ao valor da indenização, segundo doutrina e jurisprudência
pátrias, a indenização por dano moral tem duplo conteúdo: de sanção
e compensação. As deformidades congênitas sofridas pela requerente nos
membros superiores são gravíssimas, eis que acompanhadas das patologias
consequentes, geram dor, parestesia e perda de força (laudo de fls. 52/55),
além dos danos estéticos. Consequentemente, tais sequelas certamente
tiraram a tranquilidade e provocaram sério sofrimento na autora sob o aspecto
emocional. Diante desses fatos, inexiste um montante capaz de aplacar tamanha
dor. De todo modo, o valor fixado em R$ 100.000,00 (cem mil reais) não se
mostra exacerbado, pois cumpre os critérios mencionados.
- A sentença deve ser reformada no que toca ao termo inicial da correção
monetária, que deve ser fixado na data da condenação (Súmula 362 do
Superior Tribunal de Justiça).
- Quanto ao cálculo dos juros de mora e correção monetária, determinou-se
que fosse realizado de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos
para os Cálculos na Justiça Federal, o qual nada mais faz do que explicitar
os índices aplicáveis de acordo com as normas vigentes no período,
nos seguintes termos: correção monetária, a partir de janeiro de 2001,
aplicável IPCA-E / IBGE (em razão da extinção da Ufir como indexador,
pela MP n. 1.973-67/2000, art. 29, §3º), observado que o percentual a ser
utilizado em janeiro de 2001 deverá ser o IPCA-E acumulado no período
de janeiro a dezembro de 2000. A partir de janeiro de 2001, deverá ser
utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15 / IBGE). Já a título de juros de mora:
de jan/2003 a jun/2009 aplica-se a Selic (Art. 406 da Lei n.10.406/2002 -
Código Civil); de jul/2009 a abr/2012, aplica-se a taxa de 0,5% ao mês
(Art. 1º.-F da Lei n. 9.494, de 10 de setembro de 1997, com a redação dada
pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, combinado com a Lei n. 8.177, de
1º de março de 1991); e a partir de maio/2012 incide o mesmo percentual de
juros incidentes sobre a caderneta de poupança, capitalizados de forma simples
(Art. 1º.-F da Lei n. 9.494, de 10 de setembro de 1997, com a redação dada
pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, combinado com a Lei n. 8.177,
de 1º de março de 1991, com alterações da MP n. 567, de 03 de maio de
2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012). Ressalte-se que
nessa especificação de índices já está considerado o resultado das ADI
Nº 4357 e 4425, bem como a respectiva modulação de seus efeitos pelo STF.
- Preliminares rejeitadas. Apelação da União e reexame necessário
parcialmente providos.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, rejeitar as preliminares e dar parcial provimento ao apelo da
União e ao reexame necessário para reformar em parte a sentença a fim de
fixar o termo inicial da correção monetária na data da condenação, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Data do Julgamento
:
18/07/2018
Data da Publicação
:
02/08/2018
Classe/Assunto
:
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2149647
Órgão Julgador
:
QUARTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRETE
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/08/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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