TRF3 0009149-53.2008.4.03.6100 00091495320084036100
DIREITO CIVIL - AÇÃO DE COBRANÇA - DÍVIDA ORIUNDA DE CONTRATO DE
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ADMINISTRAÇÃO DE CARTÕES DE CRÉDITO DA CAIXA -
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL, A PARTIR DA ENTRADA EM VIGOR DO NOVO CÓDIGO CIVIL -
VERBA HONORÁRIA - APELO DA CEF IMPROVIDO - APELO DOS RÉUS PROVIDO EM PARTE -
SENTENÇA REFORMADA PARCIALMENTE.
1. O NCPC, conquanto se aplique imediatamente aos processos em curso,
não atinge as situações já consolidadas dentro do processo (art. 14),
em obediência ao princípio da não surpresa e ao princípio constitucional
do isolamento dos atos processuais. Assim, ainda que o recurso tivesse sido
interposto após a entrada em vigor do NCPC, o que não é o caso, por ter
sido a sentença proferida sob a égide da lei anterior, é à luz dessa
lei que ela deverá ser reexaminada pelo Tribunal, ainda que para reformá-la.
2. Tratando-se de ação fundada em direito pessoal, a prescrição
sofreu alteração com a entrada em vigor do Código Civil de 2002: o prazo
vintenário (art. 177 do CC/1916) passou a ser quinquenal (art. 206, § 5º,
I, do CC/2002). E o novo Código Civil prevê, em seu artigo 2.028, uma
regra de transição, segundo a qual "serão os da lei anterior os prazos,
quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor,
já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada".
3. A regra do artigo 205 do Código Civil de 2002, que estabelece prazo
prescricional de 5 (cinco) anos, quando a lei não lhe haja aplicado prazo
menor, não se aplica ao caso presente, que se enquadra, como se disse,
na hipótese prevista no inciso I do parágrafo 5º do artigo 206 do mesmo
Código Civil, qual seja, "a pretensão de cobrança de dívidas líquidas
constantes de instrumento público ou particular", para a qual se aplica o
prazo quinquenal.
4. No tocante ao termo "a quo" da contagem do prazo prescricional, mesmo
nos casos em que há vencimento antecipado da dívida, deve prevalecer, em
regra, aquele indicado no contrato, pois a cobrança de seu crédito antes
do vencimento normalmente contratado é uma faculdade do credor, e não
uma obrigatoriedade, que pode, inclusive, ser renunciado, não modificando,
por essa razão, o início da fluência do prazo prescricional.
5. Em relação à dívida oriunda de Contrato de Prestação de Serviços
de Cartão de Crédito, no entanto, há que se considerar a peculiaridade
desse tipo de crédito, que é disponibilizado pela instituição financeira
dentro do limite contratado para utilização de forma automática, conforme
a necessidade do tomador. Nesse caso, a prescrição deve ser contada a
partir da data apontada, no demonstrativo de débito, como data de início do
inadimplemento, pois esta corresponde, na verdade, ao termo final do contrato
para pagamento da dívida, estabelecido em contrato e contado a partir da data
em que o débito atinge o limite do crédito contratado, sem que o tomador
realize qualquer pagamento para saldar a sua dívida. Precedentes (STJ,
AgRg no AREsp nº 690.412/SP, 3ª Turma, Relator Ministro Marco Aurélio
Bellizze, DJe 21/08/2015; TRF3, AC nº 0019424-66.2005.4.03.6100/SP, 11ª
Turma, Relatora Desembargadora Federal Cecilia Mello, DE 24/01/2017).
6. A interrupção da prescrição, a teor do artigo 219 do CPC/1973, se
dará com a citação válida ("caput") e retroagirá à data da propositura
da ação (parágrafo 1º), incumbindo à parte promover a citação,
não podendo ela ser prejudicada pela demora na citação se imputável
exclusivamente ao serviço judiciário (parágrafo 2º). Este, ademais,
é o entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, expresso na
Súmula nº 106 ("Proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício,
a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça,
não justifica o acolhimento da arguição de prescrição ou decadência").
7. No caso concreto, depreende-se, do demonstrativo de débito de fls. 49/51,
que o falecido autor se tornou inadimplente a partir de 11/06/98, aplicando-se,
pois, inicialmente, o prazo prescricional de 20 (vinte) anos, contado a
partir do inadimplemento. E, ainda não tendo transcorrido mais de 10 (dez)
anos, quando da entrada em vigor do novo Código Civil, em 11/01/2003, o
prazo prescricional passou a ser quinquenal, contado a partir dessa data,
encerrando, assim, em 10/01/2008.
8. Considerando que a presente ação de cobrança foi ajuizada em 16/04/2008,
ou seja, após o decurso do prazo quinquenal contado a partir da entrada
em vigor do novo Código Civil, deve subsistir a sentença recorrida, que
julgou extinto o feito, com fulcro no artigo 269, inciso IV, do CPC/1973.
9. Não obstante tenha sido atribuído à causa o valor de R$ 61.645,36
(sessenta e um mil, seiscentos e quarenta e cinco reais e trinta e seis
centavos), mas considerando a simplicidade da causa e a singeleza do
trabalho realizado, os honorários advocatícios devem ser fixados em 5%
(cinco por cento) do valor atribuído à causa, o que se harmoniza com os
princípios da proporcionalidade e razoabilidade, nos termos do artigo 20,
parágrafo 4º, do CPC/1973.
10. Apelo da CEF improvido. Apelo dos réus parcialmente provido. Sentença
reformada, em parte.
Ementa
DIREITO CIVIL - AÇÃO DE COBRANÇA - DÍVIDA ORIUNDA DE CONTRATO DE
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ADMINISTRAÇÃO DE CARTÕES DE CRÉDITO DA CAIXA -
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL, A PARTIR DA ENTRADA EM VIGOR DO NOVO CÓDIGO CIVIL -
VERBA HONORÁRIA - APELO DA CEF IMPROVIDO - APELO DOS RÉUS PROVIDO EM PARTE -
SENTENÇA REFORMADA PARCIALMENTE.
1. O NCPC, conquanto se aplique imediatamente aos processos em curso,
não atinge as situações já consolidadas dentro do processo (art. 14),
em obediência ao princípio da não surpresa e ao princípio constitucional
do isolamento dos atos processuais. Assim, ainda que o recurso tivesse sido
interposto após a entrada em vigor do NCPC, o que não é o caso, por ter
sido a sentença proferida sob a égide da lei anterior, é à luz dessa
lei que ela deverá ser reexaminada pelo Tribunal, ainda que para reformá-la.
2. Tratando-se de ação fundada em direito pessoal, a prescrição
sofreu alteração com a entrada em vigor do Código Civil de 2002: o prazo
vintenário (art. 177 do CC/1916) passou a ser quinquenal (art. 206, § 5º,
I, do CC/2002). E o novo Código Civil prevê, em seu artigo 2.028, uma
regra de transição, segundo a qual "serão os da lei anterior os prazos,
quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor,
já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada".
3. A regra do artigo 205 do Código Civil de 2002, que estabelece prazo
prescricional de 5 (cinco) anos, quando a lei não lhe haja aplicado prazo
menor, não se aplica ao caso presente, que se enquadra, como se disse,
na hipótese prevista no inciso I do parágrafo 5º do artigo 206 do mesmo
Código Civil, qual seja, "a pretensão de cobrança de dívidas líquidas
constantes de instrumento público ou particular", para a qual se aplica o
prazo quinquenal.
4. No tocante ao termo "a quo" da contagem do prazo prescricional, mesmo
nos casos em que há vencimento antecipado da dívida, deve prevalecer, em
regra, aquele indicado no contrato, pois a cobrança de seu crédito antes
do vencimento normalmente contratado é uma faculdade do credor, e não
uma obrigatoriedade, que pode, inclusive, ser renunciado, não modificando,
por essa razão, o início da fluência do prazo prescricional.
5. Em relação à dívida oriunda de Contrato de Prestação de Serviços
de Cartão de Crédito, no entanto, há que se considerar a peculiaridade
desse tipo de crédito, que é disponibilizado pela instituição financeira
dentro do limite contratado para utilização de forma automática, conforme
a necessidade do tomador. Nesse caso, a prescrição deve ser contada a
partir da data apontada, no demonstrativo de débito, como data de início do
inadimplemento, pois esta corresponde, na verdade, ao termo final do contrato
para pagamento da dívida, estabelecido em contrato e contado a partir da data
em que o débito atinge o limite do crédito contratado, sem que o tomador
realize qualquer pagamento para saldar a sua dívida. Precedentes (STJ,
AgRg no AREsp nº 690.412/SP, 3ª Turma, Relator Ministro Marco Aurélio
Bellizze, DJe 21/08/2015; TRF3, AC nº 0019424-66.2005.4.03.6100/SP, 11ª
Turma, Relatora Desembargadora Federal Cecilia Mello, DE 24/01/2017).
6. A interrupção da prescrição, a teor do artigo 219 do CPC/1973, se
dará com a citação válida ("caput") e retroagirá à data da propositura
da ação (parágrafo 1º), incumbindo à parte promover a citação,
não podendo ela ser prejudicada pela demora na citação se imputável
exclusivamente ao serviço judiciário (parágrafo 2º). Este, ademais,
é o entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, expresso na
Súmula nº 106 ("Proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício,
a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça,
não justifica o acolhimento da arguição de prescrição ou decadência").
7. No caso concreto, depreende-se, do demonstrativo de débito de fls. 49/51,
que o falecido autor se tornou inadimplente a partir de 11/06/98, aplicando-se,
pois, inicialmente, o prazo prescricional de 20 (vinte) anos, contado a
partir do inadimplemento. E, ainda não tendo transcorrido mais de 10 (dez)
anos, quando da entrada em vigor do novo Código Civil, em 11/01/2003, o
prazo prescricional passou a ser quinquenal, contado a partir dessa data,
encerrando, assim, em 10/01/2008.
8. Considerando que a presente ação de cobrança foi ajuizada em 16/04/2008,
ou seja, após o decurso do prazo quinquenal contado a partir da entrada
em vigor do novo Código Civil, deve subsistir a sentença recorrida, que
julgou extinto o feito, com fulcro no artigo 269, inciso IV, do CPC/1973.
9. Não obstante tenha sido atribuído à causa o valor de R$ 61.645,36
(sessenta e um mil, seiscentos e quarenta e cinco reais e trinta e seis
centavos), mas considerando a simplicidade da causa e a singeleza do
trabalho realizado, os honorários advocatícios devem ser fixados em 5%
(cinco por cento) do valor atribuído à causa, o que se harmoniza com os
princípios da proporcionalidade e razoabilidade, nos termos do artigo 20,
parágrafo 4º, do CPC/1973.
10. Apelo da CEF improvido. Apelo dos réus parcialmente provido. Sentença
reformada, em parte.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, negar provimento ao apelo da CEF e dar parcial provimento
ao apelo dos réus, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
25/04/2017
Data da Publicação
:
05/05/2017
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1947948
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/05/2017
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