TRF3 0009404-97.2016.4.03.6110 00094049720164036110
PROCESSUAL PENAL E PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DA
JUSTIÇA FEDERAL REJEITADA. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO
PARA O TRÁFICO. ATIVIDADE CLANDESTINA DE TELECOMUNICAÇÕES. AUTORIA E
MATERIALIDADE COMPROVADAS. ESTADO DE NECESSIDADE E ERRO DE PROIBIÇÃO
AFASTADOS. "BATEDOR" NÃO CARACTERIZA A PARTICIPAÇÃO DE MENOR
IMPORTÂNCIA. DOSIMETRIA DA PENA.
1. A transnacionalidade do crime de tráfico de drogas e de associação
para o tráfico restou comprovada pelo local onde foi feito o carregamento
da droga (Mato Grosso do Sul, que faz fronteira com o Paraguai) e o local
onde a substância entorpecente seria entregue (no Porto de Santos). Além
disso, nos aparelhos de telefonia celular apreendidos em poder dos réus
foram identificados dois contatos com o DDI do Paraguai.
2. Autoria e materialidade devidamente comprovadas em relação aos crimes de
tráfico transnacional de drogas, associação para o tráfico transnacional
de drogas e atividade clandestina de telecomunicações relativamente a
ambos os acusados.
3. Crime de tráfico transnacional de drogas. Afastada a alegação de estado
de necessidade justificante ou exculpante, seja como causa excludente da
ilicitude, seja como causa de diminuição de pena (CP, art. 24, § 2º)
ou mesmo como atenuante (CP, art. 65, III, "a").
4. Dificuldades financeiras são bastante comuns na sociedade contemporânea,
mas isso não justifica que alguém cometa qualquer crime para superá-las,
ainda mais o tráfico (transnacional ou não) de drogas, conduta com
altíssimo grau de reprovação social. Aceitar o cometimento de crime
como justificativa para satisfação de necessidades individuais (superar
dificuldades financeiras, p. ex.) significaria abrir mão do mínimo sentido
de civilidade e de organização social, na medida em que cada ser humano
passaria a satisfazer suas próprias necessidades a qualquer custo, o que
levaria a evidente caos social.
5. Atividade clandestina de telecomunicações. A denúncia imputou aos
acusados o delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97. O julgador na
origem entendeu que a descrição dos fatos daria ensejo a classificação
jurídica diversa, pois os acusados não utilizariam os rádios de
modo habitual. O critério de habitualidade da conduta não enseja a
desclassificação do art. 183 dessa Lei para o art. 70 da Lei nº 4.177/70.
6. A conduta imputada aos réus é superveniente à Lei nº 9.472/97 e,
por isso, amolda-se a descrição típica do art. 183 daquele, não sendo
o caso de aplicação do art. 70 da Lei nº 4.177/62, eis que a conduta dos
acusados foi a de exercer atividade clandestina de comunicação. No caso,
houve alteração da capitulação jurídica dos fatos descritos na denúncia
e, por isso, considerando que o art. 183 da Lei nº 9.472/97 prevê sanções
mais graves do que a cominada pelo art. 70 da Lei nº 4.177/62, corrijo
a desclassificação verificada na sentença e mantenho a aplicação da
Lei nº 9.472/97, mas com as penas previstas pelo diploma legal de 1962,
em observância ao princípio de veda a reformatio in pejus.
7. O delito é formal e de perigo abstrato, razão pela qual se
consuma independentemente do efetivo dano ao bem jurídico tutelado,
bastando que a conduta do agente crie risco de prejuízo aos serviços de
telecomunicações autorizados. A baixa potência do rádio transceptor não
implica a atipicidade material da conduta, não sendo aplicável ao caso
o princípio da insignificância. Precedentes. A potencialidade lesiva da
atividade desenvolvida pelos apelantes restou comprovada pelos laudos.
8. Afastada a alegação do erro de proibição. Os réus diante de acentuada
experiência em suas profissões (motoristas) possuíam ciência de que era
necessária autorização do órgão regulador (ANATEL) para uso dos rádios
instalados em seus caminhões, não sendo o caso, também, da aplicação
da atenuante referente ao desconhecimento da lei, prevista no art. 65, II,
do Código Penal.
9. No crime de tráfico transnacional de drogas, a atuação de "batedor",
conduta que objetiva evitar a abordagem policial, não pode ser considerada
como participação de menor importância, pois o réu com sua ação
concorre, efetivamente, para a prática do crime, nos termos do art. 29,
caput, do Código Penal.
10. A| natureza e a enorme quantidade da droga apreendida (2,4 toneladas
de maconha) justificam a exasperação da pena-base até o máximo legal
permitido, nos termos do art. 42 da Lei nº 11.343/2006.
11. Reconhecida a um dos réus a atenuante da confissão espontânea, nos
termos do art. 65, III, "d", do Código Penal.
12. Correta a aplicação da causa de aumento de pena prevista no inciso
I do art. 40 da Lei nº 11.343/2006, no patamar de 1/6, relativa à
transnacionalidade do delito, haja vista que ficou bem delineado pela
instrução probatória o fato de que a droga era proveniente do exterior.
13. Correta a não aplicação da causa de diminuição de pena prevista
no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, pois os acusados integram
organização criminosa voltada ao tráfico ilícito de drogas.
14. Mantida a pena aplicada para o crime de associação para o tráfico.
15. Mantida a pena aplicada para o crime do art. 183 da Lei nº 9.472/97.
16. Concurso material mantido (CP, art. 69).
17. Regime inicial fechado para o cumprimento das penas dos acusados.
18. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas
de direitos, por falta do requisito objetivo previsto no art. 44, I, do
Código Penal.
19. Réu condenado ao pagamento das custas processuais. Isenção. Matéria
a ser examinada na fase de execução do julgado. Precedentes.
20. Apelação da acusação provida. Apelações das defesas não providas.
Ementa
PROCESSUAL PENAL E PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DA
JUSTIÇA FEDERAL REJEITADA. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO
PARA O TRÁFICO. ATIVIDADE CLANDESTINA DE TELECOMUNICAÇÕES. AUTORIA E
MATERIALIDADE COMPROVADAS. ESTADO DE NECESSIDADE E ERRO DE PROIBIÇÃO
AFASTADOS. "BATEDOR" NÃO CARACTERIZA A PARTICIPAÇÃO DE MENOR
IMPORTÂNCIA. DOSIMETRIA DA PENA.
1. A transnacionalidade do crime de tráfico de drogas e de associação
para o tráfico restou comprovada pelo local onde foi feito o carregamento
da droga (Mato Grosso do Sul, que faz fronteira com o Paraguai) e o local
onde a substância entorpecente seria entregue (no Porto de Santos). Além
disso, nos aparelhos de telefonia celular apreendidos em poder dos réus
foram identificados dois contatos com o DDI do Paraguai.
2. Autoria e materialidade devidamente comprovadas em relação aos crimes de
tráfico transnacional de drogas, associação para o tráfico transnacional
de drogas e atividade clandestina de telecomunicações relativamente a
ambos os acusados.
3. Crime de tráfico transnacional de drogas. Afastada a alegação de estado
de necessidade justificante ou exculpante, seja como causa excludente da
ilicitude, seja como causa de diminuição de pena (CP, art. 24, § 2º)
ou mesmo como atenuante (CP, art. 65, III, "a").
4. Dificuldades financeiras são bastante comuns na sociedade contemporânea,
mas isso não justifica que alguém cometa qualquer crime para superá-las,
ainda mais o tráfico (transnacional ou não) de drogas, conduta com
altíssimo grau de reprovação social. Aceitar o cometimento de crime
como justificativa para satisfação de necessidades individuais (superar
dificuldades financeiras, p. ex.) significaria abrir mão do mínimo sentido
de civilidade e de organização social, na medida em que cada ser humano
passaria a satisfazer suas próprias necessidades a qualquer custo, o que
levaria a evidente caos social.
5. Atividade clandestina de telecomunicações. A denúncia imputou aos
acusados o delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97. O julgador na
origem entendeu que a descrição dos fatos daria ensejo a classificação
jurídica diversa, pois os acusados não utilizariam os rádios de
modo habitual. O critério de habitualidade da conduta não enseja a
desclassificação do art. 183 dessa Lei para o art. 70 da Lei nº 4.177/70.
6. A conduta imputada aos réus é superveniente à Lei nº 9.472/97 e,
por isso, amolda-se a descrição típica do art. 183 daquele, não sendo
o caso de aplicação do art. 70 da Lei nº 4.177/62, eis que a conduta dos
acusados foi a de exercer atividade clandestina de comunicação. No caso,
houve alteração da capitulação jurídica dos fatos descritos na denúncia
e, por isso, considerando que o art. 183 da Lei nº 9.472/97 prevê sanções
mais graves do que a cominada pelo art. 70 da Lei nº 4.177/62, corrijo
a desclassificação verificada na sentença e mantenho a aplicação da
Lei nº 9.472/97, mas com as penas previstas pelo diploma legal de 1962,
em observância ao princípio de veda a reformatio in pejus.
7. O delito é formal e de perigo abstrato, razão pela qual se
consuma independentemente do efetivo dano ao bem jurídico tutelado,
bastando que a conduta do agente crie risco de prejuízo aos serviços de
telecomunicações autorizados. A baixa potência do rádio transceptor não
implica a atipicidade material da conduta, não sendo aplicável ao caso
o princípio da insignificância. Precedentes. A potencialidade lesiva da
atividade desenvolvida pelos apelantes restou comprovada pelos laudos.
8. Afastada a alegação do erro de proibição. Os réus diante de acentuada
experiência em suas profissões (motoristas) possuíam ciência de que era
necessária autorização do órgão regulador (ANATEL) para uso dos rádios
instalados em seus caminhões, não sendo o caso, também, da aplicação
da atenuante referente ao desconhecimento da lei, prevista no art. 65, II,
do Código Penal.
9. No crime de tráfico transnacional de drogas, a atuação de "batedor",
conduta que objetiva evitar a abordagem policial, não pode ser considerada
como participação de menor importância, pois o réu com sua ação
concorre, efetivamente, para a prática do crime, nos termos do art. 29,
caput, do Código Penal.
10. A| natureza e a enorme quantidade da droga apreendida (2,4 toneladas
de maconha) justificam a exasperação da pena-base até o máximo legal
permitido, nos termos do art. 42 da Lei nº 11.343/2006.
11. Reconhecida a um dos réus a atenuante da confissão espontânea, nos
termos do art. 65, III, "d", do Código Penal.
12. Correta a aplicação da causa de aumento de pena prevista no inciso
I do art. 40 da Lei nº 11.343/2006, no patamar de 1/6, relativa à
transnacionalidade do delito, haja vista que ficou bem delineado pela
instrução probatória o fato de que a droga era proveniente do exterior.
13. Correta a não aplicação da causa de diminuição de pena prevista
no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, pois os acusados integram
organização criminosa voltada ao tráfico ilícito de drogas.
14. Mantida a pena aplicada para o crime de associação para o tráfico.
15. Mantida a pena aplicada para o crime do art. 183 da Lei nº 9.472/97.
16. Concurso material mantido (CP, art. 69).
17. Regime inicial fechado para o cumprimento das penas dos acusados.
18. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas
de direitos, por falta do requisito objetivo previsto no art. 44, I, do
Código Penal.
19. Réu condenado ao pagamento das custas processuais. Isenção. Matéria
a ser examinada na fase de execução do julgado. Precedentes.
20. Apelação da acusação provida. Apelações das defesas não providas.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, REJEITAR A PRELIMINAR de incompetência da Justiça Federal;
DAR PROVIMENTO à apelação da acusação para majorar as penas-bases de
ambos os réus relativas ao crime de tráfico transnacional de drogas e
NEGAR PROVIMENTO às apelações das defesas, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Prosseguindo no
julgamento, a Turma, por maioria decidiu, fixar definitivamente as penas em:
18 (dezoito) anos e 1 (um) mês de reclusão e 1 (um) ano de detenção e
2.274 (dois mil e duzentos e setenta e quatro) dias-multa para Jorge da Silva
Querino Junior, e em 21 (vinte e um) anos e 7 (sete) meses de reclusão e 1
(um) ano de detenção e 2.702 (dois mil e setecentos e dois) dias-multa
para Leandro Gonçalves da Silva, nos termos do voto do Relator, vencido o
Desembargador Federal José Lunardelli que dava provimento à apelação da
acusação para majorar as penas-bases de ambos os réus relativas ao crime
de tráfico transnacional de drogas (em menor proporção que o Relator),
e fixava as penas em 13 (treze) anos, 2 (dois) meses e 20 ( vinte) dias de
reclusão, 1 (um) ano de detenção e 1787 (mil setecentos e oitenta e sete)
dias-multa, para Jorge da Silva Querino Junior, e em 17 (dezessete) anos,
8 (oito) meses e 10 (dez) dias de reclusão, 1 ano de detenção, e 2312
dias-multa para Leandro Gonçalves da Silva.
Data do Julgamento
:
05/06/2018
Data da Publicação
:
12/06/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 72937
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Observações
:
VIDE EMENTA
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-24 PAR-2 ART-65 INC-3 LET-A LET-D INC-2
ART-29 ART-69 ART-44 INC-1
LEG-FED LEI-9472 ANO-1997 ART-183
***** CBT-62 CÓDIGO BRASILEIRO DE TELECOMUNICAÇÕES
LEG-FED LEI-4117 ANO-1962 ART-70
***** LDR-06 LEI DE DROGAS
LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-42 ART-40 INC-1 ART-33 PAR-4
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/06/2018
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