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Jurisprudência


TRF3 0009068-82.2014.4.03.6104 00090688220144036104

Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. CONHECIMENTO PARCIAL DO RECURSO. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. OPERAÇÃO OVERSEA. NULIDADE DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA/TELEMÁTICA. NULIDADE DAS PROVAS OBTIDAS POR MEIO DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA/TELEMÁTICA E ANÁLISE DE DADOS CADASTRAIS. NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. MATÉRIA PRELIMINAR REJEITADA. DUPLA IMPUTAÇÃO DOS FATOS. BIS IN INDEM. CONCESSÃO DA ORDEM DE HABEAS CORPUS EX OFFICIO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL QUANTO AO CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO TRANSNACIONAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. TESTEMUNHO POLICIAL. RELEVANTE FORÇA PROBANTE. REDIMENSIOMENTO DAS PENAS. INAPLICABILIDADE DA MINORANTE DO ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/2006. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DAS EXECUÇÕES PENAIS PARA DECIDIR SOBRE A UNIFICAÇÃO DE PENAS. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. DESCABIMENTO. CUSTÓDIA PREVENTIVA. 1. O pedido de fixação do regime inicial, e não integral, fechado para o cumprimento da pena privativa de liberdade, haja vista a declaração de inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/1990, não pode ser conhecido, pois a sentença dispôs nesse sentido. 2. A utilização de interceptação telefônica em casos semelhantes a este é recorrente e, de fato, necessária, pois o alto grau de cautela adotado por associações ligadas ao narcotráfico determina o acesso a métodos de investigação diferentes dos tradicionais, o que atende ao disposto no art. 2º, II, da Lei nº 9.296/1996. 3. O caso concreto reflete, de forma clássica, aquelas situações em que a medida excepcional da interceptação das comunicações telefônicas mostra-se imprescindível para a colheita da prova. As sucessivas prorrogações, a seu turno, foram concretamente fundamentadas e justificaram-se em razão da complexidade do caso e do número de investigados. O longo período pelo qual se estendeu a manutenção da quebra alinha-se à gravidade dos fatos e à magnitude da atuação do grupo investigado, o que tornou imprescindível a sua prorrogação por quase um ano. Precedentes. 4. A regularidade das interceptações telefônicas/telemáticas foi objeto do HC 0028984-47.2015.4.03.0000/SP, tendo sido denegada a ordem por esta Décima Primeira Turma, em 24.05.2016. Assim, não há que se falar em nulidade da interceptação das comunicações telefônicas/telemáticas por violação aos requisitos previstos na Lei nº 9.296/1996, uma vez que a matéria já foi julgada. 5. A realização de diligências para obter a maior quantidade possível de dados acerca dos alvos da investigação, o que inclui seus números telefônicos e endereços de e-mail, é absolutamente legítima e ínsita ao próprio desempenho do trabalho da polícia judiciária. Por essa razão, a autoridade policial tem legitimidade para obter diretamente dados cadastrais, remanescendo a reserva de jurisdição apenas para a realização da interceptação do conteúdo das conversas. 6. Foi expressamente determinado pelo magistrado a quo o fornecimento de senha aos polícias federais - identificados nas decisões judiciais -, por específico prazo de validade, para que eles procedessem à consulta a cadastro de usuários, com o fim de dar prosseguimento às investigações, em virtude das quais se deu a quebra de sigilo telefônico/telemático, devidamente fundamentada (CF, art. 93, IX). A identificação dos policiais federais, por meio do nome completo e respectiva matrícula, e a especificação de prazo visam exatamente a garantir o sigilo dos dados obtidos pelas investigações. Desse modo, não há que se cogitar da ilegalidade ou inconstitucionalidade da ordem judicial, tampouco da nulidade das provas obtidas pela medida. Precedentes. Alegação rejeitada. 7. Verifica-se das certidões lavradas nos autos, que o recorrente, por meio de seu advogado, devidamente constituído, teve acesso à cópia integral digitalizada do conteúdo do pedido de quebra de sigilo de dados e/ou telefônico, em mais de uma oportunidade, daí por que a sua argumentação de que a defesa foi tolhida por falta de obtenção da totalidade das informações do referido feito não encontra suporte fático, não havendo que se cogitar da conversão do feito em diligência para a juntada de relatório policial contendo todos os acessos realizados pelos agentes. 8. A medida judicial da quebra de sigilo telefônico/telemático observou os ditames legais e não apresenta qualquer vício a ensejar sua nulidade. Do mesmo modo, a sentença é clara, precisa e concisa, não se vislumbrando nulidade em virtude do cerceamento do direito de defesa. 9. A Operação Oversea cuida da investigação de 21 (vinte e uma) apreensões de cocaína, sendo que cada um desses fatos foi classificado como um evento. Os aludidos eventos, por conseguinte, deram origem a diversas ações penais. Assim, não há que se falar na aplicação de "várias penas ao único fato investigado" em afronta ao princípio do ne bis idem, segundo alegado, genericamente, pela defesa. 10. Os fatos objeto da presente ação penal - "Evento nº 20" - não se confundem com aqueles apurados na ação penal nº 0003926-97.2014.4.03.6104, a qual trata dos "Eventos nºs 16 e 17". Os fatos da presente ação também não se confundem com aqueles da ação penal nº 0007428-44.2014.4.03.6104, uma vez que essa é oriunda do desmembramento do feito nº 0003926-97.2014.4.03.6104 e, portanto, trata, igualmente, dos "Eventos nºs 16 e 17". Assim, rejeito a preliminar de bis in idem aventada pelos réus. 11. Outrossim, verifica-se que o denominado "Evento nº 20" foi utilizado para fundamentar, do ponto de vista fático, a denúncia dos acusados pelo crime de organização criminosa. Posteriormente, foi também utilizado para fundamentar a denúncia de que trata o presente feito pela associação para o tráfico transnacional de drogas. Está claro que os acusados foram processados duas vezes pelo mesmo fato. 12. Ante a duplicidade de ações penais pelo mesmo fato, caracterizada está a violação ao princípio do ne bis in idem, o que impõe o trancamento da segunda ação penal, relativamente aos acusados, haja vista a inexistência de justa causa quanto ao delito de associação para o tráfico internacional de drogas. Precedente desta Décima Primeira Turma. Concedido, ex officio, ordem de habeas corpus para o trancamento desta ação penal tão somente no que tange ao crime de associação para o tráfico internacional de entorpecentes, com fundamento no art. 654, § 2º, do Código de Processo Penal, ante a ocorrência de flagrante ilegalidade consistente no bis in idem. 13. A materialidade, a autoria e o dolo do delito de tráfico internacional de drogas foram comprovados por documentos, depoimentos de testemunhas e interrogatórios dos réus, evidenciando que os acusados, de forma consciente e em comunhão de vontades, praticaram o crime. 14. É pacífica a jurisprudência no sentido de que os agentes públicos, como policiais, não são suspeitos apenas em razão da função que ocupam, podendo ser testemunhas em processo criminal. Ao contrário, os policiais são agentes públicos investidos em cargos cujas atribuições se ligam essencialmente à segurança pública e que não têm interesse em prejudicar pessoas inocentes, especialmente quando os relatos apresentados são coerentes, seguros e estão em harmonia com as demais provas colhidas no bojo dos autos. 15. Readequação da pena-base considerando a natureza e quantidade do entorpecente apreendido, circunstância preponderante nos termos do art. 42 da Lei nº 11.343/2006. 16. Pena de multa fixada observando-se o limite imposto na sentença a fim de evitar-se a reformatio in pejus. 17. Incide a causa de aumento de pena referente à transnacionalidade (Lei nº 11.343/2006, art. 40, I), pois, a droga estava prestes a ser enviada para comercialização na Espanha, o que se faz, de ofício, à razão de 1/6 (um sexto), por se tratar de patamar razoável e condizente com a orientação firmada nesta Corte Federal. 18. Inaplicável aos acusados a causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006, uma vez que não foram preenchidos os requisitos legais. 19. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, pois não preenchidos os requisitos previstos no art. 44 do Código Penal. 20. A custódia preventiva foi devidamente fundamentada. Considerando que os réus permaneceram presos cautelarmente durante toda a instrução e que continuam presentes os motivos que levaram à segregação preventiva, sem fato novo superveniente que justifique colocá-los em liberdade, a prisão remanesce hígida. Precedentes. Pedido de concessão do direito de recorrer em liberdade rejeitado. 21. Apelação da defesa de um dos réus parcialmente conhecida e, nesta parte, rejeitada a matéria preliminar e, no mérito, parcialmente provida. Matéria preliminar rejeitada e, no mérito, apelação da defesa do corréu desprovida. De ofício, reduzidas as penas de ambos os réus, bem como, concedida ordem de habeas corpus para o trancamento da ação penal tão somente no que tange ao crime de associação para o tráfico internacional de drogas (art. 35 da Lei nº 11.343/2006), com fundamento no art. 654, § 2º, do Código de Processo Penal, ante a ocorrência de flagrante ilegalidade consistente no bis in idem.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer de parte da apelação do réu José Camilo dos Santos; na parte conhecida, rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, dar-lhe parcial provimento, para reduzir a sanção penal na primeira fase da dosimetria da pena, minorando-a, de ofício, na terceira fase, observado o limite de dias-multa imposto na sentença, para fixá-la, definitivamente, em 7 (sete) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 758 (setecentos e cinquenta e oito) dias-multa, no valor unitário de 1/2 (metade) do salário mínimo vigente na data do fato, pela prática do crime tipificado no art. 33, caput, c.c. o art. 40, I, ambos da lei nº 11.343/2006; rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação de Ricardo dos Santos Santana, bem como, de ofício, reduzir a sanção penal na primeira e na terceira fases da dosimetria da pena, observado o limite de dias-multa imposto na sentença, fixando-a, definitivamente, em 7 (sete) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 758 (setecentos e cinquenta e oito) dias-multa, no valor unitário de 1/2 (metade) do salário mínimo vigente na data do fato pela prática do crime tipificado no art. 33, caput, c.c. o art. 40, I, ambos da Lei nº 11.343/2006. conceder, de ofício, ordem de habeas corpus para o trancamento da ação penal tão somente no que tange ao crime de associação para o tráfico internacional de drogas (art. 35 da Lei nº 11.343/2006), com fundamento no art. 654, § 2º, do Código de Processo Penal, ante a ocorrência de flagrante ilegalidade consistente no bis in idem, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 04/09/2018
Data da Publicação : 20/09/2018
Classe/Assunto : Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 68114
Órgão Julgador : DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** LDR-06 LEI DE DROGAS LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-33 PAR-4 ART-42 ART-40 INC-1 ART-35 ***** LCH-90 LEI DOS CRIMES HEDIONDOS LEG-FED LEI-8072 ANO-1990 ART-2 PAR-1 LEG-FED LEI-9296 ANO-1996 ART-2 INC-2 ***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 LEG-FED ANO-1988 ART-93 INC-9 ***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-654 PAR-2 ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-44
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/09/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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