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Jurisprudência


TRF3 0008132-51.2010.4.03.9999 00081325120104039999

Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE ABSOLUTA E TEMPORÁRIA CONFIGURADA. LAUDO PERICIAL. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER DO EXPERTO. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO. QUALIDADE DE SEGURADO DEMONSTRADA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MANUTENÇÃO. SÚMULA 111 DO STJ. APLICABILIDADE. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DO INSS DESPROVIDAS. ALTERAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO DOS JUROS DE MORA DE OFÍCIO. SENTENÇA REFORMA EM PARTE. AUXÍLIO-DOENÇA CONCEDIDO. 1 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal. 2 - A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, preconiza que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para exercício da atividade que lhe garanta a subsistência. 3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis). 4 - O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017). 5 - Independe de carência, entretanto, a concessão do benefício nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, conforme art. 26, II, da Lei nº 8.213/91, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 do mesmo diploma legislativo. 6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento do benefício se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia. 7 - Necessário para o implemento do beneplácito em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, o qual pode ser prorrogado por 24 (vinte e quatro) meses aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, nos termos do art. 15 e §1º da Lei. 8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017). 9 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo, com base em exame pericial de fls. 135/141, diagnosticou o autor como portador de "sequelas de traumatismo cranioencefálico", "hipertensão arterial", "sequelas de alcoolismo crônico" e "fratura de perna direita". Relatou que o demandante "era etilista crônico, e em julho de 2002, foi espancado em via pública, tendo ficado desmaiado, e só foi socorrido quando foi encontrado e levado ao hospital, tendo sido encaminhado para a Santa Casa de Araçatuba. Foi diagnosticado fraturas múltiplas de face, fratura de Crânio com hematoma subdural de região temporo-fronoto-parietal esquerdo, ocasionando desvio da linha média, Edema cerebral, desvio da linha média e Hemossinus. Foi operado imediatamente (11/07/02) e encaminhado para UTI onde ficou até 16/07/02. Nesta fase, devido sangramento importante subdural, fez quadro de anemia intensa. Teve alta hospitalar em 21/07/02, tendo voltado a trabalhar, mas de forma esporádica, pois a sequela do TCE, aliado a Hipertensão Arterial e ao Alcoolismo Crônico, não dava condições de trabalho. Foi internando no Hospital Psiquiátrico Benedita Fernandes, em 29/09/2004 até 31/10/2004, para tratamento de alcoolismo. Diz não estar bebendo atualmente, mas não consegue se concentrar em serviço, tendo crises de esquecimento e mal estar" (sic). Concluiu pela incapacidade laborativa total e temporária, fixando seu início em julho de 2002. 10 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010. 11 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório, referida prova técnica merece confiança e credibilidade. 12 - No momento do surgimento da incapacidade, isto é, em julho de 2002, tem-se que o autor desempenhava a função de rurícola, e, por conseguinte, estava filiado ao RGPS. 13 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça. 14 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado. 15 - C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea. 16 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII. 17 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. Precedentes jurisprudenciais. 18 - A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material. 19 - Realizada audiência de instrução e julgamento, em 25 de agosto de 2009 (fls. 163/164), foram colhidos os depoimentos de testemunhas arroladas pelo autor, as quais trouxeram poucas e genéricas informações sobre o labor rural desenvolvido por este. A testemunha JOSÉ ALVES DE SOUZA disse que "conhece o autor do serviço de roça. Trabalharam juntos por cerca de 20 anos. Desde que conheceu o autor ele sempre trabalhou na roça, nunca na cidade. O autor parou de trabalhar há cerca de 07 anos porque foi espancado. Já trabalharam junto nas Fazendas Jangada, Baguaçu, Rio Preto, carpindo, colhendo algodão, tomate. A última vez que o autor trabalhou foi para os Gralha, catando algodão, tomate, milho". Questionado pela patrona do requerente, complementou que este "já trabalhou para Valtão, Macoto, Juquinha, Pedro Japonês" (fl. 163). IVANY CASSIANO DE OLIVEIRA, por sua vez, asseverou que "conhece o autor desde o ano de 1975; Já trabalharam como bóias-frias juntos e são vizinhos. Já trabalharam nas Fazendas Sergipe, Baguaçu, Tangará, Ribeiro, Jacarezinho, Prata, Jangada, Rio Preto, em colheitas de algodão, milho, tomate, amendoim. Pode dizer que o autor trabalhou até o ano de 2002. Depois dessa data, o autor tentou ainda trabalhar, mas não conseguiu em virtude de sua enfermidade. O autor sempre trabalhou na roça, desde criança". Questionada pela mesma advogada, afirmou que "já trabalharam pra Valtão, Macoto, Adão, Joaquim Fiais, Pedro Juquinha e Gralha. O autor não pôde trabalhar mais em razão de espancamento. A última vez que o autor trabalhou foi para os Gralha, catando tomate. O autor trabalhava com os pais em serviços de roça" (fl. 164). 20 - Consoante se extrai dos depoimentos colhidos, a prova segura, isto é, por meio de testemunho direto, lastreado em documentos, é de que o demandante, ao menos, entre novembro de 1999 e outubro de 2003, laborava na lide campesina. 21 - Ressalta-se que os testemunhos trazem extensa quantidade de detalhes sobre onde o autor trabalhava na condição de rurícola, em quais culturas, com quem mantinha vínculo de trabalho, período de início e fim da atividade rural, dentre outras informações. E, o mais importante, as testemunhas atestam que o autor trabalhou no campo até 2002, ano do início da incapacidade (DII). 22 - Em suma, comprovado o surgimento da incapacidade total e temporária para o trabalho, quando o autor era segurado da Previdência Social, de rigor a concessão do auxílio-doença. 23 - A reabilitação só tem vez quando o segurado for tido por incapacitado total e definitivamente para o exercício da sua ocupação habitual, mas não para a realização de outro trabalho que lhe permita o sustento, quando então, após a constatação, haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de nova ocupação profissional. 24 - Uma vez concedido e dada a sua natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio doença realmente pode ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou aposentadoria por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do segurado, o que se dá por meio da realização de perícias periódicas por parte da autarquia, inclusive se valendo do mecanismo da "alta programada". 25 - Descabe, ainda, cogitar-se da impossibilidade de cessação do benefício, caso a perícia administrativa constate o restabelecimento da capacidade laboral, após procedimento reabilitatório, uma vez que esses deveres decorrem de imposição legal. Eventual alegação de agravamento do quadro de saúde e concessão de nova benesse, por se tratar de situação fática diversa, deve ser objeto de novo pedido administrativo ou judicial, sob pena de eternização desta lide. 26 - Acerca do termo inicial do benefício, o entendimento consolidado do E. STJ, exposto na Súmula 576, indica que: "ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida". Desta feita, não havendo prova do pedido administrativo, de rigor a manutenção da sentença, no particular, que fixou a DIB na data da citação do ente autárquico. 27 - Relativamente aos honorários advocatícios, inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a verba honorária deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente, o que resta atendido com o percentual de 10% (dez por cento) sobre os valores devidos até a sentença (Súmula 111, STJ), devendo o decisum também ser mantido no ponto. 28 - Em observância ao entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1205946/SP, submetido ao regime do artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973, adequo, de ofício, os critérios de cálculo dos juros de mora e de correção monetária, por se tratar de matéria de ordem pública e de natureza processual, com incidência imediata sobre os processos em curso. 29 - Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante. 30 - Apelação da parte autora e do INSS desprovidas. Alteração dos critérios de aplicação dos juros de mora de ofício. Sentença reforma em parte. Auxílio-doença concedido.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora e do INSS, e, de ofício, em atenção ao determinado no REsp 1.352.721/SP, julgado na forma do art. 543-C do CPC/1973, determinar a fixação dos juros de mora de acordo com os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, mantendo, no mais, íntegra a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nestes próprios autos, após regular liquidação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 06/11/2017
Data da Publicação : 16/11/2017
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1493612
Órgão Julgador : SÉTIMA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/11/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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