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Jurisprudência


TRF3 0007780-98.2007.4.03.9999 00077809820074039999

Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. TEMPO ESPECIAL. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DO INSS PROVIDAS. SENTENÇA REFORMADA. 1 - No caso, a r. sentença julgou procedente o pedido e reconheceu o labor rural no período 01/01/1967 a 03/06/1973 e da especialidade das atividades exercidas nos períodos de 01/02/83 a 09/12/1986, 04/02/1987 a 30/06/1987, 23/07/1987 a 21/10/1987, 01/02/1988 a 09/12/1995, 08/05/1996 a 24/12/1996 e 08/01/1997 a 31/01/1998 e condenou o INSS a conceder ao autor a aposentadoria por tempo de serviço, devido desde o requerimento administrativo (24/07/1998). 2 - Determinou que as parcelas vencidas deveriam ser pagas de uma só vez e corrigidas monetariamente a partir de cada um dos vencimentos, nos termos da Súmula 148, do Superior Tribunal de Justiça, e Súmula nº 8, deste Tribunal, com atualização conforme o disposto no art. 41, da Lei nº 8.213/91, incidindo, ainda, juros de mora, a partir de cada um dos vencimentos, calculados pela SELIC. 3 - Condenou o INSS, ainda, no pagamento integral dos honorários advocatícios, os quais foram arbitrados em 10% sobre o valor da condenação, incidindo somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença (Súmula 111, do STJ). 4 - Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ. 5 - O autor requereu administrativamente a aposentadoria em 24/07/1998, com o cálculo de tempo de serviço de 34 anos, 06 meses e 11 dias, e a demanda foi ajuizada em 17/10/2000. Ao proferir a sentença, cabe ao juiz considerar os fatos constitutivos, modificativos ou extintivos que influírem no julgamento da lide (art. 462, CPC/73 e 493, CPC/2015) e aplicar a norma jurídica que entender cabível, razões pelas quais a decisão proferida em 1º grau de jurisdição não constitui julgamento "extra" ou "ultra petita". 6 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça. 7 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado. 8 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea. 9 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII. 10 - É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. 11 - A certidão de transmissão de imóvel e a escritura pública de fls. 18/19 apenas comprovam a propriedade das terras, em nome de terceiros, mas não comprovam o efetivo exercício de labor rural pelo demandante. Assim, não é possível presumir que a parte autora exerceu atividades campesinas. 12 - A Declaração de Exercício de Atividade Rural expedida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Aurora-CE (fls. 20/21), não pode ser considerada, à míngua de homologação por parte do INSS (art. 106, III, da Lei nº 8.213/91); idêntica solução se aplica ao documento de fl. 17, uma vez que se trata de declaração de terceiro. 13 - Os demais documentos trazidos aos autos não são contemporâneos ao período que se pretende comprovar como de exercício de atividade rural, razão pela qual entendo não haver início de prova material da atividade rurícola, remanescendo apenas as provas testemunhais (fls. 247/251), que não são suficientes para a comprovação da condição de trabalhador rural, nos termos do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, razão pela qual incide a Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, o que inviabiliza o reconhecimento do tempo de serviço rural no período de 01/01/1967 a 03/06/1973. 14 - Pretende o autor, ainda, a contagem de períodos de labor especial. 15 - Os formulários de fls. 27 e 171 e o laudo técnico de fls. 28/29 comprovam que, nos períodos de 01/02/83 a 09/12/1986, 23/07/1987 a 21/10/1987 e 08/05/1996 a 24/12/1996, o autor esteve exposto, de modo habitual e permanente, ao agente nocivo ruído de 96 decibéis, gerado pela centrífuga, e de 88 a 97 decibéis, gerado pela moenda. 16 - Por outro lado, os formulários de fls. 30 e 144 e os laudos técnicos de fls. 31/41 e 145/154 comprovam que, no período de 04/02/1987 a 30/06/1987, o autor esteve exposto, de modo habitual e permanente, a agentes químicos, à poeira de algodão suspensa e ao agente nocivo ruído variável de 89 a 99 decibéis. 17 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais. 18 - O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB. 19 - O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável. 20 - De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB. 21 - A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB. 22 - Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB. 23 - Enquadrado como especial o labor exercido nos períodos de 01/02/83 a 09/12/1986, 04/02/1987 a 30/06/1987, 23/07/1987 a 21/10/1987 e 08/05/1996 a 24/12/1996, por ter o autor desempenhado as atividades sempre exposto ao agente nocivo ruído acima de 80 (oitenta) decibéis, nível considerado insalubre pelo anexo do Decreto nº 53.831/64 (código 1.1.6). 24 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999). 25 - Cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor. 26 - Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. 27 - Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374. 28 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos. 29 - Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais. 30 - Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição à agente nocivo, por qualquer modalidade de prova. 31 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador. 32 - Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior. 33 - Infere-se, no mérito, que o labor em atividade especial exercido pelo requerente no período de 01/02/1988 a 09/12/1995, desempenhado na Frig-Frigorífico Indl. Guararapes Ltda., restou comprovado pelo formulário de fl. 42 e pelo laudo técnico de fls. 44/45, isto porque o autor exercia a função de servente, no setor de bucharia, local que "é encarregado da limpeza dos buchos, onde são colocados em tanques com água fervendo, juntamente com água oxigenada para branquear o mesmo. A faca é usada na limpeza dos buchos, onde são retiradas as partes não próprias para o consumo. O funcionário deste setor corre o risco de contrair doenças infeciosas tais como: TUBERCULOSE, BRUCELOSE." 34 - Os fatores de riscos aos quais o autor estava exposto estão enquadrados como especiais e estão classificados nos códigos 1.3.1, dos Anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, ratificados pelo Decreto nº 611/92 (art. 292). 35 - Referente ao período de 08/01/1997 a 31/01/1998, apesar da percepção de adicional de insalubridade, o formulário de fls. 46 não especifica as funções exercidas - servente-graxaria e não há indicação exata quanto ao agente agressivo calor. Não é possível também - ante a não descrição do que consistia o trabalho - correlacionar as funções com agentes biológicos ou instrumentos perfuro-cortantes. 36 - O formulário de fls. 46, atesta que o autor exerceu a função de servente, no setor de graxaria do Frigorífico Margen Ltda., que tem por ramo de atividade o abate e frigorífico de bovinos, conforme registro na CTPS de fl. 261. 37 - Conforme o citado formulário, "Sua função como serviços gerais de graxaria, leva o funcionário a ficar constantemente exposto a uma temperatura por volta de 30 a 35º, isso ocorre porque há no setor um digestor onde é frito os resíduos da carne, para a industrialização da farinha de osso, farinha de sangue, farinha de carne. (...) No setor o funcionário corre o risco de contrair doenças infecciosas tais como brucelose, tuberculose, isso pode ocorrer em virtude do mesmo estar manuziando produtos condenados pela inspeção federal. Por esse fato o funcionário percebe a título de insalubridade de 20% s/salário mínimo." 38 - Ocorre que o supracitado período deve ser considerado de labor comum, pois as atividades foram exercidas após a vigência da Lei nº 9.032, de 29/04/1995, e nos autos não há laudo pericial ou Perfil Profissiográfico Previdenciário para os períodos reconhecidos como especiais que demonstre a efetiva exposição àqueles agentes nocivos. 39 - Observe-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça. 40 - Somando-se os períodos de labor especial reconhecidos nesta demanda (01/02/83 a 09/12/1986, 04/02/1987 a 30/06/1987, 23/07/1987 a 21/10/1987, 01/02/1988 a 09/12/1995 e 08/05/1996 a 24/12/1996), devidamente convertidos em comuns, acrescidos aos períodos incontroversos constantes do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS (fls. 219/220), constata-se que o demandante contava com 28 anos, 05 meses e 11 dias de contribuição em 24/07/1998, data do requerimento administrativo (fls. 213/218) tempo insuficiente a lhe assegurar o direito à aposentadoria proporcional ou integral por tempo de contribuição a partir daquela data, e, em 21/03/2003, data imediatamente anterior à concessão administrativa da aposentadoria por invalidez, alcançou 32 anos, 05 meses e 11 dias de tempo de contribuição e tinha 52 anos de idade, inferior à mínima prevista para a concessão da aposentadoria proporcional (53 anos). 41 - Remessa necessária e apelação do INSS providas.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa necessária e à apelação do INSS para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição e julgar improcedentes os pedidos de aposentadoria por tempo de serviço a partir da data do requerimento administrativo e de reconhecimentos do labor rural no período de 01/01/1967 a 03/06/1973 e da especialidade do labor exercido no período de 08/01/1997 a 31/01/1998 e inverter o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 05/07/2017
Data da Publicação : 17/07/2017
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1179001
Órgão Julgador : SÉTIMA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/07/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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