TRF3 0010250-81.2005.4.03.6181 00102508120054036181
PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME DESCRITO NO ARTIGO 334, § 1º, C,
DO CÓDIGO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO
CONFIGURAÇÃO. ART. 41 DO CPP. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. REQUISITOS
NÃO PREENCHIDOS. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. RECURSOS
DESPROVIDOS.
1. Preliminar de inépcia da denúncia rejeitada. A denúncia foi oferecida
em consonância com os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal,
expondo o fato criminoso, com suas circunstâncias, a qualificação dos
acusados e a classificação dos crimes adequada à descrição dos fatos.
2. Cerceamento de defesa não configurado. Com efeito, não obstante o
Laudo de Exame Merceológico tenha sido acostado aos autos posteriormente
à defesa prévia, não há de se falar em cerceamento de defesa, uma vez
que a ré teve oportunidade para se manifestar sobre o referido documento
no decorrer da ação, inclusive em sede de alegações finais, inexistindo,
neste sentido, violação à ampla defesa e ao contraditório.
3. Nulidade do Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal
não demonstrada. O erro de grafia de seu nome e ausência de qualificação
naquele documento não enseja a nulidade arguida, tendo em vista que tal fato
não gera dúvidas quanto à sua identidade ou quanto aos fatos narrados,
mormente constar referência expressa ao inquérito policial (IPL nº
2.4295/05) instaurado em razão da apreensão das mercadorias descritas
nos autos. Ademais, não há comprovação de qualquer irregularidade com
relação à sua intimação sobre o Auto de Infração.
4. Por outro lado, o descaminho é crime formal, cuja consumação ocorre
com o mero ingresso da mercadoria em território nacional sem o pagamento dos
tributos devidos, não dependendo da demonstração do valor do tributo que
deixou de ser recolhido e, neste aspecto, não exigindo a constituição
definitiva do crédito tributário para consubstanciar a materialidade
delitiva. Isto porque, ao contrário dos crimes descritos na Lei nº 4.729/65
e na Lei nº 8.137/90, que têm por escopo a proteção da ordem tributária,
configurada no interesse do Estado no recebimento dos tributos devidos,
o crime de descaminho apresenta tutela dúplice: o interesse jurídico do
ingresso de valores no erário público e outros bens jurídicos, tais
como o controle da entrada e saída de bens do território nacional e a
proteção das atividades econômicas nacionais frente à de outros países,
o que está ligado à política nacional de desenvolvimento econômico.
5. Nulidade da oitiva de testemunhas não demonstrada. Direito constitucional
ao silêncio não se aplica às testemunhas.
6. Da suspensão condicional do processo. Para a concessão da requerida
benesse, o acusado não pode estar sendo processado ou já ter sido condenado
por outro crime, nos termos do artigo 89 da Lei n° 9.099/95. No caso,
a denunciada Chan Mu Kam figura como ré em outras ações penais pela
prática do delito previsto no art. 334 do Código Penal, não fazendo jus,
portanto, à concessão da suspensão condicional do processo. Sendo assim,
à míngua dos requisitos legais para a concessão da benesse, não se
vislumbra a alegada nulidade pelo não oferecimento da proposta de suspensão
condicional do processo pelo Parquet.
7. A materialidade do delito definido no artigo 334, § 1º, alínea c,
do Código Penal ficou demonstrada pelo Auto de Apreensão, pelo Auto
de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal e pelo Laudo de
Merceológico, os quais demonstram a exposição à venda, no exercício
de atividade comercial, das mercadorias apreendidas de origem estrangeira,
no valor total de R$ 58.781,00 (cinquenta e oito mil e setecentos e oitenta
e um reais). Ademais, consoante o depoimento judicial da acusada Chan Mu Kam,
as mercadorias apreendidas, nos termos da denúncia, estavam desacompanhadas
de nota fiscal.
8. Os depoimentos judiciais das testemunhas atestam a responsabilidade penal
da ré, bem como demonstram que a mesma agiu de forma livre e consciente
ao praticar os crimes narrados na denúncia, não se admitindo falar na
ausência de dolo e desconhecimento da ilicitude.
9. A pena-base da acusada foi fixada acima do mínimo legal, em 01 (um) ano e
06 (seis) meses de reclusão, em conformidade com os critérios estabelecidos
no artigo 59 do Código Penal, considerando as circunstâncias do crime
consistentes no elevado valor das mercadorias apreendidas, totalizando
R$ 58.781,00 (cinquenta e oito mil e setecentos e oitenta e um reais),
e na significativa quantidade de objetos apreendidos. Por fim, à míngua
de agravantes ou atenuantes e causas de diminuição ou aumento da pena,
o Juízo a quo tornou definitiva a pena de 01 (um) ano e 06 (seis) meses
de reclusão, fixando, no mais, o regime inicial aberto. Presentes os
requisitos do artigo 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade foi
substituída por uma restritiva de direito consistente na prestação de
serviços em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros
estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais, segundo
suas aptidões, à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação,
tudo a ser especificado em fase de execução.
10. No caso, a pena fixada pelo Juízo a quo é proporcional ao caso concreto,
não prosperando o requerimento da acusação de majoração da pena, à
míngua das circunstâncias negativas apontadas em seu recurso. Note-se,
neste sentido, o parecer do Parquet federal, in verbis: "Assim, não
procede a insurgência da acusação, pois nenhum dos apontamentos criminais
registrados nas folhas de antecedentes da acusada é de condenação definitiva
(fls. 35/37, 41/43, 49 e 56/57 do apenso), restando obstada a exasperação
da pena-base por esse motivo".
11. Outrossim, também não merece acolhimento o pedido da defesa para a
fixação da pena-base no mínimo legal, tendo em vista as circunstâncias
do delito, configuradas no elevado valor e significativa quantidade de
mercadorias apreendidas.
12. Assim, cumprido o escopo da prevenção geral e específica, impôs-se
a justa retribuição da pena derivada e, portanto, a sentença recorrida
não merece reparos. Por fim, anoto que, não obstante o entendimento de
que a existência de circunstância judicial desfavorável ao réu obsta a
substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos,
nos moldes do artigo 44, inciso III, do Código Penal, deve ser mantida
a substituição da pena nos termos da r. sentença, por ausência de
impugnação neste sentido.
13. Matéria preliminar rejeitada. Apelação da ré e apelação da acusação
a que se nega provimento.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME DESCRITO NO ARTIGO 334, § 1º, C,
DO CÓDIGO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO
CONFIGURAÇÃO. ART. 41 DO CPP. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. REQUISITOS
NÃO PREENCHIDOS. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. RECURSOS
DESPROVIDOS.
1. Preliminar de inépcia da denúncia rejeitada. A denúncia foi oferecida
em consonância com os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal,
expondo o fato criminoso, com suas circunstâncias, a qualificação dos
acusados e a classificação dos crimes adequada à descrição dos fatos.
2. Cerceamento de defesa não configurado. Com efeito, não obstante o
Laudo de Exame Merceológico tenha sido acostado aos autos posteriormente
à defesa prévia, não há de se falar em cerceamento de defesa, uma vez
que a ré teve oportunidade para se manifestar sobre o referido documento
no decorrer da ação, inclusive em sede de alegações finais, inexistindo,
neste sentido, violação à ampla defesa e ao contraditório.
3. Nulidade do Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal
não demonstrada. O erro de grafia de seu nome e ausência de qualificação
naquele documento não enseja a nulidade arguida, tendo em vista que tal fato
não gera dúvidas quanto à sua identidade ou quanto aos fatos narrados,
mormente constar referência expressa ao inquérito policial (IPL nº
2.4295/05) instaurado em razão da apreensão das mercadorias descritas
nos autos. Ademais, não há comprovação de qualquer irregularidade com
relação à sua intimação sobre o Auto de Infração.
4. Por outro lado, o descaminho é crime formal, cuja consumação ocorre
com o mero ingresso da mercadoria em território nacional sem o pagamento dos
tributos devidos, não dependendo da demonstração do valor do tributo que
deixou de ser recolhido e, neste aspecto, não exigindo a constituição
definitiva do crédito tributário para consubstanciar a materialidade
delitiva. Isto porque, ao contrário dos crimes descritos na Lei nº 4.729/65
e na Lei nº 8.137/90, que têm por escopo a proteção da ordem tributária,
configurada no interesse do Estado no recebimento dos tributos devidos,
o crime de descaminho apresenta tutela dúplice: o interesse jurídico do
ingresso de valores no erário público e outros bens jurídicos, tais
como o controle da entrada e saída de bens do território nacional e a
proteção das atividades econômicas nacionais frente à de outros países,
o que está ligado à política nacional de desenvolvimento econômico.
5. Nulidade da oitiva de testemunhas não demonstrada. Direito constitucional
ao silêncio não se aplica às testemunhas.
6. Da suspensão condicional do processo. Para a concessão da requerida
benesse, o acusado não pode estar sendo processado ou já ter sido condenado
por outro crime, nos termos do artigo 89 da Lei n° 9.099/95. No caso,
a denunciada Chan Mu Kam figura como ré em outras ações penais pela
prática do delito previsto no art. 334 do Código Penal, não fazendo jus,
portanto, à concessão da suspensão condicional do processo. Sendo assim,
à míngua dos requisitos legais para a concessão da benesse, não se
vislumbra a alegada nulidade pelo não oferecimento da proposta de suspensão
condicional do processo pelo Parquet.
7. A materialidade do delito definido no artigo 334, § 1º, alínea c,
do Código Penal ficou demonstrada pelo Auto de Apreensão, pelo Auto
de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal e pelo Laudo de
Merceológico, os quais demonstram a exposição à venda, no exercício
de atividade comercial, das mercadorias apreendidas de origem estrangeira,
no valor total de R$ 58.781,00 (cinquenta e oito mil e setecentos e oitenta
e um reais). Ademais, consoante o depoimento judicial da acusada Chan Mu Kam,
as mercadorias apreendidas, nos termos da denúncia, estavam desacompanhadas
de nota fiscal.
8. Os depoimentos judiciais das testemunhas atestam a responsabilidade penal
da ré, bem como demonstram que a mesma agiu de forma livre e consciente
ao praticar os crimes narrados na denúncia, não se admitindo falar na
ausência de dolo e desconhecimento da ilicitude.
9. A pena-base da acusada foi fixada acima do mínimo legal, em 01 (um) ano e
06 (seis) meses de reclusão, em conformidade com os critérios estabelecidos
no artigo 59 do Código Penal, considerando as circunstâncias do crime
consistentes no elevado valor das mercadorias apreendidas, totalizando
R$ 58.781,00 (cinquenta e oito mil e setecentos e oitenta e um reais),
e na significativa quantidade de objetos apreendidos. Por fim, à míngua
de agravantes ou atenuantes e causas de diminuição ou aumento da pena,
o Juízo a quo tornou definitiva a pena de 01 (um) ano e 06 (seis) meses
de reclusão, fixando, no mais, o regime inicial aberto. Presentes os
requisitos do artigo 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade foi
substituída por uma restritiva de direito consistente na prestação de
serviços em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros
estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais, segundo
suas aptidões, à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação,
tudo a ser especificado em fase de execução.
10. No caso, a pena fixada pelo Juízo a quo é proporcional ao caso concreto,
não prosperando o requerimento da acusação de majoração da pena, à
míngua das circunstâncias negativas apontadas em seu recurso. Note-se,
neste sentido, o parecer do Parquet federal, in verbis: "Assim, não
procede a insurgência da acusação, pois nenhum dos apontamentos criminais
registrados nas folhas de antecedentes da acusada é de condenação definitiva
(fls. 35/37, 41/43, 49 e 56/57 do apenso), restando obstada a exasperação
da pena-base por esse motivo".
11. Outrossim, também não merece acolhimento o pedido da defesa para a
fixação da pena-base no mínimo legal, tendo em vista as circunstâncias
do delito, configuradas no elevado valor e significativa quantidade de
mercadorias apreendidas.
12. Assim, cumprido o escopo da prevenção geral e específica, impôs-se
a justa retribuição da pena derivada e, portanto, a sentença recorrida
não merece reparos. Por fim, anoto que, não obstante o entendimento de
que a existência de circunstância judicial desfavorável ao réu obsta a
substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos,
nos moldes do artigo 44, inciso III, do Código Penal, deve ser mantida
a substituição da pena nos termos da r. sentença, por ausência de
impugnação neste sentido.
13. Matéria preliminar rejeitada. Apelação da ré e apelação da acusação
a que se nega provimento.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, no mérito,
negar provimento à apelação da Justiça Pública e, por maioria, negar
provimento à apelação da defesa, nos termos do voto do Relator, acompanhado
pelo Des. Fed. Cotrim Guimarães, vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy que lhe
dava parcial provimento, para reduzir a pena-base para 01 ano, 04 meses e
15 dias de reclusão. De ofício, o Des. Fed. Cotrim Guimarães decretava a
extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva estatal,
uma vez que transcorreu lapso temporal superior a quatro anos entre a data
do fato e a data do recebimento da denúncia e também entre a data da
publicação da sentença penal condenatória e a presente.
Data do Julgamento
:
27/06/2017
Data da Publicação
:
07/07/2017
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 51226
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-334 PAR-1 LET-C ART-44 ART-59
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-41
LEG-FED LEI-4729 ANO-1965
LEG-FED LEI-8137 ANO-1990
***** LJE-95 LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS
LEG-FED LEI-9099 ANO-1995 ART-89
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/07/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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