TRF3 0007883-13.2008.4.03.6106 00078831320084036106
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA
POR INVALIDEZ. SEGURADO ESPECIAL. ATIVIDADE AGROPECUÁRIA. REGIME
DE ECONOMIA FAMILIAR. CÔNJUGE DE PARCEIRO/MEEIRO DE GLEBA RURAL
INFERIOR A 4 (QUATRO) MODÚLOS FISCAIS. QUALIDADE DE SEGURADA
DEMONSTRADA. LAUDO MÉDICO. INCAPACIDADE ABSOLUTA E TEMPORÁRIA. IDADE
AVANÇADA. DIVERSAS INTERNAÇÕES PSIQUIÁTRICAS. INVIABILIDADE DE PROCESSO
REABILITATÓRIO. ANÁLISE DO CONTEXTO SOCIOECONÔMICO E HISTÓRICO
LABORAL. SÚMULA 47 DO TNU. PRECEDENTE DO STJ. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE CONFIGURADA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. ALTERAÇÃO DOS
CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO DA CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA DE
OFÍCIO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista
no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da
Constituição Federal.
2 - A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, preconiza que o benefício
previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que
tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições
mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz
e insusceptível de reabilitação para exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que
tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente
inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze)
dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
4 - O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre
que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência,
será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o
benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60
da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
5 - Independe de carência, entretanto, a concessão do benefício
nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença
profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar
no Regime, não impede o deferimento do benefício se tiver decorrido a
inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
7 - Necessário para o implemento do beneplácito em tela, revestir-se
do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher
as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a
Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, o qual
pode ser prorrogado por 24 (vinte e quatro) meses aos que contribuíram por
mais de 120 (cento e vinte) meses, nos termos do art. 15 e §1º da Lei.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12
(doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência
Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de
auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91,
incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
9 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo,
com base em exame pericial de fls. 179/183, relatou: "Pericianda com quadro
compatível com transtorno afetivo bipolar (CID-10 F31), uma 'doença mental',
nas lides juspsiquiátricas. Diagnóstico diferencial, no presente caso,
com transtorno mental orgânico. Da análise da psicofarmacoterapia ora
empregada, verifica-se a necessidade de reavaliação da mesma, para que
a pericianda possa almejar qualquer melhora em seu quadro. Observe-se, à
guisa de esclarecimento, que a pericianda não faz uso sequer de medicação
estabilizadora de humor, conduta principal no quadro que apresenta. (...) Em
função do exame empreendido e das informações colhidas, verifica-se
que a pericianda não apresenta, nos dias atuais, qualquer capacidade
para o desempenho de atividades laborativas, inclusive as anteriormente
efetuadas. Tal incapacidade é, a principio, de natureza potencialmente
temporária, com duração de até seis meses, condicionada tal duração
aos fatores acima apontados (adequação da psicofarmacoterapia, adesão
da pericianda ao tratamento, inexistência de patologias orgânicas)"
(sic). Não fixou a data de início da incapacidade (DII).
10 - Apesar de ter concluído pelo caráter temporário desta, tenho que
a autora, em realidade, está incapacitada, de forma permanente, para o
exercício de atividade remunerada que lhe provenha o sustento.
11 - Se afigura pouco crível que, quem sempre trabalhou na roça, em
regime de economia familiar, desempenhando atividades braçais, e que conta,
atualmente, com mais de 59 (cinquenta e nove) anos de idade, após ter sido
submetida a diversas internações psiquiátricas, vá conseguir, após
reabilitação, capacitação e treinamento, recolocação profissional em
outras funções. Aliás, a autora acostou aos autos comprovantes de estadia
no HOSPITAL DR. ADOLFO BEZERRA DE MENEZES, por mais de 20 (vinte) dias, em
duas oportunidades, em 1996 (fl. 42) e 1997 (fl. 51). Difícil acreditar,
portanto, que a autora conseguirá se restabelecer, visto que, após mais
de 10 (dez) anos das referidas internações, apresentou-se ao perito com
quadro severo de comprometimento psíquico.
12 - Dessa forma, tem-se que a demandante é incapaz e totalmente
insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta
a subsistência, sobretudo, em virtude do seu contexto socioeconômico,
histórico laboral e das moléstias das quais é portadora, ensejando a
concessão de aposentadoria por invalidez.
13 - Análise do contexto social e econômico, com base na Súmula 47
da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais e da
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: STJ - AgRg no Ag: 1270388 PR
2010/0010566-9, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 29/04/2010,
T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/05/2010.
14 - Por sua vez, a requerente também demonstrou sua filiação ao RGPS,
eis que se encontrava na situação de segurada especial, quando inequívoca
a existência de incapacidade para o labor, isto é, na data da primeira
internação, em meados do ano de 1996, já que não há a fixação da DII
pelo expert.
15 - A autora acostou sua certidão de casamento com SANTO SEBASTIÃO PINTO,
na qual este se encontra qualificado como "lavrador" (fl. 16). Acostou,
ainda, diversos contratos de parceria agrícola, firmados por seu esposo,
referente ao imóvel FAZENDA SANTA MARIA, na qual este se comprometia
a explorar 4.000 (quatro mil) pés de café, com sua família. Os
contratos abrangem os seguintes períodos: de 01º/10/1984 a 01º/10/1987
(fls. 17/20); de 01º/10/1992 a 30/09/1995 (fls. 21/24); de 01º/10/1996
a 01º/10/1999 (fls. 25/30); e, por fim, de 01º/10/1999 a 01º/10/2002
(fls. 31/36). Impende ressaltar que cláusula comum nas avenças determina
que "o conjunto familiar auxiliará nos trabalhos da parceria agrícola sem
qualquer vínculo empregatício com o outorgante (...)", denotando o regime
de economia familiar do empreendimento. Também foram juntadas aos autos
notas fiscais, relativas à venda de sacas de café, registradas em nome do
cônjuge da requerente, abrangendo o período de 1979 a 2005 (fls. 85/115).
16 - Conforme depoimento do seu esposo (fl. 172), analisado na sequência,
a propriedade rural tinha em sua totalidade 50.000 (cinquenta mil) pés de
café, o que indica, a princípio, que a autora e seu cônjuge detinham a
posse de apenas 8% (oito por cento) do imóvel. Nessa senda, haja vista que
a FAZENDA MARIA possuía no total 143 ha² (fls. 37/38), e que o módulo
fiscal do Município de Cedral/SP, localidade da área rural, é de 20 ha²
(consulta ao sítio eletrônico do INCRA), inegável que a parte pertencente
à demandante era inferior a 4 (quatro) módulos fiscais para os fins do
disposto no art. 11, VII, a), 1, c), e §1º, da Lei 8.213/91.
17 - A autora preenche todos os requisitos previstos no referido
dispositivo. Com efeito, à época do surgimento da incapacidade, era cônjuge
de parceiro/meeiro, o qual explorava atividade agropecuária em área rural de
até 4 (quatro) módulos fiscais, na qual o trabalho dos membros da família
era indispensável à subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do
núcleo familiar.
18 - Realizada audiência de instrução e julgamento, em 20/11/2008
(fls. 171/177), foram colhidos os depoimentos do seu curador (esposo) e de
testemunhas por ela arroladas, os quais vieram a corroborar os documentos
acostada aos autos, senão vejamos: SANTO SEBASTIÃO PINTO afirmou que "a
autora parou de trabalhar em 1994 porque ficou doente. A autora trabalhava na
roça com o depoente. Nem a autora nem o depoente trabalharam em atividades
urbanas. Até 2006 o depoente e a autora moraram na fazenda Santa Maria
de Gentil Carlos Polachini, depois mudaram-se para a cidade de Guapiaçu
e o depoente passou a trabalhar na lavoura de cana-de-açúcar da Usina
Guarani. O depoente e a autora moraram na fazenda Santa Maria de 1986 a 2006. O
depoente era parceiro na lavoura de café e a autora ajudava o depoente até
a época em que parou de trabalhar". Questionado pelo procurador do INSS,
disse que "a fazenda Santa Maria tem aproximadamente 154 alqueires e há
cerca de cinquenta mil pés de café plantados. O depoente era parceiro em
quatro mil pés de café e nunca contratou ninguém para auxiliar, 'se for
pagar não compensa'" (fl. 172). A testemunha SEBASTIÃO MANCIR DOS SANTOS
relatou que "conhece a autora desde 1990 quando ela morava na fazenda Santa
Maria de Gentil Carlos Polanchini. A referida fazenda fica na região das
Palmeiras em Cedral. A autora morava com seu marido e ambos tinha parceira
de café na fazenda Santa Maria. A autora e seu marido cuidavam de quatro
mil pés de café e não eram auxiliados por mais ninguém. A autora e seu
marido saíram da fazenda Santa Maria em 2006. Ao que se recorda, depois que
conheceu a autora ela trabalhou por mais uns dois anos e começou a ficar
doente, sendo internada em 1994, depois em 1996, 1997 e 2002. O depoente foi
empregado na fazenda Santa Maria e ainda trabalha lá" (sic). Questionado
pelos patronos de ambas as partes, respondeu que "quatro mil pés de café
são plantados em cerca de dois alqueires de terra" e "depois que a autora
parou de trabalhar em 1994 seu marido continuou trabalhando sozinho"
(fls. 173/174). PAULO PEDRO CRIPPA afirmou que "conhece a autora desde
1969. Sabe que a autora trabalhou em lavoura de café desde os onze anos
de idade. Atualmente a autora não trabalha porque ficou doente. Não sabe
quando a autora parou de trabalhar. Conheceu a autora quando ela se mudou
com sua família para a fazenda Boa Esperança no município de Cedral. Em
1978 a autora se casou com o Sr. Santo e mudou-se para outro sítio. Sabe
que depois a autora e seu marido mudaram-se para a fazenda Santa Marina de
Gentil Polachini onde ficaram 'mais anos'. Sabe que a autora trabalhou na
fazenda Santa Marina porque o depoente conversava com seus pais. Algumas
vezes o depoente viu a autora trabalhando na lavoura de café da fazenda
Santa Marina porque passava por lá. Sabe que em 1994 a autora ficou doente
e já não trabalhou mais" (fls. 175/176). GENTIL CARLOS POLACHINI disse
que "conhece a autora e seu marido porque moraram na propriedade rural do
depoente. A autora e seu marido moraram na fazenda do depoente por quinze
ou vinte anos e trabalharam na lavoura de café em regime de parceria. A
autora e seu marido moraram e trabalharam na fazenda do depoente até 2005
ou 2006. Cuidavam de quatro mil pés de café e não precisavam do auxilio
de outras pessoas. A autora trabalhava ajudando seu marido, levando comida e
ajudando a carpir. A partir de 1994 quando a autora começou a ficar doente,
parou de trabalhar e o marido continua trabalhando sozinha" (fl. 177).
19 - Cumpre lembrar, para que não restem dúvidas quanto à qualidade de
segurada especial da autora, quando do surgimento da incapacidade, o fato
de que os males dos quais é portadora são de caráter degenerativo, e a
diferença entre o fim de um contrato de parceria agrícola em 30/10/1995
(fl. 21) e a data da primeira internação psiquiátrica, adotada por este
Juízo como DII (16/04/1996) é muito pequena, não podendo ser tomada em
termos matemáticos exatos, exigindo a necessária temperança decorrente dos
fatos da vida que, no dia dia, ordinariamente acontecem (art. 335 do CPC/1973,
reproduzido no art. 375 do CPC/2015). Assim, tem-se que a incapacidade surgiu
quando da vigência do referido contrato de parceria agrícola, o qual vigorou
entre outubro de 1992 e setembro de 1995 (fls. 21/24), sendo certo, aliás,
que todas as testemunhas asseveraram que a situação psíquica da autora
se agravou em 1994.
20 - Em suma, demonstrado o surgimento da incapacidade total e permanente,
quando a autora era segurada da Previdência Social, de rigor a concessão
da aposentadoria por invalidez, nos exatos termos do art. 42 da Lei 8.213/91.
21 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada,
conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão
geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do
IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
22 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório,
fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a
jurisprudência dominante.
23 - Apelação do INSS desprovida. Alteração dos critérios de aplicação
da correção monetária e dos juros de mora de ofício. Sentença reformada
em parte.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA
POR INVALIDEZ. SEGURADO ESPECIAL. ATIVIDADE AGROPECUÁRIA. REGIME
DE ECONOMIA FAMILIAR. CÔNJUGE DE PARCEIRO/MEEIRO DE GLEBA RURAL
INFERIOR A 4 (QUATRO) MODÚLOS FISCAIS. QUALIDADE DE SEGURADA
DEMONSTRADA. LAUDO MÉDICO. INCAPACIDADE ABSOLUTA E TEMPORÁRIA. IDADE
AVANÇADA. DIVERSAS INTERNAÇÕES PSIQUIÁTRICAS. INVIABILIDADE DE PROCESSO
REABILITATÓRIO. ANÁLISE DO CONTEXTO SOCIOECONÔMICO E HISTÓRICO
LABORAL. SÚMULA 47 DO TNU. PRECEDENTE DO STJ. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE CONFIGURADA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. ALTERAÇÃO DOS
CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO DA CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA DE
OFÍCIO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista
no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da
Constituição Federal.
2 - A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, preconiza que o benefício
previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que
tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições
mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz
e insusceptível de reabilitação para exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que
tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente
inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze)
dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
4 - O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre
que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência,
será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o
benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60
da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
5 - Independe de carência, entretanto, a concessão do benefício
nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença
profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar
no Regime, não impede o deferimento do benefício se tiver decorrido a
inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
7 - Necessário para o implemento do beneplácito em tela, revestir-se
do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher
as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a
Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, o qual
pode ser prorrogado por 24 (vinte e quatro) meses aos que contribuíram por
mais de 120 (cento e vinte) meses, nos termos do art. 15 e §1º da Lei.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12
(doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência
Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de
auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91,
incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
9 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo,
com base em exame pericial de fls. 179/183, relatou: "Pericianda com quadro
compatível com transtorno afetivo bipolar (CID-10 F31), uma 'doença mental',
nas lides juspsiquiátricas. Diagnóstico diferencial, no presente caso,
com transtorno mental orgânico. Da análise da psicofarmacoterapia ora
empregada, verifica-se a necessidade de reavaliação da mesma, para que
a pericianda possa almejar qualquer melhora em seu quadro. Observe-se, à
guisa de esclarecimento, que a pericianda não faz uso sequer de medicação
estabilizadora de humor, conduta principal no quadro que apresenta. (...) Em
função do exame empreendido e das informações colhidas, verifica-se
que a pericianda não apresenta, nos dias atuais, qualquer capacidade
para o desempenho de atividades laborativas, inclusive as anteriormente
efetuadas. Tal incapacidade é, a principio, de natureza potencialmente
temporária, com duração de até seis meses, condicionada tal duração
aos fatores acima apontados (adequação da psicofarmacoterapia, adesão
da pericianda ao tratamento, inexistência de patologias orgânicas)"
(sic). Não fixou a data de início da incapacidade (DII).
10 - Apesar de ter concluído pelo caráter temporário desta, tenho que
a autora, em realidade, está incapacitada, de forma permanente, para o
exercício de atividade remunerada que lhe provenha o sustento.
11 - Se afigura pouco crível que, quem sempre trabalhou na roça, em
regime de economia familiar, desempenhando atividades braçais, e que conta,
atualmente, com mais de 59 (cinquenta e nove) anos de idade, após ter sido
submetida a diversas internações psiquiátricas, vá conseguir, após
reabilitação, capacitação e treinamento, recolocação profissional em
outras funções. Aliás, a autora acostou aos autos comprovantes de estadia
no HOSPITAL DR. ADOLFO BEZERRA DE MENEZES, por mais de 20 (vinte) dias, em
duas oportunidades, em 1996 (fl. 42) e 1997 (fl. 51). Difícil acreditar,
portanto, que a autora conseguirá se restabelecer, visto que, após mais
de 10 (dez) anos das referidas internações, apresentou-se ao perito com
quadro severo de comprometimento psíquico.
12 - Dessa forma, tem-se que a demandante é incapaz e totalmente
insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta
a subsistência, sobretudo, em virtude do seu contexto socioeconômico,
histórico laboral e das moléstias das quais é portadora, ensejando a
concessão de aposentadoria por invalidez.
13 - Análise do contexto social e econômico, com base na Súmula 47
da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais e da
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: STJ - AgRg no Ag: 1270388 PR
2010/0010566-9, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 29/04/2010,
T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/05/2010.
14 - Por sua vez, a requerente também demonstrou sua filiação ao RGPS,
eis que se encontrava na situação de segurada especial, quando inequívoca
a existência de incapacidade para o labor, isto é, na data da primeira
internação, em meados do ano de 1996, já que não há a fixação da DII
pelo expert.
15 - A autora acostou sua certidão de casamento com SANTO SEBASTIÃO PINTO,
na qual este se encontra qualificado como "lavrador" (fl. 16). Acostou,
ainda, diversos contratos de parceria agrícola, firmados por seu esposo,
referente ao imóvel FAZENDA SANTA MARIA, na qual este se comprometia
a explorar 4.000 (quatro mil) pés de café, com sua família. Os
contratos abrangem os seguintes períodos: de 01º/10/1984 a 01º/10/1987
(fls. 17/20); de 01º/10/1992 a 30/09/1995 (fls. 21/24); de 01º/10/1996
a 01º/10/1999 (fls. 25/30); e, por fim, de 01º/10/1999 a 01º/10/2002
(fls. 31/36). Impende ressaltar que cláusula comum nas avenças determina
que "o conjunto familiar auxiliará nos trabalhos da parceria agrícola sem
qualquer vínculo empregatício com o outorgante (...)", denotando o regime
de economia familiar do empreendimento. Também foram juntadas aos autos
notas fiscais, relativas à venda de sacas de café, registradas em nome do
cônjuge da requerente, abrangendo o período de 1979 a 2005 (fls. 85/115).
16 - Conforme depoimento do seu esposo (fl. 172), analisado na sequência,
a propriedade rural tinha em sua totalidade 50.000 (cinquenta mil) pés de
café, o que indica, a princípio, que a autora e seu cônjuge detinham a
posse de apenas 8% (oito por cento) do imóvel. Nessa senda, haja vista que
a FAZENDA MARIA possuía no total 143 ha² (fls. 37/38), e que o módulo
fiscal do Município de Cedral/SP, localidade da área rural, é de 20 ha²
(consulta ao sítio eletrônico do INCRA), inegável que a parte pertencente
à demandante era inferior a 4 (quatro) módulos fiscais para os fins do
disposto no art. 11, VII, a), 1, c), e §1º, da Lei 8.213/91.
17 - A autora preenche todos os requisitos previstos no referido
dispositivo. Com efeito, à época do surgimento da incapacidade, era cônjuge
de parceiro/meeiro, o qual explorava atividade agropecuária em área rural de
até 4 (quatro) módulos fiscais, na qual o trabalho dos membros da família
era indispensável à subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do
núcleo familiar.
18 - Realizada audiência de instrução e julgamento, em 20/11/2008
(fls. 171/177), foram colhidos os depoimentos do seu curador (esposo) e de
testemunhas por ela arroladas, os quais vieram a corroborar os documentos
acostada aos autos, senão vejamos: SANTO SEBASTIÃO PINTO afirmou que "a
autora parou de trabalhar em 1994 porque ficou doente. A autora trabalhava na
roça com o depoente. Nem a autora nem o depoente trabalharam em atividades
urbanas. Até 2006 o depoente e a autora moraram na fazenda Santa Maria
de Gentil Carlos Polachini, depois mudaram-se para a cidade de Guapiaçu
e o depoente passou a trabalhar na lavoura de cana-de-açúcar da Usina
Guarani. O depoente e a autora moraram na fazenda Santa Maria de 1986 a 2006. O
depoente era parceiro na lavoura de café e a autora ajudava o depoente até
a época em que parou de trabalhar". Questionado pelo procurador do INSS,
disse que "a fazenda Santa Maria tem aproximadamente 154 alqueires e há
cerca de cinquenta mil pés de café plantados. O depoente era parceiro em
quatro mil pés de café e nunca contratou ninguém para auxiliar, 'se for
pagar não compensa'" (fl. 172). A testemunha SEBASTIÃO MANCIR DOS SANTOS
relatou que "conhece a autora desde 1990 quando ela morava na fazenda Santa
Maria de Gentil Carlos Polanchini. A referida fazenda fica na região das
Palmeiras em Cedral. A autora morava com seu marido e ambos tinha parceira
de café na fazenda Santa Maria. A autora e seu marido cuidavam de quatro
mil pés de café e não eram auxiliados por mais ninguém. A autora e seu
marido saíram da fazenda Santa Maria em 2006. Ao que se recorda, depois que
conheceu a autora ela trabalhou por mais uns dois anos e começou a ficar
doente, sendo internada em 1994, depois em 1996, 1997 e 2002. O depoente foi
empregado na fazenda Santa Maria e ainda trabalha lá" (sic). Questionado
pelos patronos de ambas as partes, respondeu que "quatro mil pés de café
são plantados em cerca de dois alqueires de terra" e "depois que a autora
parou de trabalhar em 1994 seu marido continuou trabalhando sozinho"
(fls. 173/174). PAULO PEDRO CRIPPA afirmou que "conhece a autora desde
1969. Sabe que a autora trabalhou em lavoura de café desde os onze anos
de idade. Atualmente a autora não trabalha porque ficou doente. Não sabe
quando a autora parou de trabalhar. Conheceu a autora quando ela se mudou
com sua família para a fazenda Boa Esperança no município de Cedral. Em
1978 a autora se casou com o Sr. Santo e mudou-se para outro sítio. Sabe
que depois a autora e seu marido mudaram-se para a fazenda Santa Marina de
Gentil Polachini onde ficaram 'mais anos'. Sabe que a autora trabalhou na
fazenda Santa Marina porque o depoente conversava com seus pais. Algumas
vezes o depoente viu a autora trabalhando na lavoura de café da fazenda
Santa Marina porque passava por lá. Sabe que em 1994 a autora ficou doente
e já não trabalhou mais" (fls. 175/176). GENTIL CARLOS POLACHINI disse
que "conhece a autora e seu marido porque moraram na propriedade rural do
depoente. A autora e seu marido moraram na fazenda do depoente por quinze
ou vinte anos e trabalharam na lavoura de café em regime de parceria. A
autora e seu marido moraram e trabalharam na fazenda do depoente até 2005
ou 2006. Cuidavam de quatro mil pés de café e não precisavam do auxilio
de outras pessoas. A autora trabalhava ajudando seu marido, levando comida e
ajudando a carpir. A partir de 1994 quando a autora começou a ficar doente,
parou de trabalhar e o marido continua trabalhando sozinha" (fl. 177).
19 - Cumpre lembrar, para que não restem dúvidas quanto à qualidade de
segurada especial da autora, quando do surgimento da incapacidade, o fato
de que os males dos quais é portadora são de caráter degenerativo, e a
diferença entre o fim de um contrato de parceria agrícola em 30/10/1995
(fl. 21) e a data da primeira internação psiquiátrica, adotada por este
Juízo como DII (16/04/1996) é muito pequena, não podendo ser tomada em
termos matemáticos exatos, exigindo a necessária temperança decorrente dos
fatos da vida que, no dia dia, ordinariamente acontecem (art. 335 do CPC/1973,
reproduzido no art. 375 do CPC/2015). Assim, tem-se que a incapacidade surgiu
quando da vigência do referido contrato de parceria agrícola, o qual vigorou
entre outubro de 1992 e setembro de 1995 (fls. 21/24), sendo certo, aliás,
que todas as testemunhas asseveraram que a situação psíquica da autora
se agravou em 1994.
20 - Em suma, demonstrado o surgimento da incapacidade total e permanente,
quando a autora era segurada da Previdência Social, de rigor a concessão
da aposentadoria por invalidez, nos exatos termos do art. 42 da Lei 8.213/91.
21 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada,
conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão
geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do
IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
22 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório,
fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a
jurisprudência dominante.
23 - Apelação do INSS desprovida. Alteração dos critérios de aplicação
da correção monetária e dos juros de mora de ofício. Sentença reformada
em parte.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e, de ofício,
estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser
calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09,
a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e
que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório,
serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no mais, íntegra a
r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
27/11/2017
Data da Publicação
:
06/12/2017
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1506159
Órgão Julgador
:
SÉTIMA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/12/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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