TRF3 0010715-07.2016.4.03.6181 00107150720164036181
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE
DROGAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. OFÍCIO DO DEA. INTERCEPTAÇÃO
TELEFÔNICA. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO
DEMONSTRADOS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE E NATUREZA DA
DROGA. REGIME SEMIABERTO. APELAÇÃO DA DEFESA NÃO PROVIDA.
1. O ofício do DEA (Drug Enforcement Administration), agência anti-drogas
dos Estados Unidos, não configura um pedido de cooperação jurídica
internacional propriamente dito, tal como previsto no art.1º, item 02,
do Decreto Presidencial nº.3.810/2001 (MLAT), pois o DEA não solicitou ao
Coordenador Geral de Polícia de Repressão a Entorpecentes do Departamento
de Polícia Federal a realização de procedimentos probatórios - busca
e apreensão, entrega de documentos, confisco de bens, interceptação
telefônica - previstos no MLAT em seu art.1°, com as formalidades previstas
no art. 4° e seus itens 01 a 03 e alíneas.
2. Da leitura dos autos, verifica-se que, no dia 05/09/2007, o DEA enviou
um comunicado noticiando que sua inteligência teve notícia de que havia
a movimentação de uma quadrilha estruturada com o objetivo de enviar
cocaína da Colômbia para a Europa, utilizando o Brasil como entreposto. Cabe
salientar que, inicialmente, foram apontados apenas NESTOR ALONSO CASTANEDA
AREVALO, CARLOS RAISH UTRIA e ESPERANZA DE JESUS ZAFRA ARREGONES e que as
investigações já aconteciam na Colômbia, onde ocorreu interceptação
telefônica judicialmente autorizada segundo a legislação daquele país e
que foi compartilhada posteriormente com a autoridade policial brasileira,
a partir de representação formulada por esta. Em 04/04/2008, a Delegacia
de repressão a entorpecentes da Polícia Federal em São Paulo demonstrou
com percuciência e detalhes as diligências realizadas para confirmar
as informações recebidas na delatio criminis do DEA e representou pelo
monitoramento telefônico dos investigados (fl. 02/08 do apenso volume I da
cópia integral dos autos n° 0004884-56.2008.403.6181), o que foi deferido,
em 10/04/2008, pelo Juízo Federal (fls. 31/38 do mesmo volume).
3. O sigilo talhado por proteção constitucional previsto no art.5, inciso
XII, in fine, da Magna Carta, é da comunicação telefônica propriamente
dita - a conversa entre os interlocutores - e não os dados, em si mesmos
considerados, guarnecidos nos aparelhos de telefonia ou os dados cadastrais
dos seus usuários.
4. A sentença se encontra formalmente em ordem, provida de relatório,
fundamentação e dispositivo e, logo, não padece de vício de nulidade. De
outro lado, quanto ao exame das razões suscitadas pela defesa, a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o art. 93, IX,
da Constituição Federal não compele o magistrado a analisar exaustivamente
todos os argumentos pretendidos pelas partes, mas sim que a fundamentação
da decisão seja coerente com o teor da prestação jurisdicional.
5. O crime de associação para o tráfico, art. 35 da Lei nº 11.343/06, é
um crime formal, o qual se perfaz sem a necessidade da efetiva circulação
de drogas e exige a presença de apenas duas pessoas agrupadas de forma
estável e permanente (elemento objetivo) com animus associativo (elemento
subjetivo) voltado para a prática dos delitos previstos no art. 33, caput e
1º, e 34 da referida Lei de Drogas. Todavia, constitui um crime autônomo,
ou seja, basta a presença do animus associativo de pessoas agrupadas de
forma estável e permanente, tendo por finalidade a prática dos tipos
previstos nos artigos 33, caput e 1º, e 34 da Lei de Drogas.
6. As provas produzidas durante a instrução processual são suficientes
para comprovar o envolvimento do réu com vasta rede destinada ao tráfico
internacional de entorpecentes, operando gigantescas quantidades de drogas
de forma dissimulada, tudo isso com estabilidade, permanência e divisão de
funções claramente caracterizadas, com o objetivo de importar, refinar,
manter e guardar a cocaína produzida na Colômbia. Os monitoramentos
telefônicos revelam estrutura e encadeamento dos atos que resultaram
em várias apreensões de drogas no bojo da Operação "San Lucca",
demonstrando que não se trata de atos amadores, desprovidos de organização
e planejamento. Os diálogos constantes nos autos permitem, à saciedade,
comprovar as alegações formuladas pela acusação na peça exordial.
7. Autoria e materialidade comprovadas nos autos.
8. Considerando a gigantesca quantidade de drogas movimentada pela associação
criminosa e relatada nos autos, bem como as circunstâncias em que isso se
deu, a pena-base foi exasperada em patamar adequado.
9. A pena definitiva para o delito previsto no artigo 35 da Lei n° 11.343/2006
fica estabelecida em 7 (sete) anos de reclusão e 1050 (um mil e cinquenta)
dias-multa.
10. Trata-se de réu primário, que não ostenta maus antecedentes e nesse
passo anoto que, diferentemente do que restou afirmado na sentença apelada,
o réu não foi condenado por tráfico de drogas na 2ª Vara do Guarujá. Com
efeito, verifica-se às fls. 1.632 que JAIRO JAVIER JULIAO CARNEIRO é
réu no processo n° 0012991-48.2005.8.26.0223, que corre na 2ª Vara
Criminal estadual do Foro de Guarujá. Contudo, ali não há informação
de sentença, o que até hoje não ocorreu, conforme é possível verificar
em consulta no site do TJ-SP. Considerando que a pena-base foi exasperada
com tal fundamentação, além da quantidade e natureza da droga apreendida
e da complexidade da organização criminosa, forçoso é, considerando
o tempo de pena corporal fixado, determinar o regime inicial semiaberto,
com fundamento no art. 33, § 2º, b, do Código Penal.
11. Deve ser fixado o regime inicial semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º,
b, do Código Penal, mesmo considerando-se o disposto no § 2º do art. 387
do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei n.º 12.736/2012, pois o
réu foi preso em 07/05/2014, data dos fatos, assim permaneceu até a data
da sentença, em 06/12/2016. Descontando tal lapso da pena aqui estabelecida,
esta continua superior a 04 (quatro) anos.
12. Exauridos os recursos nesta Corte e interpostos recursos dirigidos às
Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), expeça-se
Carta de Sentença, bem como comunique-se ao Juízo de Origem para o início
da execução da pena imposta à ré, sendo dispensadas tais providências
em caso de trânsito em julgado, hipótese em que terá início a execução
definitiva da pena.
13. Apelação da defesa não provida.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE
DROGAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. OFÍCIO DO DEA. INTERCEPTAÇÃO
TELEFÔNICA. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO
DEMONSTRADOS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE E NATUREZA DA
DROGA. REGIME SEMIABERTO. APELAÇÃO DA DEFESA NÃO PROVIDA.
1. O ofício do DEA (Drug Enforcement Administration), agência anti-drogas
dos Estados Unidos, não configura um pedido de cooperação jurídica
internacional propriamente dito, tal como previsto no art.1º, item 02,
do Decreto Presidencial nº.3.810/2001 (MLAT), pois o DEA não solicitou ao
Coordenador Geral de Polícia de Repressão a Entorpecentes do Departamento
de Polícia Federal a realização de procedimentos probatórios - busca
e apreensão, entrega de documentos, confisco de bens, interceptação
telefônica - previstos no MLAT em seu art.1°, com as formalidades previstas
no art. 4° e seus itens 01 a 03 e alíneas.
2. Da leitura dos autos, verifica-se que, no dia 05/09/2007, o DEA enviou
um comunicado noticiando que sua inteligência teve notícia de que havia
a movimentação de uma quadrilha estruturada com o objetivo de enviar
cocaína da Colômbia para a Europa, utilizando o Brasil como entreposto. Cabe
salientar que, inicialmente, foram apontados apenas NESTOR ALONSO CASTANEDA
AREVALO, CARLOS RAISH UTRIA e ESPERANZA DE JESUS ZAFRA ARREGONES e que as
investigações já aconteciam na Colômbia, onde ocorreu interceptação
telefônica judicialmente autorizada segundo a legislação daquele país e
que foi compartilhada posteriormente com a autoridade policial brasileira,
a partir de representação formulada por esta. Em 04/04/2008, a Delegacia
de repressão a entorpecentes da Polícia Federal em São Paulo demonstrou
com percuciência e detalhes as diligências realizadas para confirmar
as informações recebidas na delatio criminis do DEA e representou pelo
monitoramento telefônico dos investigados (fl. 02/08 do apenso volume I da
cópia integral dos autos n° 0004884-56.2008.403.6181), o que foi deferido,
em 10/04/2008, pelo Juízo Federal (fls. 31/38 do mesmo volume).
3. O sigilo talhado por proteção constitucional previsto no art.5, inciso
XII, in fine, da Magna Carta, é da comunicação telefônica propriamente
dita - a conversa entre os interlocutores - e não os dados, em si mesmos
considerados, guarnecidos nos aparelhos de telefonia ou os dados cadastrais
dos seus usuários.
4. A sentença se encontra formalmente em ordem, provida de relatório,
fundamentação e dispositivo e, logo, não padece de vício de nulidade. De
outro lado, quanto ao exame das razões suscitadas pela defesa, a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o art. 93, IX,
da Constituição Federal não compele o magistrado a analisar exaustivamente
todos os argumentos pretendidos pelas partes, mas sim que a fundamentação
da decisão seja coerente com o teor da prestação jurisdicional.
5. O crime de associação para o tráfico, art. 35 da Lei nº 11.343/06, é
um crime formal, o qual se perfaz sem a necessidade da efetiva circulação
de drogas e exige a presença de apenas duas pessoas agrupadas de forma
estável e permanente (elemento objetivo) com animus associativo (elemento
subjetivo) voltado para a prática dos delitos previstos no art. 33, caput e
1º, e 34 da referida Lei de Drogas. Todavia, constitui um crime autônomo,
ou seja, basta a presença do animus associativo de pessoas agrupadas de
forma estável e permanente, tendo por finalidade a prática dos tipos
previstos nos artigos 33, caput e 1º, e 34 da Lei de Drogas.
6. As provas produzidas durante a instrução processual são suficientes
para comprovar o envolvimento do réu com vasta rede destinada ao tráfico
internacional de entorpecentes, operando gigantescas quantidades de drogas
de forma dissimulada, tudo isso com estabilidade, permanência e divisão de
funções claramente caracterizadas, com o objetivo de importar, refinar,
manter e guardar a cocaína produzida na Colômbia. Os monitoramentos
telefônicos revelam estrutura e encadeamento dos atos que resultaram
em várias apreensões de drogas no bojo da Operação "San Lucca",
demonstrando que não se trata de atos amadores, desprovidos de organização
e planejamento. Os diálogos constantes nos autos permitem, à saciedade,
comprovar as alegações formuladas pela acusação na peça exordial.
7. Autoria e materialidade comprovadas nos autos.
8. Considerando a gigantesca quantidade de drogas movimentada pela associação
criminosa e relatada nos autos, bem como as circunstâncias em que isso se
deu, a pena-base foi exasperada em patamar adequado.
9. A pena definitiva para o delito previsto no artigo 35 da Lei n° 11.343/2006
fica estabelecida em 7 (sete) anos de reclusão e 1050 (um mil e cinquenta)
dias-multa.
10. Trata-se de réu primário, que não ostenta maus antecedentes e nesse
passo anoto que, diferentemente do que restou afirmado na sentença apelada,
o réu não foi condenado por tráfico de drogas na 2ª Vara do Guarujá. Com
efeito, verifica-se às fls. 1.632 que JAIRO JAVIER JULIAO CARNEIRO é
réu no processo n° 0012991-48.2005.8.26.0223, que corre na 2ª Vara
Criminal estadual do Foro de Guarujá. Contudo, ali não há informação
de sentença, o que até hoje não ocorreu, conforme é possível verificar
em consulta no site do TJ-SP. Considerando que a pena-base foi exasperada
com tal fundamentação, além da quantidade e natureza da droga apreendida
e da complexidade da organização criminosa, forçoso é, considerando
o tempo de pena corporal fixado, determinar o regime inicial semiaberto,
com fundamento no art. 33, § 2º, b, do Código Penal.
11. Deve ser fixado o regime inicial semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º,
b, do Código Penal, mesmo considerando-se o disposto no § 2º do art. 387
do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei n.º 12.736/2012, pois o
réu foi preso em 07/05/2014, data dos fatos, assim permaneceu até a data
da sentença, em 06/12/2016. Descontando tal lapso da pena aqui estabelecida,
esta continua superior a 04 (quatro) anos.
12. Exauridos os recursos nesta Corte e interpostos recursos dirigidos às
Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), expeça-se
Carta de Sentença, bem como comunique-se ao Juízo de Origem para o início
da execução da pena imposta à ré, sendo dispensadas tais providências
em caso de trânsito em julgado, hipótese em que terá início a execução
definitiva da pena.
13. Apelação da defesa não provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, negar provimento ao recurso do réu JAIRO JAVIER JULIAO
CARNEIRO e, de ofício, fixar o regime prisional inicial semiaberto, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
09/10/2018
Data da Publicação
:
18/10/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 74072
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED DEC-3810 ANO-2001 ART-1 ART-4
ITEM 1,2 E 3 - MLAT
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-12 ART-93 INC-9
***** LDR-06 LEI DE DROGAS
LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-35 ART-34 ART-33 PAR-1
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-33 PAR-2 LET-B
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-387 PAR-2
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/10/2018
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