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Jurisprudência


TRF3 0008033-55.2003.4.03.6110 00080335520034036110

Ementa
CIVIL E PROCESSO CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. RESPONSABILIDADE DA CEF. RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA. DANO MATERIAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO. SUCUMBÊNCIA. 1. Anulação da sentença. O MM. Magistrado a quo, embora reconheça que o único pedido formulado pelos autores foi o indenizatório (vale dizer, não foi formulado o pedido de rescisão do contrato), julgou o pedido procedente para condenar a CEF a devolver aos autores o valor correspondente às prestações pagas e às despesas havidas com o contrato de mútuo e a CAIXA SEGURADORA S/A a devolver os valores referentes aos prêmios efetivamente pagos. Data venia, o pagamento das prestações do contrato não é dano decorrente dos vícios de construção (não há nexo de causalidade algum com os vícios de construção; o pagamento das prestações não decorre dos vícios de construção, muito menos configura um "dano" decorrente deles). É, em verdade, a prestação aventada no contrato (frise-se, contrato que não se pretende rescindir nesta demanda). Assim, a sentença mesclou institutos distintos e acabou por incidir em julgamento extra petita, ao condenar as rés a devolverem as prestações e prêmios pagos em razão do contrato e, ainda, deixar de apreciar o pedido de ressarcimento dos gastos com alugueis e reformas (danos materiais apontados pela parte autora). Portanto, a sentença deve ser anulada, tendo em vista que configura julgamento extra petita. Aplicável ao caso sub judice o art. 1.013, §3º, do CPC/2015, porquanto a causa encontra-se madura para julgamento. 2. Legitimidade da CEF. Em relação ao primeiro pedido (rescisão do contrato de compra e venda do imóvel com financiamento e garantias), é evidente que a CEF é parte legítima porquanto figurou no contrato. Inclusive, depreende-se do contrato que a mutuária efetuava o pagamento das prestações diretamente à CEF e esta repassa parte dos valores aos vendedores. Já em relação ao segundo pedido (indenização por anos morais em decorrência dos danos oriundos de vícios de construção), cumpre esclarecer o seguinte. O Superior Tribunal de justiça firmou o entendimento no sentido de que o ingresso da Caixa Econômica federal nos feitos em que se discute indenização securitária no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação não é automático, mas restrito aos contratos celebrados entre 02.12.1988 e 29.12.2009, e nas hipóteses em que o instrumento estiver vinculado ao Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS (apólices públicas, ramo 66), desde que haja demonstração do comprometimento do FCVS, com risco efetivo de exaurimento da reserva técnica do Fundo de Equalização de Sinistralidade da Apólice - FESA. Portanto, para os contratos com apólice privada (Ramo 68), bem como para os contratos com cobertura do FCVS (apólices públicas, Ramo 66), celebrados antes de 02.12.1988, não há interesse jurídico firmado da CEF. No caso dos autos, o contrato de financiamento foi firmado em 25/11/1997, estando compreendido no lapso temporal firmado pelo STJ. E, tratando-se de contrato assinado posteriormente à vigência da Lei nº 7.682/1988, em período no qual a apólice é necessariamente pública e garantida pelo FCVS, há potencial comprometimento dos recursos do FCVS, razão pela qual resta confirmado o interesse da CEF na lide. Assim, resta configurada a legitimidade passiva da CEF e, consequentemente, a competência da Justiça Federal para processar e julgar a presente demanda. 3. Prescrição. Em preliminar, a seguradora suscita a ocorrência de prescrição nos termos do art. 178, §6º, II, do CC/1916. Acerca do tema, havia entendimento jurisprudencial no sentido de aplicar o prazo vintenário para a prescrição da ação concernente à cobertura securitária, nos termos do art. 177 do Código Civil de 1916. Contudo, a partir de precedente da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, firmou-se a compreensão de que, em verdade, incide a prescrição ânua prevista no art. 178, § 5º, II, do Código Civil de 1916 e no art. 206, § 1º, II, b, do atual Código Civil, afastando-se, ademais, a incidência do art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, que cuida da responsabilidade por danos causados por fato do produto ou do serviço. Note-se, porém, que qualquer que seja a modalidade de seguro, o prazo prescrição não flui a partir do pedido de pagamento da indenização até a comunicação da decisão a respeito, consoante a Súmula n. 229 do Superior Tribunal de Justiça. O termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência dos riscos materiais, pois a regra geral é que o termo inicial da prescrição corresponde à ciência do fato gerador da pretensão, como de todo modo estabelece o art. 206, § 1º, II, b, do Código Civil. No caso dos autos, não se sabe ao certo a data em que apareceram os vícios de construção, mas o sinistro foi comunicado pela mutuária à seguradora em 31/03/1999. Em razão do aviso de sinistro, a seguradora elaborou o laudo de vistoria inicial de fls. 250/252, que conclui pela existência de vício de construção, sendo emitido o "Termo de Negativa de Cobertura", em 14/09/1999 (fl. 253). A seguradora comunicou a CEF acerca da negativa de cobertura em 18/04/2000 (fl. 52) e não se sabe a data em que a CEF comunicou a negativa à parte autora. Apesar disto, não se pode negar que os danos por vícios de construção são progressivos e continuam a se agravar com o decorrer do tempo. É por esta razão que se mostra adequada a conclusão do Juiz no sentido de que, por se agravarem os riscos a cada dia, a pretensão não se encontra fulminada pela prescrição. 4. Responsabilidade da CEF. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é possível haver responsabilidade da CEF por vícios de construção em imóveis adquiridos no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação - SFH. Todavia, a responsabilidade dependerá das circunstâncias em que se verifica sua intervenção no caso concreto: a) inexistirá responsabilidade da CEF, quando ela atuar como agente financeiro em sentido estrito; b) existirá responsabilidade da CEF, quando ela como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa ou baixíssima renda, isto é, nas hipóteses em que tenha atuado, de algum modo, na elaboração do projeto, na escolha do terreno, na execução das obras (construção) ou na fiscalização das obras do empreendimento. No caso dos autos, de acordo com o contrato de fls. 09/28, a CEF não financiou, no caso, nenhum empreendimento em construção, com prazo de entrega. Ao contrário, trata-se de contrato de compra e venda com garantia hipotecária e com utilização de recursos do FGTS dos compradores, pelo qual os autores obtiveram recursos para financiar a compra de imóvel de terceiros particulares (fls. 09 e 17). Assim, uma vez que do contrato se vê claramente que a CEF não financia, no caso, um imóvel em construção, mas tão somente libera recursos financeiros para que o comprador adquira de terceiros imóvel já erigido. É entendimento pacífico que, nestas hipóteses em que a CEF atua estritamente como agente financeiro, a vistoria/perícia designada pela CEF não tem por objetivo atestar a solidez ou a regularidade da obra, mas sim resguardar o interesse da instituição financeira, uma vez que o imóvel financiado lhe será dado em garantia. Logo, no caso, não há responsabilidade da CEF pelos vícios de construção. 5. Responsabilidade da seguradora. Por sua vez, sustenta a Caixa Seguradora S.A. que haveria óbice à cobertura securitária do sinistro, nos termos da apólice, em razão de os danos serem decorrentes de vício construtivo. Isso porque a apólice de seguro habitacional vinculada ao mútuo contratado pelos autores expressamente exclui da cobertura securitária os riscos de natureza material decorrentes de anomalias construtivas, como se vê pela Cláusula "3.2" das "Condições particulares para os riscos de danos físicos" (fl. 259). No entanto, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal Regional Federal da Terceira Região firmou-se no sentido de que a seguradora é responsável em caso de danos decorrentes de vícios de construção, uma vez que não só é obrigatória a contratação do seguro pelo mutuário, como também é obrigatória a vistoria do imóvel pela seguradora. E, no caso, a CAIXA SEGURADORA S/A realizou a vistoria obrigatória do empreendimento, conforme se constata do laudo de fls. 250/252. No caso, verifico que o mutuário acionou a seguradora, em 31/03/1999. Em razão do aviso de sinistro, a seguradora elaborou o laudo de vistoria inicial de fls. 250/252, que conclui pela existência de vício de construção, e foi emitido o "Termo de Negativa de Cobertura", em 14/09/1999 (fl. 253). Logo, no caso, a CAIXA SEGURADORA S/A responde pelos vícios de construção. 6. Dano material. No que tange à existência de danos materiais e vícios de construção, consigno que o laudo de vistoria realizado pela própria seguradora conclui pela existência de risco de desmoronamento e aconselha a desocupação do imóvel. Ademais, foi realizada perícia técnica de engenharia às fls. 343/372, a qual, em vistoria, concluiu pela existência de vícios de construção. 7. Valor do dano material. O quantum indenizatório, a título de danos materiais, verifico que os autores postularam, na exordial, a condenação das rés ao pagamento de indenização, a título de dano material, no patamar de R$ 19.023,15. E, conforme já explicado na introdução deste voto, embora não seja possível aferir da inicial em que consiste o valor de R$ 19.023,15, os autores especificam que se trata de danos materiais decorrentes de vícios de construção constatados no imóvel financiado no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação - SFH. E os únicos danos materiais narrados na inicial são os gastos com aluguel de outro imóvel e com a reforma do imóvel financiado, de modo que é possível concluir que são estes os danos que os autores pretendem sejam ressarcidos. Fato que é confirmado pela notificação extrajudicial encaminhada à CEF, em que os autores explicam que o valor de R$ 19.800,00 corresponde aos gastos com alugueis (fls. 36/39). Assim, concluo que é possível aferir da inicial que o valor apontado refere-se aos gastos com aluguéis de outro imóvel. Até porque os autores instruíram a inicial com os contratos de aluguel (fls. 41/42-vº). O primeiro contrato foi celebrado em 10/05/2000 e prevê a locação por 12 meses e a prestação no valor de R$ 400,00 por mês. Já o segundo contrato foi celebrado em 11/07/2001 e prevê a locação por 18 meses e a prestação no valor de R$ 500,00. Os valores pactuados nestes contratos totalizam R$ 13.800,00. Entendo que somente este dano material está comprovado nos autos, já que os autores não juntaram nenhum outro comprovante de gastos decorrentes dos vícios de construção. Por outro lado, as rés, em suas contestações, não controverteram a existência do contrato de aluguel, tampouco impugnaram o valor do dano material. Assim, o valor comprovado pelos contratos de alugueis deve ser considerado o valor do dano material sofrido pelos autores, a ser ressarcido pela seguradora. 8. Correção monetária e juros. Esse valor deve ser atualizado monetariamente, conforme os índices definidos no manual de Cálculos da Justiça Federal, a partir do arbitramento nos termos da súmula 362 do STJ. Os juros de mora incidem a partir do evento danoso, no caso, desde a data em que a inscrição tornou-se indevida, na conformidade da súmula n. 54 do Superior Tribunal de Justiça, devendo ser observada a taxa de 6% (seis por cento) ao ano, prevista no artigo 1.062 do Código Civil de 1916, até 10/01/2003 e, a partir de 11/01/2003, nos termos prescritos no art. 406 do novo Código Civil, que determina a aplicação da taxa que estiver em vigor para o pagamento de impostos devidos à Fazenda Pública, a qual atualmente é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC. 9. Sucumbência. Com relação ao ônus de sucumbência, deve a CAIXA SEGURADORA S/A arcar com o pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação. 10. Sentença anulada. Pedido formulado contra a CAIXA SEGURADORA S/A julgado parcialmente procedente para condená-la ao ressarcimento dos danos materiais decorrentes dos vícios de construção, consistentes nos gastos com alugueis no valor de R$ 13.800,00 (treze mil e oitocentos reais), assim como ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, anular a sentença por julgamento extra petita e, com fulcro no art. 1.013, §3º, do CPC/2015, julgar parcialmente procedente o pedido formulado contra a CAIXA SEGURADORA S/A para condená-la ao ressarcimento dos danos materiais decorrentes dos vícios de construção, consistentes nos gastos com alugueis no valor de R$ 13.800,00 (treze mil e oitocentos reais), assim como ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 26/11/2018
Data da Publicação : 04/12/2018
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1587724
Órgão Julgador : QUINTA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/12/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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