main-banner

Jurisprudência


TRF3 0007862-84.2010.4.03.6100 00078628420104036100

Ementa
CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO - CONSTRUCARD. CERCEAMENTO DE DEFESA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. REVISÃO DO CONTRATO. TABELA PRICE. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS. PENA CONVENCIONAL, DESPESAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM 20%. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. O artigo 330 do Código de Processo Civil permite ao magistrado julgar antecipadamente a causa e dispensar a produção de provas, quando a questão for unicamente de direito e os documentos acostados aos autos forem suficientes ao exame do pedido. E o artigo 130 do Código de Processo Civil confere ao juiz a possibilidade de avaliar a necessidade da prova e de indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias, de modo que, caso a prova fosse efetivamente necessária a prova pericial contábil para o deslinde da questão, teria o Magistrado ordenado sua realização, independentemente de requerimento. Na hipótese, inexiste o alegado cerceamento de defesa, porquanto a parte recorrente confessa a existência da dívida, porém, de forma genérica e sem qualquer fundamentação, insurge-se contra os valores cobrados tão somente sob a alegação de onerosidade excessiva - deixando de questionar qualquer cláusula contratual que considere abusiva. 2. Não há mais controvérsia acerca da aplicabilidade dos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor às instituições financeiras, conforme posicionamento do Supremo Tribunal Federal na ADIN 2591/DF e disposto no enunciado da súmula nº 297 do Superior Tribunal de Justiça. Embora inegável a relação de consumo existente entre os litigantes, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, não significa ignorar por completo as cláusulas contratuais pactuadas, a legislação aplicável à espécie e o entendimento jurisprudencial consolidado. 3. É possível a revisão do contrato de abertura de crédito, desde que a apelante aponte concretamente alguma ilegalidade em suas cláusulas. 4. Inexiste qualquer ilegalidade na utilização do Sistema Francês de Amortização, conhecido como Tabela Price, previsto na cláusula que amortiza a dívida em prestações periódicas, iguais e sucessivas, cujo valor de cada prestação é composto de uma parcela de capital (amortização) e outra de juros. 5. No que diz respeito à capitalização de juros vale ressaltar que, diante da vedação contida no artigo 4º do Decreto nº 22.626, de 07 de abril de 1.933, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula nº 121. Com a edição Medida Provisória nº 1963-17 de 31.03.00 (reeditada sob o nº 2.170-36, de 23/082001), a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, acompanhando a evolução legislativa, assentou o entendimento no sentido de que "é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada." (REsp 973827/RS, submetido ao rito dos recursos repetitivos (artigo. 543-C do CPC) Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/08/2012, DJe 24/09/2012). Conquanto recentemente o E. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.388.972/SC, tambem sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia, tenha firmado a tese de que: "A cobrança de juros capitalizados nos contratos de mútuo é permitida quando houver expressa pactuação", persiste a restrição temporal firmada no julgamento do REsp nº 973.827/RS e na Súmula nº 539 do STJ no sentido de somente ser permitida a capitalização de juros nos contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001). A meu ver, a nova tese apenas reforça o entendimento que já existia em relação à necessidade de pactuação expressa. É importante destacar ainda que o E. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 973.827, cuja ementa encontra-se supra transcrita, consolidou que a pactuação da capitalização dos juros tem que ser realizada de forma expressa e clara, bem como que basta a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal para que seja lícita a cobrança da capitalização. Neste sentido, confiram-se as súmulas nºs 539 e 541 do Superior Tribunal de Justiça. No caso dos autos, admite-se a capitalização mensal dos juros remuneratórios, desde que expressamente pactuados (ou, nos termos da tese firmada pelo STJ, conste no contrato que a taxa de juros anual seja superior ao duodécuplo da mensal), pois o contrato foi celebrado em 16/06/2009, isto é, em data posterior à edição da aludida medida provisória. Todavia, verifico da leitura do contrato de abertura de crédito de fls. 09/15 que: (i) em relação ao período de adimplemento/normalidade do contrato (período de utilização e período de amortização), incidem juros remuneratórios à taxa efetiva de 1,59% ao mês e correção monetária pela Taxa Referencial - TR, conforme dispõem as cláusulas nona e décima; (ii) em relação ao período de inadimplemento, incidem juros remuneratórios à taxa efetiva de 1,59% ao mês com capitalização mensal, correção monetária pela Taxa Referencial - TR e juros de mora à taxa de 0,03333% por dia de atraso, além da possibilidade de cobrança de cláusula pena/pena convencional/multa de mora à taxa de 2% do valor da dívida, conforme dispõem as cláusulas décima quarta e décima sétima. Pois bem. Como se vê, nenhuma de suas cláusulas previu, expressamente, a capitalização dos juros remuneratórios para o período de normalidade do contrato, tampouco consta no contrato que a taxa de juros anual ultrapassa o duodécuplo da taxa mensal, de modo que não é possível presumir a pactuação da capitalização, nos termos da jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça. Em assim sendo, inexistindo comprovação de que houve pactuação da capitalização mensal dos juros remuneratórios para o período de normalidade do contrato, é ilegal a sua cobrança. Por sua vez, a capitalização mensal dos juros remuneratórios foi expressamente prevista para o período de inadimplemento do contrato, conforme se depreende do parágrafo primeiro da cláusula décima quarta, de modo que não há qualquer ilegalidade na sua cobrança. 6. No tocante à taxa de juros em limite superior a 12% ao ano, a jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal é pacífica no sentido de que, cuidando-se de operações realizadas por instituição integrante do Sistema Financeiro Nacional, não incide a limitação prevista na lei de Usura (Decreto nº 22.626, 07.04.33). Esse entendimento encontra-se consolidado na Súmula nº 596. Insta salientar que a parte ré, por ocasião das operações que originaram a presente ação, estava ciente da taxa cobrada pela instituição financeira, ora recorrida, a qual não se submetia ao limite constitucional de 12% ao ano, de que tratava o § 3º do artigo 192 da Constituição Federal, atualmente revogado pela Emenda Constitucional nº 40 de 29.05.2003. É que a Excelsa Corte já havia proclamado que o § 3º, do artigo 192 da Constituição Federal não era autoaplicável, dependendo de lei ordinária para a sua regulamentação, tendo restado cristalizado tal entendimento na Súmula nº 648. Registre-se, por oportuno, que no julgamento do Recurso Especial nº 1.061530/RS, submetido ao rito dos recursos repetitivos (art. 543-C do Código de Processo Civil), o E. Superior Tribunal de Justiça se posicionou no sentido de que a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade. A par disso, a abusividade na cobrança de juros extorsivos somente restaria configurada se a instituição financeira estivesse praticando taxa de juros em percentual superior à média praticada pelo mercado, hipótese, não verificada nos presentes autos. No caso dos autos, verifico que O "Contrato Particular de Abertura de Crédito à Pessoa Física para Financiamento de Materiais de Construção e Outros Pactos", estipulou, de forma expressa e clara, a taxa dos juros remuneratórios em "1,59% ao mês", na sua cláusula oitava (fl. 11 dos autos da execução, bem como a taxa dos juros moratórios em "0,033333% por dia de atraso", na sua cláusula décima quinta, parágrafo segundo (fl. 13). Desse modo, considerando que a taxa/percentual foi expressamente pactuada e a parte embargante não demonstrou que tal valor seja superior à média praticada pelo mercado, não há qualquer ilegalidade/abusividade na sua cobrança. 7. Quanto à cláusula contratual que prevê a cobrança de multa contratual de 2%, bem como de despesas judiciais e honorários advocatícios, resta prejudicado exame da matéria, pois a CEF não incluiu estes valores no débito em cobrança, consoante se depreende do demonstrativo de fl. 24. 8. Por todas as razões expostas, a sentença deve ser reformada apenas para afastar a capitalização mensal dos juros remuneratórios no período de adimplemento do contrato. Consigno ainda que eventuais ilegalidades verificadas no contrato não ensejam a nulidade total deste. Impõe-se, em verdade, que a CEF proceda ao recálculo do valor devido de acordo com os critérios ora estabelecidos, abatendo-se dele os valores que a autora tenha pagado a título de encargos ilegais. 9. Por fim, persiste a sucumbência em maior grau da parte ré-embargante, devendo ser mantida a condenação ao pagamento das custas processuais e verba honorária nos termos fixados na sentença. 10. Recurso de apelação da parte ré-embargante parcialmente provido apenas para afastar a capitalização mensal dos juros remuneratórios no período de adimplemento do contrato.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso de apelação da parte ré-embargante apenas para afastar a capitalização mensal dos juros remuneratórios no período de adimplemento do contrato, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 09/04/2018
Data da Publicação : 13/04/2018
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1854405
Órgão Julgador : QUINTA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-330 ART-130 ***** CDC-90 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR LEG-FED LEI-8078 ANO-1990 ***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA LEG-FED SUM-297 ***** LU-33 LEI DE USURA LEG-FED DEC-22626 ANO-1933 ART-4 ***** STF SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL LEG-FED SUM-121 LEG-FED MPR-2170 ANO-2001 EDIÇÃO 36 ***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-543C LEG-FED MPR-1963 ANO-2000 EDIÇÃO 17 ***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA LEG-FED SUM-539 ***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA LEG-FED SUM-541 ***** LU-33 LEI DE USURA LEG-FED DEC-22626 ANO-1933 ***** STF SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL LEG-FED SUM-596 ***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 LEG-FED ANO-1988 ART-192 PAR-3 LEG-FED EMC-40 ANO-2003 ***** STF SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL LEG-FED SUM-648
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/04/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão