TRF3 0008814-57.2010.4.03.6102 00088145720104036102
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RESSARCIMENTO DE
DANOS MATERIAIS E MORAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO PROVOCADO POR MOTORISTA A
SERVIÇO DA ECT. INFRAÇÃO ÀS REGRAS DE TRÂNSITO. CONDUÇÃO IMPRUDENTE,
COM ASSUNÇÃO DE RISCO. RELAÇÃO DE CAUSALIDADE ESTABELECIDA. AUSÊNCIA
DE CULPA CONCORRENTE EM RAZÃO DA IDADE DA AUTORA (SEIS ANOS À
ÉPOCA DOS FATOS). COMPROVAÇÃO DE DANOS GRAVES, COM SEQUELAS
IRREVERSÍVEIS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. ART. 37, § 6º,
CF. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO ENTE PÚBLICO. ART. 43 DO CÓDIGO
CIVIL. DANOS MATERIAIS E MORAIS CARACTERIZADOS. ARTIGOS 927 E 950 DO
CÓDIGO CIVIL. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO CORRETAMENTE. VERBA HONORÁRIA
MANTIDA. APELAÇÃO DA AUTORA DESPROVIDA, APELAÇÕES DOS REUS PARCIALMENTE
PROVIDAS.
1 - Cuida-se a questão posta de esclarecer eventual direito da autora ao
recebimento de indenização por danos materiais e morais decorrentes de
lesão grave causada por atropelamento por veículo automotor, cujo motorista
prestava serviços à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT.
2 - Da análise dos autos, verifica-se que em 22/07/2009, a autora, então
com seis anos de idade, foi atropelada por um caminhão a serviço da ECT,
o qual, segundo laudo pericial (fls. 277/283), encontrava-se no momento do
acidente em velocidade de 85 km/h, portanto em muito superior ao limite de
40 km/h estabelecido para o local.
3 - Verifica-se, assim, que o condutor do referido veículo agiu com
imprudência, uma vez que a velocidade máxima para aquele trecho urbano
encontrava-se explicitamente definida em placa de trânsito de fácil
visibilidade, e sua conduta culminou com no evento danoso. Ao desrespeitar
o referido limite de velocidade, ele agiu de forma imprudente, e assumiu o
risco pela produção do resultado observado.
4 - De outra via, não há falar em culpa concorrente, muito menos culpa
exclusiva no caso dos autos, por se tratar a vítima de uma criança de apenas
seis anos de idade na ocasião, desprovida do necessário discernimento para
se evitar tal tipo de acidente. A responsabilidade subjetiva, neste caso,
cabe unicamente ao motorista Márcio Felipe Guedes.
5 - No que diz respeito ao dano causado à autora, a declaração emitida pelo
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - Unidade
de Emergência (fls. 16/17), atesta diagnóstico de politraumatismo, fratura
de base de crânio, fratura de clavícula, fratura de órbita bilateral,
afundamento de crânio em região fronto-parietal extenso e contusão
pulmonar, tendo ela sido entubada por catorze dias, além de apresentar
pneumonia durante a internação e ter sido submetida a várias cirurgias,
cabendo ainda ressaltar o comprometimento de suas funções mastigatória,
estética e fonética (fl. 289); sequelas de traumatismo cranioencefálico, com
dificuldade de concentração, memória, aprendizado, além do desenvolvimento
de epilepsia (fl. 334); comprometimento do nervo óptico esquerdo (fl. 333).
6 - Ademais, o relatório do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto
aponta déficit acentuado na aprendizagem de conceitos básicos relacionados
à educação, com encaminhamento da autora para avaliação e seguimento
psicopedagógico (fl. 229). Não há portanto, qualquer dúvida quanto à
gravidade do dano sofrido pela autora, ressaltando-se novamente sua idade
de apenas seis anos à época dos fatos.
7 - Superada esta questão, passo à análise do tema da responsabilidade
civil do Estado, de modo que se fazem pertinentes algumas considerações
doutrinárias e jurisprudenciais. São elementos da responsabilidade civil a
ação ou omissão do agente, a culpa, o nexo causal e o dano, do qual surge
o dever de indenizar. No direito brasileiro, a responsabilidade civil do
Estado é, em regra, objetiva, isto é, prescinde da comprovação de culpa do
agente, bastando-se que se comprove o nexo causal entre a conduta do agente
e o dano. Está consagrada na norma do artigo 37, § 6º, da Constituição
Federal. Pois bem, aplica-se ao caso o instituto da responsabilidade civil
objetiva do Estado em sua modalidade comissiva, uma vez que, no caso em tela,
embora tanto o condutor como o veículo em questão estarem associados a
empresa terceirizada, estavam a serviço da Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos - ECT no momento do acidente, caracterizando-se a responsabilidade
solidária prevista no art. 43 do Código Civil.
8 - No que diz respeito ao dano material, trata-se do prejuízo financeiro
efetivamente sofrido pela vítima, causando diminuição do seu patrimônio
ou de seus responsáveis. Esse dano pode ser de duas naturezas: o que
efetivamente o lesado perdeu, dano emergente, e o que razoavelmente deixou
de ganhar, lucro cessante. No caso dos autos, o dano material advém não
só das despesas complementares ao tratamento de saúde na rede pública,
a serem suportadas pela família da autora, mas também do irreversível
comprometimento de sua capacidade laboral em razão das sequelas neurológicas
sofridas. Inteligência do art. 950 do Código Civil.
9 - Em relação ao dano moral, tem-se por uma compensação pela ofensa à
personalidade da vítima. O direito à reparação de danos morais e materiais
foi elencado pelo artigo 5º, X, da Constituição Federal de 1988. O art. 159
do Código Civil de 1916, no qual se fundamentava a responsabilidade, tinha
em vista o dano em geral, não fazendo qualquer distinção quanto ao tipo
ou à natureza. Mesmo anteriormente dominava, de outro lado, o princípio
de que o ressarcimento deveria ser o mais amplo possível, abrangendo todo
e qualquer prejuízo. O Código Civil de 2002 previu de forma explícita a
reparação por dano moral (Art. 186 e 927 do Código Civil). Precedentes
desta Corte Regional.
10 - Logo, restando comprovados conduta lesiva, dano e nexo causal, impõe-se
o ressarcimento pelos danos de ordem material e moral causados à autora.
11 - No que diz respeito ao quantum indenizatório, observo que em situações
de acidente de trânsito sem resultado morte, o arbitramento costuma ser fixado
em valores abaixo do definido pelo Juiz sentenciante. Precedentes: TRF 3ª
Região, TERCEIRA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1621237
- 0902266-70.2005.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELTON DOS SANTOS,
julgado em 07/07/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/07/2016; TRF 3ª Região,
TERCEIRA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1562640 - 0006638-94.2004.4.03.6109,
Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NERY JUNIOR, julgado em 25/06/2015, e-DJF3 Judicial
1 DATA:02/07/2015).
12 - No caso, considerando-se a pouca idade da vítima e a gravidade das
sequelas suportas, reputo razoável fixar a indenização por danos morais em
cinquenta salários mínimos. De resto, mantenha-se a indenização por dano
material conforme determinado pelo Juiz a quo, bem como a verba honorária,
porque em conformidade com o entendimento desta Terceira Turma.
13 - Apelação da autora desprovida, e apelações dos réus providas em
parte.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RESSARCIMENTO DE
DANOS MATERIAIS E MORAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO PROVOCADO POR MOTORISTA A
SERVIÇO DA ECT. INFRAÇÃO ÀS REGRAS DE TRÂNSITO. CONDUÇÃO IMPRUDENTE,
COM ASSUNÇÃO DE RISCO. RELAÇÃO DE CAUSALIDADE ESTABELECIDA. AUSÊNCIA
DE CULPA CONCORRENTE EM RAZÃO DA IDADE DA AUTORA (SEIS ANOS À
ÉPOCA DOS FATOS). COMPROVAÇÃO DE DANOS GRAVES, COM SEQUELAS
IRREVERSÍVEIS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. ART. 37, § 6º,
CF. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO ENTE PÚBLICO. ART. 43 DO CÓDIGO
CIVIL. DANOS MATERIAIS E MORAIS CARACTERIZADOS. ARTIGOS 927 E 950 DO
CÓDIGO CIVIL. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO CORRETAMENTE. VERBA HONORÁRIA
MANTIDA. APELAÇÃO DA AUTORA DESPROVIDA, APELAÇÕES DOS REUS PARCIALMENTE
PROVIDAS.
1 - Cuida-se a questão posta de esclarecer eventual direito da autora ao
recebimento de indenização por danos materiais e morais decorrentes de
lesão grave causada por atropelamento por veículo automotor, cujo motorista
prestava serviços à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT.
2 - Da análise dos autos, verifica-se que em 22/07/2009, a autora, então
com seis anos de idade, foi atropelada por um caminhão a serviço da ECT,
o qual, segundo laudo pericial (fls. 277/283), encontrava-se no momento do
acidente em velocidade de 85 km/h, portanto em muito superior ao limite de
40 km/h estabelecido para o local.
3 - Verifica-se, assim, que o condutor do referido veículo agiu com
imprudência, uma vez que a velocidade máxima para aquele trecho urbano
encontrava-se explicitamente definida em placa de trânsito de fácil
visibilidade, e sua conduta culminou com no evento danoso. Ao desrespeitar
o referido limite de velocidade, ele agiu de forma imprudente, e assumiu o
risco pela produção do resultado observado.
4 - De outra via, não há falar em culpa concorrente, muito menos culpa
exclusiva no caso dos autos, por se tratar a vítima de uma criança de apenas
seis anos de idade na ocasião, desprovida do necessário discernimento para
se evitar tal tipo de acidente. A responsabilidade subjetiva, neste caso,
cabe unicamente ao motorista Márcio Felipe Guedes.
5 - No que diz respeito ao dano causado à autora, a declaração emitida pelo
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - Unidade
de Emergência (fls. 16/17), atesta diagnóstico de politraumatismo, fratura
de base de crânio, fratura de clavícula, fratura de órbita bilateral,
afundamento de crânio em região fronto-parietal extenso e contusão
pulmonar, tendo ela sido entubada por catorze dias, além de apresentar
pneumonia durante a internação e ter sido submetida a várias cirurgias,
cabendo ainda ressaltar o comprometimento de suas funções mastigatória,
estética e fonética (fl. 289); sequelas de traumatismo cranioencefálico, com
dificuldade de concentração, memória, aprendizado, além do desenvolvimento
de epilepsia (fl. 334); comprometimento do nervo óptico esquerdo (fl. 333).
6 - Ademais, o relatório do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto
aponta déficit acentuado na aprendizagem de conceitos básicos relacionados
à educação, com encaminhamento da autora para avaliação e seguimento
psicopedagógico (fl. 229). Não há portanto, qualquer dúvida quanto à
gravidade do dano sofrido pela autora, ressaltando-se novamente sua idade
de apenas seis anos à época dos fatos.
7 - Superada esta questão, passo à análise do tema da responsabilidade
civil do Estado, de modo que se fazem pertinentes algumas considerações
doutrinárias e jurisprudenciais. São elementos da responsabilidade civil a
ação ou omissão do agente, a culpa, o nexo causal e o dano, do qual surge
o dever de indenizar. No direito brasileiro, a responsabilidade civil do
Estado é, em regra, objetiva, isto é, prescinde da comprovação de culpa do
agente, bastando-se que se comprove o nexo causal entre a conduta do agente
e o dano. Está consagrada na norma do artigo 37, § 6º, da Constituição
Federal. Pois bem, aplica-se ao caso o instituto da responsabilidade civil
objetiva do Estado em sua modalidade comissiva, uma vez que, no caso em tela,
embora tanto o condutor como o veículo em questão estarem associados a
empresa terceirizada, estavam a serviço da Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos - ECT no momento do acidente, caracterizando-se a responsabilidade
solidária prevista no art. 43 do Código Civil.
8 - No que diz respeito ao dano material, trata-se do prejuízo financeiro
efetivamente sofrido pela vítima, causando diminuição do seu patrimônio
ou de seus responsáveis. Esse dano pode ser de duas naturezas: o que
efetivamente o lesado perdeu, dano emergente, e o que razoavelmente deixou
de ganhar, lucro cessante. No caso dos autos, o dano material advém não
só das despesas complementares ao tratamento de saúde na rede pública,
a serem suportadas pela família da autora, mas também do irreversível
comprometimento de sua capacidade laboral em razão das sequelas neurológicas
sofridas. Inteligência do art. 950 do Código Civil.
9 - Em relação ao dano moral, tem-se por uma compensação pela ofensa à
personalidade da vítima. O direito à reparação de danos morais e materiais
foi elencado pelo artigo 5º, X, da Constituição Federal de 1988. O art. 159
do Código Civil de 1916, no qual se fundamentava a responsabilidade, tinha
em vista o dano em geral, não fazendo qualquer distinção quanto ao tipo
ou à natureza. Mesmo anteriormente dominava, de outro lado, o princípio
de que o ressarcimento deveria ser o mais amplo possível, abrangendo todo
e qualquer prejuízo. O Código Civil de 2002 previu de forma explícita a
reparação por dano moral (Art. 186 e 927 do Código Civil). Precedentes
desta Corte Regional.
10 - Logo, restando comprovados conduta lesiva, dano e nexo causal, impõe-se
o ressarcimento pelos danos de ordem material e moral causados à autora.
11 - No que diz respeito ao quantum indenizatório, observo que em situações
de acidente de trânsito sem resultado morte, o arbitramento costuma ser fixado
em valores abaixo do definido pelo Juiz sentenciante. Precedentes: TRF 3ª
Região, TERCEIRA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1621237
- 0902266-70.2005.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELTON DOS SANTOS,
julgado em 07/07/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/07/2016; TRF 3ª Região,
TERCEIRA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1562640 - 0006638-94.2004.4.03.6109,
Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NERY JUNIOR, julgado em 25/06/2015, e-DJF3 Judicial
1 DATA:02/07/2015).
12 - No caso, considerando-se a pouca idade da vítima e a gravidade das
sequelas suportas, reputo razoável fixar a indenização por danos morais em
cinquenta salários mínimos. De resto, mantenha-se a indenização por dano
material conforme determinado pelo Juiz a quo, bem como a verba honorária,
porque em conformidade com o entendimento desta Terceira Turma.
13 - Apelação da autora desprovida, e apelações dos réus providas em
parte.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, negar provimento à apelação da autora, e dar parcial
provimento às apelações da réus somente para reduzir a condenação em
indenização por danos morais, nos termos do relatório e voto que integram
o presente julgado.
Data do Julgamento
:
20/03/2019
Data da Publicação
:
28/03/2019
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2159116
Órgão Julgador
:
TERCEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/03/2019
..FONTE_REPUBLICACAO:
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