TRF3 0008882-24.2008.4.03.6119 00088822420084036119
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. REMESSA OFICIAL E
APELAÇÃO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO (ELAPRASE - IDURSULFASE). SÍNDROME DE
HUNTER. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIMENTO. DUPLICIDADE DE APELO. PRECLUSÃO
CONSUMATIVA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES DA FEDERAÇÃO. LEGITMIDADE
PASSIVA DA UNIÃO E DO MUNICÍPIO. INTERESSE DE AGIR. CONFIGURAÇÃO. DIREITO
AO LIVRE ACESSO À JUSTIÇA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO
DE SAÚDE. MEDICAMENTO EFICAZ DISPONÍVEL PARA O TRATAMENTO DA
DOENÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MANUTENÇÃO. RECURSOS DESPROVIDOS.
- A Prefeitura do Município de Mogi das Cruzes interpôs dois
apelos. Entretanto, o segundo não pode ser conhecido, ante a preclusão
consumativa que se operou com a apresentação do primeiro.
- De acordo com o artigo 523 do Código de Processo Civil de 1973, cabe ao
agravante requerer que seja conhecido o agravo retido nas razões da apelação
ou na sua resposta. In casu, verifica-se que a União, que interpôs o agravo
retido, não lhe faz menção em sua peça recursal, tampouco pleiteia seu
conhecimento. Desse modo, o agravo retido não deve ser conhecido.
- Descabida a alegação de ilegitimidade passiva da União e da Prefeitura
do Município de Mogi das Cruzes, à vista de que o Pleno do Supremo Tribunal
Federal, no julgamento da Suspensão de Segurança nº 3.355-AgR/RN, adotou
entendimento no sentido de que a obrigação dos entes da federação no que
tange ao dever fundamental de prestação de saúde é solidária (AI nº
808.059 AgR, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, julgado
em 02/12/2010, DJe de 01/02/2011). Ademais, da conjugação dos artigos 23,
inciso II, e 196 a 200 da Constituição Federal decorre que o direito à
saúde é de todos os cidadãos e dever da União, Estados, Distrito Federal e
Municípios. Em consequência, a corte máxima assentou que a responsabilidade
é dos entes mencionados (RE nº 195.192/RS). Destaquem-se, ademais,
precedentes do Superior Tribunal de Justiça: (AgRg no AREsp 612.404/MG,
Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/05/2015,
DJe 20/05/2015; AgRg no AREsp 264.335/CE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/04/2014, DJe 07/05/2014).
- Ficou demonstrado que o medicamento ELAPRASE (Idursulfase), embora tenha
sido registrado na ANVISA, é de comercialização proibida e não consta
da lista de produtos do SUS, bem como que ao ser requerido seu fornecimento
ao Ministério da Saúde, foi negado ao fundamento de que não pode ser
padronizado para utilização no âmbito do SUS com financiamento público,
em razão do seu alto custo e não haver informações suficientes sobre
sua eficácia e segurança no tratamento da doença em questão. Assim,
restou caracterizada a presença do interesse de agir, pois o autor não
teve outra saída a não ser socorrer-se do Poder Judiciário para obtenção
do medicamento, em decorrência de seu direito ao livre acesso à justiça,
tratado no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal.
- O direito ao fornecimento dos medicamentos decorre dos deveres impostos
à União, Estados, Distrito Federal e Municípios pelos artigos 6º,
23, inciso II, e 196 a 200 da Lei Maior na realização do direito à
saúde. As normas legais devem ser interpretadas em conformidade com as
normas constitucionais referidas, a fim de que se concretize o direito
fundamental à saúde dos cidadãos. Em consequência, a definição do
elenco de medicamento s e tratamentos diversos existe como dever aos entes
estatais para o estabelecimento de uma política de saúde consistente, o
que não exclui que drogas alternativas sejam ministradas pelo médico que
atende o paciente e sob sua responsabilidade profissional, nem que outros
programas sejam estabelecidos para assistir aqueles que forem portadores de
artrite reumatoide e que não constituem restrição ao acesso à saúde. É
certo que cumpre ao Judiciário a efetivação dos direitos prescritos
na Constituição Federal e nas leis. É a garantia fundamental do artigo
5º, inciso XXXV, da CF. O artigo 2º do Estatuto Constitucional deve ser
interpretado em harmonia com o acesso à jurisdição e com os dispositivos
pertinentes à saúde pública (artigo 6º, inciso II, e artigos 196 a 200
da CF). A reserva do possível, o denominado "mínimo existencial", no qual
se incluem os direitos individuais e coletivos à vida e à saúde e que
se apresenta com as características da integridade e da intangibilidade,
e alegações genéricas, sem demonstração objetiva, no sentido da
inexistência de recursos ou de previsão orçamentária não são capazes
de frustrar a preservação e o atendimento, em favor dos indivíduos,
de condições mínimas de existência, saúde e dignidade. Note-se que é
notória a necessidade da manutenção do tratamento. Como parâmetro, as
entidades federais, no atendimento ao direito à saúde, devem pautar-se pelos
princípios e normas constitucionais. O SUS, na regulamentação que lhe dá
a Lei nº 8.080/1990, deve-se orientar à mais ampla possível realização
concreta do direito fundamental de que aqui se cuida (artigos 1º, 2º,
4º, 6º, 9º, 15, 19-M, 19-O, 19-P, 19-Q e 19-R). É de suma importância
que o médico seja respeitado nas prescrições que faz, uma vez que é
quem acompanha e faz recomendações ao paciente, salvo quando a atividade
contrarie os próprios conhecimentos existentes no campo da medicina. Nesse
contexto, a prova cabal de que o medicamento é eficaz é desnecessária, na
medida em que a chance de melhora do doente com o uso do remédio prescrito
é suficiente para justificar seu fornecimento.
- De outro lado, o fato de o medicamento não estar padronizado em qualquer
programa de saúde contemplado pelo SUS e não ser disponibilizado na
Farmácia Alto Custo por não constar do rol de medicamentos do Protocolo
Técnico de Dispensão de Medicamentos Alto Custo, aprovado pela Resolução
SS nº 137/98, não afasta o dever do poder público de custear o tratamento
prescrito por médico e, portanto, necessário, a pacientes sem condições
financeiras. Sobre a questão, destaco entendimento desta 4ª Turma: (AI
00067763520164030000, DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE, TRF3 - QUARTA
TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/09/2016).
- Remessa oficial e apelações desprovidas.
Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. REMESSA OFICIAL E
APELAÇÃO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO (ELAPRASE - IDURSULFASE). SÍNDROME DE
HUNTER. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIMENTO. DUPLICIDADE DE APELO. PRECLUSÃO
CONSUMATIVA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES DA FEDERAÇÃO. LEGITMIDADE
PASSIVA DA UNIÃO E DO MUNICÍPIO. INTERESSE DE AGIR. CONFIGURAÇÃO. DIREITO
AO LIVRE ACESSO À JUSTIÇA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO
DE SAÚDE. MEDICAMENTO EFICAZ DISPONÍVEL PARA O TRATAMENTO DA
DOENÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MANUTENÇÃO. RECURSOS DESPROVIDOS.
- A Prefeitura do Município de Mogi das Cruzes interpôs dois
apelos. Entretanto, o segundo não pode ser conhecido, ante a preclusão
consumativa que se operou com a apresentação do primeiro.
- De acordo com o artigo 523 do Código de Processo Civil de 1973, cabe ao
agravante requerer que seja conhecido o agravo retido nas razões da apelação
ou na sua resposta. In casu, verifica-se que a União, que interpôs o agravo
retido, não lhe faz menção em sua peça recursal, tampouco pleiteia seu
conhecimento. Desse modo, o agravo retido não deve ser conhecido.
- Descabida a alegação de ilegitimidade passiva da União e da Prefeitura
do Município de Mogi das Cruzes, à vista de que o Pleno do Supremo Tribunal
Federal, no julgamento da Suspensão de Segurança nº 3.355-AgR/RN, adotou
entendimento no sentido de que a obrigação dos entes da federação no que
tange ao dever fundamental de prestação de saúde é solidária (AI nº
808.059 AgR, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, julgado
em 02/12/2010, DJe de 01/02/2011). Ademais, da conjugação dos artigos 23,
inciso II, e 196 a 200 da Constituição Federal decorre que o direito à
saúde é de todos os cidadãos e dever da União, Estados, Distrito Federal e
Municípios. Em consequência, a corte máxima assentou que a responsabilidade
é dos entes mencionados (RE nº 195.192/RS). Destaquem-se, ademais,
precedentes do Superior Tribunal de Justiça: (AgRg no AREsp 612.404/MG,
Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/05/2015,
DJe 20/05/2015; AgRg no AREsp 264.335/CE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/04/2014, DJe 07/05/2014).
- Ficou demonstrado que o medicamento ELAPRASE (Idursulfase), embora tenha
sido registrado na ANVISA, é de comercialização proibida e não consta
da lista de produtos do SUS, bem como que ao ser requerido seu fornecimento
ao Ministério da Saúde, foi negado ao fundamento de que não pode ser
padronizado para utilização no âmbito do SUS com financiamento público,
em razão do seu alto custo e não haver informações suficientes sobre
sua eficácia e segurança no tratamento da doença em questão. Assim,
restou caracterizada a presença do interesse de agir, pois o autor não
teve outra saída a não ser socorrer-se do Poder Judiciário para obtenção
do medicamento, em decorrência de seu direito ao livre acesso à justiça,
tratado no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal.
- O direito ao fornecimento dos medicamentos decorre dos deveres impostos
à União, Estados, Distrito Federal e Municípios pelos artigos 6º,
23, inciso II, e 196 a 200 da Lei Maior na realização do direito à
saúde. As normas legais devem ser interpretadas em conformidade com as
normas constitucionais referidas, a fim de que se concretize o direito
fundamental à saúde dos cidadãos. Em consequência, a definição do
elenco de medicamento s e tratamentos diversos existe como dever aos entes
estatais para o estabelecimento de uma política de saúde consistente, o
que não exclui que drogas alternativas sejam ministradas pelo médico que
atende o paciente e sob sua responsabilidade profissional, nem que outros
programas sejam estabelecidos para assistir aqueles que forem portadores de
artrite reumatoide e que não constituem restrição ao acesso à saúde. É
certo que cumpre ao Judiciário a efetivação dos direitos prescritos
na Constituição Federal e nas leis. É a garantia fundamental do artigo
5º, inciso XXXV, da CF. O artigo 2º do Estatuto Constitucional deve ser
interpretado em harmonia com o acesso à jurisdição e com os dispositivos
pertinentes à saúde pública (artigo 6º, inciso II, e artigos 196 a 200
da CF). A reserva do possível, o denominado "mínimo existencial", no qual
se incluem os direitos individuais e coletivos à vida e à saúde e que
se apresenta com as características da integridade e da intangibilidade,
e alegações genéricas, sem demonstração objetiva, no sentido da
inexistência de recursos ou de previsão orçamentária não são capazes
de frustrar a preservação e o atendimento, em favor dos indivíduos,
de condições mínimas de existência, saúde e dignidade. Note-se que é
notória a necessidade da manutenção do tratamento. Como parâmetro, as
entidades federais, no atendimento ao direito à saúde, devem pautar-se pelos
princípios e normas constitucionais. O SUS, na regulamentação que lhe dá
a Lei nº 8.080/1990, deve-se orientar à mais ampla possível realização
concreta do direito fundamental de que aqui se cuida (artigos 1º, 2º,
4º, 6º, 9º, 15, 19-M, 19-O, 19-P, 19-Q e 19-R). É de suma importância
que o médico seja respeitado nas prescrições que faz, uma vez que é
quem acompanha e faz recomendações ao paciente, salvo quando a atividade
contrarie os próprios conhecimentos existentes no campo da medicina. Nesse
contexto, a prova cabal de que o medicamento é eficaz é desnecessária, na
medida em que a chance de melhora do doente com o uso do remédio prescrito
é suficiente para justificar seu fornecimento.
- De outro lado, o fato de o medicamento não estar padronizado em qualquer
programa de saúde contemplado pelo SUS e não ser disponibilizado na
Farmácia Alto Custo por não constar do rol de medicamentos do Protocolo
Técnico de Dispensão de Medicamentos Alto Custo, aprovado pela Resolução
SS nº 137/98, não afasta o dever do poder público de custear o tratamento
prescrito por médico e, portanto, necessário, a pacientes sem condições
financeiras. Sobre a questão, destaco entendimento desta 4ª Turma: (AI
00067763520164030000, DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE, TRF3 - QUARTA
TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/09/2016).
- Remessa oficial e apelações desprovidas.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, não conhecer do apelo de fls. 740/753 e do agravo retido,
rejeitar as preliminares arguidas e negar provimento às apelações e à
remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
03/10/2018
Data da Publicação
:
09/11/2018
Classe/Assunto
:
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2129705
Órgão Julgador
:
QUARTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRETE
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-523
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-23 INC-2 ART-196 ART-197 ART-198 ART-199 ART-200 ART-5
INC-35 ART-6 INC-2 ART-2
LEG-FED LEI-8080 ANO-1990 ART-1 ART-2 ART-4 ART-6 ART-9 ART-15 ART-19M
ART-19O ART-19P ART-19Q ART-19R
LEG-FED RES-137 ANO-1998
SS
PROC:AI 0006776-35.2016.4.03.0000/SP ÓRGÃO:QUARTA TURMA
JUIZ:DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE
AUD:17/08/2016
DATA:14/09/2016 PG:
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/11/2018
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