TRF3 0007904-38.2012.4.03.6109 00079043820124036109
PENAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO PRATICADO POR TERCEIROS, SEM ENVOLVIMENTO
DO BENEFICIÁRIO DE PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL. ARTIGO 171, § 3º, DO CÓDIGO
PENAL. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO RETROATIVA: INOCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E
AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. IMPROCEDÊNCIA DAS QUESTÕES SUSCITADAS PELAS
APELANTES: PROVA DE AUTORIA E COMPROVAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO. OBTENÇÃO
DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL INDEVIDO, MEDIANTE FALSIFICAÇÃO IDEOLÓGICA DE
DOCUMENTO ESSENCIAL AO SEU DEFERIMENTO, INDUZINDO A ERRO O INSTITUTO NACIONAL
DO SEGURO SOCIAL. MANUTENÇÃO DA R. SENTENÇA.
1. Advogadas denunciadas pela prática do delito estampado no art. 171, § 3º,
do Código Penal, caracterizada pela obtenção, mediante fraude, de benefício
assistencial de prestação continuada em favor de idoso, no período entre
18.06.2009 a 31.10.2011, induzindo o Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS a erro, que somente foi percebido em procedimento de revisão, o que
resultou no prejuízo de R$ 15.504,86 à autarquia previdenciária.
2. Crime instantâneo de efeitos permanentes, fixando-se o momento
consumativo na data do pagamento da primeira prestação indevida pelo INSS
ao beneficiário, em decorrência da fraude perpetrada pelas advogadas.
3. Certificado o trânsito em julgado para a acusação, a pena estabelecida
pela sentença estabilizou-se em um ano e quatro meses de reclusão, de
forma que a prescrição balizada pela pena em concreto corresponde ao prazo
de quatro anos, de forma que não ocorreu prescrição retroativa no caso
concreto.
4. A materialidade do crime em questão colhe-se, inicialmente, das provas
materiais amealhadas no bojo do próprio processo administrativo instaurado
no âmbito do INSS, bem como pelo depoimento da beneficiária do expediente
fraudulento praticado pelas apelantes, as quais havia constituído como
advogadas.
5. O objeto material da falsidade consiste na declaração de estado civil
da beneficiária como separada, quando na verdade permaneceu casada. Como
consequência do expediente fraudulento, sem que a idosa em questão
preenchesse de fato os requisitos legais, o INSS implementou a concessão
indevida do amparo social sob o NB 5360627561, com renda mensal inicial no
importe de R$ 465,00, a partir de 18.06.2009.
6. Iniciado processo de revisão administrativa do benefício, foi realizada
diligência no endereço residencial da beneficiária a fim de verificar se a
idosa em questão ainda vivia maritalmente ou de fato havia se separado. Como
resposta, a própria beneficiária, e seu também filho, disseram que ambos
residiam naquele endereço, e que a idosa jamais havia se separado do marido.
7. informação prestada pelo serviço de previdência social do município
de Araras ao INSS dá conta de que, à época do requerimento fraudulento de
benefício assistencial, a renda familiar seria, no mínimo, correspondente
à aposentadoria por invalidez percebida mensalmente pelo esposo da idosa
requerente, pago a partir de 01.07.1994, a qual, em 12.09.2011, correspondia
à renda mensal de R$ 1.153,95.
8. Cessado o pagamento indevido de benefício em 01.12.2011, o INSS apurou
como indébito o valor de R$ 15.504,86 (corrigido até outubro de 2011).
9. O laudo pericial excluiu a possibilidade de a beneficiária ter
assinado a declaração fraudulenta relativa ao estado civil de separação
conjugal. Igualmente, atribuiu os lançamentos no referido documento às
advogadas ora apelantes.
10. Vale dizer que a perícia resultou inconclusiva tão somente no que
se refere ao padrão de escrita que apôs o endereço das indigitadas
testemunhas, o que não afasta nem contradiz as conclusões gerais do laudo,
que decorrem da análise dos outros agrupamentos de escritas existentes no
documento periciado, comprovando a interferência de ambas as apelantes no
documento com intenção de iludir o INSS a conceder benefício indevido.
11. Com relação ao elemento subjetivo atinente ao crime de estelionato
previdenciário, o objetivo de obter a concessão de benefício indevido,
mediante a indução do INSS em erro quanto a elementos essenciais à análise
do direito pleiteado, é ínsito à atuação das advogadas que instruíram,
com documento falso, o requerimento junto à autarquia previdenciária.
12. Não é preciso que o agente obtenha para si a vantagem correspondente
ao benefício indevido, entretanto, no caso, as ora apelantes auferiram
honorários advocatícios pelo êxito na concessão do benefício em favor
da cliente.
13. Embora não tenham sido arroladas testemunhas pela acusação, o vasto
conjunto probatório ora declinado demonstra de forma cabal a materialidade
e a autoria do delito descrito no art. 171, § 3º, do Código Penal.
14. Como se percebe pelo teor dos interrogatórios, as apelantes não
explicam a correspondência entre o padrão gráfico que possuem e os padrões
detectados no documento falsificado. Sequer explicam como uma pessoa idosa,
de pouca instrução, poderia ter prestado tal declaração falsa, que faz
uso de expressões restritas ao conhecimento jurídico.
15. Os fatos acima retratados, não contrastados pela defesa, conduzem
à responsabilidade penal das apelantes relativamente ao estelionato
previdenciário sob exame, na medida em que, atuando como advogadas, firmaram
declaração ideologicamente falsa, para instruir requerimento de beneficio
assistencial em nome de pessoa idosa, iludindo o INSS quanto ao preenchimento
dos requisitos legais para a concessão do amparo assistencial, em virtude do
qual obtiveram para outrem, e, indiretamente para si, através de honorários
advocatícios, vantagem indevida, consistente em prestações indevidas que
somaram o montante de R$ 15.504,86.
16. Consequentemente, a sentença resta irretocável nos termos em que
exarada, com exceção no tocante à dosimetria penal, imposta às apelantes no
mínimo cominado pelo art. 171, caput, e § 3º, do Código Penal, qual seja,
um ano e quatro meses de reclusão, no regime inicial ABERTO, e multa de 13
dias-multa, no valor de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos,
com substituição da privação da liberdade por duas penas restritivas de
direito: prestação de serviço à comunidade, a ser especificada pelo juízo
da execução, e prestação pecuniária no importe de cinco salários mínimos
vigentes à época da sentença, facultado o parcelamento em até dez vezes.
17. Com efeito, mereceria reparo a sentença no que se refere às
circunstâncias judiciais do delito sob exame, na medida em que deveria ser
valorada negativamente a culpabilidade das acusadas tendo em vista terem
praticado o crime no desempenho da advocacia, atividade indispensável à
administração da justiça (art. 133 da Constituição da República),
sem embargo da infração ética profissional, o que pressuporia um atuar
consentâneo com o ordenamento pátrio, não observado quando do cometimento
da infração, de modo que se imporia a exacerbação da pena-base, não fosse
a ausência de recurso acusatório, restando devida a manutenção da pena tal
como formatada na sentença, em respeito à vedação da reformatio in pejus.
18. Questão preliminar de prescrição rejeitada. Apelações desprovidas.
Ementa
PENAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO PRATICADO POR TERCEIROS, SEM ENVOLVIMENTO
DO BENEFICIÁRIO DE PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL. ARTIGO 171, § 3º, DO CÓDIGO
PENAL. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO RETROATIVA: INOCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E
AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. IMPROCEDÊNCIA DAS QUESTÕES SUSCITADAS PELAS
APELANTES: PROVA DE AUTORIA E COMPROVAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO. OBTENÇÃO
DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL INDEVIDO, MEDIANTE FALSIFICAÇÃO IDEOLÓGICA DE
DOCUMENTO ESSENCIAL AO SEU DEFERIMENTO, INDUZINDO A ERRO O INSTITUTO NACIONAL
DO SEGURO SOCIAL. MANUTENÇÃO DA R. SENTENÇA.
1. Advogadas denunciadas pela prática do delito estampado no art. 171, § 3º,
do Código Penal, caracterizada pela obtenção, mediante fraude, de benefício
assistencial de prestação continuada em favor de idoso, no período entre
18.06.2009 a 31.10.2011, induzindo o Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS a erro, que somente foi percebido em procedimento de revisão, o que
resultou no prejuízo de R$ 15.504,86 à autarquia previdenciária.
2. Crime instantâneo de efeitos permanentes, fixando-se o momento
consumativo na data do pagamento da primeira prestação indevida pelo INSS
ao beneficiário, em decorrência da fraude perpetrada pelas advogadas.
3. Certificado o trânsito em julgado para a acusação, a pena estabelecida
pela sentença estabilizou-se em um ano e quatro meses de reclusão, de
forma que a prescrição balizada pela pena em concreto corresponde ao prazo
de quatro anos, de forma que não ocorreu prescrição retroativa no caso
concreto.
4. A materialidade do crime em questão colhe-se, inicialmente, das provas
materiais amealhadas no bojo do próprio processo administrativo instaurado
no âmbito do INSS, bem como pelo depoimento da beneficiária do expediente
fraudulento praticado pelas apelantes, as quais havia constituído como
advogadas.
5. O objeto material da falsidade consiste na declaração de estado civil
da beneficiária como separada, quando na verdade permaneceu casada. Como
consequência do expediente fraudulento, sem que a idosa em questão
preenchesse de fato os requisitos legais, o INSS implementou a concessão
indevida do amparo social sob o NB 5360627561, com renda mensal inicial no
importe de R$ 465,00, a partir de 18.06.2009.
6. Iniciado processo de revisão administrativa do benefício, foi realizada
diligência no endereço residencial da beneficiária a fim de verificar se a
idosa em questão ainda vivia maritalmente ou de fato havia se separado. Como
resposta, a própria beneficiária, e seu também filho, disseram que ambos
residiam naquele endereço, e que a idosa jamais havia se separado do marido.
7. informação prestada pelo serviço de previdência social do município
de Araras ao INSS dá conta de que, à época do requerimento fraudulento de
benefício assistencial, a renda familiar seria, no mínimo, correspondente
à aposentadoria por invalidez percebida mensalmente pelo esposo da idosa
requerente, pago a partir de 01.07.1994, a qual, em 12.09.2011, correspondia
à renda mensal de R$ 1.153,95.
8. Cessado o pagamento indevido de benefício em 01.12.2011, o INSS apurou
como indébito o valor de R$ 15.504,86 (corrigido até outubro de 2011).
9. O laudo pericial excluiu a possibilidade de a beneficiária ter
assinado a declaração fraudulenta relativa ao estado civil de separação
conjugal. Igualmente, atribuiu os lançamentos no referido documento às
advogadas ora apelantes.
10. Vale dizer que a perícia resultou inconclusiva tão somente no que
se refere ao padrão de escrita que apôs o endereço das indigitadas
testemunhas, o que não afasta nem contradiz as conclusões gerais do laudo,
que decorrem da análise dos outros agrupamentos de escritas existentes no
documento periciado, comprovando a interferência de ambas as apelantes no
documento com intenção de iludir o INSS a conceder benefício indevido.
11. Com relação ao elemento subjetivo atinente ao crime de estelionato
previdenciário, o objetivo de obter a concessão de benefício indevido,
mediante a indução do INSS em erro quanto a elementos essenciais à análise
do direito pleiteado, é ínsito à atuação das advogadas que instruíram,
com documento falso, o requerimento junto à autarquia previdenciária.
12. Não é preciso que o agente obtenha para si a vantagem correspondente
ao benefício indevido, entretanto, no caso, as ora apelantes auferiram
honorários advocatícios pelo êxito na concessão do benefício em favor
da cliente.
13. Embora não tenham sido arroladas testemunhas pela acusação, o vasto
conjunto probatório ora declinado demonstra de forma cabal a materialidade
e a autoria do delito descrito no art. 171, § 3º, do Código Penal.
14. Como se percebe pelo teor dos interrogatórios, as apelantes não
explicam a correspondência entre o padrão gráfico que possuem e os padrões
detectados no documento falsificado. Sequer explicam como uma pessoa idosa,
de pouca instrução, poderia ter prestado tal declaração falsa, que faz
uso de expressões restritas ao conhecimento jurídico.
15. Os fatos acima retratados, não contrastados pela defesa, conduzem
à responsabilidade penal das apelantes relativamente ao estelionato
previdenciário sob exame, na medida em que, atuando como advogadas, firmaram
declaração ideologicamente falsa, para instruir requerimento de beneficio
assistencial em nome de pessoa idosa, iludindo o INSS quanto ao preenchimento
dos requisitos legais para a concessão do amparo assistencial, em virtude do
qual obtiveram para outrem, e, indiretamente para si, através de honorários
advocatícios, vantagem indevida, consistente em prestações indevidas que
somaram o montante de R$ 15.504,86.
16. Consequentemente, a sentença resta irretocável nos termos em que
exarada, com exceção no tocante à dosimetria penal, imposta às apelantes no
mínimo cominado pelo art. 171, caput, e § 3º, do Código Penal, qual seja,
um ano e quatro meses de reclusão, no regime inicial ABERTO, e multa de 13
dias-multa, no valor de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos,
com substituição da privação da liberdade por duas penas restritivas de
direito: prestação de serviço à comunidade, a ser especificada pelo juízo
da execução, e prestação pecuniária no importe de cinco salários mínimos
vigentes à época da sentença, facultado o parcelamento em até dez vezes.
17. Com efeito, mereceria reparo a sentença no que se refere às
circunstâncias judiciais do delito sob exame, na medida em que deveria ser
valorada negativamente a culpabilidade das acusadas tendo em vista terem
praticado o crime no desempenho da advocacia, atividade indispensável à
administração da justiça (art. 133 da Constituição da República),
sem embargo da infração ética profissional, o que pressuporia um atuar
consentâneo com o ordenamento pátrio, não observado quando do cometimento
da infração, de modo que se imporia a exacerbação da pena-base, não fosse
a ausência de recurso acusatório, restando devida a manutenção da pena tal
como formatada na sentença, em respeito à vedação da reformatio in pejus.
18. Questão preliminar de prescrição rejeitada. Apelações desprovidas.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, rejeitar a preliminar de prescrição e negar provimento
às apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
04/09/2018
Data da Publicação
:
17/09/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 64726
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-171 PAR-3
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-133
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/09/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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