TRF3 0008585-40.2009.4.03.6100 00085854020094036100
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DO
JUÍZO FEDERAL, DE CERCEAMENTO DE DEFESA, DE DEPENDÊNCIA DO DESFECHO DA
AÇÃO CRIMINAL E DE OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO REJEITADAS. AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MÁFIA DAS SANGUESSUGAS. EMENDAS
ORÇAMENTÁRIAS. ÁREA DA SAÚDE. PARLAMENTAR E EMPRESÁRIOS. INCIDÊNCIA
DOS ARTIGOS 3º, 9º, CAPUT, E 12, I, TODOS, DA LEI Nº 8.429/92. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS INDEVIDOS PARA A UNIÃO FEDERAL.
- Não há que se falar em incompetência do juízo da 6ª Vara Federal
de São Paulo e, em consequência, a nulidade dos atos praticados, sendo o
juízo da 7ª Vara Criminal de Mato Grosso competente. Conforme muito bem
fundamentado pelo Juízo a quo, "Embora os atos tenham sido praticados em
organização criminosa e haja processos criminais, administrativos e de
improbidade tramitando em outros juízos, especialmente na circunscrição
do Mato Grosso, não há relação de causalidade necessária entre as
condutas discutidas nos vários processos. Foram praticados inúmeros atos
ilícitos pelos integrantes da organização sem qualquer relação de
prejudicialidade entre eles. Nestes casos, não há a alegada prevenção
do juízo, instituída para impedir decisões contraditórias e facilitar
a instrução, concentrando os atos necessários num único juízo".
- Não merece guarida a alegação de cerceamento de defesa, por negativa
de ouvir como testemunha o Sr. Walter Flores de Melo Júnior, inicialmente
arrolado com testemunha de defesa, mas que passou a integrar o polo passivo da
demanda por reunião de ações conexas. Conforme observado pelo Ministério
Público Federal: "esta também não deve ser conhecida haja vista as absurdas
alegações defensivas no sentido de que o MPF teria ajuizado ação contra
a testemunha apenas com a finalidade de impedi-la de depor, argumento
sem fundamentos e de má-fé, sendo certo que eventual negativa dos fatos
pelo Sr. Walter Flores não teria o condão de alterar a solução dada a
lide. Ademais, o arrolamento de referida testemunha postergava o julgamento
da causa pois esta se encontrava fora do país. Nesse contexto, revelou-se
que Walter Flores de Melo Júnior figurava como réu em outra ação civil
pública, pelos mesmos atos de improbidade administrativa cometidos na
condição de assessor parlamentar do apelante. Desta forma, em razão da
conexão entre os fatos o Juízo a quo indeferiu a oitiva da testemunha Walter
Flores, tendo em vista que corréu não pode ser testemunha em relação
aos mesmos fatos a que responde ação, sendo certo que o indeferimento
fundamentado e legalmente necessário não cerceou o direito de defesa".
- Em razão da independência que existe entre as esferas civil, penal e
administrativa, expressamente prevista no caput do artigo 12 da Lei n.º
Lei 8.429/92, não procede a alegação de que esta decisão deve esperar
o desfecho de ações que correm em âmbito diverso e suposto bis in idem
das condenações.
- Quanto à ocorrência da prescrição, no presente caso, incide a regra
do artigo 23, I, da Lei 8.429/92 que dispõe que o termo a quo do prazo
prescricional é de 5 (cinco) anos após o término do exercício de mandato,
de cargo em comissão ou de função de confiança. Considerando que MARCOS
ROBERTO ABRAMO exerceu o mandato na Câmara dos Deputados na legislatura
de 2003 a 2006 e a presente ação foi ajuizada em 06/04/2009, inexiste
prescrição punitiva.
- O Ministério Público Federal ajuizou a presente ação civil pública em
face de MARCOS ROBERTO ABRAMO, DARCI JOSÉ VEDOIN e LUIZ ANTÔNIO TREVISAN
VEDOIN por atos de improbidade administrativa consistentes na prática de
diversos ilícitos inseridos no âmbito de atuação de uma organização
criminosa envolvendo políticos, empresários e servidores públicos voltados
à apropriação de recursos públicos, no que ficou conhecido como "Operação
Sanguessuga".
- O esquema consistia na apresentação de emendas orçamentárias,
descentralização dos recursos públicos por meio de convênios, manipulação
de processos licitatórios e repartição dos recursos públicos apropriados
entre os envolvidos, em esquema que perdurou no período de 2000 a 2006.
- Nos termos da inicial, Marcos Roberto Abramo participava do núcleo político
da organização criminosa, com a apresentação de emendas orçamentárias. Os
réus Luiz Antônio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin participavam do
núcleo empresarial e de fraude de licitações. Nesse contexto, Marcos Roberto
Abramo recebia 10% a título de comissão por cada emenda orçamentária
apresentada e liberada, sendo que, entre dezembro de 2004 e maio de 2005,
lhe foram entregues pelo menos R$ 64.000,00 em espécie, e entre 2000 e 2005,
período que apresentou 21 emendas orçamentárias, resultando a liberação
de R$ 1.700.000,00, valor referente à celebração de 12 convênios, dentre
os quais com a Sociedade Pestalozzi de São Paulo (valor de R$ 160.000,00)
e a ABC - Associação Beneficente Cristã (valor de R$ 120.000,00).
- Os atos cometidos por MARCOS ROBERTO ABRAMO estão disciplinados na Lei
de Improbidade, em especial, nos artigos 9, caput, e 12, ambos, da Lei nº
8.429/92. No que diz respeito aos empresários envolvidos (DARCI JOSÉ VEDOIN
e LUIZ ANTÔNIO TREVISAN VEDOIN), estes teriam concorrido para a improbidade
em questão, sujeitando-se às mesmas sanções, de acordo com o artigo 3º
da referida lei.
- No caso do art. 9, da Lei nº 8.429/92, a configuração da prática de
improbidade administrativa depende da presença dos seguintes requisitos
genéricos: recebimento de vantagem indevida (independente de prejuízo ao
erário); conduta dolosa por parte do agente ou do terceiro; e nexo causal
ou etiológico entre o recebimento da vantagem e a conduta daquele que ocupa
cargo ou emprego, detém mandato, exerce função ou atividade nas entidades
mencionadas no art. 1º da Lei de improbidade administrativa.
- Após análise do conjunto probatório, não há nenhuma dúvida de que
as denuncias feitas contra o réu são verídicas. Ficou caracterizada a
prática de atos de improbidade administrativa previstos no artigo 9º,
caput, da Lei nº 8.429/92.
- Levando-se em conta a jurisprudência da Primeira Seção do Superior
Tribunal de Justiça no sentido de que, em favor da simetria, a previsão do
art. 18 da Lei 7.347/85 deve ser interpretada também em favor do requerido
em ação civil pública, revejo meu posicionamento anterior e ratifico a
impossibilidade do Ministério Público e da União de serem beneficiados
em honorários advocatícios quando vencedores.
- A determinação de sigilo compatível com o feito é a de sigilo de
documentos. Quanto à fase processual e os demais atos, impera o princípio
da publicidade. Portanto, mantenho o sigilo no feito, mas na espécie sigilo
de documentos.
- Recurso de apelação da UNIÃO improvido. Recurso de MARCOS ROBERTO ABRAMO
parcialmente provido. Sigilo no feito mantido somente na espécie sigilo de
documentos.
Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DO
JUÍZO FEDERAL, DE CERCEAMENTO DE DEFESA, DE DEPENDÊNCIA DO DESFECHO DA
AÇÃO CRIMINAL E DE OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO REJEITADAS. AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MÁFIA DAS SANGUESSUGAS. EMENDAS
ORÇAMENTÁRIAS. ÁREA DA SAÚDE. PARLAMENTAR E EMPRESÁRIOS. INCIDÊNCIA
DOS ARTIGOS 3º, 9º, CAPUT, E 12, I, TODOS, DA LEI Nº 8.429/92. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS INDEVIDOS PARA A UNIÃO FEDERAL.
- Não há que se falar em incompetência do juízo da 6ª Vara Federal
de São Paulo e, em consequência, a nulidade dos atos praticados, sendo o
juízo da 7ª Vara Criminal de Mato Grosso competente. Conforme muito bem
fundamentado pelo Juízo a quo, "Embora os atos tenham sido praticados em
organização criminosa e haja processos criminais, administrativos e de
improbidade tramitando em outros juízos, especialmente na circunscrição
do Mato Grosso, não há relação de causalidade necessária entre as
condutas discutidas nos vários processos. Foram praticados inúmeros atos
ilícitos pelos integrantes da organização sem qualquer relação de
prejudicialidade entre eles. Nestes casos, não há a alegada prevenção
do juízo, instituída para impedir decisões contraditórias e facilitar
a instrução, concentrando os atos necessários num único juízo".
- Não merece guarida a alegação de cerceamento de defesa, por negativa
de ouvir como testemunha o Sr. Walter Flores de Melo Júnior, inicialmente
arrolado com testemunha de defesa, mas que passou a integrar o polo passivo da
demanda por reunião de ações conexas. Conforme observado pelo Ministério
Público Federal: "esta também não deve ser conhecida haja vista as absurdas
alegações defensivas no sentido de que o MPF teria ajuizado ação contra
a testemunha apenas com a finalidade de impedi-la de depor, argumento
sem fundamentos e de má-fé, sendo certo que eventual negativa dos fatos
pelo Sr. Walter Flores não teria o condão de alterar a solução dada a
lide. Ademais, o arrolamento de referida testemunha postergava o julgamento
da causa pois esta se encontrava fora do país. Nesse contexto, revelou-se
que Walter Flores de Melo Júnior figurava como réu em outra ação civil
pública, pelos mesmos atos de improbidade administrativa cometidos na
condição de assessor parlamentar do apelante. Desta forma, em razão da
conexão entre os fatos o Juízo a quo indeferiu a oitiva da testemunha Walter
Flores, tendo em vista que corréu não pode ser testemunha em relação
aos mesmos fatos a que responde ação, sendo certo que o indeferimento
fundamentado e legalmente necessário não cerceou o direito de defesa".
- Em razão da independência que existe entre as esferas civil, penal e
administrativa, expressamente prevista no caput do artigo 12 da Lei n.º
Lei 8.429/92, não procede a alegação de que esta decisão deve esperar
o desfecho de ações que correm em âmbito diverso e suposto bis in idem
das condenações.
- Quanto à ocorrência da prescrição, no presente caso, incide a regra
do artigo 23, I, da Lei 8.429/92 que dispõe que o termo a quo do prazo
prescricional é de 5 (cinco) anos após o término do exercício de mandato,
de cargo em comissão ou de função de confiança. Considerando que MARCOS
ROBERTO ABRAMO exerceu o mandato na Câmara dos Deputados na legislatura
de 2003 a 2006 e a presente ação foi ajuizada em 06/04/2009, inexiste
prescrição punitiva.
- O Ministério Público Federal ajuizou a presente ação civil pública em
face de MARCOS ROBERTO ABRAMO, DARCI JOSÉ VEDOIN e LUIZ ANTÔNIO TREVISAN
VEDOIN por atos de improbidade administrativa consistentes na prática de
diversos ilícitos inseridos no âmbito de atuação de uma organização
criminosa envolvendo políticos, empresários e servidores públicos voltados
à apropriação de recursos públicos, no que ficou conhecido como "Operação
Sanguessuga".
- O esquema consistia na apresentação de emendas orçamentárias,
descentralização dos recursos públicos por meio de convênios, manipulação
de processos licitatórios e repartição dos recursos públicos apropriados
entre os envolvidos, em esquema que perdurou no período de 2000 a 2006.
- Nos termos da inicial, Marcos Roberto Abramo participava do núcleo político
da organização criminosa, com a apresentação de emendas orçamentárias. Os
réus Luiz Antônio Trevisan Vedoin e Darci José Vedoin participavam do
núcleo empresarial e de fraude de licitações. Nesse contexto, Marcos Roberto
Abramo recebia 10% a título de comissão por cada emenda orçamentária
apresentada e liberada, sendo que, entre dezembro de 2004 e maio de 2005,
lhe foram entregues pelo menos R$ 64.000,00 em espécie, e entre 2000 e 2005,
período que apresentou 21 emendas orçamentárias, resultando a liberação
de R$ 1.700.000,00, valor referente à celebração de 12 convênios, dentre
os quais com a Sociedade Pestalozzi de São Paulo (valor de R$ 160.000,00)
e a ABC - Associação Beneficente Cristã (valor de R$ 120.000,00).
- Os atos cometidos por MARCOS ROBERTO ABRAMO estão disciplinados na Lei
de Improbidade, em especial, nos artigos 9, caput, e 12, ambos, da Lei nº
8.429/92. No que diz respeito aos empresários envolvidos (DARCI JOSÉ VEDOIN
e LUIZ ANTÔNIO TREVISAN VEDOIN), estes teriam concorrido para a improbidade
em questão, sujeitando-se às mesmas sanções, de acordo com o artigo 3º
da referida lei.
- No caso do art. 9, da Lei nº 8.429/92, a configuração da prática de
improbidade administrativa depende da presença dos seguintes requisitos
genéricos: recebimento de vantagem indevida (independente de prejuízo ao
erário); conduta dolosa por parte do agente ou do terceiro; e nexo causal
ou etiológico entre o recebimento da vantagem e a conduta daquele que ocupa
cargo ou emprego, detém mandato, exerce função ou atividade nas entidades
mencionadas no art. 1º da Lei de improbidade administrativa.
- Após análise do conjunto probatório, não há nenhuma dúvida de que
as denuncias feitas contra o réu são verídicas. Ficou caracterizada a
prática de atos de improbidade administrativa previstos no artigo 9º,
caput, da Lei nº 8.429/92.
- Levando-se em conta a jurisprudência da Primeira Seção do Superior
Tribunal de Justiça no sentido de que, em favor da simetria, a previsão do
art. 18 da Lei 7.347/85 deve ser interpretada também em favor do requerido
em ação civil pública, revejo meu posicionamento anterior e ratifico a
impossibilidade do Ministério Público e da União de serem beneficiados
em honorários advocatícios quando vencedores.
- A determinação de sigilo compatível com o feito é a de sigilo de
documentos. Quanto à fase processual e os demais atos, impera o princípio
da publicidade. Portanto, mantenho o sigilo no feito, mas na espécie sigilo
de documentos.
- Recurso de apelação da UNIÃO improvido. Recurso de MARCOS ROBERTO ABRAMO
parcialmente provido. Sigilo no feito mantido somente na espécie sigilo de
documentos.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, negar provimento ao recurso de apelação da UNIÃO e dar
parcial provimento à apelação de MARCOS ROBERTO ABRAMO, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
03/05/2018
Data da Publicação
:
06/07/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2202512
Órgão Julgador
:
QUARTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO SARAIVA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE
Referência
legislativa
:
***** LIA-92 LEI DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
LEG-FED LEI-8429 ANO-1992 ART-3 ART-9 ART-12 INC-1 ART-23 INC-1 ART-1
***** LACP-85 LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA
LEG-FED LEI-7347 ANO-1985 ART-18
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/07/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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